RESUMO
A amiloidose cardíaca corresponde a uma miocardiopatia infiltrativa, resultante do depósito da proteína amiloide no miocárdio. Na amiloidose sistêmica primária (tipo AL), a proteína amiloide é composta por cadeias leves que resultam de discrasia dos plasmócitos, havendo envolvimento cardíaco em até 50% dos doentes.
Apresentamos o caso de um homem de 43 anos, com queixas de edema periódico da língua e xerostomia, hemorragia gengival e hematúria há dois meses. Analiticamente havia a destacar anemia normocítica, trombocitopenia e um INR alto espontâneo, pelo que foi referenciado à consulta de Medicina Interna. Na primeira consulta, apresentou-se com sinais de insuficiência cardíaca congestiva franca, pelo que foi referenciado ao Serviço de Urgência. O eletrocardiograma demonstrou taquicardia sinusal e critérios de baixa voltagem. O ecocardiograma revelou hipertrofia biventricular com fração de ejeção preservada, fisiologia restritiva com elevação das pressões de enchimento, espessamento do septo interauricular e das válvulas auriculoventriculares, derrame pericárdico ligeiro e padrão de apical sparing no strain longitudinal 2D. Realizou ainda ressonância magnética cardíaca, que mostrou realce tardio subendocárdico difuso. A eletroforese das proteínas foi inconclusiva, contudo a análise da urina revelou proteinúria no espectro nefrótico, presença de proteína de Bence Jones e um teste de imunofixação com uma banda monoclonal de cadeias lambda. A biópsia da gordura abdominal foi negativa. Não obstante, foi realizada uma biópsia da medula óssea, verificando-se plasmocitose monoclonal lambda, o que confirmou o diagnóstico de amiloidose primária sistêmica.
Este caso representa uma causa rara de insuficiência cardíaca no jovem adulto. A baixa voltagem no eletrocardiograma e os achados ecocardiográficos típicos devem fazer suspeitar de amiloidose cardíaca. O prognóstico é ditado pelo nível de envolvimento cardíaco, motivo pelo qual o diagnóstico e o tratamento precoces são essenciais.