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Quando em Roma, faça como os romanos: um estudo de caso da Odebrecht e o contínuo da destrutividade

Resumo

Esta pesquisa conduz um estudo de caso de uma empresa de construção pesada Odebrecht para responder à questão: Como um indivíduo racionaliza o crime em uma organização corrupta? Este estudo é baseado nos conceitos de organização corrupta, contínuo da destrutividade, desengajamento moral e racionalização. Nós analisamos quatro livros que são artefatos da cultura da Odebrecht e vídeos de 49 executivos que colaboraram na investigação da Lava Jato. Os resultados descrevem os caminhos que os funcionários trilham dentro da organização, adquirindo seus sistemas de valores, crenças e pressupostos. Estes caminhos levam a racionalização da corrupção. Este estudo de caso mostra que o contínuo da destrutividade começa quando empregados encontram comportamentos antiéticos dentro da organização e que os mecanismos de racionalização se modificam com o tempo dentro da cultura corrupta. A qualquer momento executivos podem pedir demissão ou denunciar; no entanto, com o tempo se torna difícil exercer qualquer uma dessas opções. Ao aplicar e refinar o contínuo, esta pesquisa prove um entendimento sobre como desengajamento moral e racionalização incentivam funcionários a seguir adiante no contínuo.

Palavras-chave:
cultura organizacional; organização corrupta; racionalização; contínuo da destrutividade; corrupção

Abstract

This research conducts a case study on Odebrecht, a heavy construction company, to answer the question of how an individual rationalizes crime in a corrupt organization? The study is based on the concepts of a corrupt organization, the continuum of destructiveness, moral disengagement, and rationalization. We analyze four books, artifacts on Odebrecht’s culture and videos on 49 executives that collaborated in the Car Wash corruption probe. The results describe the paths employees undertake in the organization by acquiring its internal set of values, beliefs, and assumptions. These paths lead to the rationalization of corruption. This case study shows that the continuum of destructiveness starts when employees encounter unethical behavior in the organization and that their rationalization mechanism changes with time in the corrupt culture. At any point, executives can quit or blow the whistle; however, with time, it becomes more challenging to exercise either of the options. By applying and refining the continuum, this research provides an understanding of how moral disengagement and rationalization to help employees to progress in the continuum in a corrupt culture.

Keywords:
organizational culture; corrupt organization; rationalization; the continuum of destructiveness; corruption

Resumen

Esta investigación realiza un estudio de caso de la empresa de construcción pesada Odebrecht para responder a la pregunta: ¿Cómo un individuo racionaliza el crimen en una organización corrupta? Este estudio se basa en los conceptos de organización corrupta, continuo de destructividad, desvinculación moral y racionalización. Analizamos cuatro libros que son artefactos de la cultura Odebrecht y videos de 49 ejecutivos que colaboraron en la investigación “Lava Jato”. Los resultados describen los caminos que toman los empleados dentro de la organización, adquiriendo sus sistemas de valores, creencias y suposiciones. Estos caminos conducen a la racionalización de la corrupción. Este estudio de caso muestra que el continuo de destructividad comienza cuando los empleados encuentran un comportamiento poco ético dentro de la organización y que los mecanismos de racionalización cambian con el tiempo dentro de la cultura corrupta. Los ejecutivos pueden renunciar o denunciar en cualquier momento, sin embargo, con el tiempo se vuelve difícil ejercer cualquiera de estas opciones. Al aplicar y refinar el continuo, esta investigación proporciona una idea de cómo la desconexión moral y la racionalización alientan a los empleados a ascender en el continuo.

Palabras clave:
cultura organizacional; organización corrupta; racionalización; continuo de destructividad; corrupción

1. INTRODUÇÃO

A literatura sobre corrupção pode ser dividida em diferentes abordagens em relação à sua causa, como escolha pública, “maçãs podres”, decisões sobre valores morais, cultura organizacional, ethos da administração pública e correlação com outras variáveis (Graaf, 2007Graaf, G. (2007). Causes of corruption: towards a contextual theory of corruption. Public Administration Quarterly, 31(1), 39-86. Retrieved fromhttps://www.jstor.org/stable/41288282
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). Esta pesquisa entende a corrupção como resultado de uma cultura organizacional, que viu o crescimento de duas linhas de pesquisa. A primeira retrata a corrupção como uma norma cultural (Nelson, 2017Nelson, J. S. (2017). The corruption norm. Journal of Management Inquiry, 26(3), 280-286. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1056492616675415
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). A segunda investiga como fatores contextuais e institucionais transformam a corrupção em uma prática institucionalizada (Castro, Phillips, & Ansari, 2020Castro, A., Phillips, N., & Ansari, S. (2020). Corporate corruption: a review and research agenda. Academy of Management Annals, 14(2), 1-79. Retrieved from https://doi.org/10.5465/annals.2018.0156
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). Essas duas linhas apresentam a corrupção como uma norma. No entanto, nenhuma delas pode explicar como a corrupção se torna uma norma institucionalizada a partir de atitudes individuais. Os conceitos de desengajamento moral e racionalização, que se referem à justificação do comportamento inadequado e ao distanciamento dele, são fundamentais para entender esse processo (Bandura, 1999Bandura, A. (1999). Moral disengagement in the perpetration of inhumanities. Personality and Social Psychology Review, 3(3), 193-209. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1207/s15327957pspr0303_3
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; Klerk, 2017bKlerk, J. J. (2017b). “The devil made me do it!” An inquiry into the unconscious “devils within” of rationalized corruption. Journal of Management Inquiry, 26(3), 254-269. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1056492617692101
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). No entanto, os pesquisadores não conseguiram avaliar essas teorias empiricamente devido à falta de dados confiáveis sobre corrupção (Campbell & Göritz, 2014Campbell, J. L., & Göritz, A. S. (2014). Culture corrupts! A qualitative study of organizational culture in corrupt organizations. Journal of Business Ethics, 120(3), 291-311. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-013-1665-7
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). Para fazer isso, esta pesquisa se concentrará no framework do continuum da destrutividade (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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).

O continuum da destrutividade descreve o caminho que os indivíduos percorrem depois de se juntarem a uma organização corrupta. Especificamente, este framework descreve sua evolução de espectadores organizacionais, para participantes inocentes, racionalizadores e perpetradores de corrupção, dentro de organizações corruptas e incentivados pela distância ética (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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). Certas pesquisas e simulações que investigam os efeitos das variáveis de racionalização mostram que a racionalização ocorre depois que os indivíduos participam de atividades antiéticas (Rabl & Kühlmann, 2009Rabl, T., & Kühlmann, T. M. (2009). Why or why not? Rationalizing corruption in organizations. Cross Cultural Management: An International Journal, 16(3), 268-286. Retrieved from https://doi.org/10.1108/13527600910977355
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). Embora alguns estudos se concentrem na racionalização do setor público (Gannett & Rector, 2015Gannett, A., & Rector, C. (2015). The rationalization of political corruption. Public Integrity, 17(2), 165-175. Retrieved from https://doi.org/10.1080/10999922.2015.1000654
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), há um número limitado de estudos empíricos sobre agentes corruptos de empresas privadas e sobre como as organizações corruptas encorajam o continuum da destrutividade. Essa lacuna pede o refinamento e aplicação da teoria da corrupção em evidências empíricas (Castro et al., 2020Castro, A., Phillips, N., & Ansari, S. (2020). Corporate corruption: a review and research agenda. Academy of Management Annals, 14(2), 1-79. Retrieved from https://doi.org/10.5465/annals.2018.0156
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).

Usando este framework para entender a perspectiva dos colaboradores, podemos determinar se há um ponto de decisão ou se, durante suas carreiras, os executivos foram levados por mecanismos como racionalização e desengajamento moral que lhes permitiram racionalizar suas ações imorais. Esta investigação se baseia na seguinte pergunta de pesquisa: como um indivíduo racionaliza o crime em uma organização corrupta? Essa pergunta pode ser dividida nos seguintes três objetivos de pesquisa:

  • Explicar o caminho de racionalização que indivíduos seguem após ingressar em uma organização corrupta.

  • Refinar o continuum da destrutividade.

  • Compreender a relação entre uma organização corrupta e o continuum da destrutividade.

Para alcançar esses objetivos, esta pesquisa usou dados fornecidos pelos colaboradores na investigação da corrupção da Operação Lava Jato, que foi uma grande investigação da corrupção sistêmica das empresas de petróleo, gás e construção. Com a ajuda de acordos de delação premiada, os investigadores lançaram uma operação que levou à prisão de vários executivos e políticos (Ministério Público Federal, 2014Ministério Público Federal. (2014). Entenda o caso. Retrieved from https://www.mpf.mp.br/grandes-casos/lava-jato/entenda-o-caso
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). Este artigo analisa dados de corrupção da maior construtora envolvida no esquema, a Odebrecht. A empresa fez um acordo de leniência e seus executivos fizeram acordos de delação premiada. Em seus depoimentos, eles relatam atos de corrupção e suas trajetórias na corporação corrupta. A análise desses depoimentos descreve a história dos 49 executivos na organização corrupta e a cultura da corrupção construída ao longo das últimas décadas. Ao usar dados judiciais para pesquisar a corrupção, esta pesquisa também responde à necessidade de pesquisa mais empírica e inovadora sobre um tema comprovadamente difícil, arriscado e às vezes antiético para os pesquisadores (Castro et al., 2020Castro, A., Phillips, N., & Ansari, S. (2020). Corporate corruption: a review and research agenda. Academy of Management Annals, 14(2), 1-79. Retrieved from https://doi.org/10.5465/annals.2018.0156
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). Para apoiar este conjunto de dados, também analisamos quatro livros - três livros de uma coleção chamada TEO (Tecnologia Empresarial Odebrecht) (N. Odebrecht, 2011Odebrecht, N. (2011). Sobreviver, crescer e perpetuar: Tecnologia Empresarial Odebrecht (TEO) (11a ed.). Salvador, BA: Fundação Norberto Odebrecht.) e um livro intitulado “Confiar e Servir” escrito pelo ex-presidente e membro do conselho da Odebrecht (E. Odebrecht, 2007Odebrecht, E. (2007). Confiar e servir: ideias sobre o desenvolvimento do Brasil e de suas empresas. Rio de Janeiro, RJ: Versal Editores.).

Esta pesquisa explica e refina empiricamente o continuum da destrutividade (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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). Esta abordagem facilita a criação de um framework baseado em dados empíricos, descreve como os executivos, em diferentes estágios do continuum, racionalizaram de maneira diferente e apresenta o desengajamento ético como um importante constructo para o framework do continuum. Também mostra que não há um ponto de decisão em que os racionalizadores se tornam perpetradores e que, a qualquer momento, os indivíduos podem racionalizar sua participação ou exercer a opção de não participar. A pesquisa usa dados judiciais - delações premiadas, neste caso - para conduzir uma pesquisa qualitativa sobre corrupção (Castro et al., 2020Castro, A., Phillips, N., & Ansari, S. (2020). Corporate corruption: a review and research agenda. Academy of Management Annals, 14(2), 1-79. Retrieved from https://doi.org/10.5465/annals.2018.0156
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).

A próxima seção faz uma revisão da literatura para explicar as definições de organizações corruptas e do continuum da destrutividade. Também explica os conceitos de desengajamento moral e racionalização observados na trajetória dos executivos da Odebrecht. Depois disso, discutimos a coleta de dados e os métodos usados para analisar os dados. Finalmente, analisamos os dados, discutimos os resultados e as considerações finais com as contribuições de observar empiricamente o continuum da destrutividade.

2. REVISÃO DE LITERATURA

2.1 Organização corrupta

A corrupção é o abuso do poder para benefício pessoal ou organizacional (Anand, Ashforth, & Joshi, 2004Anand, V., Ashforth, B. E., & Joshi, M. (2004). Business as usual: the acceptance and perpetuation of corruption in organizations. Academy of Management Executive, 19(4), 9-23. Retrieved fromhttps://doi.org/10.5465/AME.2005.19417904
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). Recentemente, os pesquisadores têm desenvolvido teorias de corrupção e as usado para entender os mecanismos de corrupção dentro de uma organização (Castro et al., 2020Castro, A., Phillips, N., & Ansari, S. (2020). Corporate corruption: a review and research agenda. Academy of Management Annals, 14(2), 1-79. Retrieved from https://doi.org/10.5465/annals.2018.0156
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). Essas teorias incluem a institucionalização (Nelson, 2017Nelson, J. S. (2017). The corruption norm. Journal of Management Inquiry, 26(3), 280-286. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1056492616675415
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) e a racionalização da corrupção. Enquanto a primeira discute como a corrupção se torna uma norma, a segunda mostra como os perpetradores racionalizam e justificam seus atos (Castro et al., 2020; Klerk, 2017bKlerk, J. J. (2017b). “The devil made me do it!” An inquiry into the unconscious “devils within” of rationalized corruption. Journal of Management Inquiry, 26(3), 254-269. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1056492617692101
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). Ambas não conseguem explicar como a racionalização e atitude individual transformam a corrupção em norma, e como toda pesquisa sobre corrupção, elas carecem de evidências empíricas, devido às dificuldades de obter dados confiáveis de agentes corruptos.

Em um ambiente onde a corrupção é a norma, mecanismos e processos organizacionais podem facilitar comportamentos ilícitos. Isso separa uma Organização de Indivíduos Corruptos (OIC) de uma Organização Corrupta (OC). Enquanto seria mais fácil remover indivíduos corruptos de uma OIC, a remoção de indivíduos corruptos pode não ser suficiente para acabar com a corrupção em uma OC. As normas e mecanismos de uma OC são modificados para gerenciar atividades ilegais. Isso cria um processo de pagamentos ilegais, sistemas de informação alternativos para ocultar atividades ilegais e, em última instância, uma cultura leniente em relação à corrupção (Pinto, Leana, & Pil, 2008Pinto, J., Leana, C. R., & Pil, F. K. (2008). Corrupt organizations or organizations of corrupt individuals? Two types of organizational-level corruption. Academy of Management Review, 33(3), 685-709. Retrieved fromhttps://doi.org/10.5465/AMR.2008.32465726
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).

Os estudos sobre culturas organizacionais corruptas dependem de dados de casos específicos, como o escândalo da Enron (Sims & Brinkmann, 2003Sims, R. R., & Brinkmann, J. (2003). Enron ethics (or: culture matters more than codes). Journal of Business Ethics, 45(3), 243-256. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1023/A:1024194519384
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) ou o Sistema Nacional de Saúde do Reino Unido (Pope & Burnes, 2013Pope, R., & Burnes, B. (2013). A model of organisational dysfunction in the NHS. Journal of Health Organization and Management, 27(6), 676-697. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1108/JHOM-10-2012-0207
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) e entrevistas com especialistas (Campbell & Göritz, 2014Campbell, J. L., & Göritz, A. S. (2014). Culture corrupts! A qualitative study of organizational culture in corrupt organizations. Journal of Business Ethics, 120(3), 291-311. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-013-1665-7
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). Na esfera pública, a corrupção organizacional de alto nível impacta a corrupção de nível inferior (Gofen, Meza, & Pérez-Chiqués, 2022Gofen, A., Meza, O., & Pérez-Chiqués, E. (2022). When street‐level implementation meets systemic corruption. Public Administration and Development, 42(1), 1-105. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1002/pad.1970
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). Na esfera privada, uma cultura corporativa corrupta influencia os funcionários a tomar decisões antiéticas (Arewa & Farrell, 2015Arewa, A. O., & Farrell, P. (2015). The culture of construction organisations: The epitome of institutionalised corruption. Construction Economics and Building, 15(3), 59-71. Retrieved from https://doi.org/10.5130/AJCEB.v15i3.4619
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; Messick & Bazerman, 2001Messick, D. M., & Bazerman, M. H. (2001). The next phase of business ethics: integrating psychology and ethics. In J. Dienhart, D. Moberg, & R. Duska (Eds.), Research in ethical issues in organizations(pp. 213-238, Vol. 3). Bingley, UK: Emerald Publishing Limited.). Nesse contexto, é imperativo analisar o processo do continuum da destrutividade para entender o que é cultura e como ela influencia a corrupção.

Este estudo descreve uma organização corrupta sob a perspectiva de agentes corruptos. Nesse sentido, ele se concentra no impacto da cultura organizacional no comportamento individual. A cultura organizacional pode ser definida como:

Um padrão de suposições básicas compartilhadas que foi aprendido por um grupo enquanto resolvia seus problemas de adaptação externa e integração interna, que funcionou bem o suficiente para ser considerado válido e, portanto, ser ensinado aos novos membros como a maneira correta de perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas (Schein, 2004Schein, E. H. (2004). Organizational culture and leadership (3a ed.). San Francisco, CA: Jossey-bass., p.17).

Em uma organização corrupta, os valores que impulsionam as decisões são construídos de forma a justificar e racionalizar a corrupção (Klerk, 2017bKlerk, J. J. (2017b). “The devil made me do it!” An inquiry into the unconscious “devils within” of rationalized corruption. Journal of Management Inquiry, 26(3), 254-269. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1056492617692101
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). Histórias e narrativas são criadas como uma justificativa para convencer os agentes de que eles não estão moralmente errados (Messick & Bazerman, 2001Messick, D. M., & Bazerman, M. H. (2001). The next phase of business ethics: integrating psychology and ethics. In J. Dienhart, D. Moberg, & R. Duska (Eds.), Research in ethical issues in organizations(pp. 213-238, Vol. 3). Bingley, UK: Emerald Publishing Limited.). Esses agentes criam estruturas e ferramentas para facilitar atividades ilegais, como pagamento de propina, sobrepreço de contrato e geração de caixa dois. Essas práticas se tornam parte do processo interno da organização.

A cultura também é uma fonte de poder; ela cria restrições que ajudam os membros organizacionais a se comportar de acordo com determinados valores e pressupostos. A cultura organizacional pode ser prejudicial aos funcionários (Pagès, Gaulejac, Bonetti, & Descendre, 1998Pagès, M., Gaulejac, V. D., Bonetti, M., & Descendre, D. (1998). L’emprise de l’organisation. Vizcaya, España: Desclée De Brouwer.). Os indivíduos são assimilados à cultura corporativa ao ponto de confiarem mais nessa cultura do que em seu senso moral. O continuum da destrutividade representa essa assimilação e evangelização (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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).

Vários estudos mostram que a cultura e a natureza da indústria da construção podem facilitar fraudes e corrupção. Independentemente da localização geográfica dos estudos, a relação próxima da indústria com o governo, as cadeias de suprimentos extensas e os contratos complexos tornam essa indústria suscetível à corrupção em nível global (Arewa & Farrell, 2015Arewa, A. O., & Farrell, P. (2015). The culture of construction organisations: The epitome of institutionalised corruption. Construction Economics and Building, 15(3), 59-71. Retrieved from https://doi.org/10.5130/AJCEB.v15i3.4619
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). Essa perspectiva não pode ignorar a influência da cultura organizacional na corrupção. Uma cultura individualista promove astúcia e justifica atividades antiéticas para atingir objetivos organizacionais. Essa cultura também promove má liderança, avareza e baixos valores éticos corporativos, o que prejudica o crescimento de uma empresa a longo prazo (Sims & Brinkmann, 2003Sims, R. R., & Brinkmann, J. (2003). Enron ethics (or: culture matters more than codes). Journal of Business Ethics, 45(3), 243-256. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1023/A:1024194519384
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).

Esses estudos levam à pergunta sobre o que acontece com o indivíduo que se junta a um OC e como essa pessoa se distancia moralmente do comportamento corrupto. Essa pergunta pode ser respondida pelo continuum da destrutividade (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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).

2.2 Continuum da destrutividade

Zyglidopoulos e Fleming (2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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) criaram o continuum da destrutividade para explicar como espectadores inocentes se tornam perpetradores culpados de corrupção em OCs. O progresso de um espectador inocente a perpetrador é mediado pela distância ética. Portanto, é importante definir a distância ética.

A distância ética é a distância entre a atividade antiética e suas consequências, o que implica a dissociação da ação de suas implicações morais. No caso da distância ética estrutural, os agentes permanecem inconscientes de que sua posição na empresa pode desempenhar um papel relevante na alteração da atividade antiética que observam ou empreendem. Frequentemente, esses indivíduos podem não participar ativamente da ação, mas podem testemunhar a participação de seus superiores em atividades ilegais. No caso da distância ética temporal, os agentes permanecem inconscientes das futuras consequências negativas de sua atividade antiética. Isso ocorre no caso de crimes de corrupção, uma vez que o suborno a autoridades políticas ou a execução de contratos superfaturados não exerce efeitos negativos diretos ou, pelo menos, imediatamente visíveis sobre as comunidades (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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).

Nem todos os membros organizacionais podem ser submetidos ao continuum. Especialmente em grandes organizações, os funcionários podem não estar cientes do esquema de corrupção, não são participantes ativos do esquema, nem estão envolvidos em um trabalho que promova ou esteja relacionado às atividades ilegais. Esses funcionários mantêm uma distância ética estrutural da atividade ilegal ao ponto de não estarem cientes dela. Os funcionários se tornam espectadores organizacionais quando tomam conhecimento dos esquemas de corrupção de sua organização. Assim, o processo do continuum da destrutividade afetará indivíduos que estão cientes de práticas ilegais em sua organização, até certo ponto.

Os funcionários se tornam espectadores organizacionais quando veem a necessidade de ação, mas não participam diretamente da atividade. De uma perspectiva geral, e não do ponto de vista de OCs, os espectadores organizacionais podem ser definidos da seguinte forma:

Espectadores Organizacionais são indivíduos que não tomam as ações necessárias quando surgem ameaças ou oportunidades importantes. Eles frequentemente possuem informações cruciais ou um ponto de vista valioso que melhoraria a capacidade de tomada de decisão de uma organização, mas por uma variedade de razões psicológicas e organizacionais, eles não intervêm (Gerstein & Shaw, 2008Gerstein, M., & Shaw, R. (2008). Organizational bystanders. People + Strategy, 31(1), 47-54., p. 5).

Agentes que reagem a um problema ilegal são vistos como delatores. Na ausência de problemas, eles agem como alarmistas. Em qualquer caso, os observadores organizacionais se engajam em racionalização psicológica; por exemplo, esses indivíduos difundem a responsabilidade, desejam a aceitação dos colegas e temem as consequências (Gerstein & Shaw, 2008Gerstein, M., & Shaw, R. (2008). Organizational bystanders. People + Strategy, 31(1), 47-54., p. 11). A distância estrutural dos funcionários em relação ao ato - o fato de não estarem diretamente envolvidos - os aproxima de se tornarem participantes inocentes (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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).

Os participantes inocentes estão envolvidos em situações que levam ao comportamento incorreto, mas não são diretamente responsáveis por ele. Apesar de as sanções morais de autoavaliação dos funcionários serem ativadas com mais facilidade quando pensam em repercussões futuras (Agerström & Björklund, 2009Agerström, J., & Björklund, F. (2009). Temporal distance and moral concerns: future morally questionable behavior is perceived as more wrong and evokes stronger prosocial intentions. Basic and Applied Social Psychology, 31(1), 49-59. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1080/01973530802659885
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), os participantes inocentes não conseguem prever os impactos morais de suas ações ou inações, ou seja, não conseguem visualizar as consequências das ações antiéticas. Isso pode ser atribuído à sua distância temporal, especialmente em uma cultura que exige resultados a curto prazo. A distância temporal é a distância entre o fato e suas consequências, o que acelera o processo de conversão de um participante inocente em um racionalizador (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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). Devido à distância estrutural, os participantes inocentes percebem seus papéis como irrelevantes para a perpetuação da corrupção, tornando-se assim racionalizadores que não enfrentam acusações, apesar de serem responsáveis pelos resultados da ação corrupta. A separação entre esses rótulos é analítica e usada apenas para fins de compreensão (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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).

Os perpetradores mantêm uma distância ética reduzida e visualizam as consequências e implicações morais de suas ações. Depois de se tornarem cientes de suas ações erradas, podem decidir se tornar delatores ou perpetradores (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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). Em cada estágio do continuum, a racionalização torna difícil tomar decisões éticas. Isso ocorre porque os agentes justificam ou não conseguem visualizar as implicações morais de suas ações e omissões. Esses agentes podem avaliar a qualidade ética de suas decisões aplicando diferentes mecanismos sobre como o mundo funciona e como a atividade antiética pode afetar sua identidade (Messick & Bazerman, 2001Messick, D. M., & Bazerman, M. H. (2001). The next phase of business ethics: integrating psychology and ethics. In J. Dienhart, D. Moberg, & R. Duska (Eds.), Research in ethical issues in organizations(pp. 213-238, Vol. 3). Bingley, UK: Emerald Publishing Limited.). Este modelo de distância ética pode ser visto na Figura 1. Ele propõe que a distância ética facilite um observador a se tornar um participante inocente e um participante inocente a se tornar um racionalizador, no entanto, diminui até o ponto em que os indivíduos devem decidir entre se tornar perpetradores culpados ou delatores (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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, p. 270).

Figura 1
Papel da distância ética na determinação da transição de participantes entre seus diferentes tipos

Este modelo explica a corrupção a partir de uma perspectiva individual, concentrando-se em como os indivíduos se tornam perpetradores. Esta pesquisa não mede a distância ética, dada a natureza qualitativa dos dados. No entanto, os testemunhos dos executivos da Odebrecht podem mostrar como os mecanismos de racionalização levam ao desengajamento moral. Uma cultura corrupta ajuda os executivos a encontrar desculpas para se envolverem e adotarem uma postura leniente em relação à corrupção. Essa ideia de que as ações dos executivos não têm implicações morais justifica e normaliza a corrupção. Neste contexto, é necessário definir o desengajamento moral e os mecanismos de racionalização.

O desengajamento moral é a percepção equivocada de que uma atividade desumana não é errada. Isso é alcançado através da racionalização - o processo cognitivo que faz os indivíduos perceberem suas ações como justificáveis, não moralmente erradas ou incrimináveis (Anand et al., 2004Anand, V., Ashforth, B. E., & Joshi, M. (2004). Business as usual: the acceptance and perpetuation of corruption in organizations. Academy of Management Executive, 19(4), 9-23. Retrieved fromhttps://doi.org/10.5465/AME.2005.19417904
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; Bandura, 1999Bandura, A. (1999). Moral disengagement in the perpetration of inhumanities. Personality and Social Psychology Review, 3(3), 193-209. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1207/s15327957pspr0303_3
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). Esses indivíduos podem se desengajar moralmente aumentando sua distância ética, distorcendo as consequências de suas ações, criando desculpas e racionalizando a corrupção. Esses processos fazem com que os funcionários acreditem que suas ações não são erradas ou são moralmente justificáveis, prejudicando assim a tomada de decisão ética das organizações (Messick & Bazerman, 2001Messick, D. M., & Bazerman, M. H. (2001). The next phase of business ethics: integrating psychology and ethics. In J. Dienhart, D. Moberg, & R. Duska (Eds.), Research in ethical issues in organizations(pp. 213-238, Vol. 3). Bingley, UK: Emerald Publishing Limited.). Os funcionários moralmente desengajados não se implicam em suas decisões antiéticas.

O desenvolvimento dessa ideia levou os pesquisadores a identificar mecanismos de racionalização, diferentes processos cognitivos que levam ao desengajamento moral. Klerk (2017bKlerk, J. J. (2017b). “The devil made me do it!” An inquiry into the unconscious “devils within” of rationalized corruption. Journal of Management Inquiry, 26(3), 254-269. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1056492617692101
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) descreveu oito mecanismos de racionalização: O primeiro mecanismo concentra-se na racionalização da responsabilidade - a negação, deslocamento ou difusão da responsabilidade individual. O segundo mecanismo foca na legalidade ou ignorância legal, justificando comportamentos corruptos como se não fossem ilícitos. No terceiro mecanismo, o perpetrador minimiza ou distorce as consequências da ação corrupta, negando o dano ou a vítima. O quarto mecanismo concentra-se em como o perpetrador se redime de atividades corruptas, desviando a atenção em favor do negócio. O quinto mecanismo mostra que os perpetradores realizam uma comparação social, comparando seu crime com outros crimes que seriam piores. No sexto mecanismo, os perpetradores exercem a pretensão de direito (entitlement), afirmando que tinham o direito de ser corruptos. O sétimo mecanismo mostra como os perpetradores apelam a lealdades mais altas ou valores de ordem superior. No oitavo, racionalizando a intenção, os perpetradores afirmam que pagarão pelo erro ou percebem a ação como menos grave do que realmente é.

Os executivos usam diferentes mecanismos de racionalização em diferentes pontos do continuum. Isso permite que eles aumentem sua distância ética e se desengajem moralmente de seu comportamento antiético. Antes de detalhar esse processo, é importante descrever as escolhas metodológicas desta pesquisa.

3. METODOS

3.1 Contexto do caso e coleta de dados

A Operação Lava Jato começou no Brasil em 2014, mas revelou crimes em pelo menos outros 49 países. A investigação se concentrou em um esquema de corrupção principalmente nos setores de petróleo e gás e construção. Ela utilizou acordos bilaterais e delações premiadas que permitiram aos promotores visar políticos e empresas importantes. A força-tarefa foi marcada por controvérsias. Foi acusada de envolver-se em conluio entre juízes e promotores, usar excessivamente delações premiadas e interferir nas eleições, dando prioridade aos casos de candidatos líderes nas pesquisas (Silva, 2020Silva, F. S. (2020). From car wash to Bolsonaro: law and lawyers in Brazil’s illiberal turn (2014-2018). Journal of Law and Society, 47(S1), S90-S110. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1111/jols.12250
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). Esta operação foi auxiliada pela mídia brasileira e se tornou o centro do debate público brasileiro (Andrade, 2018Andrade, E. R. (2018). A apropriação do discurso da Lava Jato pela mídia: a formação de arquivos de memória sobre o evento e seus personagens principais. Polifonia, 25(37.1), 19-34. Retrieved fromhttps://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/view/6109
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).

Na época das investigações, a Odebrecht era a maior empresa de construção a enfrentar acusações. Nesta pesquisa, compilamos os depoimentos de 49 executivos da Odebrecht em todos os níveis da empresa. Esses depoimentos descrevem o envolvimento dos executivos nos casos de corrupção e sua trajetória na corporação. Como a Odebrecht é representativa de corrupção em larga escala, ela fornece uma compreensão dos fatores que levam ao surgimento de uma cultura corrupta em grandes corporações e, assim, confirma as ideias teóricas e pré-estabelecidas (Seawnght & Gerring, 2008Seawnght, J., & Gerring, J. (2008). Case selection techniques in case study research: a menu of qualitative and quantitative options. Political Research Quarterly, 61(2), 294-308. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1065912907313077
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). É também um caso teoricamente relevante por suas percepções sobre a dinâmica interna de uma organização corrupta (Dyer & Wilkins, 1991Dyer, W. G., & Wilkins, A. L. (1991). Better stories, not better constructs, to generate better theory: a rejoinder to Eisenhardt. The Academy of Management Review, 16(3), 613-619. Retrieved fromhttps://doi.org/10.2307/258920
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).

Os dados compreendem os depoimentos em vídeo dos 49 executivos, totalizando 141 horas e 5 minutos. A duração dos depoimentos individuais variou de 13 minutos a 10 horas. Organizamos e analisamos os vídeos usando um software de análise qualitativa de dados assistida por computador, que facilitou a transcrição das partes codificadas. Cada depoimento recebeu a letra C seguida de um número de identificação aleatório.

Além desses vídeos, analisamos quatro livros escritos e publicados por ex-executivos e membros da família fundadora da Odebrecht. Os três primeiros livros fazem parte de uma coleção chamada “Sobreviver, crescer e perpetuar: tecnologia empresarial Odebrecht” (N. Odebrecht, 2011Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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). Esses três volumes são artefatos que, segundo os executivos, explicam a cultura da Odebrecht. A partir de agora, nos referiremos a esta coleção como TEO (Tecnologia Empresarial Odebrecht). O quarto livro é intitulado “Confiar e servir: ideias sobre o desenvolvimento do Brasil e de suas empresas” (E. Odebrecht, 2007Odebrecht, E. (2007). Confiar e servir: ideias sobre o desenvolvimento do Brasil e de suas empresas. Rio de Janeiro, RJ: Versal Editores.). Apresenta a análise de um ex-presidente da Odebrecht sobre o contexto empresarial brasileiro. Esses livros foram importantes para fornecer contexto e percepção sobre a cultura da Odebrecht, aumentando a capacidade de descrever o estudo de caso de uma corporação corrupta.

3.2 Método de análise

Como a quantidade de dados coletados e analisados faz parte de um projeto de pesquisa maior, começamos com a codificação aberta dos vídeos dos executivos (Dyer & Wilkins, 1991Dyer, W. G., & Wilkins, A. L. (1991). Better stories, not better constructs, to generate better theory: a rejoinder to Eisenhardt. The Academy of Management Review, 16(3), 613-619. Retrieved fromhttps://doi.org/10.2307/258920
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). O objetivo era organizar e resumir os dados, procurando por insights teóricos que seriam posteriormente refinados (Charmaz, 2000Charmaz, K. (2000). Grounded theory: objectivist and contructivist methods. In N. K. Denzin, & Y. Lincoln (Eds.), The handbook of qualitative research (pp. 509-535). Thousand Oaks, CA: Sage publications.). Nesta etapa inicial, foram codificados os nomes dos personagens importantes, lugares e casos que nos ajudaram a organizar a vasta quantidade de dados.

O segundo passo foi comparar os dados usando a codificação axial (Charmaz, 2000Charmaz, K. (2000). Grounded theory: objectivist and contructivist methods. In N. K. Denzin, & Y. Lincoln (Eds.), The handbook of qualitative research (pp. 509-535). Thousand Oaks, CA: Sage publications.). Isso forneceu uma lógica para organizar e resumir dados de declarações empíricas; nessa fase, codificamos cada trecho dos vídeos. Essa codificação nos permitiu comparar a experiência de cada colaborador. Também foi importante entender os eventos que eles estavam descrevendo e abstrair ideias de pesquisa com base no imenso conjunto de dados. A comparação constante entre os códigos permitiu a emergência de três grupos importantes de códigos que descreviam a trajetória dos executivos dentro da empresa, a cultura organizacional e os mecanismos de racionalização.

Enquanto esses dois primeiros passos eram indutivos, eles revelaram ideias importantes que poderiam ser analisadas considerando estruturas teóricas. A trajetória dos executivos remontava ao continuum da destrutividade e aos mecanismos de racionalização. Isso nos levou a tomar uma decisão metodológica de analisar dedutivamente os dados com base nas categorias dessas duas estruturas.

O terceiro passo foi fazer uma codificação conceitual, com base nos mecanismos de racionalização e no continuum da destrutividade. Para ambas as categorias, o processo foi semelhante. Realizamos um processo de codificação minuto a minuto, preenchendo os códigos com citações in vivo que descreviam empiricamente conceitos teóricos. Essa codificação permitiu caracterizar cada estágio do continuum: espectadores organizacionais, participantes inocentes, racionalizadores, ponto de decisão, perpetradores culpados e recusa em participar; e os oito mecanismos de racionalização: racionalização da responsabilidade, legalidade ou ignorância legal, má construção das consequências, redenção, ponderação social, entitlement, apelo a lealdades mais altas e racionalização da intenção.

Para a descrição da categoria de organização corrupta, os códigos abertos que foram criados no início da análise foram agrupados em conceitos que descreviam a cultura. Desde a abstração da codificação inicial havia três códigos conceituais: regras e processos internos, histórias e narrativas, pressupostos e valores. Estes representam a organização corrupta desde seus artefatos e processos visíveis até suas crenças subjacentes (Schein, 2010Schein, E. H. (2010). Organizational culture and leadership (4a ed.). Hoboken, NJ: John Wiley & Sons.). Após a codificação conceitual, foi feita outra etapa de comparações constantes para fazer links entre os códigos e gerar ideias teóricas, de modo a entender as relações entre os mecanismos de racionalização e cada etapa do continuum e como a cultura corrupta potencializa esse processo (Charmaz, 2000Charmaz, K. (2000). Grounded theory: objectivist and contructivist methods. In N. K. Denzin, & Y. Lincoln (Eds.), The handbook of qualitative research (pp. 509-535). Thousand Oaks, CA: Sage publications.).

O quadro 1 Apresenta os códigos abertos e conceituais e as categorias coletadas desta análise para as categorias de organização corrupta e continuum da destrutividade.

Quadro
1 Processo de codificação

A seção subsequente apresenta uma análise dos dados e discute nossa contribuição teórica. Especificamente, descreve uma cultura corrupta, como os funcionários avançam ao longo do continuum da destrutividade, racionalizando de maneira diferente nessa cultura e, por fim, a relação entre cultura e o continuum.

4. ANÁLISE DE DADOS

A análise mostrou que duas categorias teóricas “organização corrupta” e “continuum da destrutividade” foram úteis para explicar o fenômeno. Ambas estão relacionadas e influenciam uma à outra. Esta seção descreve os fatores que levam à construção de uma OC e como seus funcionários progridem através do continuum da destrutividade.

4.1 A organização corrupta

A Odebrecht criou uma cultura permissiva que ajudou os membros da organização a racionalizar suas ações. A OC foi formada por regras e processos que operacionalizavam atividades ilegais; ela também desenvolveu histórias e narrativas que ajudaram os membros a racionalizar práticas corruptas; e estabeleceu um conjunto de valores e crenças compartilhados entre os membros organizacionais (Pinto et al., 2008Pinto, J., Leana, C. R., & Pil, F. K. (2008). Corrupt organizations or organizations of corrupt individuals? Two types of organizational-level corruption. Academy of Management Review, 33(3), 685-709. Retrieved fromhttps://doi.org/10.5465/AMR.2008.32465726
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).

A Odebrecht tinha diversas regras e processos internos que ajudaram ou foram desenvolvidos especificamente para contribuir com a atividade ilícita. A empresa era organizada em pequenas unidades de negócios com base em cada contrato, e cada contrato ou centro de custo tinha um executivo dedicado. Os executivos dessas unidades poderiam pedir pagamentos ilegais se o contrato fosse lucrativo, e, portanto, seus superiores verificavam se a unidade de negócios estava tendo perdas financeiras. Além da perda financeira, os bônus dos executivos eram pagos com base no lucro de seus projetos. Como na Enron (Sims & Brinkmann, 2003Sims, R. R., & Brinkmann, J. (2003). Enron ethics (or: culture matters more than codes). Journal of Business Ethics, 45(3), 243-256. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1023/A:1024194519384
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), a comissão dos executivos estava diretamente relacionada ao seu desempenho; esses executivos eram esperados para realizar e obter resultados, por quaisquer meios necessários. Esses pagamentos são explicados na seguinte citação:

Na verdade, quando fazia uma alocação dessa, na hora de fazer o fechamento do projeto, a gente sabia que estava, através do setor de operações estruturadas, que tinha uma despesa naquele projeto, e essa despesa você abatia do lucro, para avaliar o empresário que tinha dado aquele lucro (C14).

Por meio de sistemas de tecnologia da informação, os executivos criavam e-mails não rastreáveis e programavam pagamentos ilegais. Os executivos usavam esses sistemas para enviar e-mails e planilhas que agendavam os pagamentos ilegais. Um executivo afirmou: “O sistema, eu hoje agradeço por alguém ter colocado esse sistema, o que a gente tem aqui, eu hoje tenho no sistema a comprovação de que o pagamento [ilegal] aconteceu” (C14). O setor de operações estruturadas era um departamento na hierarquia da holding responsável por fazer os pagamentos ilegais, eles cuidavam da geração de caixa 2 e dos pagamentos ilegais nacionais e internacionais.

Os executivos usavam codinomes ao fazer transações com o setor de operações estruturadas, onde os pagamentos ilegais eram programados. Usando esses codinomes, eles agendavam os pagamentos via cambistas em dinheiro vivo ou contas offshore. Se fosse em dinheiro vivo, aquele setor fornecia ao executivo uma senha, local e data; o executivo fornecia essas informações ao contato que receberia o dinheiro.

Além disso, pelas regras definidas [...] nunca poderíamos saber a identidade das pessoas que recebiam os pagamentos. Para garantir esse anonimato, os funcionários que nos solicitavam pagamentos eram instruídos a criar um codinome ou apelido para o destinatário do pagamento, que somente eles saberiam a real identidade (C35).

A geração de caixa 2 também fazia parte do trabalho. Os pagamentos ilegais não podiam ser feitos com dinheiro registrado na conta legal da empresa. Todos os executivos estavam cientes dos riscos. A regra da empresa não permitia a geração de caixa 2 no Brasil; isso é atribuído ao complexo sistema tributário brasileiro. Houve algumas exceções a essa regra nos dados.

A gente, no Brasil, tinha uma regra de não fazer caixa 2, uma proibição de fazer caixa 2. A geração de caixa 2 era feita pelo pessoal de operações estruturadas, fora do Brasil, gerando dólares, gerando euros, gerando qualquer moeda estrangeira, e a partir daí eles encontravam doleiros que recebiam esse dinheiro lá fora e entregava aqui no Brasil (C14).

Além das regras e processos que permitiam a atividade ilícita, a empresa possuía histórias e narrativas que apoiavam seus sistemas de crenças. O caixa 2 era usado para pagar bônus aos executivos por meio do mesmo sistema de pagamento ilegal. Um executivo destacou a necessidade de desenvolver confiança mútua para evitar roubo interno e fraude.

Eles estavam trabalhando na confiança né amigo, pelo que passava de dinheiro na mão desse povo, se quisesse pegar 2, 3 milhões e sumir no mundo, nunca mais ninguém achava (C35).

O uso de bônus e estabelecimento de metas em uma empresa focada em resultados confirma os argumentos de Campbell e Göritz (2014Campbell, J. L., & Göritz, A. S. (2014). Culture corrupts! A qualitative study of organizational culture in corrupt organizations. Journal of Business Ethics, 120(3), 291-311. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-013-1665-7
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) de que essas normas e valores refletem os pressupostos subjacentes aos mecanismos de racionalização.

A Odebrecht tinha uma prática histórica de pagar parte do bônus de alguns grandes executivos com recursos de caixa 2, com sonegação de imposto (C35).

Além dos próprios bônus, os executivos compartilhavam histórias, algumas delas racionalizando a corrupção e reforçando suas políticas. Quando não cumpriam essas normas internas, eram demitidos. Isso é destacado nas seguintes palavras:

Pra que é que você precisa saber o que é que eu faço na minha área, não tinha que ficar divulgando o que é que fazia, nem o que é que não fazia? Eu demiti um rapaz que procurou uma palhaçada, eu entrei no elevador, eu, [dois outros executivos], e esse palhaço na frente de outras pessoas chegou pra [meu colega] e disse você não ter vergonha de dar dinheiro para esse povo, não? [Meu colega] lhe disse eu não do nada não, eu pago o que os outros mandam eu não dou nada não. Mas eu achei que o comportamento dessa pessoa, que era o gerente de uma pessoa lá em [um país estrangeiro] não cabia, ainda mais em um elevador onde tinham 8 ou 10 pessoas ele fazer um comentário desse, não cabia. Ai eu liguei para o chefe dele e pedi a cabeça dele, esse tipo de comportamento não pode ter, até porque ele como diretor de uma obra, em determinado momento, podia pedir [por pagamentos ilegais] (C35).

Conforme é possível ver no trecho final da citação, fazia parte da descrição de trabalho de qualquer diretor de projeto solicitar pagamentos ilegais para um contrato.

“Um cliente satisfeito é a fundação da existência da Odebrecht” (N. Odebrecht, 2011Odebrecht, N. (2011). Sobreviver, crescer e perpetuar: Tecnologia Empresarial Odebrecht (TEO) (11a ed.). Salvador, BA: Fundação Norberto Odebrecht., p. 42). Isso foi feito criando relacionamentos pessoais que ajudariam a Odebrecht a ganhar acesso ao poder público. O incentivo para ter um relacionamento pessoal e direto com o cliente é declarado na TEO. “Para cada cliente, deve haver um empresário previamente identificado; este empresário deve representar seu respectivo time” (N. Odebrecht, 2011, p. 88). Era a estratégia da empresa designar um executivo para manter relacionamentos com um político (Coelho & Barros, 2021Coelho, C. C., & Barros, A. (2021). Padrinhos e caciques: o lado sombrio da atividade política corporativa na captura do Estado. Revista Eletrônica de Ciência Administrativa, 20(1), 15-42. Retrieved from https://doi.org/10.21529/RECADM.2021001
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; Rodrigues & Barros, 2022Rodrigues, C. C., & Barros, A. (2022). From caciques and godfathers to second-order corruption. Journal of Management Inquiry, 31(1), 67-81. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1177/1056492620901780
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).

A TEO afirma que os líderes devem treinar novos líderes e adaptar todos os funcionários à sua filosofia. Nesse sentido, uma frase repetida na TEO é “[...] uma grande organização com um espírito de pequena”. A organização sugere também que os executivos devem ler o livro para entender a cultura associada à satisfação dos clientes e acionistas. De acordo com a TEO, a leitura do livro pode tornar os executivos socialmente responsáveis, mas também afirma que o cliente é tudo o que deveria importar (N. Odebrecht, 2011Odebrecht, N. (2011). Sobreviver, crescer e perpetuar: Tecnologia Empresarial Odebrecht (TEO) (11a ed.). Salvador, BA: Fundação Norberto Odebrecht.).

Por trás das regras, processos, histórias e narrativas, existiam pressupostos e valores. A TEO descreve várias das crenças, pressupostos e valores da organização. O livro enfatiza a observância de diretrizes comportamentais especificas para os executivos. Além de citar a TEO, os executivos usavam a linguagem organizacional em seus depoimentos. Por exemplo, eles se referiam à Odebrecht como “a Organização” e as instituições, governos e outros contratantes como “o Cliente”; eles citavam o lema da empresa para “Servir o cliente”, quando questionados sobre o propósito da empresa (Lamb, Lacerda, Dresch, & Morandi, 2018Lamb, I. T., Lacerda, D. P., Dresch, A., & Morandi, M. I. W. M. (2018). Análise da Tecnologia Empresarial Odebrecht (TEO): uma análise a partir dos conceitos do projeto organizacional de Galbraith. Interciencia, 43(7), 4475-4483. Retrieved from https://www.interciencia.net/wp-content/uploads/2018/07/475-DRESCH-43_07.pdf
https://www.interciencia.net/wp-content/...
; N. Odebrecht, 2011Odebrecht, E. (2007). Confiar e servir: ideias sobre o desenvolvimento do Brasil e de suas empresas. Rio de Janeiro, RJ: Versal Editores.).

A inversão do que é normal e a racionalização de atividades imorais alteram o pressuposto subjacente que forma o objetivo da empresa. Apesar de ter um pequeno capítulo sobre responsabilidade social (N. Odebrecht, 2011Odebrecht, N. (2011). Sobreviver, crescer e perpetuar: Tecnologia Empresarial Odebrecht (TEO) (11a ed.). Salvador, BA: Fundação Norberto Odebrecht., p. 112), os pressupostos de lucro, resultados e bônus presentes no livro superam a justiça como princípio orientador. A cultura da Odebrecht trabalhava para si mesma, tendo seu próprio conjunto de agendas internas, valores, princípios e pressupostos. Com o tempo, esses valores são assimilados pelos executivos e os ajudam a racionalizar suas atividades ilegais, que podem ser descritas como um processo contínuo de destruição.

4.2 O continuum da destrutividade

Após explicar o contexto e cultura da empresa, é possível descrever o continuum de destrutividade, todas as suas fases e como os executivos racionalizam em cada uma delas.

Os colaboradores afirmam que, quando entraram na organização, “você começa a perceber como as coisas funcionam” (C03). Essa percepção, após a fase de entrada, reflete a posição de um espectador organizacional no continuum de destrutividade. Nesta fase, os funcionários estão cientes do que está acontecendo em sua organização, mas não participam de reuniões ou solicitações. Embora mantenham uma distância ética estrutural das atividades ilegais, eles não conseguem visualizar os impactos de suas ações e omissões (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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). Neste ponto, o mecanismo de racionalização mais evidente é apelar para lealdades superiores, o que faz com que os executivos culpem seus superiores ou os valores e a importância que atribuem ao produto da empresa (Klerk, 2017bKlerk, J. J. (2017b). “The devil made me do it!” An inquiry into the unconscious “devils within” of rationalized corruption. Journal of Management Inquiry, 26(3), 254-269. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1056492617692101
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).

Ele falou com [meu superior] que haveria necessidade de um pagamento antecipado, era a primeira vez que eu tinha vivido uma experiencia dessa. [...] Eu não tenho certeza se [meu superior] pagou, mas eu estava junto com ele. Depois eu não sei como ficou as tratativas dele nesse assunto (C73).

Os espectadores organizacionais também racionalizam sua responsabilidade. Isso apareceu na forma de construir erroneamente as consequências das ações, interpretando as atividades como legítimas.

Nesse processo de normalização, fez com que a gente tratasse [a atividade corrupta] como uma grande banalização o que dificultava o que era legitimo do que não era legitimo. Mesmo que você tinha um interesse legítimo tratava com caixa 2 (C31).

Em relação à liderança, na Odebrecht, quando um funcionário se torna um líder, ele pode pedir pagamentos ilegais. Como afirmou um executivo: “Quando eu virei gerente de contrato, apesar de eu estar atuando muito na área privada, eu sabia sim que tinha esse mecanismo [de pagamentos ilícitos]” (C66). Nesta fase, eles começam a participar de reuniões e se tornam participantes inocentes. Como previsto por Zyglidopoulos e Fleming (2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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), nesta posição, a distância ética estrutural faz com que os participantes pensem que não contribuem para a corrupção. Em outras palavras, eles não conseguem ver as consequências de suas ações. O mecanismo de racionalização, neste ponto, os leva a distorcer as consequências. Nesse sentido, um executivo afirmou o seguinte:

A solução da guerra dos portos [um contrato feito com propina] foi fundamental da manutenção atividade industrial no Brasil, preservação dos empregos e da cadeia produtiva. E geração de impostos com ganho para o erário. E que a nossa atuação não se deu em benefício só da Braskem, mas de todo um setor industrial (C17).

Nesta fase, os funcionários fazem comparações sociais. Eles comparam seus crimes com outros crimes: essa racionalização é descrita nas seguintes palavras: “Um termo que eu nunca escutei, é cartel, eu nunca escutei. Agora sabia que tinha também o que a gente chama de fraude de licitação, análise de mercado” (C50). O fato de os executivos nunca terem ouvido falar dos nomes dos crimes que cometeram apenas demonstra como suas atividades ilegais foram racionalizadas. Eles justificaram ou não pensaram que estava errado ou ilegal, neste ponto, os funcionários mostram indulgência em relação à corrupção. Como parte do trabalho, eles eram obrigados a manter um relacionamento próximo com agentes políticos e considerar a possibilidade de pedir pagamentos ilegais.

Os colaboradores relatam que racionalizam de maneira diferente do que foi previsto pelo continuum da destrutividade. Essa racionalização começa no momento em que encontram atividades antiéticas (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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). Por exemplo, justificando que era correto pagar o que os outros pagaram, o executivo racionalizou a responsabilidade (Klerk, 2017bKlerk, J. J. (2017b). “The devil made me do it!” An inquiry into the unconscious “devils within” of rationalized corruption. Journal of Management Inquiry, 26(3), 254-269. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1056492617692101
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), normalizando assim a corrupção. Conforme a seguinte declaração:

Eu estou aqui fazendo um exercício de memória, sobre as práticas ilícitas, por que é de se marcar, vamos dizer assim. Porque desde 78, quando eu trabalhava na Andrade Gutierrez, naquela época ainda no regime militar, já se tinha notícias de práticas pouco ortodoxas, vamos dizer assim. É óbvio que na nossa juventude a gente apenas ouvia (C15).

Dessa forma, em todas as etapas do continuum, há racionalização. No entanto, existe um ponto de decisão em que os executivos são solicitados a se envolver em práticas corruptas e decidir entre denunciar ou se tornar cúmplice. A cultura da Odebrecht levou os funcionários à racionalização após sua contratação. A cultura não forneceu aos funcionários a possibilidade de denunciar, mesmo quando perceberam o erro de fazer pagamentos ilegais. Os executivos também expressaram que qualquer desistência desses atos levava à demissão da empresa. Pesquisas anteriores sobre denúncia retrataram-na como uma ferramenta ineficaz (Johansson & Carey, 2016Johansson, E., & Carey, P. (2016). Detecting fraud: the role of the anonymous reporting channel. Journal of Business Ethics, 139(2), 391-409. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-015-2673-6
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). Alguns agentes dizem que era difícil recusar um pedido de suborno.

Eu nunca ofereci, mas também nunca disse que não [a um pedido de propina], eu jogava o jogo e quando achava que era razoável aceitava. Eu podia não concordar, renegociar. A recusa em si era sempre muito complicada porque podia haver retaliações. Em outra obra eles poderiam retaliar a gente (C15).

Zyglidopoulos e Fleming (2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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) descrevem o ponto de decisão como um momento de clareza em que a distância ética é diminuída. Neste ponto, os agentes tornam-se conscientes de suas ações erradas e decidem perpetrá-las ou denunciar. Na Odebrecht, embora os agentes, no ponto de decisão, possam ter menos distância ética porque suas ações estão diretamente relacionadas à corrupção, o processo de racionalização que lhes dá desengajamento moral, turvando sua visão, começou na fase de espectador e cresceu no continuum. Portanto, neste caso, é possível ver que a decisão de se tornar um perpetrador está mais relacionada ao processo de desengajamento moral e racionalização do que à sua distância ética da conduta imprópria (Klerk, 2017bKlerk, J. J. (2017b). “The devil made me do it!” An inquiry into the unconscious “devils within” of rationalized corruption. Journal of Management Inquiry, 26(3), 254-269. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1056492617692101
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). Na fase de perpetradores culpados, os executivos se sentem no direito de obter benefícios da corrupção. Isso é mostrado na seguinte citação:

A tendencia era perdermos no Supremo [Tribunal Federal]. Chegamos a interceder junto ao deputado pela relação que ele tinha com o presidente Lula, que ele pudesse sensibilizar o presidente Lula, para que o presidente pudesse, não sei se arbitrar, mas ser favorável a esse crédito todo [para nós] (C04).

Os executivos também procuraram se redimir das atividades. “Que tudo isso ta muito errado, se o senhor me permite, posso dizer isso?” (C13). E alegando que não era ilegal ou desacreditando a operação. Isso foi feito mesmo antes dos depoimentos quando “O objetivo era desacreditar o mecanismo das delações [premiadas]” (C31).

Considerando o quadro teórico, nosso estudo de caso apresenta todos os elementos descritos no continuum da destrutividade. No entanto, o caminho de racionalização adotado pelos executivos parece mais um continuum, e não apresenta um único ponto de decisão. Em qualquer momento, uma pessoa envolvida em uma organização corrupta pode decidir se tornar um denunciante ou se afastar. No entanto, a disposição para cometer o ato se enfraquece à medida que a racionalização da corrupção se fortalece. É importante notar que, devido à natureza dos nossos dados, todos os executivos se tornaram denunciantes sob um acordo de leniência firmado pela Odebrecht com o Ministério Público. Na época, a Operação Lava Jato já havia investigado outras empresas e casos, o que torna essa decisão não individual sob a análise do quadro teórico do continuum de destrutividade. Com isso em mente, explicamos a racionalização dos executivos e refinamos o continuum de destrutividade.

5. DISCUSSÃO

Ao entrar em uma organização corrupta, é necessário cumprir suas regras, valores e crenças. A indústria da construção civil oferece oportunidades para comportamentos inadequados, facilitados pela proximidade com o Estado, contratos complexos e cultura corporativa (Arewa & Farrell, 2015Arewa, A. O., & Farrell, P. (2015). The culture of construction organisations: The epitome of institutionalised corruption. Construction Economics and Building, 15(3), 59-71. Retrieved from https://doi.org/10.5130/AJCEB.v15i3.4619
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). Dada essa cultura e contexto, a racionalização também se torna parte do trabalho.

Não pudemos avaliar as proposições sobre a distância ética e seus efeitos na transição entre as fases do continuum (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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). Embora alguns executivos mostrem que mantiveram diferentes distâncias éticas estruturais e temporais da corrupção durante seu tempo na organização, isso não se relaciona diretamente com sua capacidade de progredir no continuum. Isso pode ser atribuído à cultura da empresa. A Odebrecht impôs sua cultura de maneira que seus executivos acreditassem que a organização é importante para seu ambiente externo. Isso os levou a racionalizar o comportamento inadequado desde o momento em que tomaram conhecimento das atividades ilegais. A racionalização ocorre até mesmo para espectadores organizacionais e participantes inocentes (Gerstein & Shaw, 2008Gerstein, M., & Shaw, R. (2008). Organizational bystanders. People + Strategy, 31(1), 47-54.; Messick & Bazerman, 2001Messick, D. M., & Bazerman, M. H. (2001). The next phase of business ethics: integrating psychology and ethics. In J. Dienhart, D. Moberg, & R. Duska (Eds.), Research in ethical issues in organizations(pp. 213-238, Vol. 3). Bingley, UK: Emerald Publishing Limited.).

A racionalização e o subsequente desengajamento moral fornecem uma melhor compreensão do que leva os indivíduos mais adiante no continuum. Embora a distância ética seja mediadora do progresso, os mecanismos psicológicos e as sanções morais influenciam a decisão dos indivíduos de dar um passo à frente no continuum, sair ou denunciar (Bandura, 1999Bandura, A. (1999). Moral disengagement in the perpetration of inhumanities. Personality and Social Psychology Review, 3(3), 193-209. Retrieved fromhttps://doi.org/10.1207/s15327957pspr0303_3
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). Pressupondo que isso seja verdade, ocorrem dois refinamentos no continuum. Primeiro, não há um único ponto de decisão; em cada oportunidade, o agente pode decidir denunciar ou sair do esquema. Isso só pode ocorrer se suas sanções morais superarem os mecanismos de racionalização. Em uma cultura corrupta, a disposição para denunciar diminui com o tempo.

Segundo, indivíduos que estão dentro da organização corrupta começam a racionalizar como espectadores organizacionais. Com o tempo, novos argumentos convencem os indivíduos de que suas ações não são imorais. Isso exclui a fase de racionalização do continuum, porque os indivíduos racionalizam em todas as fases. Quanto mais avançados os indivíduos estiverem no continuum, mais mecanismos de racionalização eles usam para justificar ou se desengajar moralmente das decisões antiéticas. A Figura 2 mostra o continuum da destrutividade refinado que ocorreu na Odebrecht.

Figura 2
Continuum da destrutividade

A ideia de que indivíduos em diferentes estágios do continuum irão racionalizar comportamentos antiéticos de maneira diferente possibilita a operacionalização dos mecanismos de racionalização descritos por Klerk (2017bKlerk, J. J. (2017b). “The devil made me do it!” An inquiry into the unconscious “devils within” of rationalized corruption. Journal of Management Inquiry, 26(3), 254-269. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1056492617692101
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). O estudo de caso mostra quais mecanismos de racionalização são mais utilizados em cada fase do continuum.

Como espectadores organizacionais, os indivíduos racionalizam apelando para lealdades superiores e racionalizando a responsabilidade (Klerk, 2017aKlerk, J. J. (2017a). Nobody is as blind as those who cannot bear to see: psychoanalytic perspectives on the management of emotions and moral blindness. Journal of Business Ethics, 141(4), 745-761. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-016-3114-x
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, 2017bKlerk, J. J. (2017b). “The devil made me do it!” An inquiry into the unconscious “devils within” of rationalized corruption. Journal of Management Inquiry, 26(3), 254-269. Retrieved from https://doi.org/10.1177/1056492617692101
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). Isso ocorre devido à distância estrutural que faz com que os agentes não vejam as consequências da corrupção ou de sua inação; essa omissão faz parte da cultura de corrupção (Zyglidopoulos & Fleming, 2008Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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). Como participantes inocentes, quando a distância ética temporal está presente, a dificuldade em ver as consequências da ação faz com que os agentes racionalizem a intenção e os leva a se envolver em comparações sociais. Concordamos com Zyglidopoulos e Fleming (2008)Zyglidopoulos, S. C., & Fleming, P. J. (2008). Ethical distance in corrupt firms: how do innocent bystanders become guilty perpetrators? Journal of Business Ethics, 78(1-2), 265-274. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-007-9378-4
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de que os perpetradores mantêm menos distância ética do que os espectadores organizacionais e participantes inocentes. Os dados mostram que os perpetradores estão diretamente envolvidos na ação corrupta, o que os faz saber que o que estão fazendo está errado, levando-os a se sentirem no direito de praticar corrupção e obter seus resultados.

6. CONCLUSÃO

Esta pesquisa tem como objetivo refinar o continuum da destrutividade, examinando uma organização corrupta e explicando o que acontece quando um indivíduo encontra e participa de tal cultura. Ela apresenta uma versão do continuum que enfatiza o processo de racionalização em vez da distância ética. Essas mudanças fazem com que o continuum se pareça mais com um caminho que os indivíduos percorrem ao entrar em uma organização corrupta. A contribuição da pesquisa empírica sobre a Odebrecht mostrou que um indivíduo começa a racionalizar imediatamente após ingressar em uma organização corrupta e tomar conhecimento da atividade antiética. O primeiro contato do indivíduo com atividades antiéticas leva a mecanismos de racionalização, que, por sua vez, levam ao desengajamento moral e ao progresso do indivíduo no continuum.

Os indivíduos no continuum começam como espectadores organizacionais; eles racionalizam apelando para lealdades superiores e racionalizando a responsabilidade. Quando participam de reuniões e se aproximam do lado ilegal dos negócios, têm uma grande chance de racionalizar sua intenção. Portanto, envolvem-se em ponderações sociais e começam a minimizar as consequências. Nesse estágio, seus pares também desempenham um papel no fortalecimento de seu raciocínio e desengajamento moral. Por fim, ao se tornarem perpetradores, buscam direitos e redenção; eles também dependem da legalidade para racionalizar suas ações.

Outro aspecto deste estudo de caso é que não há um único ponto de decisão no continuum; a qualquer momento, o indivíduo pode desistir ou denunciar. O processo de racionalização torna isso mais difícil. Deve-se notar que a cultura da Odebrecht criou um código de valores, crenças e pressupostos que fizeram com que seus membros racionalizassem suas ações. Ao ensinar a seus funcionários que o propósito da empresa é servir ao cliente e que cada líder empresarial deve ter relacionamentos pessoais com membros importantes das organizações dos clientes, a cultura corrupta contribuiu para a racionalização. A relação entre a cultura e os mecanismos de racionalização fica explícita quando a TEO é usada para racionalizar a corrupção (Campbell & Göritz, 2014Campbell, J. L., & Göritz, A. S. (2014). Culture corrupts! A qualitative study of organizational culture in corrupt organizations. Journal of Business Ethics, 120(3), 291-311. Retrieved from https://doi.org/10.1007/s10551-013-1665-7
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).

Esta pesquisa faz parte de um passo inicial para entender ideias teóricas como o continuum da destrutividade com base em evidências empíricas e como uma cultura organizacional corrupta cria mecanismos de racionalização. Essas mudanças na concepção do continuum da destrutividade enfatizam os mecanismos de racionalização e desengajamento moral. Isso não significa que a distância ética não desempenha um papel no continuum; no entanto, o processo de aculturação que muda o raciocínio para o comportamento incorreto deve ser mais bem explicado. Como este é um estudo qualitativo, não teve a intenção de validar o continuum e suas proposições derivadas, dessa forma incentivamos pesquisas futuras para investigar e medir como a distância ética e os mecanismos de racionalização desempenham seu papel no aprofundamento dos indivíduos no caminho do continuum de destrutividade. Outros estudos devem ser conduzidos para validar e até mesmo generalizar como a cultura leva à racionalização. Isso é importante devido à necessidade de revisar a cultura que era vista como uma ferramenta poderosa para produzir resultados organizacionais. No entanto, é uma das muitas causas de corrupção estrutural e até mesmo endêmica.

AGRADECIMENTOS

O presente trabalho foi realizado com apoio da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV EAESP).

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  • [Versão traduzida]

Pareceristas:

  • 13
    Eda Castro Lucas de Souza (Instituto de Educação Superior de Brasília, Brasília / DF - Brasil) https://orcid.org/0000-0002-8557-0592
  • 14
    Dois revisores não autorizaram a divulgação de suas identidades.
  • Relatório de revisão por pares: o relatório de revisão por pares está disponível neste link. https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rap/article/view/88614/83349

Editado por

Alketa Peci (Fundação Getulio Vargas, Rio de Janeiro / RJ - Brasil) https://orcid.org/0000-0002-0488-1744
Mauricio Dussauge Laguna (Centro de Investigación y Docencia Económicas, Ciudad de México - México) https://orcid.org/0000-0001-7630-1879

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    22 Ago 2022
  • Aceito
    14 Mar 2023
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