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Anestesia para transplante renal em pacientes com cardiomiopatia dilatada: estudo retrospectivo de 31 casos

Resumo

Justificativa e objetivos

A cardiomiopatia dilatada é um estado de aumento progressivo das câmaras cardíacas, principalmente do ventrículo esquerdo, que leva à diminuição do débito cardíaco e, por fim, à insuficiência cardíaca. Embora tenha etiologia multifatorial, é bastante comum em pacientes com doença renal terminal que precisam de transplante renal para sua cura. Ambas as condições andam lado a lado e o manejo anestésico de tais casos é um verdadeiro desafio para o anestesiologista. A monitoração e o controle rigoroso da fisiologia cardíaca são de extrema importância, além de um meticuloso manejo dos líquidos, o que por um lado preserva o fluxo sanguíneo renal, por outro previne a insuficiência cardíaca. Essa é a base para alcançar o bom resultado da cirurgia de transplante renal.

Métodos

Este estudo observacional retrospectivo foi feito mediante a análise de prontuários eletrônicos de 31 pacientes com cardiomiopatia dilatada submetidos à cirurgia de transplante renal. Os dados foram avaliados em termos demográficos, duração da doença renal, comorbidades (principalmente hipertensão), achados ecocardiográficos (inclusive fração de ejeção), medicamentos e resultados no pós-operatório.

Resultados

A complicação perioperatória mais comum nessa população de pacientes foi hipotensão (51,61%), seguida de complicações pulmonares, como ventilação mecânica pós-operatória (12,9%) e edema pulmonar (6,45%). A alta incidência de hipotensão pode ser um fator causador do aumento da incidência de atraso no funcionamento do enxerto (12,9%) e necrose tubular aguda (2,23%) nesses pacientes.

Conclusão

A monitoração rigorosa e o controle dos parâmetros hemodinâmicos, bem como a fluidoterapia criteriosa, são a pedra angular na melhoria dos resultados em pacientes com cardiomiopatia dilatada submetidos à cirurgia de transplante renal.

Palavras-chave
Manejo anestésico; Cardiomiopatia dilatada; Cirurgia não cardíaca; Transplante renal; Disfunção sistólica

Abstract

Background and objectives:

Dilated cardiomyopathy is a state of progressive enlargement of cardiac chambers mainly left ventricle which leads to decreased cardiac output and ultimately cardiac failure. Although it has multifactorial etiology, it is quite common in patients with end stage renal disease who require renal transplant surgery for their cure. Both conditions go side by side and anesthetic management of such cases poses real challenge to anesthesiologist. Strict monitoring and control of cardiac physiology is of utmost importance besides meticulous fluid management, thus preserving renal blood flow on one hand and preventing cardiac failure on other hand. This is the basis of achieving good outcome of the renal transplant surgery.

Methods:

This is a retrospective observational study done by analysing electronic database of 31 patients with dilated cardiomyopathy who underwent renal transplant surgery. Data was studied in terms of demographics, duration of renal disease, comorbidities mainly hypertension, cardiac echo graphic findings including ejection fraction, medications and post-operative outcome.

Results:

Most common perioperative complication in this patient population was hypotension (51.61%) followed by pulmonary complications postoperative mechanical ventilation (12.9%) and pulmonary edema (6.45%). High incidence of hypotension may be a causative factor to increased rate of delayed graft functioning (12.9%) and acute tubular necrosis (2.23%) in these patients.

Conclusion:

Strict monitoring and control of hemodynamic parameters as well as meticulous fluid therapy is the cornerstone in improving outcome in patients with dilated cardiomyopathy undergoing renal transplant surgery.

KEYWORDS
Anesthetic management; Dilated cardiomyopathy; Non-cardiac surgery; Renal transplant; Systolic dysfunction

Introdução

A cardiomiopatia dilatada (CMD) é uma doença progressiva dos músculos cardíacos, caracterizada por dilatação e contração prejudicadas do ventrículo esquerdo ou de ambos os ventrículos. Os critérios para o diagnóstico de CMD são a fração de ejeção do ventrículo esquerdo inferior a 40% ou o encurtamento fracionário inferior a 25%.11 Thiagarajah PH, Thiagarajah S, Frost EA. Anaesthetic considerations in patients with cardiomyopathies – a review. Middle East J Anesthesiol. 2009;20:347-54. Os fatores etiológicos mais comuns são hereditariedade; miocardite; cardiopatia isquêmica cardiopatia valvular; hipertensão crônica; sobrecarga de volume; doenças endócrinas como distúrbios da tireoide, diabetes melito, feocromocitoma, toxinas como o etanol, drogas anticâncer etc.22 Luk A, Ahn E, Soor GS, et al. Dilated cardiomyopathy: a review. J Clin Pathol. 2009;62:219. Os pacientes com doença renal em estágio terminal (DRT), definida como uma taxa de filtração glomerular inferior a 15 mL.min−1, e aqueles há muito tempo em diálise quase sempre apresentam anormalidades cardíacas, tais como cardiopatia isquêmica, cardiomiopatia dilatada, hipertensão não controlada, hipertensão pulmonar e valvulopatia cardíaca, entre outras.33 Martinez BS, Gasanova I, Adesanya AO. Anaesthesia for kidney transplantation – a review. J Anesth Clin Res. 2013;4:1-6.,44 Goyal VK, Solanki SL, Baj B, et al. Pulmonary hypertension and post-operative outcome in renal transplant: a retrospective analysis of 170 patients. Indian J Anaesth. 2018;62:131-5. Hipertensão crônica, sobrecarga de volume, anemia e anormalidades metabólicas são responsáveis pelo desenvolvimento de dilatação do ventrículo esquerdo e redução da fração de ejeção nessa população de pacientes. O transplante renal é preferível à diálise em pacientes com DRT para proporcionar melhor qualidade de vida, prevenir a deterioração adicional e a morte súbita.55 Josephson CB, Delgado D, Schiff J, et al. The effectiveness of renal transplantation as a treatment for recurrent uremic cardiomyopathy. Can J Cardiol. 2008;24:315-7. O manejo anestésico perioperatório desses pacientes de alto risco é muito desafiador, tanto para os anestesiologistas quanto para a equipe de terapia intensiva. As complicações perioperatórias que exigem atenção são: insuficiência ventricular esquerda, arritmias ventriculares e supraventriculares, anormalidades no sistema de condução, tromboembolismo, edema pulmonar, suporte ventilatório pós-operatório, necessidade de inotrópicos e vasopressores, necrose tubular aguda, atraso no funcionamento do enxerto e até morte súbita.66 Koplan BA, Stevenson WG. Ventricular tachycardia and sudden cardiac death. Mayo Clin Proc. 2009;84:289-97.,77 Koutalas E, Kanoupakis E, Vardas P. Sudden cardiac death in non-ischemic dilated cardiomyopathy: a critical appraisal of existing and potential risk stratification tools. Int J Cardiol. 2013;167:335-41.

Neste estudo retrospectivo, discutimos o manejo anestésico perioperatório e os resultados de 31 pacientes com CMD e DRT submetidos a transplante renal em nosso centro. Este estudo ajudará a melhorar o manejo perioperatório de pacientes de alto risco para reduzir a incidência de complicações perioperatórias através de modificações para aprimorar o período pré-operatório, o monitoramento hemodinâmico, a estratégia ventilatória, entre outros.

Métodos

Após a aprovação do Comitê de Ética institucional, revisamos os dados eletrônicos de 500 pacientes submetidos a transplante renal em nosso centro de novembro de 2012 a abril de 2018. Os pacientes com fração de ejeção < 40% na ecocardiografia feita no dia anterior à cirurgia foram selecionados e os registros perioperatórios desses pacientes foram minuciosamente pesquisados.

Todos os pacientes foram cuidadosamente avaliados na consulta pré-operatória para anestesia, inclusive anamnese, exame físico com exames laboratoriais relevantes, exames cardíacos e pulmonares. Os pacientes foram bem informados sobre seus estados cardíacos e assinaram o termo de consentimento, esclareceram-se o alto risco de eventos cardíacos perioperatórios e a necessidade de suporte ventilatório. Pantoprazol (40 mg) e alprazolam (0,25 mg) foram prescritos por via oral para ser tomados com água na noite anterior e 2 h antes da entrada em sala de cirurgia. Os imunossupressores (tacrolimus e micofenolato) foram iniciados dois dias antes da cirurgia. Os medicamentos anti-hipertensivos, antianginosos, hormônios tireoidianos foram continuados até a manhã da cirurgia.

Na chegada à sala de cirurgia, iniciou-se a monitoração padrão (pressão arterial não invasiva, oxímetro de pulso, eletrocardiograma) e uma linha venosa (IV) foi garantida. Uma cânula arterial (20G) foi colocada na artéria radial (braço sem fístula) sob anestesia local e a monitoração invasiva da pressão arterial foi iniciada. Após a infiltração do anestésico local, o cateter venoso central (7,5 Fr) foi inserido na veia jugular interna de um dos lados, guiado por ultrassom, e a monitoração da pressão venosa central (PVC) foi iniciada. Midazolam (1 mg) e fentanil (3 mcg.kg−1) foram injetados por via intravenosa como pré-medicação. A anestesia foi induzida com etomidato (0,03 mg.kg−1) e a intubação traqueal foi feita com tubo endotraqueal de tamanho apropriado após a administração de uma dose de atracúrio (0,6 mg.kg−1). A anestesia foi mantida com isoflurano em mistura de oxigênio–ar (50%–50%), infusão de atracúrio e bolus intermitentes de fentanil. Anticorpo intravenoso (basiliximabe ou globulina antitimocítica) foi administrado a todos os pacientes, conforme escolha do nefrologista. O alvo da pressão arterial média (PAM) foi mantido entre 70–80 mmHg antes da reperfusão e entre 90–110 mmHg após a conclusão da anastomose. A PVC foi mantida em torno de 10 a 12 mmHg. Soro fisiológico normal e Kabilyte (Plasmalyte) (Fresenius Kabi, Índia) foram usados durante o período intraoperatório com concentrado de hemácias ou albumina a 20%, caso necessário. Coloides não foram usados. Inotrópicos, vasopressores ou vasodilatadores foram usados de acordo com os parâmetros vitais do paciente para manter o alvo da PAM. Testes de gasometria arterial foram feitos no pré-operatório quando o cateter arterial foi colocado, após a indução da anestesia e no fim da cirurgia. Os parâmetros da gasometria (sódio, potássio, cálcio, hemoglobina, pH sanguíneo, lactato sérico etc.) foram registrados. A analgesia foi mantida com infusão intravenosa de paracetamol (15 mg.kg–1) a cada 8 h, e fentanil injetado em bolus foi usado para analgesia de resgate.

As complicações perioperatórias cardíacas (necessidade de inotrópicos ou vasopressores, insuficiência ventricular esquerda, arritmias), pulmonares (edema pulmonar, suporte ventilatório pós-operatório) e renais (necrose tubular aguda, atraso no funcionamento do enxerto) foram registradas.

Resultados

Os registros perioperatórios de 500 pacientes com doença renal terminal submetidos a transplante de rim de doador vivo bem-sucedido de novembro de 2012 a abril de 2018 em nosso hospital foram detalhadamente pesquisados. Ecocardiogramas pré-operatórios de 33 pacientes com CMD (FE < 40%) foram encontrados. Dois pacientes foram excluídos do estudo devido a registros perioperatórios incompletos, enquanto 31 foram submetidos à análise retrospectiva (fig. 1). A incidência de CMD em nossos pacientes foi de 6,6%.

Figura 1
Apresentação do desenho do estudo.

Também registramos as características demográficas e clínicas dos pacientes, inclusive idade, sexo, duração da doença renal crônica (DRC), outras comorbidades (hipertensão, diabetes melito, derrame pleural), medicamentos em uso e achados ecocardiográficos pré-operatórios detalhados (tabela 1). A maioria dos pacientes era do sexo masculino, com média de idade inferior a 35 anos. As incidências de hipertensão, diabetes melito e derrame pleural foram de 74,19%, 6,45% e 12,9%, respectivamente. A média da fração de ejeção foi < 34%. A duração média da anestesia foi de 193,54 ± 21,87 minutos. A perda sanguínea média intraoperatória foi de 324,28 ± 63,39 mL. Apenas oito pacientes precisaram de transfusão de sangue no intraoperatório e a quantidade média de transfusões de concentrado de hemácias desleucocitado foi de 287,5 mL. A quantidade total usada de cristaloides durante a cirurgia foi de 1.112,903 ± 233,44 mL de soro fisiológico normal e de 1.077,41 ± 197,83 mL de soro fisiológico balanceado (Kabilyte, Fresenius Kabi). Coloides não foram administrados. Albumina foi infundida em dois pacientes (albumina sérica pré-operatória < 2,5 mg.dL–1). O manejo de fluidos e vasopressores foi feito sob a monitoração da PVC e PAM. Nenhuma monitoração adicional para estimar o débito cardíaco ou as variáveis dinâmicas de responsividade aos líquidos, como a variação de pressão de pulso (Pulse Pressure Variation – PPV) ou variação do volume sistólico (Stroke Volume Variation – SVV), foi usada. Solução de preservação não foi usada e o rim foi perfundido com 500 mL de solução fria de Ringer-lactato com 5.000 unidades de heparina, 2 mL de papaverina e 5 mL de lidocaína a 2%. Os tempos médios de isquemia foram 3–4 minutos (isquemia quente) e 20–30 minutos (isquemia fria) em todos os pacientes. A produção de urina foi imediata em todos os pacientes na reperfusão. Nenhum diurético foi usado (tabela 2).

Tabela 1
Características demográficas e pré-operatórias dos pacientes
Tabela 2
Variáveis demográficas e clínicas dos pacientes

Os valores de pH sanguíneo, concentração de hemoglobina, potássio e cálcio séricos estavam mais baixos no fim da cirurgia, enquanto o valor do lactato sérico estava mais alto (tabela 3). O débito urinário nas primeiras 24 horas foi de 13.264 ± 5,49 L, enquanto o nível sérico de creatinina no primeiro dia de pós-operatório foi de 2,196 ± 0,806 mg.dL–1. Hipotensão foi registrada em 16 pacientes (51,61%) tratados com norepinefrina isoladamente ou combinação de norepinefrina e epinefrina em dose baixa. Complicações respiratórias como edema pulmonar e necessidade de ventilação mecânica pós-operatória foram relatadas em dois e em quatro pacientes, 6,45% e 12,9%, respectivamente. Um paciente apresentou necrose tubular aguda e quatro pacientes (12,9%) precisaram de diálise uma semana após o transplante (tabela 4). Nenhum paciente apresentou arritmia significativa que precisasse de tratamento médico. Nenhuma intervenção cardíaca perioperatória (dispositivo de assistência ventricular esquerda, bomba ou fios de estimulação de balão intra-aórtico) foi necessária em todos os pacientes. Não houve relato de mortalidade no perioperatório até a alta do paciente.

Tabela 3
Variáveis metabólicas nos períodos pré e pós-operatórios
Tabela 4
Desfechos pós-operatórios dos pacientes

Discussão

O transplante renal é o tratamento de escolha em pacientes com doença renal em estágio terminal. Hipertensão crônica, sobrecarga de volume, hemodiálise e muitas outras doenças fisiológicas levam ao enfraquecimento do ventrículo esquerdo nessa população de pacientes. O aprimoramento pré-operatório adequado do estado cardíaco, a anestesia balanceada com monitoração invasiva e a terapia intensiva no pós-operatório são a chave para o sucesso do tratamento.88 Poldermans D, Bax JJ, Boersma E, et al. Guidelines for pre-operative cardiac risk assessment and perioperative cardiac management in non-cardiac surgery. Eur Heart J. 2009;30:2769-812. O aprimoramento pré-operatório inclui, mas não se limita a:

  • Controle adequado da pressão arterial com modificação das doses dos agentes anti-hipertensivos;

  • Diálise pré-operatória para correção de hipervolemia, desequilíbrio eletrolítico e distúrbios metabólicos;

  • Correção de anemia para melhorar a capacidade do transporte de oxigênio;

  • Aprimoramento de outras comorbidades comumente associadas – controle adequado do diabetes, doenças pulmonares, etc.

O período intraoperatório é muito crucial para que, de um lado, possamos controlar os parâmetros cardíacos dentro da variação ideal e, de outro lado, manter a perfusão renal adequada para alcançar o débito urinário adequado. Grosso modo, os objetivos intraoperatórios necessários para o manejo desses pacientes são os seguintes:99 Shibuya M, Kamekura N, Kimura Y, et al. Clinical study of anaesthetic management during dental treatment of 25 patients with cardiomyopathy. Spec Care Dentist. 2003;23:216-222.,1010 Juneja R, Nambiar PM. Cardiomyopathies and anaesthesia. Indian J Anaesth. 2017;61:728-35.

  • Aprimoramento de líquidos para manter adequadas a pré-carga (PVC 8-12 mmHg) e a pressão de perfusão (PAM 90-100 mmHg), com o uso criterioso de inotrópicos e vasopressores para um bom débito urinário;

  • Manter a frequência e o ritmo cardíacos normais;

  • Manter os parâmetros eletrolíticos e metabólicos dentro da variação normal;

  • Monitoração invasiva (Pressão Arterial Invasiva, Pressão Venosa Central e Débito Cardíaco) para obter melhor controle hemodinâmico;

  • Anestesia balanceada, evitar usar depressores cardíacos, injeção lenta de drogas, evitar usar drogas nefrotóxicas, evitar a resposta do sistema nervoso simpático e providenciar o controle adequado da dor;

  • Prontidão do sistema de suporte cardíaco em emergência (bomba de balão intra-aórtico, fios de estimulação e medicamentos de emergência).

Os pacientes com CMD e DRT submetidos a transplante renal apresentam duplo desafio para manter o equilíbrio hidroeletrolítico e os parâmetros hemodinâmicos desejados no perioperatório. Os desequilíbrios que, de outra forma, poderiam ser tolerados em receptores de transplante renal podem ser fatais na presença de CMD. Não há muita literatura disponível sobre o tema. Há poucos estudos sobre o manejo desses casos sob bloqueio neuraxial central,1111 Srivastava D, Tiwari T, Sahu S, et al. Anaesthetic management of renal transplant surgery in patients of dilated cardiomyopathy with ejection fraction less than 40%. Anesthesiol Res Pract. 2014;2014:525-69.,1212 Bhosale G, Shah V. Combined spinal-epidural anesthesia for renal transplantation. Transplantation Proc. 2008;40:1122-4. mas tais casos requerem a retirada de antitrombóticos no perioperatório. Porém, como esses pacientes apresentam risco aumentado de desenvolver tromboembolismo pulmonar, a retirada de agentes antitrombóticos pode ser prejudicial. Portanto, a anestesia geral é a técnica preferida no manejo anestésico. Durante a administração da anestesia geral, cuidados devem ser tomados para minimizar a supressão do miocárdio, pois os agentes anestésicos intravenosos e inalatórios produzem algum grau de supressão do miocárdio. A seleção do agente adequado, bem como a administração em doses apropriadas, é importante. Além disso, como há um aumento do tempo de circulação cérebro-braço devido à circulação mais lenta, é preciso esperar um pouco até que o efeito desejado seja obtido.

O período pós-operatório, especialmente nas primeiras 24 horas, é mais crítico devido a alterações rápidas no volume de líquidos, desequilíbrio eletrolítico e metabólico etc. Tais pacientes podem desenvolver insuficiência cardíaca congestiva.1313 Holte K, Sharrock NE, Kehlet H. Pathophysiology and clinical implications of perioperative fluid excess. Br J Anaesth. 2002;89:622-32. Os pacientes permanecem com monitoração atenta após a transferência para a unidade de terapia intensiva pós-transplante renal. Queda e aumento da pressão arterial, dessaturação de oxigênio, desequilíbrio eletrolítico e metabólico e débito urinário devem ser seriamente observados e prontamente atendidos para evitar consequências perigosas como insuficiência cardíaca, edema pulmonar, arritmias ventriculares e atriais fatais e falência renal, dentre outras.1414 Strunden MS, Heckel K, Goetz AE, et al. Perioperative fluid and volume management: physiological basis, tools and strategies. Ann Intensive Care. 2011;1:2.

Conclusões

Os pacientes com CMD agendados para cirurgia de transplante renal são um desafio para o anestesiologista. Por ser uma faca de dois gumes, precisamos manter a resistência vascular sistêmica e o débito cardíaco especificamente no pós-operatório. Essa conduta no pós-operatório é obrigatória para preservar o fluxo sanguíneo renal e, portanto, o bom funcionamento do rim enxertado, mas, por outro lado, precisamos impedir a insuficiência cardíaca. Esses objetivos podem ser atingidos com sucesso mediante a monitoração rigorosa da pressão arterial e do débito cardíaco, bem como o uso criterioso de líquidos e vasopressores intravenosos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    Sep-Oct 2019

Histórico

  • Recebido
    15 Dez 2018
  • Aceito
    9 Jun 2019
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