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Resposta à carta ao Editor Resposta do autor à Carta ao Editor: Os efeitos da lidocaína e do sulfato de magnésio na atenuação da resposta hemodinâmica à intubação orotraqueal: estudo unicêntrico, prospectivo, duplamente encoberto e aleatorizado.

Agradecemos a carta de Barbosa FT11 Barbosa FT. Effects of lidocaine and magnesium sulfate in attenuating hemodynamic response to orotracheal intubation: a single-center, prospective, double blind, randomized study. Braz J Anesthesiol. 2017, http://dx.doi.org/10.1016/j.bjan.2017.01.002 [Epub ahead of print].
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjan.2017.01...
por prestigiar nosso trabalho e os elogios ao estudo feito em nosso serviço intitulado “Os efeitos da lidocaína e do sulfato de magnésio na atenuação da resposta hemodinâmica à intubação orotraqueal: estudo unicêntrico, prospectivo, duplamente encoberto e aleatorizado”.22 Mendonça FT, de Queiroz LM, Guimarães CCR, et al. Effects of lidocaine and magnesium sulfate in attenuating hemodynamic response to tracheal intubation: single-center, prospective, double-blind, randomized study. Braz J Anesthesiol. 2017;67:50-6. Para nós, autor e convidado do autor para redigir esta resposta, nada mais justo do que responder com toda a atenção todos os questionamentos, dentro de nossas limitações:

  1. Pergunta: Os autores referem-se a uma diferença estatística de forma discreta. Isso não permite que o leitor do artigo chegue a suas conclusões: “Observou-se no Grupo M elevação estatisticamente significativa nos valores de PAS (p = 0,018) e PAD (p = 0,0467) na medida pós-IOT (fig. 2), mas de pequena importância clínica”. Os valores deveriam ser demonstrados em texto, pois da forma como se encontra na figura 2 do artigo, não é possível captar a magnitude deles, de forma que a falta de importância clínica não representa ausência de relevância biológica.

    Quanto ao Item 1, foi realmente falha de nossa parte a omissão desses dados, que não foi intencional. Os dados faltantes estão na tabela 1.

    Tabela 1
    Comparação da média ± desvio-padrão de pressão arterial em mmHg nos diversos momentos do estudo
  2. Pergunta: Os dados foram, em parte ou na sua totalidade, analisados ao longo do tempo e os pacientes foram submetidos também à ação de anestésicos, além das medicações testadas, que podem ser adicionais ou não. É sabido que o sulfato de magnésio tem efeito clínico prolongado após o uso venoso, enquanto que a lidocaína tem efeito protetor curto em relação ao magnésio. Assim, existem dois fatores que devem ser considerados nessa análise estatística: o tempo e o tratamento. O melhor teste estatístico a ser executado para essa situação é o a Anova dois fatores. Os resultados analisados da forma como estão no texto podem estar erroneamente positivos e percebe-se claramente a possibilidade da presença de erro tipo I nessa pesquisa.

    Quanto ao Item 2, discordamos da afirmação. O Anova de dois fatores é aplicável quando temos uma variável dependente numérica e duas variáveis independentes categóricas.33 Gelman A. Analysis of variance? Why it is more important than ever. Ann Stat. 2005;33:1-53.,44 Fujikoshi Y. Two-way ANOVA models with unbalanced data. Discrete Math. 1993;116:315-34. Tempo é uma variável numérica e esse delineamento de coleta de dados é conhecido como medidas repetidas. O teste Anova de medidas repetidas ou uma opção não paramétrica (como modelos de efeitos mistos) são indicados nessas situações, não Anova de dois fatores.33 Gelman A. Analysis of variance? Why it is more important than ever. Ann Stat. 2005;33:1-53.,55 Ma Y, Mazumdar M, Memtsoudis SG. Beyond repeated-measures analysis of variance: advanced statistical methods for the analysis of longitudinal data in anesthesia research. Reg Anesth Pain Med. 2012;37:99-105. Considere o seguinte: não existe independência entre as medidas em relação ao tempo (dependência histórica), o que viola um importante pressuposto do teste Anova de dois fatores.33 Gelman A. Analysis of variance? Why it is more important than ever. Ann Stat. 2005;33:1-53.,44 Fujikoshi Y. Two-way ANOVA models with unbalanced data. Discrete Math. 1993;116:315-34. E, ao contrário do que se afirmou, usar repetidamente testes de hipótese em cada par temporal aumenta o número de testes e aumenta a incidência de falso-positivos, um dos principais motivos do Anova de medidas repetidas.55 Ma Y, Mazumdar M, Memtsoudis SG. Beyond repeated-measures analysis of variance: advanced statistical methods for the analysis of longitudinal data in anesthesia research. Reg Anesth Pain Med. 2012;37:99-105. Por outro lado, diversos fatores nos impedem de usar Anova de medidas repetidas nessa amostra, pois violaríamos pressupostos como esfericidade e normalidade (note que o tempo entre as medidas não é regular). Modelos de efeitos mistos poderiam ser aplicados, porém, devido a sua baixa sensibilidade, requerem amostras muito grandes, pouco úteis nesta amostra. Além disso, considerando que o objetivo principal do estudo é aquele usado para o cálculo do tamanho da amostra, ou seja, a simples variação da pressão arterial sistólica após a intubação orotraqueal, fazer análises de medidas repetidas, que não foram previstas, se caracterizaria como mineração de dados, o que seria inadequado.

  3. Pergunta: Se os autores consideram correto o uso do teste t de Student, ou mais adequadamente em alguns casos o teste U de Mann-Whitney, conforme o texto, deveriam ter corrigido o valor de p com o procedimento para correção múltipla de testes de hipóteses, em vez de considerar apenas 5% como o nível de significância em todas as análises. A possibilidade de o resultado ter sido positivo na análise estatística e ter ocorrido ao acaso é de 5%. A correção do valor de p diminuiria a probabilidade de o resultado estatístico ter ocorrido ao acaso. Assim, é clara a possibilidade da presença de erro tipo I nessa pesquisa.

    Quanto ao Item 3, concordamos parcialmente. Muitos autores recomendam que os valores exatos de p sejam publicados,66 Rothman KJ. No adjustments are needed for multiple comparisons. Epidemiol Camb Mass. 1990;1:43-6. já que não há consenso sobre qual o melhor método para correção por múltiplos testes, a correção do valor-p crítico é considerada para significância, em vez da correção do valor de p de cada teste de hipótese feito, uma opção bem recomendada.77 Narum SR. Beyond Bonferroni: less conservative analyses for conservation genetics. Conserv Genet. 2006;7:783-7. Nesse estudo, com o método de correção proposto por Bonferroni, por exemplo, o valor crítico de p seria 5%/16 = 0,003125. A correção de Bonferroni é a mais conservadora, porém há quem discuta se ela se aplica ao único teste do resultado principal do estudo ou apenas a todos os outros testes de hipótese adicionais, ou até mesmo se ela deveria ser usada.88 Perneger TV. What's wrong with Bonferroni adjustments. BMJ. 1998;316:1236-8.,99 Armstrong RA. When to use the Bonferroni correction. Ophthalmic Physiol Opt J Br Coll Ophthalmic Opt Optom. 2014;34:502-8.

  4. Pergunta: O objetivo descrito pelos autores foi “comparar os efeitos da administração endovenosa de sulfato de magnésio versus lidocaína na hemodinâmica desse reflexo após a laringoscopia e intubação orotraqueal”. A conclusão citada pelos autores foi “sulfato de magnésio e lidocaína apresentam boa eficácia e segurança no controle hemodinâmico da laringoscopia e intubação” não condiz com o objetivo proposto. É necessário que os autores relacionem quais foram as variáveis de eficácia e quais as de segurança para que a conclusão fique mais bem compreendida. Lembro-lhes que o termo eficácia geralmente deve ser usado em pesquisas cujas condições de execução sejam ideais, tal como ocorre com os estudos laboratoriais. Esse termo também deve ser revisto pelos autores, é sugerido o termo efetividade.

    Quanto ao Item 4, realmente houve problema na redação das conclusões. A conclusão mais precisa seria: nosso estudo não foi capaz de detectar diferença estatisticamente significante na PAS pós-IOT entre os grupos que receberam sulfato de magnésio ou lidocaína. Por se tratar de estudo de superioridade (não está escrito, mas como não usamos margem de inferioridade no cálculo do tamanho da amostra, apenas essa opção é compatível), o estudo não pode concluir. Além disso, todo o resto é discussão. Reforçamos para demais leitores que não encontrar diferença em um estudo de superioridade não significa que encontramos igualdade nem não inferioridade.

  5. Pergunta: Para finalizar, deixo como recomendação a observação aos autores de que existem doses maiores, igualmente seguras e de mesma efetividade, que poderiam ter sido testadas nessa pesquisa clínica e aumentado o grau de informações referentes ao tema.

    Quanto ao Item 5, agradecemos a sugestão e a consideraremos para próximas pesquisas.

  • Resposta do autor à Carta ao Editor: Os efeitos da lidocaína e do sulfato de magnésio na atenuação da resposta hemodinâmica à intubação orotraqueal: estudo unicêntrico, prospectivo, duplamente encoberto e aleatorizado.

References

  • 1
    Barbosa FT. Effects of lidocaine and magnesium sulfate in attenuating hemodynamic response to orotracheal intubation: a single-center, prospective, double blind, randomized study. Braz J Anesthesiol. 2017, http://dx.doi.org/10.1016/j.bjan.2017.01.002 [Epub ahead of print].
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.bjan.2017.01.002
  • 2
    Mendonça FT, de Queiroz LM, Guimarães CCR, et al. Effects of lidocaine and magnesium sulfate in attenuating hemodynamic response to tracheal intubation: single-center, prospective, double-blind, randomized study. Braz J Anesthesiol. 2017;67:50-6.
  • 3
    Gelman A. Analysis of variance? Why it is more important than ever. Ann Stat. 2005;33:1-53.
  • 4
    Fujikoshi Y. Two-way ANOVA models with unbalanced data. Discrete Math. 1993;116:315-34.
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    Ma Y, Mazumdar M, Memtsoudis SG. Beyond repeated-measures analysis of variance: advanced statistical methods for the analysis of longitudinal data in anesthesia research. Reg Anesth Pain Med. 2012;37:99-105.
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    Rothman KJ. No adjustments are needed for multiple comparisons. Epidemiol Camb Mass. 1990;1:43-6.
  • 7
    Narum SR. Beyond Bonferroni: less conservative analyses for conservation genetics. Conserv Genet. 2006;7:783-7.
  • 8
    Perneger TV. What's wrong with Bonferroni adjustments. BMJ. 1998;316:1236-8.
  • 9
    Armstrong RA. When to use the Bonferroni correction. Ophthalmic Physiol Opt J Br Coll Ophthalmic Opt Optom. 2014;34:502-8.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2017
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