Resumos
JUSTIFICATIVA E OBJETIVO: Avaliar os efeitos antinociceptivos do meloxicam subaracnóideo sobre a hipernocicepção mecânica induzida pela carragenina em ratos.
MÉTODOS: Estudo randômico e controlado. Dezoito ratos Wistar, machos adultos, foram submetidos à implantação de uma cânula subaracnóidea, e aleatoriamente distribuídos em dois grupos: o Grupo I (GI) recebeu 5 µL de solução salina, enquanto que ao Grupo II (GII) foram administrados 30 µg de meloxicam, ambos pela via subaracnóidea. A hipernocicepção mecânica foi induzida pela injeção intraplantar de carragenina e avaliada com o emprego de um analgesímetro digital a cada 30 minutos durante um período de 4 horas. Os resultados foram registrados como o Δ do limiar de retirada (g), calculado subtraindo-se o valor das mensurações após os tratamentos, do valor basal.
RESULTADOS: Os valores médios do Δ do limiar de retirada foram menores no grupo tratado com meloxicam ao longo de todos os momentos de avaliação entre 45 e 165 minutos, contudo não foi demonstrada significância estatística (p = 0,835) para essa diferença.
CONCLUSÃO: A administração subaracnóidea do meloxicam na dose de 30 µg.animal-1 não foi capaz de suprimir a hipernocicepção mecânica em um modelo de dor inflamatória induzida pela administração intraplantar de carragenina em ratos. Os dados sugerem que outras doses sejam pesquisadas antes que o efeito do fármaco seja descartado.
AINE; Carragenina; Dor; Medula espinhal
BACKGROUND AND OBJECTIVE: Evaluate the antinociceptive effects of subarachnoid meloxicam on the mechanical hypernociception induced by carrageenan in rats.
METHODS: Randomized controlled trial. Eighteen adult male Wistar rats underwent a cannula implantation into the subarachnoid space and were randomly divided into two groups: Group I received saline solution 5 µL, while Group II received meloxicam 30 mg. The mechanical hypernociception was induced by intraplantar injection of carrageenan and evaluated using a digital analgesy meter every 30 min during a 4-h period. The results were recorded as the Δ withdrawal threshold (in g), calculated by subtracting the measurement value after treatment from baseline.
RESULTS: The Δ withdrawal threshold mean values were lower in the group of patients treated with meloxicam over all time points between 45 and 165 min, however, there was no statistical significance (p = 0.835) for this difference.
CONCLUSION: Subarachnoid meloxicam at a dose of 30 µg animal-1 did not suppress the mechanical hypernociception in a model of inflammatory pain induced by intraplantar administration of carrageenan in rats. The data suggest that other dosages should be investigated the drug effect is discarded.
NSAIDs; Carrageenan; Pain; Spinal cord
JUSTIFICACIÓN Y OBJETIVO: Evaluar los efectos antinociceptivos del meloxicam subaracnoideo sobre la hipernocicepción mecánica inducida por la carragenina en ratones.
MÉTODOS: Estudio aleatorizado y controlado. Dieciocho ratones Wistar, machos adultos, fueron sometidos a la implantación de una cánula subaracnoidea y aleatoriamente distribuidos en 2 grupos: el grupo I recibió 5 µl de solución salina, mientras que al grupo II se le administró 30 µg de meloxicam, ambos por vía subaracnoidea. La hipernocicepción mecánica fue inducida mediante inyección intraplantar de carragenina y fue calculada con el uso de un analgesímetro digital cada 30 min durante un período de 4 h. Los resultados fueron registrados como el Δ del umbral de retirada (g), calculado restándose el valor de las medidas posteriormente a los tratamientos, del valor basal.
RESULTADOS: Los valores medios del Δ del umbral de retirada fueron menores en el grupo tratado con meloxicam en todos los momentos de evaluación entre 45 y 165 min, sin embargo, no se demostró significación estadística (p = 0,835) para esa diferencia.
CONCLUSIÓN: La administración subaracnoidea del meloxicam en la dosis de 30 µg/animal-1 no fue capaz de suprimir la hipernocicepción mecánica en un modelo de dolor inflamatorio inducido por la administración intraplantar de carragenina en ratones. Los datos sugieren que deben investigarse otras dosis antes de descartar el efecto del fármaco.
AINE; Carragenina; Dolor; Médula espinal
Introdução
Evidências demonstram que os anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) apresentam, além da ação periférica reconhecida, um poderoso efeito nos estados de dor experimental que é independente de seus efeitos anti-inflamatórios.1 Adicionalmente à sua ação inibitória da síntese de prostaglandinas perifericamente, uma ação central dos AINEs tem sido sugerida por estudos experimentais nos quais esses fármacos demonstram uma maior potência pela via subaracnóidea quando comparada à administração sistêmica.2and3 Estudos têm demonstrado que ambas as formas da ciclooxigenase (COX) são constitutivamente expressas no cérebro e na medula espinhal de ratos,4 sendo COX-2 a isoforma predominante no corno dorsal da medula espinhal.5 A administração espinhal dos fármacos anti-inflamatórios tem mostrado suprimir o reflexo das fibras C, inibir a sensibilização neuronal no corno dorsal da medula espinhal e atenuar a dor inflamatória de longa duração.2, 6, 7, 8, 9,10and11
O meloxicam é um analgésico e anti-inflamatório não esteroidal pertencente à classe do ácido enólico, apresentando preferência pela isoenzima COX-2.12 Diferentemente de muitos outros AINEs, apresenta alta biodisponibilidade oral e uma longa meia-vida, embora não esteja destituído de efeitos colaterais.13 Estudos abordando a administração do meloxicam pelas vias espinhais são escassos14, 15,16and17 e não avaliam seus efeitos sobre a dor inflamatória aguda. O objetivo da presente investigação foi avaliar o poder antinociceptivo do meloxicam subaracnóide sobre a dor aguda induzida pela carragenina em ratos.
Materiais e métodos
O protocolo experimental utilizado foi analisado e aprovado pela Comissão de Ética no Uso de Animais da instituição. Os ratos foram alojados individualmente sob temperatura controlada (21°-24 °C) e ciclo claro-escuro de 12 horas, com água e alimento ofertados ad libitum por no mínimo 14 dias.
Os animais foram cirurgicamente preparados sob anestesia com quetamina e xilazina (100 e 10 mg.kg-1 via intraperitoneal, respectivamente), e a seguir, submetidos à implantação da cânula no espaço subaracnóide de acordo com uma modificação da técnica previamente descrita pela literatura.18 Resumidamente, os animais foram acomodados em decúbito ventral, com os membros anteriores e posteriores fixados em abdução e com a região da cabeça levemente elevada em relação ao resto do corpo. Após anti-sepsia da pele da região atlantooccipital, uma incisão vertical com aproximadamente 2 cm de comprimento foi realizada na linha média da região, iniciando no ponto entre as orelhas e se estendendo caudalmente. O tecido subcutâneo e os músculos biventer cervicis e rectus capitis dorsalis maior foram afastados por dissecação romba. Com o afastamento da musculatura, a dura-máter e a cisterna magna foram visualizadas, e após a exposição da membrana atlantooccipital, uma agulha 18-Gauge foi empregada para puncionar sua região central, até que ocorresse saída de líquido cefalorraquidiano. Uma cânula de polietileno PE-10 (#BB31695-PE/1, Scientific Commodities, Lake Havasu City - AZ, USA) foi, então, inserida através do orifício e avançada 8,5 cm caudalmente no interior do espaço subaracnóide, até alcançar a região do alargamento lombar. A mensuração, o corte e a marcação das cânulas com tinta esmalte foram realizados no período prévio ao experimento, sendo esse material individualmente embalado e esterilizado com óxido de etileno. A porção cranial da cânula foi inserida através de uma agulha 18-Gauge, permitindo sua acomodação no tecido subcutâneo, de modo a emergir da pele próximo ao topo da cabeça. Os músculos e a pele foram suturados e a extremidade externa do cateter foi ocluída com a inserção de um pequeno fragmento de agulha dental (30G × 21 mm). Por fim, a porção externa da cânula foi fixada à pele com sutura. Durante o período que se seguiu à implantação da cânula, os animais foram mantidos em caixas plásticas individuais, sob as mesmas condições do período prévio. No dia seguinte à colocação da cânula, os animais foram avaliados, de modo que déficits neurológicos pudessem ser constatados. Aqueles que apresentaram alterações neurológicas foram excluídos do estudo.
Dezoito ratos Wistar, pesando 300-450 g, foram preparados com sucesso para o estudo, e um dia após a colocação da cânula, foram submetidos ao teste de avaliação da hipernocicepção mecânica induzida pela carragenina. Para isso, foi empregado um analgesímetro digital (Insight Ltda Equipamentos Científicos, Ribeirão Preto - SP, Brasil), de acordo com técnica previamente descrita,19 na qual um transdutor de pressão equipado com uma ponteira de polipropileno de 7 mm2 foi aplicado perpendicularmente à superfície plantar direita dos animais, com uma pressão linearmente crescente. O equipamento registrou a força exercida, expressa em gramas (g), com precisão de 0,1 g. A estimulação do membro foi repetida até que o animal apresentasse três mensurações semelhantes (a diferença entre o valor mais alto e o mais baixo fosse inferior a 10 g). Assim, o comportamento nociceptivo foi quantificado através da média de três valores expressos em gramas, que representa o limiar de retirada da pata ao estímulo mecânico, em cada momento de avaliação. Foram considerados como resposta positiva a retirada do membro do contato com a ponteira ou o comportamento de sacudir e/ou lamber o membro no momento ou imediatamente após a estimulação (flinch). A ambulação foi considerada uma resposta ambígua, logo, quando ocorreu no momento da aplicação do teste, este foi repetido.
Aproximadamente trinta minutos antes do início das avaliações, os ratos foram transferidos para o local de realização dos testes, constituído por caixas acrílicas com assoalho de tela aramada não maleável, em uma sala silenciosa, permitindo sua aclimatização, constatada pelo cessar do comportamento de limpeza e exploração do local. Ao longo desse período, foram realizadas aproximadamente cinco estimulações dos membros dos animais, de modo a permitir sua familiarização com o estímulo aplicado. Logo a seguir, foram estabelecidos os valores basais de cada animal.
Uma vez registrados os valores basais, os animais foram contidos manualmente, procedendo-se a retirada do fragmento metálico oclusivo do cateter. A seguir, os animais foram distribuídos aleatoriamente em dois grupos. Os animais do Grupo I (GI, n = 9) foram submetidos à administração subaracnóidea de 5 µL de solução salina, enquanto que os animais do Grupo II (GII, n = 9) receberam 30 µg de meloxicam diluídos em solução salina até um volume final de 5 µL, pela mesma via. As soluções foram administradas com o auxílio de uma microseringa Hamilton de 10 µL (701N, Hamilton Company, Reno - NV, USA) durante um período de 30 segundos. Realizado tal procedimento, 10 µL de solução salina estéril foram injetados para lavagem do cateter.
Imediatamente após a administração das substâncias no espaço subaracnóideo, carragenina-lambda (0,1 mL de carragenina 2,5%) foi injetada na região intraplantar do membro direito, seguindo a técnica descrita previamente na literatura.20 O momento da injeção da carragenina foi registrado como tempo 0 (T0), e as avaliações posteriores foram realizadas a cada 30 minutos durante as quatro horas posteriores à administração do fármaco, para se obter um perfil temporal de ação da mesma. Todas as avaliações foram realizadas por um componente que desconhecia o tratamento ao qual cada animal fora submetido. Uma vez que os animais foram testados nos períodos anteriores e posteriores à administração dos fármacos, os resultados foram registrados como o Δ do limiar de retirada (g), calculado subtraindo-se o valor das mensurações após os tratamentos, do valor basal, e esses valores foram confrontados.
Os dados são apresentados como média ± desvio-padrão. Os valores do Δ do limiar de retirada foram comparados com uso de análise de variâncias com medidas repetidas e dois fatores, sendo o grupo (GI ou GII) o fator fixo e o momento (tempo a cada 30 minutos) o fator de repetição. Para a análise foi suposta matriz de correlações não estruturadas entre os momentos de avaliação. As análises foram realizadas com o software SAS versão 8.0 para Windows e o nível de significância foi determinado em p < 0,05.
Resultados
Um aumento médio do Δ do limiar de retirada ocorreu com o passar do tempo, sendo os seus valores estatisticamente maiores nas avaliações com 210 e 240 minutos em relação às demais (p < 0,05). Diferenças entre outros momentos de avaliação puderam ser constatadas, sempre havendo aumento médio do Δ do limiar de retirada com o transcorrer do experimento, como demonstrado pela tabela 1.
Diferença média, erro padrão e valor de p do Δ do limiar de retirada (g) nos ratos dos grupos GI e GII, no diferentes momentos de avaliação da hipernocicepção induzida pela injeção intraplantar de carragenina
Os valores médios do Δ do limiar de retirada foram menores no grupo tratado com meloxicam ao longo de todos os momentos de avaliação entre 45 e 165 minutos, apesar de não ter sido demonstrada significância estatística (p = 0,835) para essa diferença (fig. 1). Diferenças médias no Δ do limiar de retirada ocorreram entre os momentos de avaliação dentro de cada grupo (p < 0,001).
Valores médios do Δ do limiar de retirada ± desvio padrão (g) nos diferentes momentos de avaliação da hipernocicepção mecânica, em ratos submetidos à administração SA de solução salina (GI) ou meloxicam (GII).
Durante a avaliação da antinocicepção, dois ratos, ambos pertencentes ao GI, apresentaram respostas clinicamente diferenciadas após a indução da hiperalgesia. Esses animais mostraram a presença de secreção ocular, significativo abatimento, com vocalizações em repouso e reluta em apoiar o membro submetido à aplicação de carragenina, sugerindo a presença de dor intensa. A avaliação antinociceptiva desses ratos apresentou um grau de dificuldade elevado em relação ao demais, visto que os animais não permitiam que força fosse exercida contra a superfície plantar durante a aferição. Nesses casos, os animais erguiam o membro afetado, acompanhando o movimento da ponteira, não exercendo resistência à pressão exercida. Como resultado, tais animais apresentaram altos valores de limiar de retirada, que não condisseram com o que pôde ser clinicamente observado.
Discussão
A efetividade dos AINEs convencionais, dos inibidores da COX-2 e dos anticorpos monoclonais anti-prostaglandina E2 como agentes anti-inflamatórios nos modelos experimentais utilizando a carragenina,encontra-se atualmente bem descrita na literatura.20,21and22 Suas ações foram tradicionalmente atribuídas à inibição das prostaglandinas periféricas, as quais exercem importante papel na sensibilização dos nociceptores no sítio de lesão,23 uma vez que a injeção intraplantar de carragenina induz um significativo aumento na expressão de COX-2, bem como na produção de prostaglandina E2.24 As quantidades relativas de cada isoforma que são expressas nos diferentes tecidos, contudo, variam e podem ser moduladas sob condições patológicas. Assim, contrastando com outros órgãos, o cérebro normal do rato, bem como a medula espinhal expressam mais COX-2 do que COX-1,25 e dados confirmam seu papel no processamento sensorial da dor.26 Desse modo, uma série de evidências experimentais sugere atualmente que os AINEs exercem sua ação analgésica também por atividade sobre o Sistema Nervoso Central, adicionalmente à sua reconhecida ação periférica.25
Diversos fármacos têm sido administrados por via espinhal na tentativa de comprovar tal mecanismo, e a ausência de efeitos consistentes do meloxicam subaracnóideo sobre a nocicepção induzida no modelo experimental utilizado vem contra os achados de outros autores, que reportam atividade antinociceptiva após o uso espinhal de outros AINEs.2, 14, 15, 20, 27, 28, 29, 30,31and32 Ressalta-se, contudo, que embora uma variedade de trabalhos pesquise o poder antinociceptivo dos inibidores da COX-2 administrados por via subaracnóidea, estudos abordando especificamente os efeitos do meloxicam são ainda escassos. Esses trabalhos já foram capazes de demonstrar, entretanto, um efeito inibitório sobre o fenômeno de wind-up in vitro, 33 bem como sobre a nocicepção induzida pela capsaicina ou formalina. 34 Adicionalmente, um efeito analgésico sinérgico com a morfina foi demonstrado após sua administração SA em animais com dor visceral experimental. 15 Em estudo prévio, 17 dose semelhante à do presente trabalho (30 µg.animal-1) foi utilizada a fim de pesquisar os efeitos anti-alodínicos do meloxicam SA. Os autores, contudo, empregaram um modelo de dor neuropática experimental em camundongos diabéticos, diferindo do modelo de dor inflamatória desta pesquisa. Os efeitos do fármaco, entretanto, foram demonstrados com a dose empregada, o que não ocorreu neste estudo. Observando-se atentamente os dados apresentados na figura 1, todavia, é possível perceber que o grupo submetido à administração do meloxicam apresentou valores médios do Δ do limiar de retirada inferiores àqueles mostrados pelo grupo que recebeu a solução salina, durante todos os momentos de avaliação entre 45 e 165 minutos.
A inflamação gerada pela aplicação intraplantar de carragenina se caracteriza por mostrar um comportamento bifásico em relação ao edema. A fase precoce (0-1 h) tem sido atribuída à liberação de histamina, 5-hidroxitriptamina e bradicinina, de modo que a eficácia dos AINEs nesse período tem sido questionada. Na fase tardia (1-6 h), por outro lado, uma elevada produção de PGs tem sido tem sido verificada.35 A hiperalgesia, contudo, parece se desenvolver em paralelo com a elevação dos níveis espinhais de COX-2 e seu pico só ocorre após 4 horas da injeção de carragenina.36 Observando a figura 1, entretanto, é possível perceber que os efeitos do meloxicam sobre a hiperalgesia ocorreram justamente no período anterior às 4 horas de avaliação, com valores significativamente elevados do Δ do limiar de retirada após 165 minutos da administração, contrastando com tais afirmações.
Esse comportamento da curva de resposta, todavia, também foi observado em trabalhos que, usando o modelo da carragenina, observaram-se efeitos anti-hiperalgésicos térmicos quando da administração SA do SC58125 - um inibidor seletivo da COX-2 - somente durante os 170 minutos iniciais da avaliação.37 Visto que a hiperalgesia térmica tem mostrado ser similarmente mediada pela ação da COX-2 espinhal,38 estudos que caracterizem o padrão de expressão medular da COX-2 na inflamação induzida pela carragenina, até então aparentemente inexistentes, poderão elucidar tais observações. Um significativo aumento na intensidade da hipernocicepção, caracterizado pela elevação do Δ do limiar de retirada, especialmente nas avaliações com 210 e 240 minutos, foi observado em ambos os grupos experimentais. Tais constatações podem ser explicadas pelas afirmações de outros autores, segundo as quais a repetição do estímulo mecânico pode produzir uma elevação na sensibilidade da área estimulada.39 A administração do meloxicam, portanto, também não foi capaz de impedir esse aumento da hipernocicepção com o transcorrer do tempo.
Dentre os diferentes fatores que podem ter influenciado a obtenção dos presentes resultados, o estabelecimento de uma dose adequada surgiu como uma necessidade essencial cuja importância pode ter sido decisiva para os dados aqui demonstrados. Atualmente, os escassos trabalhos envolvendo o meloxicam por via subaracnóidea envolvem protocolos de administração distintos daquele preconizado nesse estudo, como técnicas de infusão contínua16 ou sua associação com opióides.15 A necessidade de determinação de uma dose capaz de demonstrar efeitos consistentes, ou mesmo a ausência de tais efeitos, se baseou na extrapolação dos resultados obtidos em tais estudos, com sua adequação às necessidades desse trabalho. Assim, tomando por base pesquisas prévias que obtiveram resultados satisfatórios com o uso de 30 µg.animal-1 de meloxicam subaracnóide sobre a dor neuropática experimental em animais diabéticos,17 a utilização de dose semelhante foi preconizada, de forma a observar seus efeitos sobre a hiperalgesia inflamatória.
A dor neuropática, contudo, é uma síndrome complexa que envolve teorias inflamatórias e imunes ainda pouco esclarecidas, e cuja hiperalgesia resulta tanto do comprometimento de tecidos neurais quanto não neurais, estando associada à ativação de fibras Aβ, além das fibras Ad.40 Contudo, a complexidade do sistema nociceptivo tem demonstrado que diferentes vias sensoriais são ativadas após alterações mínimas na natureza do processo doloroso,41 levando a acreditar que doses diferenciadas de um mesmo fármaco possam ser necessárias para supressão das dores de diferentes origens. Tal possibilidade pode ser prontamente cogitada no presente estudo, visto que uma dose capaz de controlar a hiperalgesia neuropática não obteve os mesmos resultados sobre aquela de origem inflamatória. Fica assim demonstrada a necessidade de pesquisas futuras com diferentes doses do fármaco.
Agradecimentos
À CNPQ/CAPES pela verba de incentivo à pesquisa.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Mar-Apr 2015
Histórico
-
Recebido
21 Ago 2013 -
Aceito
28 Out 2013