Resumos
Este estudo descritivo de caso objetivou analisar a interferência do vestuário no desempenho, na amplitude de movimento (ADM) e no conforto dos exercícios físicos (EF) realizados na ginástica laboral (GL) com uniforme (UNI) e vestuário para a prática de exercícios físicos (VEF). Participaram 20 trabalhadoras com 28,9±10,2 anos de uma empresa de Florianópolis. Foram utilizados uma câmera fotográfica, banco de Wells, questionário e entrevista. Foram realizados sete EF: flexão do quadril, flexão do ombro, flexão do tronco-ângulos do quadril e tornozelo, extensão do ombro, flexão do tronco modificado-ângulos do quadril e tornozelo, adução horizontal do ombro e teste de sentar e alcançar com UNI e VEF. Aplicaram-se o teste t pareado, Qui-quadrado e Exato de Fisher, p<0,05. Constatou-se que, com UNI, sete trabalhadoras cuidavam para não mostrar o corpo, 17 retiravam peças do vestuário e 13 perceberam limitação do movimento. A presença de desconforto na parte superior do corpo foi menor nos EF de flexão do quadril e adução horizontal do ombro e na parte inferior nos EF de flexão, extensão e adução horizontal do ombro. Com UNI, as ADM foram menores do que com VEF nos EF: flexão do quadril (p=0,017), flexão do ombro (p=0,0075), flexão do tronco (quadril e tornozelo), flexão do tronco modificado (tornozelo), teste de sentar e alcançar (valores angulares e lineares) (p<0,001). O desempenho da flexão do tronco (tornozelo) foi melhor (p=0,001) com UNI devido ao calçado. Conclui-se que o vestuário tende a interferir na ADM e no conforto, mas não no desempenho dos exercícios físicos.
Ginástica; Trabalhadores; Amplitude de movimento articular; Vestuário
The objective of this descriptive case study was to analyze the interference of clothing with exercise performance, joint range of motion (ROM), and comfort during a session of labor gymnastics wearing a uniform (UNI) and specific exercise clothes (SEC). Twenty female workers (28.9±10.2 years) from a company in Florianópolis were studied. A photo camera, Wells bench, a questionnaire, and interview were used for data collection. The subjects were submitted to seven types of exercise wearing UNI and SEC: hip flexion, shoulder flexion, trunk flexion-hips and ankle angles, shoulder extension, modified trunk flexion-hips and ankle angles, horizontal shoulder adduction, and a sit-and-reach test. The results were analyzed using the paired t-test, chi-square test, and Fisher's exact test (p<0.05). Seven women wearing UNI tended not to show the body, 17 removed some part of UNI, and 13 noted movement limitation. Discomfort was lower in the upper body part during hip flexion and horizontal shoulder adduction and in the lower part during shoulder flexion, extension and horizontal shoulder adduction. Lower ROM values were observed for subjects wearing UNI compared to those wearing SEC during hip flexion (p=0.017), shoulder flexion (p=0.0075), trunk flexion (hips and ankle angles), modified trunk flexion (ankle angles), and the sit-and-reach test (linear and angular values) (p<0.001). Trunk flexion performance (ankle angles) was better in the UNI condition (p=0.001), probably because the subjects were wearing shoes. In conclusion, clothing tends to interfere with ROM and comfort, but not with exercise performance.
Gymnastics; Workers; Joint range of motion; Clothing
ARTIGO ORIGINAL
Interferência do vestuário no desempenho, na amplitude de movimento e no conforto na ginástica laboral
Clothing interference in performance, articular range of motion and comfort in labor gymnastics
Adriana Seára Tirloni; Antônio Renato Pereira Moro
Universidade Federal de Santa Catarina. Centro de Desportos. Laboratório de Biomecânica. Florianópolis, SC. Brasil
Endereço para correspondência Endereço para correspondência Adriana Seára Tirloni Rua: Baraúna, 159 - Parque São Jorge Florianópolis - SC - CEP: 88034-450 E-mail: adri@tirloni.com.br
RESUMO
Este estudo descritivo de caso objetivou analisar a interferência do vestuário no desempenho, na amplitude de movimento (ADM) e no conforto dos exercícios físicos (EF) realizados na ginástica laboral (GL) com uniforme (UNI) e vestuário para a prática de exercícios físicos (VEF). Participaram 20 trabalhadoras com 28,9±10,2 anos de uma empresa de Florianópolis. Foram utilizados uma câmera fotográfica, banco de Wells, questionário e entrevista. Foram realizados sete EF: flexão do quadril, flexão do ombro, flexão do tronco-ângulos do quadril e tornozelo, extensão do ombro, flexão do tronco modificado-ângulos do quadril e tornozelo, adução horizontal do ombro e teste de sentar e alcançar com UNI e VEF. Aplicaram-se o teste t pareado, Qui-quadrado e Exato de Fisher, p<0,05. Constatou-se que, com UNI, sete trabalhadoras cuidavam para não mostrar o corpo, 17 retiravam peças do vestuário e 13 perceberam limitação do movimento. A presença de desconforto na parte superior do corpo foi menor nos EF de flexão do quadril e adução horizontal do ombro e na parte inferior nos EF de flexão, extensão e adução horizontal do ombro. Com UNI, as ADM foram menores do que com VEF nos EF: flexão do quadril (p=0,017), flexão do ombro (p=0,0075), flexão do tronco (quadril e tornozelo), flexão do tronco modificado (tornozelo), teste de sentar e alcançar (valores angulares e lineares) (p<0,001). O desempenho da flexão do tronco (tornozelo) foi melhor (p=0,001) com UNI devido ao calçado. Conclui-se que o vestuário tende a interferir na ADM e no conforto, mas não no desempenho dos exercícios físicos.
Palavras-chave: Ginástica; Trabalhadores; Amplitude de movimento articular; Vestuário.
ABSTRACT
The objective of this descriptive case study was to analyze the interference of clothing with exercise performance, joint range of motion (ROM), and comfort during a session of labor gymnastics wearing a uniform (UNI) and specific exercise clothes (SEC). Twenty female workers (28.9±10.2 years) from a company in Florianópolis were studied. A photo camera, Wells bench, a questionnaire, and interview were used for data collection. The subjects were submitted to seven types of exercise wearing UNI and SEC: hip flexion, shoulder flexion, trunk flexion-hips and ankle angles, shoulder extension, modified trunk flexion-hips and ankle angles, horizontal shoulder adduction, and a sit-and-reach test. The results were analyzed using the paired t-test, chi-square test, and Fisher's exact test (p<0.05). Seven women wearing UNI tended not to show the body, 17 removed some part of UNI, and 13 noted movement limitation. Discomfort was lower in the upper body part during hip flexion and horizontal shoulder adduction and in the lower part during shoulder flexion, extension and horizontal shoulder adduction. Lower ROM values were observed for subjects wearing UNI compared to those wearing SEC during hip flexion (p=0.017), shoulder flexion (p=0.0075), trunk flexion (hips and ankle angles), modified trunk flexion (ankle angles), and the sit-and-reach test (linear and angular values) (p<0.001). Trunk flexion performance (ankle angles) was better in the UNI condition (p=0.001), probably because the subjects were wearing shoes. In conclusion, clothing tends to interfere with ROM and comfort, but not with exercise performance.
Key words: Gymnastics; Workers; Joint range of motion; Clothing.
INTRODUÇÃO
Os programas de ginástica laboral (GL) destacam-se pela fácil implantação, baixo custo e resultados aparentemente positivos sobre a saúde do trabalhador1, apesar de existirem restrições para a sua prática, como o tempo, convencionou-se que as sessões durariam 10 minutos; o espaço, pois a GL seria realizada no próprio local de trabalho; o vestuário habitual seria mantido sem nenhuma alteração e a temperatura ambiente condicionou a intensidade dos exercícios2.
Para Silva et al.3, não há necessidade de roupa especial para a prática da GL. Da mesma maneira, Sjögren et al.4 afirmam que treinamentos físicos realizados por trabalhadores, na empresa, com baixa intensidade (30% de 1RM), não causariam suor, e desta maneira, não seria necessária a mudança do vestuário para a prática dos exercícios físicos (EF) e tomar banho após a prática. No estudo realizado por Holmström e Ahlborg5, com trabalhadores da construção civil, foi mencionado apenas que os EF foram realizados com o vestuário habitual de trabalho, mas não o especificaram, enquanto que outros estudos6,7 não fazem menção ao vestuário utilizado pelos trabalhadores durante a GL.
Com trabalhadores de uma empresa de informática, constatou-se que o vestuário não foi citado por nenhum trabalhador como causa da não-adesão ao programa, no entanto, foi mencionada a inadequação do ambiente e o constrangimento, devido à exposição pessoal no local de trabalho8. Apesar das variáveis de interferência, houve aceitação dos trabalhadores ao programa e estes deram credibilidade à eficiência de curtos períodos de atividade física durante o trabalho. Por outro lado, um estudo sobre a forma como os programas de GL eram realizados destaca que a prática de EF com roupas de trabalho em um país tropical, como o Brasil, pode causar desconfortos, principalmente, associados a não utilização de uniformes (UNI) ou a não troca de roupas para trabalhar9.
Na elaboração de um programa de GL, é necessário que os exercícios respeitem o vestuário dos trabalhadores8,10. Todavia, observou-se que alguns estudos5,6,7 não trazem orientações aos profissionais de Educação Física quanto às recomendações que estes devam repassar aos trabalhadores, diariamente, sobre o vestuário, tais como: retirar peças do vestuário e realizar os EF na amplitude que o vestuário permitir, proporcionando conforto e satisfação aos trabalhadores.
A implementação dos programas de GL tem aumentado no Brasil, mas existem poucas evidências sobre os seus possíveis benefícios, como a melhora da amplitude de movimento (ADM), haja vista os estudos que não controlam algumas variáveis (frequência no programa e a prática de atividade física fora do local de trabalho) para poder comprovar a relação entre a participação na GL e a melhora da ADM9 e a interferência do UNI na ADM.
Sendo assim, este estudo tem como objetivo analisar a interferência do vestuário no desempenho, na ADM e no conforto percebido pelas trabalhadoras durante os EF realizados na GL, além de analisar o nível de satisfação e a percepção das trabalhadoras quanto à importância do programa de ginástica laboral.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Este estudo descritivo do tipo estudo de caso foi aprovado pelo Comitê de Ética para Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC (Processo nº 032/2008). Participaram 20 trabalhadoras de uma empresa privada de prestação de serviços de Florianópolis, SC, Brasil, com 28,9 ± 10,2 anos de idade. A escolha das participantes foi não-probabilística intencional por voluntariado, tendo como critérios de inclusão: a utilização do UNI fornecido pela empresa e a participação no programa de GL a pelo menos um mês.
A coleta de dados ocorreu em uma sala da empresa a 22,8 ± 0,4 ºC. Participavam do programa de GL 40 trabalhadoras (22 vestiam UNI durante o trabalho), a GL ocorria simultaneamente com as atividades desenvolvidas em dois setores: refeitório e agendamento, ambos climatizados.
O programa de GL era desenvolvido há cinco anos e três vezes por semana nessa empresa; utilizavam-se técnicas de alongamento, fortalecimento muscular, massagem, entre outros; com música e diferentes materiais; produziam-se reportagens semanais sobre saúde; avaliações físicas anuais; orientações posturais e trekking uma vez ao ano.
Os instrumentos de medidas utilizados foram: câmera fotográfica Samsung® S85, com resolução de 8.2 mega pixels, posicionada perpendicularmente a 2,5 m de distância das avaliadas, fixada em um tripé a 91,5 cm e 47 cm de altura (posição corporal em pé e sentada, respectivamente), e para a análise das imagens (ADM), utilizou-se o Software CorelDraw® 9.0; banco de Wells para realizar o teste de sentar e alcançar; questionário contendo informações sobre: 1) dados de identificação, 2) percepção das trabalhadoras quanto às características do vestuário, 3) satisfação e importância do programa de GL; e entrevista estruturada para verificar a dificuldade em realizar os EF e o conforto do vestuário (parte superior e inferior da roupa e calçado). O questionário e a entrevista estruturada obtiveram índice de validade de 93 e 92% e clareza de 94 e 91%, respectivamente.
Após as trabalhadoras concordarem em participar da pesquisa, assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, e no dia agendado, dirigiram-se a uma sala da empresa, uniformizadas (calça e colete de poliéster - tecido sintético - e camisa fornecida ou recomendada pela empresa) para a coleta de dados. Com UNI, as trabalhadoras usaram o calçado que estavam habituadas a trabalhar (salto do tipo anabela com 1 cm na parte anterior e 4 cm na posterior), como o uso do calçado fornecido pela empresa não era obrigatório, foram utilizados diferentes calçados. As alturas dos solados dos calçados, na parte anterior, variaram de 1 a 5,5 cm com UNI e com vestuário para a prática de exercícios físicos (VEF) de 0 a 2,0 cm, sendo que, na parte posterior dos calçados, a variação foi de 0 a 8,5 cm e 0 a 4,0 cm, respectivamente. Portanto, as diferenças entre as alturas anterior e posterior dos calçados tanto com UNI como com VEF variaram de 0 a 4,0 cm. Foi recomendado às trabalhadoras que retiravam os calçados rotineiramente durante a GL, que o fizessem na coleta, e que trouxessem um VEF (uma calça com tecido flexível e justa ao corpo, camiseta sem manga, meia e tênis).
Primeiramente, as trabalhadoras responderam o questionário, e logo após, receberam as explicações sobre os procedimentos da coleta de dados: 1) marcação dos pontos anatômicos - devido aos resultados do estudo piloto do presente estudo, adotou-se a marcação dos pontos anatômicos modificados com UNI, na qual os pontos anatômicos (acrômio, epicôndilo lateral do úmero, trocânter maior, epicôndilo lateral do fêmur, maléolo lateral e cabeça do 2º metatarso) eram marcados no hemicorpo direito sobre o UNI, por meio de palpação na postura de ADM máxima; com VEF os pontos anatômicos foram marcados e não eram modificados após os EF; 2) captura das imagens - a trabalhadora deveria permanecer na posição estática até a captura de três fotografias consecutivas em cada EF na ADM máxima.
As trabalhadoras realizaram sete EF (Figura 1), intercalando membros inferiores e superiores, primeiramente, com UNI e depois com VEF. Após cada EF, as trabalhadoras respondiam duas perguntas sobre dificuldade em realizar o EF e o conforto do vestuário.
No teste de sentar e alcançar, as trabalhadoras realizaram três tentativas, com intervalo de 20 segundos e selecionou-se a fotografia correspondente ao maior valor no teste para realizar as análises angulares. Foram utilizados a estatística descritiva, teste t pareado, Qui-quadrado e Exato de Fisher, p < 0,05.
RESULTADOS
A maioria das trabalhadoras percebeu as interferências do UNI, pois 13 sentiram limitação do movimento ao realizarem a GL, algumas realizavam os EF com cautela para não mostrar alguma parte do corpo (7) e retiravam peças do UNI (17) para realizarem a GL. Apesar da maioria (19) ter percebido, na posição fundamental, o tamanho do UNI como adequado, as regiões das coxas/axilas e ombros foram as partes do corpo que mais apertavam as trabalhadoras durante a GL.
Na Tabela 1, estão dispostos os valores das ADM nos sete EF analisados, nos quais foram avaliadas as articulações do ombro, quadril e tornozelo.
Os resultados mostram que houve diferença significativa entre as ADM nos EF: flexão do quadril (p = 0,017), flexão do ombro (p = 0,0075), flexão do tronco (quadril e tornozelo), flexão do tronco modificado (tornozelo), teste de sentar e alcançar 160 ADM (angulares e lineares), verificou-se que (quadril e valores lineares - p < 0,001); sendo que 78% apresentaram valores inferiores com UNI que com UNI as ADM foram significativamente me-com VEF, mostrando a interferência do UNI na nores do que com VEF. ADM nos EF realizados.
A maior parte (44,4%) das diferenças das médias dos valores angulares variou de 0º a 5º e dos valores lineares de 0 a 5,0 cm. Após a análise das 160 ADM (angulares e lineares), verificou-se que 78% apresentaram valores inferiores com UNI que com VEF, mostrando a interferência do UNI na ADM nos EF realizados.
Os desempenhos físicos das trabalhadoras, utilizando os dois vestuários ao realizarem os cinco EF, estão apresentados na Tabela 2.
Não existiu diferença significativa entre o uso do vestuário e o desempenho da ADM para os EF: extensão do ombro, flexão do quadril e teste de sentar e alcançar, pois os dados comportaram-se de maneira semelhante nas duas situações (Tabela 2), havendo diferença significativa (p = 0,001) no desempenho da flexão dorsal do tornozelo no EF de flexão do tronco.
As trabalhadoras perceberam dificuldade significativamente maior apenas ao realizarem a flexão do quadril com UNI, quando comparado com o VEF (p = 0,003), não havendo diferença significativa nos demais EF.
A parte superior do vestuário (UNI) interferiu na limitação do movimento e conforto tanto nos EF para os membros inferiores como para os membros superiores (flexão, extensão e adução horizontal do ombro, flexão do tronco, flexão do tronco modificado e teste de sentar e alcançar) (p < 0,05). Já a parte inferior do vestuário causava desconforto nos EF que envolviam os membros inferiores (flexão do quadril, flexão do tronco, flexão do tronco modificado e teste de sentar e alcançar) (p < 0,05), entretanto, o desconforto do calçado foi percebido apenas no EF de flexão de tronco modificado (p = 0,047).
Constatou-se que não houve associação (teste Exato de Fisher) do desempenho com o conforto ao realizar os EF: extensão de ombro (p = 0,351), flexão do quadril (p = 0,524) e flexão dorsal do tornozelo no EF de flexão do tronco (p = 0,116).
Todas as trabalhadoras estavam satisfeitas com o programa de GL e classificaram-no como importante, citando que o programa é uma maneira de melhorar a saúde, a postura, promover a prática de EF, combater o sedentarismo, evitar doenças ocupacionais e aumentar a disposição para o trabalho.
DISCUSSÃO
As trabalhadoras perceberam interferência negativa do UNI durante a GL, pois 13/20 sentiam limitação do movimento e todas justificaram que o tecido do uniforme não possuía elasticidade. A limitação do movimento poderia estar relacionada com os EF prescritos e/ou com o conforto percebido em relação ao vestuário, pois no estudo de Martins13, ao verificar a usabilidade e o conforto de dois UNI, realizando diferentes tarefas, inclusive alongamentos, foi constatado que os tecidos destinados à confecção de UNI devem ser menos sintéticos, proporcionando maior mobilidade ao usuário e com acabamentos de materiais maleáveis.
A percepção da limitação do movimento pelas trabalhadoras contrapõe um dos objetivos do EF mais aplicado na GL1,3,5-7, o alongamento, que tem a função de aumentar a ADM14,15. Apesar disso, apenas uma trabalhadora deixou de participar da GL devido à roupa que estava vestindo, o mesmo foi confirmado em outro estudo8, no qual o vestuário não foi citado como causador da não-adesão ao programa.
A prescrição dos EF na GL deve respeitar o vestuário utilizado pelos trabalhadores10, mas faltam informações para orientarem os profissionais de Educação Física a promoverem conforto e aumento da ADM na GL, como a retirada de peças do vestuário. Maciel et al.9 mencionam que a prática de EF com roupa de trabalho é muito desconfortável, principalmente, em um país tropical e também, para aqueles trabalhadores que não utilizam uniformes de trabalho ou não efetuam troca de roupas para trabalhar. No presente estudo, a GL era praticada em ambientes climatizados, com o objetivo de prevenir a sudorese e o desconforto dos trabalhadores.
Verificou-se que das dez ADM analisadas, sete foram significativamente menores com UNI do que com VEF e a maior parte das diferenças entre os valores angulares variou de 0 a 5º e os lineares de 0 a 5 cm. Observou-se uma carência de estudos quan-titativos que abordem a limitação do movimento devido ao vestuário na prática da GL, sendo que se encontrou apenas estudos qualitativos8,9.
No presente estudo, os valores do teste de sentar e alcançar foram de 21,2 ± 11,7 cm com UNI e 24,7 ± 11,4 cm com VEF, sendo que houve diferença significativa (p < 0,001) entre os valores angulares do quadril e lineares do teste com os dois vestuários (Tabela 1). Santos e Moro16 verificaram valores semelhantes (24,5 ± 7,25 cm no pré-teste e 25,53 ± 7,99 cm no pós-teste) nesse teste com 16 trabalhadores submetidos a um programa de GL, todavia, os trabalhadores estavam de sunga ou maiô. Em outro estudo , com 26 servidores públicos, os valores do teste foram de 24,21 ± 9,49 cm no pré-teste e 26,24 ± 9,36 cm no pós-teste, não sendo mencionado o vestuário utilizado pelos trabalhadores.
Apesar de haver diferença significativa entre os valores do teste de sentar e alcançar, não houve diferença entre as duas classificações (agrupadas) no desempenho das trabalhadoras com os dois vestuários. Por esse motivo, torna-se necessária a avaliação de um número maior de indivíduos para possibilitar a análise estatística nas cinco classificações do teste de sentar e alcançar, e assim, verificar se o UNI não interfere no desempenho do avaliado.
Os diferentes tipos de calçados utilizados podem ter influenciado no desempenho da flexão dorsal do tornozelo no EF de flexão do tronco. Segundo Sacco et al.17, o salto alto exige alterações posturais a fim de manter o equilíbrio postural ocasionado pelo deslocamento do centro de gravidade para frente, colocando o corpo sob condições não-fisiológicas, alterando a função das articulações, gerando forças e torques acima dos normais. Para Santos et al.18, a altura do salto do calçado é diretamente proporcional à intensidade das alterações biomecânicas.
No estudo atual, ocorreram alterações angulares no tornozelo, nos EF de flexão do tronco e flexão do tronco modificado, o que é explicado por Ebbeling et al.19, pois o uso de salto gera desequilíbrio muscular, o que afeta o funcionamento de toda a cadeia cinética do membro inferior, principalmente, dos tornozelos, pelo aumento da flexão plantar. As alturas dos saltos com UNI e VEF variaram de 0 a 4 cm, não ultrapassando a altura (5 cm) do calçado feminino recomendada para manter o conforto e reduzir os riscos de lesões19.
As trabalhadoras perceberam dificuldade significativamente maior ao realizarem a flexão do quadril com UNI do que com VEF, pois a calça apertava (6) e havia dificuldade em manterem-se equilibradas (3), já que este EF é realizado sobre o apoio de apenas um pé no solo.
Uma trabalhadora ao realizar os EF descalça (UNI) percebeu desconforto no calcanhar apenas na flexão do tronco modificado, pois parte da massa corporal estava apoiada sobre o calcanhar do membro inferior anteriorizado.
No estudo atual, todas as trabalhadoras mostraram-se satisfeitas com o programa de GL. Resultado semelhante ocorreu no estudo de Trujillo e Zeng6, que apesar dos alongamentos serem demonstrados por um software (Stop and Strech) na tela do microcomputador (micro-pausas), a cada 60 minutos, 94,7% dos trabalhadores estavam satisfeitos com o uso desse recurso visual.
O programa de GL foi percebido por todas as trabalhadoras como importante para a saúde, da mesma maneira, alguns estudos confirmam os seus benefícios7,20, no entanto, outros questionam a sua efetividade9,21,22, sugerindo a realização de estudos com amostras representativas e delineamentos mais robustos para constatação dos referidos benefícios, como o aumento da ADM.
Holmström e Ahlborg5 constataram que exercícios de aquecimento de curta duração pela manhã, podem ser eficientes para aumentar ou manter a ADM e aumentar a resistência dos músculos das costas dos trabalhadores que realizem funções manuais e adotem posturas extremas durante o trabalho. Em contrapartida, os mesmos autores citam as limitações do estudo: design não-randomizado, dificuldade dos trabalhadores participarem do estudo e examinadores não cegos em relação aos grupos experimentais. Já os resultados do estudo de Paiva Neto et al.23, possibilitam afirmar que a GL pode contribuir para a manutenção da ADM, que está diretamente relacionado com a duração e a frequência das sessões, pois os trabalhadores participavam do programa, há 9 anos, com cinco sessões semanais. Ao realizarem uma revisão sistemática, Coury, Moreira e Dias22 concluíram que os estudos sobre GL com alta qualidade metodológica e resultados efetivos foram aqueles em que o tempo de aplicação do protocolo era igual ou superior a dez semanas.
A não-padronização do vestuário usado em empresas pode ter efeitos negativos no programa de GL, pois segundo Maciel et al.9, só o fato dos trabalhadores exercitarem-se na frente de seus colegas e chefes já está associado a desconfortos. Todavia, as autoras não citam as condições que poderão proporcionar conforto aos trabalhadores, como a postura profissional e a maneira como as sessões de GL são conduzidas (seleção dos exercícios e orientações com relação às roupas utilizadas pelas trabalhadoras - saias, vestidos e blusas decotadas), além de generalizarem que o relacionamento entre os trabalhadores, na sua maioria, é ruim. Por outro lado, no presente estudo, as trabalhadoras mencionaram estarem satisfeitas com o programa, pois sentiam-se à vontade com a profissional de GL e com as colegas de trabalho durante as sessões.
Para Devide24, no momento da implantação da GL, os diferentes fatores motivacionais que levam à prática de EF devem ser estudados, pois o que pode satisfazer uma pessoa pode desconfortar outras. De acordo com Soares, Assunção e Lima25, uma das explicações para a baixa adesão à GL pode ser a falta de orientação e acompanhamento dos instrutores ao programa e a emulação social entre o instrutor e trabalhadores.
Com base nestas afirmações, talvez a prática de GL por trabalhadores que utilizem uniformes seja mais apropriada, pois caso contrário, cada trabalhador adotará um vestuário diferente, o que poderia limitar ainda mais a prescrição dos EF na GL.
CONCLUSÃO
O uniforme interferiu negativamente na amplitude de movimento e na percepção de conforto das trabalhadoras ao realizarem sete exercícios físicos, durante a ginástica laboral, mas não influenciou no desempenho dos exercícios físicos e mesmo as trabalhadoras percebendo a limitação do movimento devido ao uniforme, estavam satisfeitas com o programa, e não consideraram o vestuário um empecilho para a prática.
Os resultados deste estudo podem contribuir para orientar: os profissionais de Educação Física quanto à prescrição dos exercícios físicos na ginástica laboral em relação ao vestuário utilizado pelos trabalhadores; as empresas que desenvolvem ou desejam implantar programa de ginástica laboral, em relação à aquisição de uniformes confeccionados com tecidos que proporcionem mobilidade articular e sejam confortáveis ou a adoção de normas quanto ao vestuário utilizado pelos trabalhadores na empresa; e por último, as empresas que confeccionam uniformes, no sentido de adaptarem-se às novas culturas empresariais e rotinas laborais, visando proporcionar maior conforto aos trabalhadores durante a ginástica laboral.
Recebido em 18/01/10
Revisado em 25/05/10
Aprovado em 11/06/10
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
27 Fev 2012 -
Data do Fascículo
Dez 2010
Histórico
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Revisado
25 Maio 2010 -
Recebido
18 Jan 2010 -
Aceito
11 Jun 2010