RESUMO
O estudo objetivou analisar os grupos de pesquisa em Pedagogia do Esporte no Brasil, suas linhas de pesquisa e temas abordados, além de características relacionadas à sua origem. A busca foi realizada no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq a partir do termo Pedagogia do Esporte. Foram identificados 49 grupos, com predominância nas regiões Sudeste e Sul e majoritariamente vinculados a universidades públicas. Desde o final dos anos 2000, observa-se um aumento no número de grupos. 127 linhas de pesquisa foram classificadas de acordo com o Modelo Bioecológico do Comitê Olímpico do Brasil, sendo a classificação Treinadores a mais frequente. Identificou-se uma variedade de temas, o que indica a amplitude da área em estudo.
Palavras-chave:
Pedagogia; Esporte; Grupo de pesquisa; Treinadores
ABSTRACT
The study aimed to analyze research groups in Sport Pedagogy in Brazil, their lines of research and topics covered, as well as characteristics related to their origin. The search was conducted in the CNPq Research Groups Directory using the term Sports Pedagogy. 49 groups were identified, predominantly in the Southeast and South regions and mostly linked to public universities. Since the end of the 2000s, there has been an increase in the number of groups. 127 lines of research were classified according to the Bioecological Model proposed by the Brazilian Olympic Committee, with the Coaches classification being the most frequent. A variety of topics were identified, which indicates the breadth of the area under study.
Keywords:
Pedagogy; Sports; Research group; Coaches
RESUMEN
El estudio tuvo como objetivo analizar los grupos de investigación en Pedagogía del Deporte en Brasil, sus líneas y temas de investigación, así como las características relacionadas a su origen. La búsqueda se realizó en el Directorio de Grupos de Investigación del CNPq utilizando el término Pedagogía del Deporte. Fueron identificados 49 grupos, sobre todo en las regiones Sudeste y Sur y en su mayoría vinculados a universidades públicas. Desde finales de los años 2000 se observa un aumento en el número de grupos. 127 líneas de investigación fueron clasificadas según el Modelo Bioecologico del Comité Olímpico de Brasil, siendo la clasificación de Entrenadores la más frecuente. Hay una variedad de temas, lo que indica la amplitud del área bajo estudio.
Palabras clave:
Pedagogía; Deporte; Grupo de investigación; Entrenadores
INTRODUÇÃO
O esporte, ao longo do século XX, experimentou uma notável evolução que transcendeu barreiras outrora inimagináveis (Reverdito et al., 2009), mantendo-se como um dos fenômenos mais marcantes do século XXI (Galatti et al., 2014). No âmbito esportivo, um vasto conjunto de pesquisas acadêmicas abrange diversos tópicos, como treinamento (Vidal, 2022), aquisição de habilidades motoras (Antunes et al., 2022), educação (Ghidetti, 2020) e outros. Segundo Barroso e Darido (2009), o esporte, como componente curricular da Educação Física e devido a sua intensa presença na sociedade, requer uma abordagem pedagógica adequada. Sob essa perspectiva, a Pedagogia do Esporte, enquanto parte das Ciências do Esporte, emergiu como resultado do crescente interesse da sociedade pelas atividades esportivas (Reverdito et al., 2009). Ela desempenha um papel de relevância ímpar como uma das disciplinas que se dedicam ao estudo do esporte, uma vez que aborda a questão ensino-aprendizagem relacionada às práticas esportivas (Galatti et al., 2014).
Com a influência das ciências humanas, os processos educativos no ensino e aprendizagem de esportes passaram a ser contemplados, resultando em um campo de estudo prolífico (Rufino e Darido, 2011). Segundo Tani (2014), a Educação Física e as Ciências do Esporte no Brasil já ultrapassaram uma etapa fundamental do processo para a construção de bases de conhecimento científico, que consiste na criação de uma cultura acadêmica voltada à publicação, a qual foi impulsionada de forma marcante pelas exigências dos programas de pós-graduação. Contudo, apesar do fato de que o cenário da pesquisa tenha sido simplificado devido à disponibilidade rápida de diversas fontes de informação (Araújo, 2008), um estudo realizado por Rufino e Darido (2011) afirma que a Pedagogia do Esporte ainda era um tema escasso de publicações em periódicos nacionais até o início do século XXI.
Diversos autores conceituam a Pedagogia do Esporte e o que ela abrange. De acordo com Rufino e Darido (2011), a Pedagogia do Esporte engloba não apenas as abordagens sobre como ensinar os esportes, mas também os motivos subjacentes à sua instrução, abarcando suas múltiplas formas de manifestação. Para Costa et al. (2019), a Pedagogia do Esporte tem o objetivo de propor, planejar, organizar, sistematizar, executar, transformar e avaliar processos pedagógicos, associados à prática esportiva, compreendendo o ser humano na integralidade de seu desenvolvimento. Já para Galatti et al. (2014) a Pedagogia do Esporte tem como objeto de estudo e intervenção do processo de ensino, vivência, aprendizagem e treinamento do esporte.
Estudos conduzidos nas últimas décadas, por pesquisadores como Rufino e Darido (2011) e Costa et al. (2019), revelaram as áreas de maior foco dentro do campo da Pedagogia do Esporte. Rufino e Darido (2011) identificaram os Jogos Esportivos Coletivos como a temática mais estudada em artigos publicados em periódicos nacionais associados à Educação Física, com 27% de frequência dentre os estudos analisados. Por sua vez, Iniciação Esportiva/Especialização Precoce, representaram 13% das pesquisas analisadas, destacando a relevância dada ao processo de desenvolvimento esportivo desde idades iniciais. Posteriormente, os achados do estudo de Costa et al. (2019) evidenciaram Metodologias de Ensino como a temática mais discutida e recorrente em periódicos brasileiros, sugerindo a importância de abordagens pedagógicas eficazes na formação esportiva.
No ano de 2016 foi realizada a primeira edição do Congresso Internacional de Pedagogia do Esporte (CONIPE) em Campinas, São Paulo. Na primeira edição, que ocorreu em junho de 2016, foram apresentados 83 estudos científicos. Já na segunda edição, que teve lugar em junho de 2018, houve um notável aumento no número de contribuições, totalizando 265 trabalhos, que englobavam tanto estudos científicos quanto relatos de experiência (Galatti et al., 2018). Conquanto, em 2022 foi realizada outra edição, envolvendo a apresentação de 189 trabalhos, os quais se distribuíram em 95 resumos científicos, 62 relatos de experiência e 32 simpósios temáticos (Galatti et al., 2022). Verifica-se, assim, um crescimento progressivo nas atividades da área ao longo dos anos, mesmo que sejam notáveis as lacunas decorrentes do período pós-pandêmico no desenvolvimento de pesquisas.
Grande parte da atividade científica no Brasil é produzida por grupos de pesquisa, estes sendo pilares essenciais para o avanço do conhecimento em diversas áreas. Definidos pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) como “um conjunto de indivíduos organizados hierarquicamente por experiência, no qual existe envolvimento profissional e permanente com atividades de pesquisa, reunidos em torno de uma temática comum e que, para desenvolver suas pesquisas, compartilham de equipamento, local e conhecimento”. De acordo com o 11º Censo do Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil (DGP) (Brasil, 2016), existem mais de 37 mil grupos de pesquisa no país, estes podendo ser identificados no site do DGP.
Pesquisas com a finalidade de fornecer informações sobre os grupos de pesquisa têm sido conduzidas em campos diversos, como atividade física e saúde (Santos et al., 2012), psicologia do esporte (Vilarino et al., 2017), gestão do lazer (Tavares et al., 2009) e gestão do esporte (Lemes et al., 2017). Essas pesquisas proporcionam o reconhecimento dos principais grupos, áreas de pesquisa proeminentes e principais temas abordados, promovendo a identificação de tendências, avanços e lacunas das diferentes áreas do conhecimento. No ramo da Pedagogia do Esporte não foram produzidos estudos que abordem as características dos grupos de pesquisa no Brasil.
Considerando o número crescente de publicações e a importância dessa área dentro das Ciências do Esporte, o presente estudo tem como objetivo analisar os grupos de pesquisa em Pedagogia do Esporte registrados no CNPq e identificar as principais linhas de pesquisa e temas explorados, bem como a distribuição espacial dos grupos no país. Essas informações podem auxiliar no desenvolvimento de parcerias científicas e práticas entre os diferentes grupos.
MÉTODO
O presente estudo se trata de um estudo documental, a qual se caracteriza por envolver análise de diferentes fontes e materiais, os quais não receberam qualquer tipo de tratamento analítico (Kripka et al., 2015). A pesquisa foi realizada com base em dados oriundos do Diretório de Grupos de Pesquisa no Brasil do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Como estratégia de busca, foi utilizado o termo “Pedagogia do Esporte”, sendo considerada a presença do termo nos seguintes campos: “Nome do grupo”, “Nome da linha de pesquisa” e “Palavra-chave da linha de pesquisa”. Realizada a busca, foram identificados 49 grupos de pesquisa, os quais foram selecionados para a análise de acordo com os critérios estabelecidos e anteriormente apresentados. Na sequência, foram consultados os espelhos (páginas do diretório) de cada um dos grupos e coletados os seguintes dados: 1) Nome do grupo; 2) Tipo de instituição de ensino superior (pública ou privada); 3) Nome da instituição; 4) Ano de fundação do grupo; 5) Nome dos líderes do grupo; 6) Unidade Federativa; 7) Linhas de pesquisa; 8) Temas predominantes. As informações foram tabuladas com o auxílio do software Microsoft Excel.
Inicialmente, foram identificadas informações que justificassem a presença dos grupos no diretório, assim como, do termo “Pedagogia do Esporte” no nome do grupo, no nome de linha de pesquisa ou nas palavras-chaves cadastradas para descrever uma (ou mais) das linhas de pesquisa. A primeira busca revelou 98 linhas de pesquisa com presença do termo no título ou nas palavras-chave. As demais (43) linhas de pesquisa dos grupos encontrados foram analisadas de forma independente por três pesquisadores, a fim de se verificar a existência de relação com a área da Pedagogia do Esporte. Para esta análise, foram considerados aspectos que, de alguma forma, tangenciavam, diretamente ou indiretamente, o processo de ensino-aprendizagem-treinamento no esporte, tanto nos níveis micro, meso ou macro do Modelo Bioecológico de Desenvolvimento de Atletas, proposto pelo Comitê Olímpico Brasileiro (COB, 2022; ver Figura 1).
O modelo consiste em apresentar o atleta como centro do processo, rodeado por elementos que podem influenciar o seu desenvolvimento. Estes elementos estão distribuídos em três níveis: o Micro Nível, mais próximo do indivíduo (Treinadores, Equipe Interdisciplinar etc.); o Meso Nível (Estrutura de Treino, Clubes, Confederações etc.); e o Macro Nível, mais distante do atleta (Características Culturais, Políticas, Ambientais etc.).
Levando-se em consideração o modelo apresentado e analisando o nome e a descrição da linha de pesquisa, identificou-se que 29 dessas 43 não incluídas na primeira etapa se relacionavam à Pedagogia do Esporte, contabilizando um total de 127 linhas de pesquisa para as análises subsequentes (ver Figura 2).
Fluxograma de busca e seleção das linhas de pesquisa analisadas. Fonte: Elaborado pelos autores.
Com o número total de linhas de pesquisa selecionadas, foram identificados os grupos de pesquisa nos quais havia predominância de linhas na área da Pedagogia do Esporte (n > 50%). Para os grupos que não atingiram este limiar, foi realizada uma análise a fim de identificar quais as áreas ou temas de aderência predominantes, a fim de se conhecer as diferentes possibilidades de intersecções entre estas áreas (ou temas) e a Pedagogia do Esporte.
Por fim, as linhas de pesquisa foram classificadas com base no Modelo Bioecológico de Desenvolvimento de Atletas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Caracterização geral dos grupos de pesquisa
Em relação à fundação dos grupos, identificou-se que o primeiro é datado de 1984. Dentre todos os grupos, 46 (93,8%) fazem parte de universidades públicas, revelando que grande parte da pesquisa na área da Pedagogia do Esporte é produzida nestas instituições. Este resultado corrobora com os apresentados por Massi e Queiroz (2015), que identificaram a predominância das universidades públicas na condução de trabalhos de iniciação científica no país, os quais são realizados majoritariamente no âmbito de grupos de pesquisa. No âmbito da iniciação científica, 77% do trabalho produzido é realizado em universidades públicas, enquanto 23% são produzidos em universidades privadas (Massi e Queiroz, 2015).
Mesmo que o primeiro grupo registrado tenha sido em 1984, verifica-se um maior crescimento no número de grupos de pesquisa no final da década de 2000 e início da década de 2010 (Figura 3). Esse aumento pode estar relacionado à fase da expansão universitária, que abrangeu o período de 2003 a 2006 (Vinhais, 2013). Durante esse intervalo, houve uma notável ampliação na disponibilidade de cursos e vagas universitárias, incluindo a criação de novas universidades federais e o estabelecimento e fortalecimento de campi universitários em instituições já existentes, o que gerou um aumento no número de pessoal docente nas universidades públicas pelo país.
Evolução no número de grupos de pesquisa ao longo do tempo. Fonte: Elaborado pelos autores.
Como descrito anteriormente, os grupos foram selecionados a partir de três possibilidades, sendo: existência do termo “Pedagogia do Esporte” no nome do grupo (17; 34,7%); existência do termo “Pedagogia do Esporte” em pelo menos uma linha de pesquisa (14; 28,6%); utilização do termo “Pedagogia do Esporte” como palavra-chave em uma das linhas de pesquisa (18; 36,7%). Considerada uma área abrangente e diversificada, a Pedagogia do Esporte reflete a complexidade e pluralidade do esporte e da prática pedagógica (Rufino e Darido, 2011). Essa amplitude e interdisciplinaridade da área dificultam a categorização clara de pesquisas específicas sob esse título, devido à diversidade de modalidades, públicos-alvo e objetivos educacionais que a Pedagogia do Esporte aborda. Por conseguinte, a dificuldade em encontrar linhas de pesquisa explicitamente designadas como pertencentes à área da Pedagogia do Esporte reside na natureza extensiva e multidisciplinar dessa ciência.
Quanto à distribuição geográfica dos grupos, verificou-se uma diversificação, visto que todas as regiões do Brasil possuem, no mínimo, quatro grupos. As regiões Sudeste e Sul apresentam grande relevância, posto que 31 (63,2%) dos 49 grupos estão localizados em universidades destas regiões. O Sudeste lidera o número de grupos cadastrados com 17 (34,7%). Já a região sul vem em seguida com 14 (28,5%) grupos. O Nordeste possui oito (16,3%) grupos cadastrados, o Centro-Oeste cinco (10,2%) e o Norte quatro (8,1%). Uma das instituições cadastradas é uma universidade de Ensino à Distância (EAD). Essa conjuntura reflete a influência que as Instituições de Ensino Superior (IES) possuem no que diz respeito à produção científica e à formação de grupos de pesquisa.
De acordo com o Censo da Educação Superior de 2022, mais de 57% das IES do Brasil estão localizadas nas regiões Sudeste e Sul. Destas, 42% estão no Sudeste e apenas 15% no Sul. Do total, aproximadamente 24% estão no Nordeste, enquanto o restante está distribuído entre as regiões Norte e Centro-Oeste. Apesar do Nordeste possuir uma grande quantidade de IES em termos absolutos, a região Sudeste se destaca pela predominância de grupos de pesquisa, o que pode ser atribuído à maior concentração de doutores na região em comparação com o Nordeste, além da maior concentração de cursos de mestrado e doutorado da Área 21 – na qual a Educação Física está contemplada – nas regiões Sul e Sudeste (Santos et al., 2012). Os resultados expressam a assimetria na produção científica nacional quando relacionada às regiões geográficas, revelando a sua persistente centralização nos polos onde há maior investimento.
Características temáticas dos grupos e suas linhas de pesquisa
Dos 49 grupos encontrados na pesquisa, 32 (65,3%) deles são considerados específicos (com ao menos 50% das linhas de pesquisa dentro do escopo da Pedagogia do Esporte) e 17 (34,7%) são grupos caracterizados como não específicos. Destes grupos não específicos, foi possível observar que as áreas ou temas de aderência predominantes com maior recorrência são: a) Gênero, como evidenciado no Grupo de Estudo das Pedagogias do Corpo e da Sexualidade (GEPECOS/UEM), o qual articula suas pesquisas em três eixos temáticos – artivismo e educação, pedagogias do corpo e poéticas animalistas; b) Saúde, a exemplo do Grupo de Pesquisas em Educação Física Escolar e Saúde (GPEFES/UFGD), o qual, além da Pedagogia do Esporte no contexto da Educação Física escolar, possui linhas relacionadas à qualidade de vida, à violência e ao bullying; e c) Psicologia, exemplificado pelo Grupo de Estudos de Psicologia do Esporte e Desempenho Humano (UEM), o qual associa aspectos psicopedagógicos, psicossociais e comportamentais ao desempenho humano e, mais especificamente, ao esporte.
A análise das linhas de pesquisa foi realizada com base no Modelo Bioecológico de Desenvolvimento de Atletas, do COB (2022), por meio da classificação das 127 linhas de pesquisa nos 4 níveis do modelo. Foram identificadas 12 linhas de pesquisa referentes ao nível central, respectivo ao Atleta. No Micro Nível, foram classificadas 58 linhas de pesquisa - nível composto por Treinadores, Pares, Familiares e Equipe Interdisciplinar. Já no Meso Nível, que inclui Confederações, Equipes/Clubes, Oportunidades e suporte, Competições e Estrutura de treino, foram classificadas 5 linhas de pesquisa. Por fim, 17 linhas foram identificadas como referentes ao Macro Nível, que diz respeito às Características Políticas, Ambientais, Econômicas e Culturais, ligadas ao desenvolvimento de atletas.
A temática Esporte Educacional foi identificada em 16 linhas de pesquisa, porém o modelo proposto pelo COB não apresenta tal classificação. Sendo assim, após análise, considerou-se pertinente a inclusão da mesma nos resultados do estudo. Por fim, foi possível observar uma grande quantidade de linhas de pesquisa que abrangem a Pedagogia do Esporte de forma ampla e sem determinar sua especificidade dentro da temática, sendo essas (19 linhas) incluídas em uma nova categoria, nomeada Genérica (ver Tabela 1).
Distribuição das linhas de pesquisa nos níveis e categorias do Modelo Bioecológico de Desenvolvimento de Atletas.
Na categoria de linhas de pesquisa Treinadores, encontram-se linhas relativas a metodologias de ensino-aprendizagem-treinamento esportivo. Neste grupo encaixam-se linhas de pesquisa que utilizam os termos metodologias, ensino, treinamento e aprendizagem do esporte. Um exemplo de descrição deste grupo de linha de pesquisa é a descrição da linha de pesquisa “Pedagogia do Treinamento Desportivo” do Grupo de Pesquisa Laboratório Aplicado em Estudos de Educação Física, Esporte e Lazer (LaEL).
Esta linha tem como objetivo a discussão sobre métodos e técnicas do treinamento voltado para o esporte de rendimento. Pretende-se o desenvolvimento de reflexões sobre tática de jogo, comportamento motor, ações de jogo, aperfeiçoamento de fundamentos da prática esportiva.
A ênfase nas pesquisas relacionadas às metodologias de ensino e seus correlatos decorre, em certa medida, da caracterização da Pedagogia do Esporte como um domínio dedicado à análise sistemática dos processos de ensino-aprendizagem no ambiente esportivo (Rufino e Darido, 2011). Tal como evidenciado em pesquisas prévias, a predominância de temáticas relacionadas à área pode gerar equívocos ao sugerir que a Pedagogia do Esporte se limita à discussão exclusiva das metodologias de ensino, dando a entender que outros aspectos do processo de ensino-aprendizagem-treinamento no contexto esportivo não são abordados (Costa et al., 2019), ainda que os resultados apresentem maior regularidade entre a predominância das temáticas ao compará-los a outras análises de produção científica.
Ainda no grupo de linhas de pesquisa denominado Treinadores, também se situam linhas de pesquisa que tratam da formação e desenvolvimento de treinadores, professores e profissionais da Educação Física. Como exemplo pode-se citar a descrição da linha de pesquisa “Desenvolvimento e atuação profissional de treinadores esportivos” do Núcleo de Pesquisa de Pedagogia do Esporte (NUPPE).
Investigar a filosofia pessoal e história de vida do treinador. Conhecimentos e competências para a intervenção profissional. Teoria e prática curricular na formação inicial universitária. Estruturação de programas de formação continuada. Perspectiva social da aprendizagem profissional. Autoeficácia pedagógica de treinadores. Crenças e metodologias de ensino dos esportes.
A predominância de linhas de pesquisa que exploram o papel dos treinadores esportivos reflete sua significativa importância dentro da Pedagogia do Esporte, na medida em que o treinador esportivo é encarregado de proporcionar oportunidades de aprendizado para aqueles envolvidos na prática esportiva, tanto para os que buscam participação como para aqueles que almejam alcançar níveis mais avançados de desempenho atlético (Milistetd et al., 2015). Embora Costa et al. (2019) tenham encontrado uma variedade escassa de artigos relacionados à formação profissional, a prevalência de linhas de pesquisa que possuem o treinador como objeto de estudo indica um aumento no interesse por esse tema, sendo esses estudos fundamentais para a Pedagogia do Esporte, na medida em que permitem a compreensão do papel crucial dos treinadores na formação esportiva de atletas nos mais diferentes níveis de prática.
O grupo de linhas de pesquisa Esporte Educacional, único dos grupos que não consta no Modelo Bioecológico antes citado, trata majoritariamente do estudo do tema Pedagogia do Esporte no contexto escolar. Podemos citar como exemplo de descrição destas linhas de pesquisa a linha “Educação Física e desporto Escolar” do Grupo de Pesquisa Pedagogia e Movimento: “Desenvolver estudos e práticas pedagógicas relativas ao ensino e aprendizagem da Educação Física e esportes em nível escolar, e demais aspectos relacionados aos processos de educação e desenvolvimento humano”.
A relevância das práticas esportivas vai além da mera identificação de talentos, abrangendo a integração na cultura esportiva e proporcionando oportunidades para participar, apreciar e se envolver no esporte (Machado et al., 2015). A prevalência do esporte educacional como promotor do desenvolvimento integral dos indivíduos destaca-se nesse contexto. Não se trata apenas do aprimoramento de habilidades físicas, mas de cultivar valores como trabalho em equipe, respeito e disciplina. A Pedagogia do Esporte, portanto, se relaciona com o esporte educacional, para além da perspectiva do rendimento, com a aplicação de princípios pedagógicos no contexto esportivo para o desenvolvimento integral do indivíduo.
A parte central do modelo bioecológico é o Atleta. Este grupo de linhas de pesquisa é considerado um dos mais abrangentes, contando com termos diversos como: ‘talento no esporte’, ‘desenvolvimento pessoal’, ‘aprendizagem motora’ e ‘formação de carreira esportiva”. A categoria pode ser encontrada em diferentes estudos que analisam o processo de ensino-aprendizagem e desenvolvimento integral do indivíduo, possuindo o atleta como seu objeto principal.
Na categoria Equipe Interdisciplinar se situam as linhas de pesquisa de temas como análise de desempenho – sendo esse o mais predominante. Para exemplificar, cita-se a linha intitulada ‘Análise de Desempenho, do Grupo de Pesquisa Laboratório de Pedagogia do Esporte (LAPESP): “Investigar os diversos fatores que incidem sobre o ensino e treino do esporte a partir de controles de carga interna e externa, e avaliação de aprendizagem tática”. Pode-se inferir que a abrangência da Pedagogia do Esporte se estende à sua interconexão com a análise de desempenho, sendo essa aproximação impreterível para que sejam considerados aspectos pedagógicos na realização da análise de desempenho (intencionalidade, sistematização, avaliação e planejamento), com adaptação ao cenário de prática (Shamah et al., 2023). Por conseguinte, a temática da avaliação no contexto esportivo vem ganhando destaque como tema emergente na Pedagogia do Esporte na medida em que deve desempenhar uma função educativa, além de simplesmente caracterizar e comparar jogos ou jogadores (Reverdito et al., 2022).
Por fim, o grupo de linhas de pesquisa Aspectos Culturais possui dois termos como pilares centrais: 1) Mulheres e esporte; e 2) Aspectos socioculturais do esporte. Ambos passaram a ganhar espaço na Pedagogia do Esporte, visto o crescente interesse na ampliação de espaços e oportunidades para diversos grupos sociais, destacando a necessidade de investigar e promover maior inclusão (Reverdito et al., 2022). De acordo com essa conjuntura, pode-se citar como exemplo a linha de pesquisa “Aspectos históricos-socioculturais do Esporte e da Educação Física” do Núcleo de Estudos em Cultura, Corpo e Movimento, que possui o objetivo “Compreender os campos do Esporte e da Educação Física a partir do referencial-teórico histórico-cultural”.
A partir dos resultados obtidos, decorrentes da classificação das diferentes linhas de pesquisa, é possível identificar algumas lacunas. Estas lacunas podem configurar temas inexplorados no âmbito da Pedagogia do Esporte, seja por falta de relação direta com a área em questão, seja pela carência de acadêmicos que transitem nestas intersecções; assim como podem ser apenas resultados da falta de maturidade da pesquisa em um tema, o que não o configuraria enquanto uma linha de pesquisa. Este parece ser o caso das categorias Familiares e Competições, por exemplo, visto que autores como Milan et al. (2024), Bettega et al. (2023) e Santos et al. (2024) possuem estudos que integram questões pedagógicas da formação de atletas ao papel desempenhado por familiares; assim como Leonardo e Scaglia (2018) e Gonçalves et al. (2024), que vêm estudando o papel das competições esportivas no desenvolvimento de diferentes conteúdos pedagógicos e na formação de atletas em diferentes modalidades esportivas.
Por outro lado, quando se trata da pesquisa acerca de entidades de administração do esporte (federações e confederações), assim como entidades de prática (equipes e clubes) e seus respectivos dirigentes, enquanto fatores que podem influenciar o desenvolvimento do atleta, parece existir uma carência de estudos – apesar desta intersecção estar cada vez mais em voga no atual cenário esportivo. Essa carência aqui identificada pode ser explicada pela limitação da busca realizada, exclusivamente com o termo “Pedagogia do Esporte”. Como exemplo desta relação, pode-se citar o próprio Modelo de Desenvolvimento Esportivo do Comitê Olímpico do Brasil (COB, 2022), utilizado como uma das referências para o presente estudo.
O modelo do COB possui uma seção inteiramente dedicada ao “Desenvolvimento de atletas em longo prazo”, oferecendo diretrizes para o desenvolvimento esportivo nos diferentes níveis – desde a iniciação ao alto rendimento, ainda finalizando com o pós-carreira – e contendo orientações tanto a treinadores quanto àqueles envolvidos na gestão dos esportes (dirigentes, clubes, federações e confederações). Ressalta-se ainda que este documento foi desenvolvido, em grande parte, por acadêmicos – muitos deles inseridos em grupos de pesquisa aqui investigados – indicando o potencial do tema para futuras pesquisas acerca de modelos de desenvolvimento esportivo implementados por diferentes entidades de administração de esportes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando os objetivos deste estudo, destaca-se a predominância dos grupos de pesquisa em Pedagogia do Esporte nas regiões Sudeste e Sul, sendo mais da metade dos grupos advindos dessas regiões. É notável também a disparidade entre o número de grupos originados de IES públicas e privadas, com 93,8% desses grupos vinculados a universidades públicas. Destes, 32 dos 49 grupos encontrados foram considerados específicos, ou seja, tratam majoritariamente sobre o tema. Por conseguinte, observa-se um aumento progressivo dos grupos de pesquisa em Pedagogia do Esporte nos últimos anos, o que indica um interesse crescente pela área. Das 127 linhas de pesquisa encontradas, a categoria mais recorrente foi Treinadores, caracterizado principalmente por linhas relacionadas à metodologia de ensino-aprendizagem-treinamento de esportes e formação de treinadores esportivos. Outras classificações também ganharam destaque, como Esporte Educacional, Atleta, Equipe Interdisciplinar e Características Culturais.
A partir da condução deste estudo, que se restringiu à revisão dos grupos de pesquisa em Pedagogia do Esporte, faz-se necessário a promoção de outras pesquisas para alcançar maior profundidade no entendimento do assunto, seja ampliando a busca para além do termo utilizado – incluindo áreas identificadas como de alguma forma relacionadas aos grupos e linhas, a exemplo da psicologia e gestão do esporte –, seja investigando a produção científica dos grupos analisados.
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FINANCIAMENTO
O presente trabalho não contou com apoio financeiro de nenhuma natureza para sua realização.
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