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Quando a educação se torna uma necessidade para além de um direito universal: interface entre campo acadêmico e ação coletiva camponesa na constituição da Educação Diferenciada

When education becomes a necessity beyond a universal right: an interface between the academic field and peasant collective action in the constitution of Differentiated Education

Cuando la educación se convierte en una necesidad, además de un derecho universal: la interfaz entre el ámbito académico y el actuación colectiva campesina para la constitución de la Educación Diferenciada

RESUMO

A educação diferenciada, enquanto movimento político posto em curso por povos e comunidades tradicionais, visa à aquisição da cultura escolar e científica como instrumento para fortalecer o protagonismo étnico-político na luta por direitos. Com um olhar local — a região Transamazônica e Xingu —, abordamos construção social de demandas e propostas de educação diferenciada, pari passu com a trajetória de constituição e mudanças do grupo do movimento social da região, que tem constituído formas de ação coletiva e quadros institucionais representativos do campesinato. Nessa perspectiva, fazendo uso de aportes teórico-metodológicos bourdieusianos, o artigo traz ao debate a relação entre a educação efetivada por políticas de ações afirmativas e as finalidades sociais que ela vem ganhando sobretudo quanto à incorporação daquelas às estratégias de reprodução social do campesinato, ultrapassando o previsto nas políticas públicas.

Palavras-chave:
Educação Diferenciada; Campesinato; Ação Coletiva

ABSTRACT

Differentiated education, as a political movement undertaken by traditional peoples and communities, aims at the acquisition of school and scientific culture as a tool to strengthen ethnic-political protagonism in the struggle for rights. From a local perspective — the Transamazonic and Xingu region —, we address the social construction of demands and proposals for differentiated education, in parallel with the trajectory of constitution and changes within the region's social movement group, which has established forms of collective action and institutional frameworks representative of the peasantry. In this perspective, drawing on Bourdieu's theoretical and methodological contributions, the article brings to the debate the relationship between education as implemented through affirmative action policies and the social purposes that it has been gaining, particularly regarding their incorporation into the strategies of social reproduction of the peasantry, surpassing what is foreseen in public policies.

Keywords:
Differentiated Education; Peasantry; Collective Action

RESUMEN

La educación diferenciada, como movimiento puesto en marcha por los pueblos y comunidades tradicionales, tiene como objetivo la adquisición de la cultura escolar y científica como medio para reforzar el protagonismo étnico-político en la lucha por derechos. Desde una perspectiva local – la región de Transamazónica y Xingu -, acercamos la construcción social de las demandas y propuestas de educación diferenciada, pari passu a la trayectoria de constitución y cambios del grupo del movimiento social de la región, que ha constituido maneras de actuación colectiva y marcos institucionales representativos de los campesinos. Desde esta perspectiva, haciendo uso de las aportaciones teóricas y metodológicas bourdieusianas, el artículo aporta al debate la relación entre la educación efectuada por políticas de acciones afirmativas y las finalidades sociales que ha ido ganando, especialmente cuanto a la incorporación de aquellas a las estrategias de reproducción social de los campesinos, superando lo que se había pensado en las políticas públicas.

Palabras clave:
Educación Diferenciada; Campesinos; Actuación colectiva

INTRODUÇÃO

A existência do campesinato enquanto categoria social vai ao encontro do caráter político de sua trajetória, especialmente no Brasil. Condizentemente com este olhar, Wanderley (1997WANDERLEY, Maria de Nazareth Baudel. Raízes do Campesinato Brasileiro. In: ENCONTRO DE PESQUISA SOBRE A QUESTÃO AGRÁRIA NO TABULEIRO COSTEIRO DE SERGIPE, 2., 1997, Aracaju. Anais […]. Aracaju: EMBRAPA-CPATC, 1997. p. 9-40.) analisa o campesinato como expressão da diversidade político-cultural do mundo rural brasileiro, constituindo-se pelo enfrentamento de situações próprias de história social marcada por instabilidade econômico-política e precariedade estrutural, condição adversa que nutre a construção de uma identidade política contrastiva com os defensores do latifúndio e o autoritarismo do Estado.

Inspirada por esse olhar sobre o campesinato, trazemos à reflexão a trajetória do o grupo do movimento social da região1 1 Neste artigo, utilizo a noção de ação coletiva para me referir ao amplo conjunto de atores e agentes que, na trajetória de lutas pela permanência na terra a partir da colonização agrícola dirigida pelo Estado na década de 1970, têm protagonizado diversas formas de organização social representativa do campesinato na região Transamazônica e Xingu. Ações coletivas compreendem "[…] desde as manifestações elementares da ação de massa […] até aquelas marcadas pela presença de estruturas organizacionais racionalmente concebidas para a consecução de fins" (Azevedo e Prates, 1991, p. 124). Atualmente, na região Transamazônica e Xingu, as ações coletivas camponesas são aglutinadas pela Fundação Viver, Produzir e Preservar (FVPP), constituída por lideranças regionais. (aqui tomado com base em categorização local e autodefinição), o qual se constitui a partir da colonização agrícola da Transamazônica direcionada pelo Estado brasileiro desde a década de 1970, e vem criando seus próprios quadros institucionais, bem como formando agentes identificados com o campesinato e sua ação coletiva. Em meio a essa trajetória, de uma perspectiva histórica, mas com um olhar sociológico, objetivamos trazer ao debate os sentidos, as finalidades e expectativas sociais desse grupo ao demandar e propor formas de educação básica e, sobretudo, superior reconhecidas como diferenciadas, em grande medida se antecipando à institucionalização de políticas públicas de ações afirmativas ao olharmos o contexto local, que passa a apresentar necessidades específicas de escolarização. Enquanto assunto público, a educação diferenciada, especialmente as experiências de ensino superior nas quais situo os cursos Etnodesenvolvimento e Educação do Campo, parece atender à expectativa coletiva de formação de agentes capazes de dar continuidade ao grupo em um espaço social em transformação. Por esse viés, a educação diferenciada assume o papel de estratégia de reprodução social, sendo condição de possiblidade da permanência do campesinato em meio a mudanças internas que respondem a transformações do espaço social no qual o grupo vem se construindo como agente coletivo.

O tema das estratégias de reprodução social, na sociologia de Bourdieu, insere-se em questões alusivas à manutenção da classe, bem como das espécies de capitais que mantêm sua posição, e incide sobre reações de indivíduos ou grupos sujeitas às flutuações do jogo social — e não a um cálculo racionalmente elaborado —, diante de mudanças na estrutura e volume do seu capital; portanto, mudanças que ameaçam a manutenção da classe e/ou da posição de frações de classe na estrutura social (Bourdieu, 2007BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Edusp; Porto Alegre: Zouk, 2007.). A manutenção da classe, nesses termos, passa pela luta por classificações e representações, que é luta para construção de uma visão de mundo social legitimadora do espaço de diferenças inter-relacionais e de distinções internas que demarcam a existência de classes (Bourdieu, 1996BOURDIEU, Pierre. Razões práticas. Sobre a teoria da ação. Campinas, São Paulo: Papirus, 1996.).

Apropriando-me de ferramentas analíticas daquela sociologia (ainda que tenham sido pensadas e usadas inicialmente para estudar mudanças nas elites francesas), e permitindo-me variações no uso analítico dessas ferramentas conforme o contexto empírico que dá vida a este artigo, parece-me particularmente interessante pensar que o investimento coletivo do grupo do movimento social da região em formação diferenciada para seus agentes estaria dentro de um quadro de lutas por permanências: na região/na terra conquistada, na trajetória política ascendente (mas sempre ameaçada) dos quadros institucionais representativos dos agricultores familiares que expressam uma condição camponesa.

O espaço social deste campesinato na Transamazônica, ao longo de sua trajetória, vem se constituindo pelo campo político (representado pelas organizações sociais/sindicais, notadamente o grupo do movimento social da região, sob a liderança de agricultores colonos e descendentes, em torno do Movimento Pela Sobrevivência na Transamazônica, com base no sindicalismo rural, atualmente representado pela Fundação Viver, Produzir e Preservar [FVPP]); o campo religioso (representado pelos espaços das organizações comunitário-religiosas); e, sobretudo, o campo científico-acadêmico (representado por instituições de pesquisa como o Laboratório Agroecológico da Transamazônica — LAET e a Universidade Federal do Pará — UFPA). A configuração desse espaço relacional vem se atualizando conforme contornos distintos de alianças, parcerias, projetos coletivos, acesso a recursos públicos em interface ou não com o Estado ao longo de ciclos da ação coletiva.

Fazemos uso de entrevistas semiestruturadas realizadas com lideranças do grupo do movimento social da região, bem como análise de documentos alusivos à ação coletiva e aos cursos. O texto articula dois níveis de discussão. Primeiramente apresentamos a construção da educação diferenciada enquanto movimento nacional protagonizado ao nível de políticas públicas por atores sociais. Em seguida, abordamos as condições sociais e políticas que levaram a ação coletiva representativa dos camponeses na região Transamazônica e Xingu a construir a educação escolar básica (via Casas Familiares Rurais — CFR etc.) e universitária, como uma demanda em meio a processos sociais que expõem fragilidades profissionais, políticas e técnicas de agricultores e suas ações coletivas, confluindo para as intenções e ações públicas institucionalizadas em políticas de educação diferenciada.

EDUCAÇÃO DIFERENCIADA E SUA INSTITUCIONALIZAÇÃO NO CONTEXTO NACIONAL

A ideia de educação diferenciada vem se convencionando enquanto conceito genérico para definir/nomear as experiências de educação escolar e universitária de caráter inovador (Brasil, 2007BRASIL. Ministério da Educação. Educação do campo: diferenças mudando paradigmas. Cadernos Secad 2. [S.l.]: Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade; MEC, 2007.), distintas das oferecidas nas cidades e implementadas com/a partir do protagonismo político de povos e comunidades tradicionais, constituídos por diversos pertencimentos étnico-políticos: indígenas, camponeses, ribeirinhos, extrativistas, quilombolas.

O termo educação diferenciada tem sido largamente utilizado no campo da educação escolar, sobretudo a partir das políticas educacionais dos anos 1990, para designar diversas práticas de inclusão educacional mobilizadas pelo reconhecimento da diferença (física, cognitiva, cultural, econômica etc.) e pelo questionamento da escola enquanto instituição homogeneizadora, dadas as referências pedagógicas urbanocentradas, masculinizadas, padrões de aprendizado e de mobilidade, entre outros, que não atendem a necessidades e demandas de grupos sociais e agentes que vêm sendo excluídos dos sistemas de ensino formal ou que nele permanecem sem estarem representados pedagogicamente nos conteúdos escolares. O sentido que adotamos aqui refere-se especificamente à educação diferenciada enquanto movimento ou projeto político posto em curso por povos e comunidades tradicionais, fundamentado no princípio de interculturalidade, visando à apropriação de conhecimentos e à construção de habilidades pela aquisição da cultura escolar e científica como estratégia para fortalecer ou construir o protagonismo e pertencimentos étnico-políticos de indígenas, camponeses, ribeirinhos, extrativistas, quilombolas.

A trajetória de constituição das experiências experimentadas por povos e comunidades tradicionais, a exemplo das ações socioeducativas do Movimento Sem Terra (MST), práticas interculturais e bilíngues em grupos indígenas, propostas de educação comunitária baseadas na Pedagogia da Alternância etc., e a partir delas a construção de princípios que norteiam a noção de educação diferenciada no Brasil é, gradativamente, marcada por uma gama de movimentos populares reivindicatórios em estreita relação com o debate universitário e a proposição de políticas públicas específicas. Assim, um facundo movimento de baixo pra cima, ou seja, experiências escolares construídas por ações coletivas em todo o país com as universidades públicas vêm desde o final da década de 1990 em uma trajetória de formação de agentes populares e construção de agenda pública nos governos municipais, estaduais e federal. Paulatinamente, essa trajetória vem construindo também a visibilidade de categoriais sociopolíticas e problemas sociais graves e de longa data quanto à oferta e à qualidade da educação escolar para pessoas e grupos cujas identidades e pertencimentos sociais não são (ou não eram) culturalmente nem legalmente inclusos nos debates e projetos da ação pública estatal.

Segundo Lenoir (1996LENOIR, Remi. Objeto sociológico e problema social. In: CHAMPAGNE, Patrick; LENOIR, Remi; MERLLIÉ, Dominique; PINTO, Louis. Iniciação à prática sociológica. Petrópolis: Vozes, 1996. p. 59-106.), a visibilidade de uma categoria faz-se após a emergência de um problema social, em um trabalho posto em curso por atores, entidades que nomeiam, estabelecem critérios caracterizadores em torno da população alvo de investimento de ações, culminando na criação e difusão de uma nova categoria de percepção do mundo social. Os debates nacionais que ressoaram na criação da noção e do projeto político em torno da educação diferenciada afiguram-se como espaços e tempos iniciais deste trabalho social que poderíamos definir de construção da maior visibilidade de povos e comunidades tradicionais e reivindicação de educação escolar diferenciada. Nos debates que se seguiram, sobretudo a partir da década de 2000, observa-se que ao lado das tensões referentes à preservação do meio ambiente e à presença de grupos que realizam esse bem social por meio de seus modos de vida e, ainda, tensões referentes à permanência das novas gerações em seus modos de vida, estiveram e estão também tensões em torno do que se poderia chamar de uma crise da oferta da educação universal como vem sendo realizada nos diversos territórios.

Ainda que a ideia de educação diferenciada enquanto projeto político amplo tenha recebido a visibilidade teórico-prática nas últimas décadas, ela nasce em meio às construções democráticas desde a década de 1980 no campo jurídico e de políticas públicas com a forte contribuição das ações reivindicatórias indígenas visando a "[…] uma escola que considerasse de fato e de direito as especificidades linguísticas e culturais dessas sociedades" (Macedo, 2015MACEDO, Aurinete Silva. Saberes tradicionais Krahô e educação escolar indígena: um diálogo possível na escola indígena. 2015. 238 f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Língua e Literatura) — Universidade Federal de Tocantins, Araguaína, 2015., p. 43). Ainda que ações coletivas já estivessem sendo experimentadas em formas de escolarização alternativas aos modelos hegemônicos e urbanocentrados em diversos estados do país, a educação escolar, baseada na organização indígena, parece introduzir no debate público nacional a noção de que é um importante meio para a defesa de direitos, cujo domínio passa necessariamente pela oferta pautada pelos sujeitos coletivos a quem essa educação se destina, forçando o Estado brasileiro e incorporar esses princípios de forma prática em suas ações no âmbito da educação e demais áreas de políticas públicas. Para tanto, importantes marcos legais antecederam e/ou foram sendo criados ou alterados por essa atuação coletiva, destacando-se: o art. 210 da Constituição Federal de 1988, que já falava da garantia de educação diferenciada para povos indígenas; a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), enquanto marco internacional nas reivindicações por escolarização adequada às demandas indígenas; e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) 9,394/96 enquanto marco nacional, que trata em vários artigos da necessidade política de currículos diferenciados adequados aos territórios indígenas e rurais.

O debate nacional em torno da educação diferenciada ganha substancial endossamento, até mesmo para forçar alterações nas legislações nacionais e nas políticas públicas, com os processos reivindicatórios e propositivos do movimento Por uma Educação do Campo no final da década de 1990, protagonizado pelo MST e um amplo coletivo formado por professores/as do campo, centros de formação e pesquisa universitários e públicos afeitos ao campesinato, sindicatos de trabalhadores rurais e demais organizações sociais do campo representadas pela Federação do Trabalhadores da Agricultura (FETAGRI) de vários estados. Esse movimento tem como marcos o I e II Encontro Nacional de Educadores da Reforma Agrária (ENERA) entre 1996 e 1997, que já reivindicavam propostas educacionais compatíveis com as diversidades do campo e com um projeto político cuja defesa da educação estava junto da luta por reforma agrária e contra o avanço do agronegócio. Sucedendo-se a estes, outros encontros nacionais foram realizados, como a I Conferência Nacional por uma Educação Básica do Campo, realizada em Luziânia, Goiás, de 27 a 30 de julho 1998, na qual se formaliza o conceito de educação do campo (Caldart, 2012CALDART, Roseli Salete. Educação do campo. In: CALDART, Roseli Salete; PEREIRA, Isabel Brasil; ALENTEJANO, Paulo; FRIGOTTO, Gaudêncio (orgs.). Dicionário da educação do campo. Rio de Janeiro; São Paulo: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Expressão Popular, 2012. p. 257-264.) para especificar uma educação diferenciada para/com os povos do campo, contrária à noção de educação rural, até então vigente e destituída de um conteúdo politizado capaz de atribuir aos camponeses em suas várias expressões socioprodutivas o protagonismo da condução de propostas educativas; o Seminário Nacional realizado em Brasília em novembro de 2002; a I e II Conferências Nacionais, realizadas entre 2003 e 2004; entre outros eventos que têm construído a trajetória da oferta de educação do campo enquanto uma das expressões ou formas de educação diferenciada, que se volta aos povos de campo, mas também ao que se convencionou chamar de povos e comunidades tradicionais. Vejamos esse posicionamento nas palavras de Caldart (2012CALDART, Roseli Salete. Educação do campo. In: CALDART, Roseli Salete; PEREIRA, Isabel Brasil; ALENTEJANO, Paulo; FRIGOTTO, Gaudêncio (orgs.). Dicionário da educação do campo. Rio de Janeiro; São Paulo: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Expressão Popular, 2012. p. 257-264., p. 260):

Mas, quando se discutir a educação do campo, se estará tratando da educação que se volta ao conjunto dos trabalhadores e das trabalhadoras do campo, sejam os camponeses, incluindo os quilombolas, sejam as nações indígenas, sejam os diversos tipos de assalariados vinculados à vida e ao trabalho no meio rural.

As conquistas desse amplo movimento vêm se dando em vários níveis, em termos de conquistas de ações públicas no campo educacional imbuídas da defesa de uma educação territorial, que compreende a educação enquanto instrumento de desenvolvimento e possiblidade de reprodução com dignidade, ao lado da luta nacional por reforma agrária e pela agricultura agroecológica (Fernandes, 1996FERNANDES, Bernardo Mançano. MST: formação e territorialização em São Paulo: Hucitec, 1996.). Em 1998, vinculado ao extinto Ministério do Desenvolvimento Agrário, é criado o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA),2 2 Nesse período, entre 1999 a 2012, na Transamazônica paraense foram implementadas diversas turmas de PRONERA, desde a alfabetização de jovens e adultos à escolarização inicial e ao ensino médio. Na região Transamazônica e Xingu, a condução dessas turmas deu-se por meio da parceria entre o grupo do movimento social da região e o campus da UFPA de Altamira, com o protagonismo de docentes mais identificados com o campesinato. destinado à alfabetização e escolarização de jovens e adultos no campo dos beneficiários do Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA). Gradativamente, o programa foi-se ampliando para a oferta de ensino médio técnico para a formação de professores/as, agentes de saúde, técnicos em agropecuária etc. Em 2001 foram instituídas as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo pelo Conselho Nacional de Educação, que, do ponto de vista jurídico, representou uma importante conquista no sentido de pautar as ações de governo, em suas várias instâncias, para a adequação da oferta da escolarização do campo às reivindicações e proposições do movimento Por uma Educação do Campo, forçando, gradativamente a oferta de ensino superior principalmente para os professores que atuam em territórios rurais. Em 2010, foi criado o Fórum Nacional de Educação do Campo (FONEC), com reforço na articulação nacional de diversos movimentos sociais e sindicais do campo e ampliação da participação de universidades públicas no conjunto das lutas por formação escolar e universitária às populações do campo.

Em 2012, enquanto desdobramento da articulação nacional Por uma Educação do Campo, e no contexto de políticas de expansão da educação superior no Brasil, bem como das políticas de ações afirmativas voltadas para um equilíbrio na distribuição de serviços públicos, especialmente da educação para a população negra, indígena e rural, tem-se a institucionalização das Licenciaturas em Educação do Campo (LEDOCS) por meio do Programa de Apoio às Licenciaturas em Educação do Campo (PROCAMPO), sub-projeto do Programa Nacional de Educação do campo (PRONACAMPO), que previa além desse sub-projeto investimento na gestão e práticas pedagógicas, educação profissional tecnológica e infraestrutura. De lá pra cá já foram implementados 42 cursos em vários estados brasileiros (cf. Molina e Hage, 2019MOLINA, Mônica Castagna; HAGE, Salomão Mufarrej (orgs.). Licenciaturas em Educação no Campo: resultados da pesquisa sobre os riscos e potencialidades de sua expansão – Dados eletrônicos. Florianópolis: LANTEC /CED/UFSC, 2019.).

Nessa conjuntura são implementados no âmbito local — região Transamazônica e Xingu — os cursos Etnodesenvolvimento e Educação do Campo, ambos voltados a povos e comunidades tradicionais3 3 Trata-se de categorização de reconhecimento social de pertencimentos e engajamentos em questões definidas por lutas coletivas. O pertencimento ou identificação com esses coletivos é um dos requisitos para ingresso naqueles cursos via PSE, no qual se exige a apresentação de documento de pertencimento social emitido pelas autoridades representativas dos respectivos coletivos. e cuja forma de ingresso é o Processo Seletivo Especial (PSE) — o primeiro, a partir de incentivos do programa federal de apoio à Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) em 2008, contando também com apoio financeiro da fundação Ford; o segundo, a partir do PROCAMPO em 2014. É interessante notar as articulações locais motivadas pelas demandas que já vinham sendo apresentadas pelo grupo do movimento social da região para acesso ao ensino universitário específico ou diferenciado para seus agentes (como parte de uma luta maior de reivindicações de ampliação da oferta de cursos para a população local). Em princípio, o curso Etnodesenvolvimento vinha sendo planejado por docentes da UFPA, sobretudo do campus de Belém, para/com grupos indígenas. No decorrer dos debates locais acerca desse curso, do seu público e da sua forma de oferta, o chamado grupo do movimento social da região passou a protagonizar um intenso processo reivindicatório para o atendimento de outras categorias, como os agricultores familiares e ribeirinhos; a essa proposição de ampliação do público-alvo se somaram também movimentos de atuação em comunidades da cidade como o movimento negro, dentre outros.

O curso de Licenciatura em Educação do Campo no campus de Altamira iniciou suas primeiras turmas em julho de 2014, com o edital do MEC/SECADI que previa vagas para docentes, técnicos administrativos e recursos financeiros para a implementação das turmas. Destina-se a formar educadores para atuar na Educação Básica, nas áreas de Linguagens e Códigos e Ciências da Natureza, nas séries finais do ensino fundamental e no ensino médio. Esse curso, partícipe do movimento nacional e regional da educação do campo, parte do pressuposto de que a educação deve realizar-se no conjunto das lutas e organizações do povo do campo, na luta pela terra e por condições dignas de vida e de afirmação de sua identidade; logo, defende que ela seja definida coletivamente pelos próprios sujeitos do campo, em contraposição às propostas urbanocêntricas de ensino (Caldart, 2012CALDART, Roseli Salete. Educação do campo. In: CALDART, Roseli Salete; PEREIRA, Isabel Brasil; ALENTEJANO, Paulo; FRIGOTTO, Gaudêncio (orgs.). Dicionário da educação do campo. Rio de Janeiro; São Paulo: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Expressão Popular, 2012. p. 257-264.). A implementação do curso Educação do Campo nas representações dos agentes da ação coletiva local deu-se como espécie de fluxo de continuidade entre o que se almejava e reivindicava para a oferta de educação diferenciada e a política pública para a formação de professores, dada a conjuntura política favorável às demandas populares:

Então, o Pronacampo já era um debate maior que a CONTAG fazia parte, que o MST fazia parte, e a gente vinculado à CONTAG fazia parte dessa ideia e dessas discussões em Brasília, em Belém e vivíamos aquele momento do governo da esquerda que tínhamos espaço pra participar. […] foi quase automático, quando a universidade [agentes da UFPA-campus de Altamira] se predispôs, o movimento entendeu isso como uma coisa automática. (Ana Paula, 52 anos, ex-coordenadora da FVPP, docente do curso Educação do Campo)

Não obstante ao movimento nacional que tem sistematizado os princípios pedagógicos e políticos da educação diferenciada, cumpre destacar que no âmbito local — região Transamazônica e Xingu, a exemplo de outras regiões brasileiras — as proposições por essa forma de fazer educação ultrapassam o previsto nas políticas públicas. Essas políticas de educação diferenciada, quando olhadas, sobretudo por meio dos cursos Educação do Campo e Etnodesenvolvimento, ganham contornos para além da formação de profissionais para atuar na educação básica. Há subjacentes outras finalidades sociais que vão ao encontro da contínua construção do espaço social de um tipo de campesinato que desde suas origens tem, na interface com o Estado, a constituição de quadros institucionais próprios e formação de agentes mediadores e lideranças como condição de possibilidade para sua reprodução social.

O CONTEXTO, OS AGENTES E SUAS AGÊNCIAS NA CONSTRUÇÃO DE EXPERIÊNCIAS DE EDUCAÇÃO DIFERENCIADA NA REGIÃO TRANSAMAZÔNICA E XINGU

A região Transamazônica e Xingu localiza-se no oeste do Pará, e sua territorialização tem como um dos marcos importantes a década de 1970, momento no qual se efetiva a intensificação demográfica, resultante do conjunto de políticas ligadas ao movimento de expansão da fronteira amazônica desencadeado pelo Estado, resultando em expressiva sucessão migratória dirigida (Velho, 1979VELHO, Otávio Guilherme. Capitalismo autoritário e campesinato – um estudo comparativo a partir da fronteira em movimento. 2. ed. São Paulo: Difel, 1979.), via ocupação horizontal da abertura de estradas e projetos de colonização para a expansão econômica brasileira fundada em grandes projetos, cuja finalidade era viabilizar a industrialização em larga expansão no contexto de regime militar.

Os agentes da ação coletiva, na região polarizada no município de Altamira, conformam um grupo para quem a posse da terra se deu com o projeto de colonização. Nas representações dos agricultores, a estrada Transamazônica e o projeto de colonização são valorados como marcadores da ideia de uma nova era: no que se refere às possibilidades de melhores condições de vida e de trabalho na agricultura, bem como uma espécie de ilusão, engano propagandeado pelo Estado, revestido de promessas não cumpridas. Ambos teriam funcionado como fatores de atração da migração. Os meados da década de 1970 e, principalmente, os anos iniciais da década de 1980 coincidem com o auge da recessão provocada pela crise do modelo de intervenção estatal por meio do projeto de colonização agrícola. Esse projeto fora abandonado pelo governo federal, ficando as famílias de migrantes contando apenas com as relações de parentesco, as redes de vizinhança e os laços de conterraneidade (Hébette, 2002).

A essas redes de solidariedade entre grupos familiares se somaram, aos poucos, os grupos de vizinhos organizados pela Prelazia do Xingu mediante as Comunidades Eclesiais de Base (CEB), cuja finalidade fora discutir os direitos dos agricultores e a questão fundiária, bem como realizar a alfabetização dos migrantes e seus filhos (em experiências quase informais). A Igreja Católica cumpriu a tarefa de organizar essas famílias nas chamadas comunidades e, gradativamente, a ação sindical somou-se a essas organizações informais, constituindo um espaço semipúblico de resistência e elaboração de projetos coletivos (Hébette, 2002).

Dessa forma, tendo em vista a aglutinação dos colonos em torno dos debates sobre direitos trabalhistas, a ação sindical, as celebrações religiosas, bem como a escolarização inicial dos migrantes e seus filhos, deu-se o início de uma espécie de comunidade política (cf. Weber, 1999WEBER, Max. Economia e sociedade: fundamentos da Sociologia Compreensiva. V. II. Brasília: Universidade de Brasília, 1999.). Entre os conteúdos mobilizadores está uma certa crença subjetiva na comunidade de origem. Neste tempo-espaço orientado pela atuação militante, a construção do grupo deu-se, sobretudo, pela força política mobilizadora da ação coletiva em torno da identidade de trabalhadores rurais somada à de colonos da Transamazônica. A autoidentificação manifesta um projeto coletivo de resistência baseado no trabalho eclesial de base. Esse trabalho repercutiu em trocas de serviços mais amplas e, gradativamente, nas mobilizações para a tomada dos Sindicatos dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR) até então de caráter patronal.

Como se vê, a reação dos agricultores para tornar realidade a construção de um espaço social de produção e reprodução camponesa corresponde a dois momentos da organização social nos quais a ação coletiva e a ação pública por vezes são antagônicas, outras vezes são complementares. O primeiro diz respeito à constituição de quadros institucionais com base na imposição do projeto de colonização e à gradativa organização coletiva de base comunitário-religiosa, que aos poucos, perante a retirada da ação pública, em 1975, dá vida às organizações sindicais mais integradas e formalizadas. A atuação regional desses sindicatos e suas relações com organizações nacionais como a Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG) possibilitou a barganha política por direitos e a proposição de ações e projetos reivindicatórios de formas de inclusão de demandas dos agricultores na ação pública, tendo início o segundo momento caracterizador da ação coletiva mais propositiva nas ações públicas estatais. Desse momento, constituíram-se o Movimento pela Sobrevivência na Transamazônica (MPST), entidade representativa dos diversos grupos sociais da região, sob a liderança dos colonos organizados em Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais e com a parceria estratégica local/regional do grupo dos professores (que posteriormente viria a formar, na região, o Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Estado do Pará — SINTEPP) e da Prelazia do Xingu. O espaço público das organizações sociais fortalece-se também no cenário nacional, seja com os pares estratégicos, como Federação dos Trabalhadores na Agricultura (FETAGRI), CUT e Confederação Nacional de Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), seja ainda na esfera político-partidária, tendo em vista a consolidação do Partido dos Trabalhadores (PT), com o qual dialogavam as lideranças do MPST e seus pares estratégicos.

O conjunto de articulações regionais e nacionais reforçou a construção de um Projeto Global de Desenvolvimento (PGDT) em 1991. Também definido como projeto alternativo de desenvolvimento ou projeto da Nova Colonização, propunha-se a […] recuperar o projeto de colonização em outras bases. Neste projeto, percebe-se o papel reivindicativo da ação coletiva, mas também o papel de ator social propositivo que passa a marcar o perfil do MPST (MPST, 1996), cobrando para a realização de suas ações a assessoria de um quadro gerencial e de instituições de pesquisa. Neste contexto foi constituída a FVPP e, em 1993, a parceria com o LAET, via Programa Agroecológico da Transamazônica (PAET).

Esses fatores aproximam-se, por vários aspectos, dos motivos que transformam a estrutura e a legitimidade carismática em uma estrutura e legitimidade gradativamente institucionalizada, representadas pelo STTR e pelo PT. Essa era, naquela conjuntura, a possibilidade de permanência na região; tratava-se de ampliar o espaço de atuação para além do espaço eclesial, envolvendo formas organizativas institucionalizadas e partidárias, além da sua espacialização em outros municípios e grupos. Tais são as características das formas de sociabilidade e legitimidade rotinizadas tradicionalmente (Weber, 1999WEBER, Max. Economia e sociedade: fundamentos da Sociologia Compreensiva. V. II. Brasília: Universidade de Brasília, 1999.).

Os repertórios discursivos e os quadros institucionais constituídos pela ação coletiva dão conta de formas de agenciamento movidas por alianças que remontam a uma origem comum, a um recrutamento de base religiosa em meio a uma linguagem do parentesco, tal como analisado por Alves (2014ALVES, Julite Miranda. Redes sociais e dádiva: a constituição dos vínculos sociais entre lideranças na Transamazônica-Pará. 2014. 170 f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Universidade Federal do Campina Grande, Paraíba, 2014.). Os agenciamentos, conforme interpretação possível apoiada na pesquisa dessa autora, deram-se imersos em conteúdos subjetivos: a retribuição da confiança e da lealdade às primeiras lideranças (padres, freiras engajadas na luta pela permanência na terra e na região) e, posteriormente, a retribuição às lideranças ligadas ao sindicalismo. Gradativamente, essas formas de agenciamento de mediadores mescla-se com (não anula) um conteúdo mais institucionalizado, tendo em vista a mudança discursiva e de repertórios de ação da classe para manter a distinção social e a legitimidade política. Isso corresponderia a mudanças da ação coletiva propositiva em meio à constituição do espaço social camponês, no final da década de 1980 e início da década de 1990, que diz respeito à consolidação dos quadros institucionais e ao desafio da profissionalização e da ambientalização.4 4 A ambientalização é um processo sociopolítico em que as ações e projetos passam a ser pautados pelas questões ambientais e pela preocupação moral com o bom uso da natureza (Larrère e Larrère, 1997).

Com a conquista de financiamentos específicos para a agricultura familiar como o Fundo Constitucional de Financiamento do Norte (FNO) especial, por garantir a permanência das famílias nos lotes, as organizações sociais passam a exigir um quadro cada vez mais específico de profissionalização para apoio técnico, demandantes de saber acadêmico/escolar. Ainda como consequência dessa conquista, contata-se o predomínio da pecuária como prática produtiva e a capitalização das famílias. A fim de dar continuidade ao projeto não só de sobrevivência na Transamazônica, mas de desenvolvimento da Transamazônica, ao mesmo tempo que buscavam alternativas para diminuir os impactos da evolução diferenciada dos estabelecimentos agrícolas bem como qualificar os seus quadros, o MPST e a FVPP mobilizaram parcerias com órgãos de pesquisa como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), o Groupe de Recherches et d’Echanges Technologiques (GRET) e a UFPA para a criação do LAET/UFPA em 1993, para o qual se previa um Programa de Pesquisa-Formação-Desenvolvimento a fim de desenvolver pesquisas técnico-científicas.

Em 1996, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), ao lado do já instalado FNO, dá visibilidade à agricultura familiar, mas impõe cada vez mais a exigência formal de profissionalização para a inserção nos mercados agropecuários, e a escolarização é posta como meio de acesso a esse objetivo. Ao lado disso, a partir de 1999, tem-se a liberação de recursos do Programa Piloto para a proteção das Florestas Tropicais do Brasil (PP/G-7), captados pela FVPP para a difusão de novas técnicas de uso da terra e recursos florestais. Isso influenciou a mudança, em 2000, da nominação MPST para Movimento pelo Desenvolvimento da Transamazônica e Xingu (MDTX), o que se afigura como uma forma de colocar-se e/ou manter-se no jogo social, desfrutando e disputando os capitais (simbólicos, materiais, sociais) que as nominações legítimas representam.

A profissionalização, a ambientalização da ação coletiva põem em voga tanto a incapacidade técnica da produção agrícola quanto a inabilidade das antigas lideranças à frente dos quadros institucionais. Nessa conjuntura, o campesinato coloca em questão a educação universal perante os desafios da gestão política da sua reprodução social. A partir de meados da década de 1990, investimentos importantes em propostas de escolarização diferenciadas via Alternância Pedagógica vêm sendo implementadas pelo campesinato, principalmente em interface com o campo acadêmico. Assim pensadas, essas propostas têm-se colocado como estratégias de reprodução social do grupo, visando conservar sua posição social na condição camponesa, afirmar ou reforçar o habitus coletivo, mas transformando seu capital social e simbólico5 5 Capital simbólico relaciona-se com a distinção social, prestígio, percebidos e revelados na posição de credibilidade ou de ser olhado com outros olhos, que atribui legitimidade aos portadores do mesmo (Bourdieu, 1989, p. 134). pela incorporação do capital cultural6 6 O capital cultural neste contexto diz respeito ao capital em estado incorporado, ou seja, sob a forma de disposições duráveis do organismo; capital que se tornou parte integrante da pessoa como um habitus informado pelo capital social, enquanto rede durável de vinculação a um grupo (Bourdieu, 1989, p. 74). (representado pelo saber escolar/acadêmico).

A necessidade do diploma expõe uma estrutura social em mudança e, como interpreto, três investimentos importantes da ação coletiva para a conservação e/ou ampliação de seus quadros institucionais são assumidos: as escolas comunitárias CFR e o curso de Licenciatura em Ciências Agrárias, ambos a partir de meados da década de 1990, e os cursos superiores Etnodesenvolvimento e Educação do Campo demandados à UFPA na década de 2000. As primeiras eram mantidas pelos STTR e destinadas a formar os filhos dos colonos no nível de ensino fundamental e médio. Os segundos eram destinados a formar em nível superior os agentes da ação coletiva. Estes cursos superiores foram sendo implementados com a parceria formal ou tácita dos quadros institucionais que compõem a ação coletiva regional: associações indígenas, MDTX, FVPP (que articula os STTR da região), Movimento de Mulheres do Campo e da Cidade, Movimento Xingu Vivo para Sempre etc.

Certamente, aqui, é marcante um campesinato que não passa por uma construção tradicional; há em sua base um processo que D'Incao (2002) define como movimento de construção social do campesinato paraense ou de construção da presença do campesinato no debate político de temas, questões públicas que lhes dizem respeito e aí se colocam como protagonistas. Essa presença do campesinato na sociedade paraense também passa pela construção de uma matriz analítica e pela adoção de um referencial teórico apropriado à análise desse campesinato, ou seja, dar visibilidade também acadêmica a ele. Isso, em grande medida, levou no final da década de 1990 a um processo de aproximação entre intelectuais da ação (docentes, pesquisadores de universidades e centros de pesquisa) e agentes do sindicalismo rural. Segundo interpretação possível baseada em outras duas autoras, esse movimento vem criando tanto uma espécie de elite intelectual do campo democrático da Amazônia (Monteiro, 2021MONTEIRO, Raimunda. Amazônica: espaço-estoque, a negação da vida e esperanças teimosas. Belém: Imprensa Oficial do Estado do Pará, 2021.) quanto "[…] a capacidade de adaptação e de conquistas que lhes são historicamente inacessíveis pela via da criação de agentes intelectuais e políticos dotados de novos olhares" (Neves, 2008NEVES, Delma Pessanha. Mediação social e mediadores políticos. In: NEVES, Delma Pessanha. Desenvolvimento social e mediadores políticos. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008. p. 21-44., p. 305). Em ambas as interpretações, a educação escolar e a formação universitária, principalmente, ganham a centralidade de dar continuidade às conquistas de recursos e serviços públicos para a permanência da condição social camponesa.

Vejamos a avaliação que lideranças antigas (no trecho de entrevista abaixo) fazem dessa relação com a universidade e com a necessidade de formação acadêmica de seus quadros, o que em muito passou a mobilizar ações de apropriação ou criação do que se poderia dizer um aparato institucional de criação de agentes intelectuais e políticos de que fala Neves (2008NEVES, Delma Pessanha. Mediação social e mediadores políticos. In: NEVES, Delma Pessanha. Desenvolvimento social e mediadores políticos. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008. p. 21-44.). A seguir, nos trechos do depoimento de Ana Paula (52 anos, ex-coordenadora da FVPP, docente do curso Educação do Campo), destacam-se duas fontes motivadoras da necessidade de escolarização: 1. dominar as formas de funcionamento do Estado do ponto de vista administrativo e da gestão, dada a meta de a ação coletiva se fazer representar na ação pública pela reivindicação de pautas e, sobretudo, pela inserção de agentes identificados com as lutas coletivas do campesinato na estrutura do Estado; 2. ter uma expertise profissional interna à ação coletiva, diante dos novos desafios que as conquistas a partir do ciclo da ambientalização passaram a apresentar do ponto de vista da argumentação e da ação científica e técnica. A isso se somam os questionamentos que os agentes da ação coletiva já passavam perante os pares antagônicos acerca de sua autoridade escolar/acadêmica para falar em nome do desenvolvimento regional:

[…] no período de 2004, a Fundação [FVPP] estava avançando nessa história das casas [CFR]. Tinha feito aquele contrato com o BNDES7 7 Trata-se do Projeto de Consolidação da Produção Familiar Rural e Contenção dos Desmatamentos na Transamazônica e Baixo Xingu, no qual se previa, entre outras ações, a expansão das CFR em todos os municípios da Transamazônica e Xingu. e tava numa fase assim muito de proposições para a educação, dessa coisa de ter mais pessoas, na avaliação do movimento, com um pouco mais de inteligência, de conhecimento para ir tocando as proposições. […]. Os debates são cada vez maiores, a gente era muito cobrado pelo povo de fora. Essa experiência de fazer o projeto para o BNDES […] exigiu uma inteligência muito grande da gente para discutir o ordenamento fundiário, discutir a proposição de casas [CFR], e ter argumentos técnicos, científicos […]. E de fato naquele tempo quem tinha faculdade no movimento? Só eu que tinha ensino superior no grupo todo. Meus companheiros todos tinham no máximo ensino fundamental, nem o médio completo. […] a gente não fazia lutas por outro lugar. A educação que você pedia era pra esse lugar […].

Nos documentos de quadros institucionais da ação coletiva, com a visibilidade dos jovens (ou da nova geração de agentes que vêm sendo incorporados aos quadros institucionais da ação coletiva) e a necessidade de formação profissional e acadêmica deles, esses dois elementos constitutivos do capital cultural institucionalizado passam a figurar como "prioridade estratégica para o desenvolvimento da agricultura familiar dessa região" (MPST e FVPP, 1996, p. 9). Essa visibilidade dos jovens e de investimentos na sua formação amplia-se com o Projeto de Consolidação da Produção Familiar Rural e Contenção dos Desmatamentos na Transamazônica e Baixo Xingu, de 2001, que passou a pautar as ações do grupo do movimento social da região, fase de maior difusão dos projetos agroecológicos nos municípios de atuação do projeto.

A despeito das definições ocidentais acerca do que sejam a juventude e os jovens, em geral orientadas por parâmetros etários e psicossociais, interessa para a sociologia perceber os "recortes" em termos de fronteiras construídas pela prática social em que os indivíduos são percebidos, nomeados e designados como jovens. Os recortes que definem a juventude, portanto, ensejam objetos de disputas e divisões que, por sua vez, são informadas e informam as visões de mundo, os significados, as diferenciações e as posições sociais almejadas, neste caso, pelas gerações anteriores (Bourdieu, 1983BOURDIEU, Pierre. A "juventude" é apenas uma palavra. In: BOURDIEU, Pierre. Questões de Sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero Limitada, 1983. p. 112-121.).

Assim, os investimentos coletivos acima e suas estratégias práticas no campo da educação escolar para os jovens coadunam-se com as reflexões de Weber (1999WEBER, Max. Economia e sociedade: fundamentos da Sociologia Compreensiva. V. II. Brasília: Universidade de Brasília, 1999.) sobre as estruturas rotinizadas racionalmente, nas quais o grau de qualificação profissional cresce paralelamente à burocracia (nesse caso, às demandas incorporadas aos quadros institucionais da ação coletiva com o novo sindicalismo propositivo e gerenciador de programas sociais da ação pública como aposentadorias, cadastramento de terras etc. e com a ambientalização de suas práticas). Isso porque a legitimidade se dá, mais do que em outros momentos da trajetória do grupo, em virtude de conhecimento, e a posição de poder se dá pelo conhecimento profissional. São essas exigências sociais desse cenário que mobilizam os agentes do grupo do movimento social da região a dar visibilidade aos jovens investidos de expectativas de continuidade das conquistas e das lutas do grupo, bem como a implementar importantes inciativas educativas compatíveis com os interesses políticos e socioeconômicos da agricultura de base camponesa em parceria com o campo acadêmico, antecipando o que definimos hoje como educação diferenciada. Vejamos:

  • Um reflexo possível dessas condições sociais nitidamente ambientalizadas é formalizado no Projeto de Estruturação Técnico-Pedagógica da CFR de Medicilândia, de 1996, no qual se lê entre as suas finalidades a busca de respostas à demanda de "[…] formação e informação principalmente quanto ao conhecimento tecnológico adequado à necessidade ambiental da região que permita aos pequenos produtores da região prosperar e viver com dignidade" (CFR/Medicilândia, 1996, p. 2). Com o Projeto de Consolidação da Produção Familiar Rural e Contenção dos Desmatamentos na Transamazônica e Baixo Xingu, de 2001, dá-se a ampliação das CFR para os demais municípios da Transamazônica, visando à implantação dessas escolas nos 12 municípios de atuação do MDTX. As CFR parecem ser vitrines da publicização de ações ambientalizadas e da busca pela profissionalização da agricultura familiar, com repercussões concretas na condução dessas experiências.

  • O curso de Licenciatura em Ciências Agrárias, implementado com a importante parceria institucional entre o movimento social da região ligado aos camponeses (representado pelo MDTX e FVPP), o LAET/LASAT e a UFPA (campus de Altamira e Marabá), o qual chegou a formar quatro turmas entre 1997 e 2000, foi uma proposta construída entre esses quadros institucionais, conforme analisam lideranças desse movimento e pesquisadores oriundos daquela parceria. Nasceu do acúmulo das pesquisas sobre as necessidades técnicas da agricultura familiar e a necessidade de agentes com ensino superior e com conhecimento acadêmico capazes de construir respostas àquelas necessidades, bem como atuar como docentes nas escolas comunitárias CFR. Estas se tornaram, a partir da década de 2000, sobretudo, centros de formação visando ao projeto de desenvolvimento regional Consolidação da Produção Familiar e Contenção dos Desmatamentos da Transamazônica e Xingu, então orientador das ações regionais do movimento.

Apesar das resistências institucionais em implementar um curso de licenciatura na área das ciências agrárias, com ingresso diferenciado do alunado e com formato metodológico proposto pelo movimento social, capaz de aproximar os universitários dos agricultores nas recorrentes práticas de campo — quando ainda não se tinha o debate nacional sobre políticas de ação afirmativa ou algo correlato —, o grupo dirigente do movimento social, para implementar e manter o curso, contou com a importante contribuição de agentes do campo acadêmico (docentes, sobretudo da UFPA, identificados com as questões do campesinato e da agricultora familiar) e do campo religioso (padres ou ex-padres e freiras inspirados na pedagogia pastoral progressista das Comunidades Eclesiais de Base) que compunham as interações relacionais do espaço social do campesinato. O depoimento a seguir acerca do processo de seleção dos ingressos no curso de Licenciatura em Ciências Agrárias dá visibilidade às expectativas que mobilizaram desde então os investimentos em formação universitária postos em curso pelo grupo do movimento social da região e suas parcerias com o campo acadêmico, no sentido de, a partir da formação de uma espécie de nova geração de mediadores, lideranças locais, ter-se a manutenção e/ou ampliação do espaço sociopolítico dos grupos identificados com o campesinato. Vemos no depoimento a seguir também os diversos níveis de mediação entre campo político e campo acadêmico na mobilização e criação de formas para garantir que os seus entrassem nesse curso:

A primeira proposição da Licenciatura [em Ciências Agrárias] era você ter pessoas para trabalhar nas Casas Familiares Rurais. Lembra que a gente ficava imaginando que ia criar as Casas, mas quem que vai trabalhar? Era o agrônomo formado nessa perspectiva agrotóxica e agro-qualquer-coisa… esse povo também não tem o que ensinar lá nas CFR […] o movimento estava se pautando muito por uma história assim: "-vamos construir um espaço na sociedade, a gente quer um conhecimento assim nesses moldes, então é preciso estudar" […], às vezes até brincava falando assim: "mas isso não é uma ideia de construir uma ideia de um governo paralelo ao governo que já existe?". Aí eu lembro que o Avelino [uma das primeiras lideranças do movimento] também dizia assim: "não, não é construir um governo paralelo, é construir um espaço paralelo, isso eu concordo, em que a gente possa ali discutir nossas ideias com queira partilhar delas". Isso significava incluir quem quisesse das universidades, incluir quem quisesse do movimento sindical, enfim, dos governos […]. Nós montamos uma proposta de curso […]. (Ana Paula, 52 anos, ex-coordenadora da FVPP, docente do curso Educação do Campo)

Ainda que não houvesse até então, nesse contexto, o amplo debate acerca da educação diferenciada e processos seletivos específicos para determinados públicos, os princípios pedagógicos e os principais elementos que conformam essa noção já estavam postos quer fosse nesse dilatado movimento de construção social do campesinato paraense, quando inaugurou uma relação de cooperação com os agricultores em suas organizações representativas pela construção de agentes intelectuais desse grupo e engaja-se mediando conquistas institucionais com esse intento; quer fosse nas reivindicações públicas do grupo do movimento social da região, que já fazia a luta pela educação para esse lugar, e lugar, nesse contexto de fala, parece ter o sentido de espaço apropriado — a região Transamazônica e Xingu, novamente enquanto ideia-valor mobilizadora de projetos de permanência no lugar e de projeção de ações políticas capazes de possibilitar a reprodução com dignidade. Ou seja, uma dimensão territorial e a ideia de práticas educativas pautadas na diferença, para público específico, estavam movimentando a luta local por escolarização para além da reivindicação de um direito universal, como nos levam a entender os documentos e as interpretações dos agentes do movimento social da região na Transamazônica paraense nesse período.

A dimensão territorial da educação enquanto "[…] algo capaz de fornecer [aos povos e comunidades tradicionais] instrumentos valiosos na luta pela defesa do território" (Paula, 1999PAULA, Eunice Dias de. A interculturalidade no cotidiano de uma escola indígena. Cadernos Cedes, São Paulo, v. 19, n. 49, p. 76-91, dez. 1999. https://doi.org/10.1590/S0101-32621999000200007
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, p. 82), somada à escolarização/formação acadêmica voltada a sujeitos coletivos, ou seja, uma dimensão formativa cujo sujeitos estão inseridos em uma dimensão coletivizada de projetos e relações socioprodutivas, compõem a ampla noção que se vem convencionando definir como educação diferenciada. Muito mais que um conceito teorizado, essa ideia vem se constituindo enquanto projeto político de ruptura epistemológica e política com as pedagogias hegemônicas gestadas paralelamente ao desenvolvimento do modelo de desenvolvimento e produção capitalistas. Além desse marco valorativo, a "[e]ducação diferenciada, como projeto político de respeito às diferenças culturais, está fundamentada no princípio da interculturalidade e da representação democrática" (Monteiro e Mascarenhas, 2020MONTEIRO, Alcioni da Silva; MASCARENHAS, Suely Aparecida do Nascimento. Educação escolar diferenciada, formação de professores indígenas e currículo. Eccos - Revista Cientifica, São Paulo, n. 54, p. 1-15, e17338, jul./set. 2020. https://doi.org/10.5585/eccos.n54.17338
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, p. 3).

Como analisamos, os cursos de Etnodesenvolvimento (criado em 2009, com ingresso da primeira turma em 2011) e Educação do Campo (cujas atividades formativas em Altamira iniciaram em 2014) estão situados no chamado movimento de construção do campesinato paraense. No caso aqui analisado, encontram ressonância em uma estrutura de Estado afeita às demandas populares, mais precisamente no âmbito do ensino superior, destacando-se as Políticas de Ações Afirmativas e o PROCAMPO (oriundo do movimento nacional Por uma Educação do Campo, liderado por um amplo coletivo popular no qual se incluía a FVPP), ambos implementados pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD/MEC), atualmente extinta.

A constituição dos dois cursos resguarda especificidades oriundas dos atores que protagonizaram suas demandas no âmbito regional e nacional e do contexto em que os cursos foram discutidos e implementados no campus de Altamira. Importa ainda dizer que a forma político-pedagógica que assumem, em diálogo com demandas antigas da agricultura familiar local e dos seus quadros institucionais representativos, bem como de outros importantes segmentos que compõem a cena pública no debate acerca dos direitos de povos e comunidades tradicionais (associações indígenas, Movimento dos Atingidos por Barragens, Movimento de Mulheres do Campo e da Cidade, Movimento de Mulheres Negras, colônia de pesca), constrói no grupo do movimento social da região um sentimento-valor em relação à universidade de "[…] estar presente institucionalmente, não por pessoas […] É aquela demanda dos agricultores entrando na pauta institucionalizada da universidade […]" (Ana Paula, 52 anos, ex-coordenadora da FVPP, docente do curso Educação do Campo, ao avaliar o sentido dos cursos para o movimento).

O significado da implementação desses cursos para a ação coletiva na região e as representações acerca das condições de possiblidade da criação deles no âmbito local giram em torno de dois conteúdos que demarcam uma relação singular entre movimento social e universidade delineadora do já comentado amplo movimento de construção social do campesinato paraense:

1. Há, por um lado, o que os agentes do movimento e da universidade chamam de um passivo acumulado nessa relação de agentes do campo acadêmico e do campo da ação coletiva, sobretudo por conta das experiências de oferta de escolarização pensadas e executadas com a mediação de agentes da UFPA (a exemplo das CFR e da Licenciatura em Ciências Agrárias, ainda na década de 1990), que teria construído uma busca recíproca desses campos para a efetivação dos cursos diante dos recursos disponíveis na ação pública no contexto de reivindicações pela ampliação de cursos superiores e por educação diferenciada, como condição de possibilidade para manter-se como resistência:

A relação assim mais positiva pro movimento sempre foi a universidade, ele sempre se sentiu confortável nessa relação com a universidade […] porque o movimento sempre teve o enfrentamento com a EMATER, teve uma relação mas sempre foi essa de conflito, uma relação de conflito com o INCRA que nunca cumpriu o papel do tamanho que os movimentos queriam, uma relação conflituosa com os bancos […] vocês [docentes da UFPA] tinham um passivo construído de relação, esses cursos tá muito relacionado com o que vocês viveram no PRONERA, com o que vocês acompanharam nas Casas Familiares Rurais, e tudo isso era um relação estabelecida com o movimento […]. (Ana Paula, 52 anos, ex-coordenadora da FVPP, docente do curso Educação do Campo)

[…] pra mim a educação no movimento foi importantíssima porque nessa região aí, ainda a gente tem o índice muito alto inclusive de analfabetos, e isso faz com que a gente tenha muita dificuldade de inclusive se posicionar enquanto resistência. E a capacidade do movimento e a importância a partir do diálogo e a partir da parceria com as nossas instituições de ensino, com nossos parceiros das nossas universidades, aí eu acho que o movimento foi muito propositivo. (João PT, 54 anos, diretor de política agrária da FETAGRI/Pará)

2. Por outro lado, a implementação dos dois cursos significou a institucionalização da relação entre o movimento social da região com a universidade e a inclusão de pautas políticas dele nesta, a ponto de, na avaliação expressa no excerto a seguir, as ações de escolarização básica pelo PRONERA na região a partir de 1998, implementadas pelo movimento em parceria com a UFPA, não demarcarem um lugar de pertencimento entre ambos. Em certo sentido, o trecho da entrevista a seguir denota que essa inclusão e esse pertencimento se dão pela presença física de agentes do movimento nos cursos como estudantes, mas também pelo pertencimento simbólico desse movimento ao campo acadêmico:

O PRONERA era para os agricultores, era o letramento, era a formação de técnico que era pra aprimorar esse debate da agricultura […] aí isso tudo muito colado com a universidade, com a UFPA, embora fale UFPA eu sempre faço questão de ressaltar que institucionalmente até esse momento era uma relação muito com as pessoas chaves da universidade […] os cursos [Etnodesenvolvimento e Educação do Campo] trouxeram pra dentro da universidade um público que não estudava! […]. Então eu acho que é isso, o movimento se sentiu representado pelo público desses cursos, é o filho do cara do sindicato, é a pessoa da associação, é do movimento de mulheres, é o professor da comunidade que participa também das discussões do sindicato, das discussões da associação do movimento de mulheres […]a gente foi finalmente aceito do jeito que a gente é […] (Ana Paula, 52 anos, ex-coordenadora da FVPP, docente do curso Educação do Campo).

Os coletivos sociopolíticos e étnicos que articulam o alunado dos cursos de Etnodesenvolvimento e Educação do Campo são indígenas (aldeados e citadinos), quilombolas, camponeses, extrativistas, ribeirinhos e ativistas do movimento de mulheres negras. Dada a natureza de oferta desses cursos de forma flexibilizada8 8 Forma de oferta adotada pela UFPA que permite o funcionamento de turmas fora da sede do campus/faculdade. e intensiva,9 9 Diz respeito à organização dos horários e tempos de funcionamento das aulas dos dois cursos. As aulas ocorrem concentradas nos meses de janeiro e fevereiro/julho e agosto, em dois turnos, sendo oito horas diárias de aulas durante o Tempo Universidade. No Tempo Comunidade, fora do período de aulas presenciais, são realizadas as atividades complementares de pesquisa e estágios supervisionados. essas licenciaturas têm se espacializado geograficamente nas seguintes mesorregiões do Pará: Sudoeste Paraense (região Transamazônica e Xingu), Baixo Amazonas, Marajó, e mesorregião Belém.

Como se viu na trajetória de construção do projeto político e das práticas educativas envoltas na noção de educação diferenciada no Brasil, emergem no contexto de cultura política, sobretudo da década de 1990 e 2000, pari passu à construção de uma nova categoria de percepção do mundo social: povos e comunidades tradicionais, em um contexto de transformações políticas e novas práticas organizativas, nas quais identidades étnicas e/ou ambientalmente orientadas são acionadas para a conquista de direitos, seja junto à bandeira de luta do socioambientalismo, seja como elemento atualizador de bandeiras tradicionais ligadas ao sindicalismo rural (direito à terra, à moradia, créditos agrícolas, à educação etc.), em uma conjuntura internacional de ações públicas e coletivas fortemente influenciadas pela ecologia e justiça ambiental.

Tendo em vista esse cenário, o qual poderíamos chamar de cultura política etnizada e ambientalizada, as práticas de educação diferenciada têm adotado em todo o país (com variadas formas conforme o perfil das instituições de ensino superior) a interculturalidade e, sobretudo, a Pedagogia da Alternância como estratégia metodológica para implementar processos formativos em que o conteúdo e a forma escolar/universitária resguardem relação direta com o saber tradicional, bem como para que a interdisciplinaridade seja incorporada como desafio para a construção do conhecimento de forma global. Além disso, essas práticas trazem à tona a relação entre educação e promoção do desenvolvimento sustentável enquanto processo endógeno, ou seja, pensado por povos e comunidades tradicionais, firmando seus modos de vida, a conservação dos recursos naturais e a gerência destes pelos próprios sujeitos. Para tanto, a alternância entre espaços e tempos de formação é essencial; assim a cadência entre formação na escola ou na universidade e a formação/pesquisa-intervenção nos grupos ou comunidades de pertencimento dos estudantes torna-se o princípio político (prático) para a mobilização das características educativas acima descritas.

A alternância pedagógica no curso de Licenciatura em Etnodesenvolvimento, diferentemente do curso de Educação do Campo, assume principalmente a perspectiva do etnodesenvolvimento como fundamento conceitual. A ideia de etnodesenvolvimento, conforme Oliveira, Parente e Domingues (2017OLIVEIRA, Assis da Costa; PARENTE, Francilene de Aguiar; DOMINGUES, William César Lopes. Pedagogia da alternância e(m) etnodesenvolvimento: realidade e desafios. Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 42, n. 4, p. 1545-1565, out./dez. 2017. https://doi.org/10.1590/2175-623663216
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), está associada à noção de desenvolvimento sustentável, primando pela "[…] autonomia gerencial dos povos e comunidades tradicionais na definição dos modos e das escolhas de desenvolvimento" (p. 1549-1550). Nessa perspectiva, a educação universitária é posta enquanto "[…] suporte de qualificação dos agentes para inserção nos jogos de poder em condições mais favoráveis de negociação e incidência política". Quanto ao perfil do egresso, esse curso pretende formar agentes de desenvolvimento ou etnogestores; a licenciatura habilita os egressos a atuarem nas séries finais do ensino fundamental e no ensino médio, sobretudo nas áreas de conhecimento ligadas às Ciências Humanas e Sociais.

Para além de suas finalidades formais, instituídas no Projeto Pedagógico, esses cursos estão situados em processos sociais que nascem do encontro entre campesinato e campo acadêmico, visando dar continuidade a uma forma coletiva de existência em condições atualizadas pelo capital cultural universitário, imprescindível à manutenção do capital político na atualidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A composição do espaço social e, nele, as formas de capitais legitimadores do grupo do movimento social da região são atualizadas conforme os recursos pelos quais se disputa e os pares antagônicos ou de diálogo com os quais se faz a luta, tal não é outra a natureza da classe realizada ou mobilizada, como a trajetória desse grupo expõe.

O desafio de profissionalização da agricultura e dos agentes dos quadros institucionais da ação coletiva para a manutenção de sua posição distintiva, como se vê, teria se dado pelas necessidades impostas pela gestão financeira das organizações sociais tendo em vista o volume de recursos comparado ao de décadas anteriores, num quadro regional onde se tem o mínimo de assistência técnica pública e uma notável falta de habilidade gerencial das direções de organizações sindicais. Os questionamentos internos e externos ao grupo parecem revelar, além da fragilidade técnica/gerencial, uma fragilização simbólica da distinção do grupo do movimento social da região; assim, é também sua existência que passa a ser questionada, quando se pensa que existir é também ser reconhecido como legitimamente diferente (Bourdieu, 1989BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertand Brasil, 1989.).

Uma das formas para a reprodução da posição de classe dá-se pela modificação dos capitais de origem, pela reconversão deles em tipos de capitais mais rentáveis e/ou mais legítimos, possibilitando movimentos transversais e horizontais nas relações entre os campos que compõem o espaço social (Bourdieu, 2007BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Edusp; Porto Alegre: Zouk, 2007.). A formação universitária e, decorrente dela, o diploma de ensino superior, no contexto do campesinato por mim estudado, são pensados como instrumento de reconversão dos capitais diferenciadores, principalmente da classe ou grupo dirigente, portanto são condição de continuidade da posição social daquele campesinato nas relações que o constituem.

A reprodução do campesinato, tradicionalmente, não está garantida pela escola. Sintomático disso é o fato de que os estudos sobre a relação condição camponesa e reprodução social recorrem com frequência à análise de práticas socioprodutivas e, especialmente, à relação terra-família como mobilizadores de estratégias para a transmissão do patrimônio e sucessão. A escolarização, por vezes, é identificada em etnografias clássicas como algo disfuncional às estratégias de reprodução de famílias camponesas. Aqui situo, entre outros, o estudo realizado por Bourdieu (1962BOURDIEU, Pierre. Célibat et condition paysanne. Études Rurales, n. 5/6, p. 32-135, 1962.) acerca do costume sucessório na região de Béarn, sudoeste da Franca, em que as estratégias matrimoniais, antes balizadas pela tradição, por uma espécie de acordo social em que o primogênito das famílias camponesas teriam preferência nos casamentos, são transformadas pelo aumento da escolarização entre as moças que, obtendo títulos escolares e novas ideias possibilitadas pela escolarização, passam a projetar no meio urbano seus projetos de vida, recusando a casar-se com rapazes do campo. Derivou disso o aumento do celibato e, com ele, a crise do sistema de transmissão do patrimônio familiar, bem como da própria condição camponesa.

Na conjuntura do campesinato da região Transamazônica e Xingu, a titulação escolar técnica, profissional e o conhecimento acadêmico, especialmente agroecológico, mas também um saber pedagógico sensível às necessidades de consolidação da agricultura familiar, tornaram-se uma espécie de bem a ser disputado em uma luta pela autoridade científica, para falar politicamente em nome da região e nela atuar, gerindo os programas e projetos em curso implementados pela ação coletiva e se fazer presente na ação pública. Esse seria o conteúdo mobilizador não mais só da busca de formação escolar ou universitária, mas de uma formação capaz de ampliar o protagonismo do grupo do movimento social da região. Por essa razão, a educação diferenciada, ao servir a esses propósitos lidos a partir da sociologia bourdieusiana como estratégias de reprodução social, é fortemente transformadora e tem construído ou reforçado uma relação sui generis entre o campesinato organizado em ação coletiva e o campo acadêmico.

  • 1
    Neste artigo, utilizo a noção de ação coletiva para me referir ao amplo conjunto de atores e agentes que, na trajetória de lutas pela permanência na terra a partir da colonização agrícola dirigida pelo Estado na década de 1970, têm protagonizado diversas formas de organização social representativa do campesinato na região Transamazônica e Xingu. Ações coletivas compreendem "[…] desde as manifestações elementares da ação de massa […] até aquelas marcadas pela presença de estruturas organizacionais racionalmente concebidas para a consecução de fins" (Azevedo e Prates, 1991AZEVEDO, Sergio de; PRATES, Antônio Augusto Pereira. Planejamento participativo movimentos sociais e ação coletiva. In: ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO. Ciências sociais hoje. São Paulo: Vértice, Editora Revista dos Tribunais, 1991. p. 122-152., p. 124). Atualmente, na região Transamazônica e Xingu, as ações coletivas camponesas são aglutinadas pela Fundação Viver, Produzir e Preservar (FVPP), constituída por lideranças regionais.
  • 2
    Nesse período, entre 1999 a 2012, na Transamazônica paraense foram implementadas diversas turmas de PRONERA, desde a alfabetização de jovens e adultos à escolarização inicial e ao ensino médio. Na região Transamazônica e Xingu, a condução dessas turmas deu-se por meio da parceria entre o grupo do movimento social da região e o campus da UFPA de Altamira, com o protagonismo de docentes mais identificados com o campesinato.
  • 3
    Trata-se de categorização de reconhecimento social de pertencimentos e engajamentos em questões definidas por lutas coletivas. O pertencimento ou identificação com esses coletivos é um dos requisitos para ingresso naqueles cursos via PSE, no qual se exige a apresentação de documento de pertencimento social emitido pelas autoridades representativas dos respectivos coletivos.
  • 4
    A ambientalização é um processo sociopolítico em que as ações e projetos passam a ser pautados pelas questões ambientais e pela preocupação moral com o bom uso da natureza (Larrère e Larrère, 1997LARRÈRE, Catherine; LARRÈRE, Raffael. Do bom uso da natureza: para uma filosofia do meio ambiente. Lisboa: Instituto Piaget, 1997.).
  • 5
    Capital simbólico relaciona-se com a distinção social, prestígio, percebidos e revelados na posição de credibilidade ou de ser olhado com outros olhos, que atribui legitimidade aos portadores do mesmo (Bourdieu, 1989BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertand Brasil, 1989., p. 134).
  • 6
    O capital cultural neste contexto diz respeito ao capital em estado incorporado, ou seja, sob a forma de disposições duráveis do organismo; capital que se tornou parte integrante da pessoa como um habitus informado pelo capital social, enquanto rede durável de vinculação a um grupo (Bourdieu, 1989BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertand Brasil, 1989., p. 74).
  • 7
    Trata-se do Projeto de Consolidação da Produção Familiar Rural e Contenção dos Desmatamentos na Transamazônica e Baixo Xingu, no qual se previa, entre outras ações, a expansão das CFR em todos os municípios da Transamazônica e Xingu.
  • 8
    Forma de oferta adotada pela UFPA que permite o funcionamento de turmas fora da sede do campus/faculdade.
  • 9
    Diz respeito à organização dos horários e tempos de funcionamento das aulas dos dois cursos. As aulas ocorrem concentradas nos meses de janeiro e fevereiro/julho e agosto, em dois turnos, sendo oito horas diárias de aulas durante o Tempo Universidade. No Tempo Comunidade, fora do período de aulas presenciais, são realizadas as atividades complementares de pesquisa e estágios supervisionados.
  • Financiamento:

    O estudo não recebeu financiamento.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    22 Nov 2022
  • Revisado
    30 Jun 2023
  • Aceito
    11 Jul 2023
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