Resumos
A compreensão do mecanismo da visão em cores, sobretudo no Ensino Médio, é importante para a formação de um indivíduo capaz de acompanhar as tecnologias de imagem, o que o ajuda também a compreender como percebe as cores do mundo natural. Com base na teoria tricromática de Young-Helmholtz e fazendo uso de um LED tricolor RGB, em uma montagem de custo relativamente baixo, foi desenvolvido um aparato que permite ao professor mostrar como as cores podem ser adicionadas para a composição de outras, ou seja, a síntese aditiva de cores.
Palavras-chave: visão cromática; LED; Young-Helmholtz
Understanding the color vision mechanism, in high school in particular, is important in the formation of a person able to follows imaging technologies, which also helps to understand how he perceives the natural world colors. Based on Young-Helmholtz trichromatic theory and making use of a tri-color RGB LED, with relatively low cost assembly, it has been developed an apparatus that enables the teacher to show how colors can be added to compose other ones, i.e. additive synthesis.
Keywords: chromatic vision; LED; Young-Helmholtz
1. Introdução
O processo de composição das cores em aparelhos televisores, seja nos antigos tubos de raios catódicos ou nos modernos televisores de LED (da sigla em inglês para Light Emission Device que significa Dispositivo Emissor de Luz), utiliza a síntese aditiva de luzes nas cores vermelha, verde e azul [1,2], de acordo com a teoria tricromática de Young-Helmholtz [3]. Para Thomas Young (1773-1829) nossa retina seria composta de células receptoras capazes de se sensibilizarem com luzes nas cores vermelha, verde e violeta. Muitos anos mais tarde, Helmholtz (1821-1894) sugeriu a substituição da cor violeta pela azul, definindo assim a forma com que, a partir dessas três cores (Red, Green e Blue, em inglês ou RGB), poderíamos compor qualquer outra nova cor do espectro visível pelo olho humano [4]. Apesar dos estudos de Young datarem do século XVIII, somente em 1964 sua tese foi comprovada experimentalmente por duas equipes de pesquisadores independentes [5,6].
A relevância de se compreender as novas tecnologias, que já estão incorporadas em nosso dia a dia, deriva da necessidade de formação de um cidadão contemporâneo, atuante e solidário, com instrumentos para intervir e participar na realidade, como apontam as Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais [7]. É importante compreender também o desenvolvimento histórico antecessor a essas novas tecnologias, tanto quanto a influência que essas impõem a outros aspectos culturais como a arte fotográfica e cinematográfica, por exemplo. Outrossim, reafirmando a necessidade de se formar um cidadão crítico capaz de compreender a física a partir de sua contextualização histórica e social, o estudo da Óptica é rico em significado. A visão é um dos órgãos dos sentidos mais importantes para o ser humano, mas os fenômenos físicos aos quais ela remete tem perdido espaço nos currículos atuais para outros campos da Física.
Além da Física, a Biologia pode complementar o tema, analisando os aspectos fisiológicos da visão. É, portanto, uma forma de se introduzir na Biologia o estudo da estrutura do olho humano, chegando aos cones, que são as células responsáveis pela visão cromática.
O desenvolvimento dos LED's de alta potência e do LED azul, no início dos anos 1990 [8, 9], permitiu o desenvolvimento da luz branca de estado sólido (SSL). Com uma altíssima eficiência de conversão eletro-óptica ganhou rapidamente os mercados, substituindo gradativamente as lâmpadas incandescentes e fluorescentes. Apresentando uma maior durabilidade e baixo aquecimento foi logo incorporado aos dispositivos de imagem eletrônicos. Os criadores do LED azul foram agraciados com o Prêmio Nobel de Física em 2014 [10, 11].
A luz branca emitida pelo Sol pode servir de base para compreender que, de fato, quando vemos o branco, estamos estimulando igualmente os cones sensíveis às luzes vermelha, verde e azul. Com a ajuda de um prisma, como observou Isaac Newton [12], podemos verificar que a cor branca do sol é na verdade a superposição de luzes (ondas eletromagnéticas) de várias cores de comprimentos de onda distintos. O mesmo pode ser percebido num fenômeno natural bem conhecido de todos nós, o arco-íris, ou quando a luz branca incide na superfície de um disco compacto (ou CD na sigla em inglês para Compact Disc) ou um DVD (sigla em inglês para Digital Versatile Disc).
A suposição de que a luz branca é uma cor pura, ou seja, de frequência eletromagnética bem definida, pode ser facilmente derrubada com a explicação do fenômeno que ocorre com o prisma ou o arco-íris. Desta forma, podemos fazer com que o estudante perceba que, na verdade, quando vemos a luz branca estamos diante de luzes coloridas que sensibilizam nossos receptores, os cones, de uma forma bem balanceada. Ao receber esse estímulo, o cérebro determina que estamos diante da cor branca [1].
Com base nesse princípio, o experimento desenvolvido permite a composição de diversas cores, inclusive o branco, a partir de três cores básicas contidas no LED RGB, através do manuseio de potenciômetros. Além disso, ao produzir uma determinada cor o estudante pode decompô-la, como ocorre com a luz do sol em um arco-íris, e observar sua estrutura usando um DVD para difratar a luz proveniente do LED RGB, observando sua composição espectral [13,14]. Ao variar cada potenciômetro individualmente, o estudante pode perceber que está alterando a tonalidade daquela luz. A alteração da cor do LED RGB [15] pode ser acompanhada pela redução gradativa da intensidade da componente básica da luz dispersa pelo DVD.
A Figura 1 mostra a composição de cores pela síntese aditiva de algumas combinações simples. Ela pode ser utilizada em sala de aula, mostrando ao estudante de que forma podemos compor diversas outras cores através das luzes vermelha, verde e azul. O estudante poderá observar, ainda na figura 1, que na fronteira entre o azul e o verde há uma cor azul esverdeado, entre o azul e o vermelho há o rosa arroxeado e no encontro das cores verde e vermelha, o amarelo.
2. Arranjo Experimental
O aparato proposto pode ser montado com a participação de algum estudante mais motivado, ou com um interesse particular em eletrônica. Os componentes utilizados são descritos na Tabela 1.
A montagem da caixa pode ser feita com sobras de madeira, eucatex, acrílico, compensado ou até mesmo um papelão bem resistente. As dimensões utilizadas na caixa foram, aproximadamente, 11,5 cm x 15,0 cm x 4,5 cm, como pode ser visto na Figura 2a. Na Figura 2b, temos a caixa aberta para a visualização do seu interior, com todas as conexões estabelecidas. Os potenciômetros que podem ser vistos nas Figuras 2a são os potenciômetros deslizante (P1,P2,P3), enquanto que na Figura 2b são os potenciômetros de ajuste fino (P4 e P5). Após o ajuste, esses últimos são acondicionados no interior da caixa para que não tenham seus valores alterados por descuido.
(a) Vista superior da montagem com o LED RGB produzindo a cor branca e os demais com brilho atenuado. Os três potenciômetros estão deslocados em direção ao LED RGB. (b) Vista interna onde podem ser observados os potenciômetros de ajuste fino e as pilhas de alimentação.
O LED RGB é composto de três LED's encapsulados em um mesmo invólucro e com o terminal anodo como comum, ou seja, esse LED corresponde a três LED's e pode ser visto na figura 2b, entre as duas chaves (Ch1 e Ch2). Na outra extremidade são colocados os outros três LED's, na sequência (R,G,B). Temos então 3 pares de LED's nas cores vermelha, verde e azul.
O esquema do circuito eletrônico é apresentado na Figura 3. Os pares de LED's de mesma cor são alimentados por fontes individuais (3V) conectadas através do ponto central do respectivo potenciômetro (P1,P2 ou P3). Ao se alterar a posição de um dos potenciômetros modificamos as resistências que alimentam os circuitos de cada um dos LED's do determinado par. Dessa forma, ao se alterar a posição de um potenciômetro a intensidade do brilho é comutada entre os LED's da mesma cor.
Os resistores R1 a R6 de 100 Ω limitam a corrente nos LED's para não danificá-los. Os potenciômetros P4 e P5, ambos de 10 kΩ, são usados para um ajuste no brilho dos LED's vermelhos. A sugestão de procedimento a ser adotado é começar pela produção da cor amarela no LED RGB, colocando os potenciômetros P1 e P2 nas posições em que a luz do LED RGB fique com maior brilho, e o P3 com mínimo de azul no RGB. A cor a ser obtida deve ser a amarela. Para isso, ajusta-se o potenciômetro P4 até obter essa cor. O ajuste do potenciômetro P5 é para que os LED's individuais fiquem com brilhos equivalentes, quando todos acesos. Os valores que permitiram um funcionamento adequado para o experimento foram P4 ≈ 150 Ω, e P5 ≈ 1,2 kΩ. Como esses valores de ajuste fino podem variar muito em função do estado de uso das pilhas, além das características técnicas de cada LED, é interessante manter os potenciômetros de ajuste de valor de 10 kΩ. Sugerimos, ainda, fazer uma calibração antes de começar a usar o aparato em uma nova sessão de experiências.
A necessidade de se usar os dois potenciômetros de ajuste decorre do fato do LED vermelho operar com valores de tensão bem mais baixos que os das demais cores (em torno de 1,5 a 2,0V).
Como os LED's possuem uma lente em seu topo, a luz emitida é bem direcional e, no caso do LED RGB, é possível perceber as três fontes luminosas de cores de forma distinta, quando se olha bem de perto. O uso do papel fosco ou vegetal permite que a luz emitida pelos LED's fique mais difusa e possa ser observada em diferentes ângulos. No caso do LED RGB, permite ainda que as cores se misturem de forma a se observar um padrão de cor homogêneo.
A Figura 4 permite visualizar a comutação entre os LED's individuais (parte superior da figura) e os LED's no RGB. A chave Ch1 aciona o LED RGB (embaixo na figura) e a outra Ch2 aciona os demais LED's (na parte superior da figura). Isso permite que inicialmente seja mostrado aos estudantes que variando os potenciômetros estamos variando o brilho de cada um dos três LED's individuais, quando apenas a chave Ch2 está acionada. Ao ligarmos as duas chaves (Ch1e Ch2),os estudantes podem perceber que enquanto o brilho que está sendo modificado no LED individual (aumentando ou diminuindo), o brilho da cor correspondente no LED RGB se altera de forma complementar.
Quatro exemplos de composição. (a) Todos os potenciômetros estão direcionando a corrente elétrica em direção aos LED's RGB gerando a cor branca. (b) O LED vermelho está totalmente aceso enquanto que no RGB os LED's verde e azul produzem uma cor azul esverdeado. (c) O LED verde está com todo brilho enquanto que o vermelho e azul brilham no RGB compondo a cor violeta. (d) O LED azul brilha e no RGB apenas o vermelho e o verde produzem o amarelo.
Para analisar a distribuição espectral da luz composta no LED RGB, foi utilizado um DVD do qual a camada prateada foi removida. Como ele é composto de dois discos laminares, para retirar a camada prateada basta pressionar a junção dos dois discos pelo orifício central com uma haste pontiaguda. Pode ser uma chave de fenda bem fina ou a ponta de uma tesoura. Em seguida, ao girar a haste provoca-se o descolamento das duas superfícies. Aplicando uma fita adesiva no que restar de metal do disco inferior, retiram-se completamente os resíduos prateados, ou seja, a camada de gravação. O uso do DVD permite um resultado muito melhor que com um CD, que também pode ser utilizado. O DVD assim trabalhado deve ser posicionado sobre o LED RGB, centrando-o sobre este. Um suporte feito com arame, como os encontrados em garrafas de espumante, pode ser utilizado para apoiar o DVD sobre o LED RGB, como mostra a Figura 5.
3. Resultados
Os resultados obtidos com o experimento podem ser observados nas Figuras 4a, 4b, 4c e 4d. A Figura 4a mostra todos os três potenciômetros posicionados para baixo o que faz com que o brilho das três cores do LED RGB atinja seu máximo. Ao mesmo tempo, os três LED's superiores têm seus brilhos reduzidos ao mínimo. O LED RGB produz uma cor que, visualmente, percebemos como branca.
Na Figura 4b o brilho da cor vermelha do LED RGB é reduzido restando, neste LED, apenas as cores verde e azul. A percepção visual sugere a cor azul esverdeado. Pode-se observar que o LED superior vermelho aumenta seu brilho ao máximo.
Na Figura 4c o potenciômetro do vermelho retorna para a posição inferior e o da cor verde vai para seu ponto superior máximo. Ao se fazer isso, diminui-se toda a intensidade da luz verde do LED RGB e aumenta-se o brilho do LED superior verde ao máximo. O LED RGB produz uma resposta visual de se estar diante de uma cor violeta.
Retornando o potenciômetro do verde a sua posição inferior e elevando o potenciômetro do azul ao seu topo, pode-se observar que o brilho do LED azul superior aumenta consideravelmente e a cor azul do LED RGB é reduzida. Nesse momento, o LED RGB está apenas com as cores vermelha e verde acesas, o que produz a sensação visual da cor amarela.
Ao manusear os potenciômetros de diferentes formas, o estudante pode compor inúmeras outras cores e compreender que cada cor que ele produz é a combinação das três cores básicas dos três LED's, nas proporções que ele define.
Utilizando o DVD devidamente preparado, como é descrito anteriormente, e posicionando-o de forma que o orifício coincida com o LED RGB (Figura 5), pode-se observar o quanto de vermelho, verde e azul aquela cor formada é composta.
Na figura 5 os potenciômetros estão posicionados na mesma posição da figura 4a, gerando a cor branca. Com uso do DVD observamos o quanto destas três cores estão contidas no LED RGB. O mesmo pode ser feito para qualquer outra cor, evidenciando ao estudante que a cor que enxergamos é o produto da sensibilização dos cones sensíveis ao vermelho, ao verde e ao azul, o que constitui uma característica puramente fisiológica.
4. Conclusão
O aparato desenvolvido, com custo relativamente baixo (inferior a R$ 50,00) e de montagem simples, atendeu a proposta inicial de produzir cores através do processo da síntese aditiva. De forma lúdica, os estudantes têm acesso a um equipamento que pode ser facilmente manuseado.
Em oposição ao processo de síntese subtrativa usada, por exemplo, nas misturas de tintas, esse material instrumentaliza o processo de compreensão da síntese aditiva de cores. Através da transferência do brilho luminoso de um LED de determinada cor para a cor correspondente do LED RGB, o estudante controla e visualiza a composição da cor gerada aditivamente. Além disso, ele pode analisar o espectro de emissão da luz produzida pelo LED RGB em suas componentes básicas através do uso do DVD.
Referências
- 1 Ricardo Barthem, A Luz, Temas Atuais de Física (Editora Livraria da Física, São Paulo, 2005), 1ª ed.
- 2 Constantino Pérez Veja y José Mª Zamanillo Sainz de la Mazza, Fundamentos de Televisión Analógica y Digital (Servicio de Publicaciones de la Universidade de Cantabria, Santander, 2003).
- 3 Luís Miguel Bernardo, História da Luz e das Cores (Editora UP, Porto, 2009), v. I, 2ª ed.
- 4 P.K. Kaiser and R.M. Boynton, Human Color Vision (Optical Society of America, Washington, 1996), 2ª ed., p. 563-579,
- 5 W.B. Marks, W.H. Dobelle and E.F. MacNichol Jr., Science 143, 1181 (1964).
- 6 Paul K. Brown and George Wald, Nature 200, 37 (1963).
- 7 Brasil, Parâmetros Curriculares Nacionais + (PCN+) - Ciências da Natureza e suas Tecnologias (Ministério da Educação, Brasília, 2002), p. 26-27.
- 8 H.M. Kito Amano, K. Hiramatsu and I. Akasaki, Jpn. J. Appl. Phys. 28, L2112 (1989).
- 9 B. Brilliant Johnstone, Shuji Nakamura and the Revolution in Lighting Technology (Prometheus Books, Amherst, 2007).
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10 The Nobel Prize in Physics 2014, disponível em http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/physics/laureates/2014/, acessado em 18/1/2016.
» http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/physics/laureates/2014/ -
11 Felipe Rudge, Por que Prêmio Nobel para o LED azul Opinião, 23 de outubro de 2014, disponível em http://www.sbfisica.org.br/v1/index.php?option=com_content&view=article&id=604:por-que-premio-nobel-para-o-led-azul&catid=150:opiniao&Itemid=316, acessado em 19 /1/2016.
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- 13 Nilson Marcos Dias Garcia e Hypolito Jose Kalinowski, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 21, 332 (2004).
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14 L.J. Jonathas, Uma Abordagem experimental para o Ensino da Quantização da Luz Dissertação de Mestrado em Ensino de Física, UFRJ, 2015. Disponível em http://objdig.ufrj.br/12/teses/828142.pdf, acessado em 9/3/2016.
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» http://www.cree.com/~/media/Files/Cree/LED-Components-and-Modules/XLamp/XLamp-Application-Notes/LED_color_mixing.pdf
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Set 2016
Histórico
-
Recebido
26 Jan 2016 -
Revisado
12 Mar 2016 -
Aceito
11 Abr 2016