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E se a energia não se conserva? Um estudo sobre o escoamento d’água em um recipiente por meio de um orifício circular

What if energy is not conserved? A study on water flow through a circular orifice in a container

Resumos

Compreender as limitações e as potencialidades dos modelos científicos é uma das dimensões da aprendizagem da Física. Uma alternativa para proporcionar essa compreensão é por meio da investigação experimental focada na avaliação das implicações das idealizações consideradas nesses modelos. Inseridos neste contexto, apresentamos uma investigação sobre o escoamento de fluidos em orifícios. Começamos analisando um modelo amplamente explorado em livros didáticos em que, pautado pela equação de Bernoulli, não são consideradas perdas de energia. Mostramos, a partir de dados experimentais coletados com videoanálise, que esse modelo não é adequado para representar o escoamento d’água, mesmo em orifícios com área menores do que 1% da área da superfície de fluido no recipiente. Propomos, então, um modelo de escoamento dissipativo mobilizando conceitos de hidrologia pouco usuais no ensino de Física. Mostramos que as predições desse modelo são corroboradas experimentalmente. Desse modo, o artigo é uma alternativa experimental para quem deseja explorar um problema de hidrodinâmica com enfoque no processo de modelagem científica, procurando, ao mesmo tempo, fomentar a aprendizagem conceitual e a compreensão do caráter representacional do conhecimento.

Palavras-chave:
Hidrodinâmica; escoamento; vazão; modelagem científica


Understanding the limitations and potentialities of scientific models is a crucial aspect of learning Physics. One method to foster this understanding is through experimental investigation focused on assessing the implications of the idealizations considered in these models. Within this context, we present a study on fluid flow through orifices. We begin by analyzing a model widely explored in textbooks which, based on Bernoulli’s equation, does not account for energy losses. From experimental data collected via video analysis, we demonstrate that this model is inadequate for representing water flow, even in orifices with areas smaller than 1% of the fluid surface area in the container. Consequently, we propose a dissipative flow model, incorporating hydrology concepts that are rarely used in Physics education. We show that the predictions of this model are experimentally corroborated. Thus, this paper offers an experimental alternative for those wishing to explore a hydrodynamics problem with a focus on the scientific modeling process, aiming simultaneously to promote conceptual learning and understanding of the representational nature of knowledge.

Keywords
Hydrodynamics; flow; discharge; scientific modeling


1. Introdução

Toda teorização no campo científico demanda, invariavelmente, a construção de representações dos objetos/eventos investigados [1[1] M. Bunge, Teoria e Realidade (Perspectiva, São Paulo, 1974).]. Na Física, as noções de gás ideal, fluido incompressível e corpo pontual, por exemplo, referem-se a construtos idealizados, em que elementos do que é representado são desprezados. No ensino de Física, no entanto, não é raro que as influências dessas idealizações sejam esquecidas, provocando uma dissociação entre os modelos científicos e as condições e restrições envolvidas em sua construção [2[2] R.V. Brandão, I.S. Araújo e E.A. Veit, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 28, 507 (2011)., 3[3] L.A. Heidemann, I.S. Araujo e E.A. Veit, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 33, 3 (2016).]. Na medida em que apaga a razão de ser do conhecimento a ser ensinado, ou seja, o porquê e para que ele existe, a transposição didática torna o produto da teorização uma complexa rede de informações carente de sentido e significado.

Da perspectiva da modelagem científica, compreender a razão de ser do conhecimento demanda conhecer os referentes, ou seja, os objetos reais alvos das representações construídas, e as condições em que eles são representados [2[2] R.V. Brandão, I.S. Araújo e E.A. Veit, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 28, 507 (2011)., 3[3] L.A. Heidemann, I.S. Araujo e E.A. Veit, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 33, 3 (2016).]. Entender, portanto, o porquê e para que existe o modelo de gás ideal, por exemplo, demanda compreender que tipos de gases se pretende representar e, especialmente, as condições em que esses gases se encontram.

Uma forma de enfatizar o papel das representações no ensino de Física é por meio de atividades experimentais focadas na avaliação da adequação dos modelos científicos para representar aparatos específicos, assim como na expansão desses modelos para representar objetos/eventos em que as idealizações impostas aos modelos não são suficientemente respeitadas [4[4] L.A. Heidemann, I.S. Araujo e E.A. Veit, Rev. Bras. Ensino Fís. 38, 1504 (2016).]. Por exemplo, o modelo de escoamento de um líquido de um recipiente por meio de um orifício na sua lateral é amplamente explorado em livros didáticos [5[5] D. Halliday, R. Resnick e J. Walker, Fundamentos de Física (LTC, Rio de Janeiro, 2016), v. 2, 10 ed.,6[6] H.D. Young e R.A. Freedman, Física II: Termodinâmica e Ondas (Pearson Education do Brasil, São Paulo, 2016), 14 ed.8[8] R.H. Doca, G.J. Biscuola e N.V. Boas, Tópicos de Física 1 (Editora Saraiva, São Paulo, 2012), 21 ed.]. Partindo da equação de Bernoulli, conclui-se que a vazão volumétrica ϕ de líquido pelo orifício é dada por:

(1) ϕ = A V = A 2 g Y ,

onde A é a área do orifício, V é a intensidade da velocidade de saída do fluido pelo orifício, g é a intensidade da aceleração gravitacional local e Y, a diferença de altura da água no recipiente e do orifício lateral. Menos frequente, no entanto, são discussões sobre as limitações dessa predição, indicando claramente em que condições o modelo explorado representa os eventos de forma suficientemente precisa1 1 Ainda que usualmente os livros explicitem que o tamanho do orifício de saída é considerado pequeno comparado com a abertura do recipiente, uma consulta não exaustiva nos mostrou que é frequente que os livros não mencionem a idealização de que não ocorrem perdas de energia nesse modelo, o que é um aspecto fundamental da sua construção. [5[5] D. Halliday, R. Resnick e J. Walker, Fundamentos de Física (LTC, Rio de Janeiro, 2016), v. 2, 10 ed., 7[7] P.A. Tipler e G. Moscsa, Física para cientistas e engenheiros (LTC, Rio de Janeiro, 2019), v. 1, 6 ed., 9[9] C.S. Calçada e J.L. Sampaio, Física Clássica: Mecânica (Editora Atual, São Paulo, 2012), v. 1, 1 ed.]. Veremos neste artigo, por exemplo, que a vazão predita na Eq. 1 demanda a idealização de que a área do orifício do recipiente é desprezível quando comparada com a área da superfície livre do líquido no recipiente e que, partindo da equação de Bernoulli, pressupõe-se a conservação de energia no escoamento do fluido. Em que condições essas suposições são adequadas? Como podemos abordar situações em que elas não são adequadas? Do ponto de vista da modelagem científica, essas perguntas podem ser enunciadas como: Qual é o domínio de validade desse modelo científico? Como esse modelo científico pode ser expandido para ampliarmos o seu domínio de validade?

Na medida em que experimentos didáticos são delineados e conduzidos com o objetivo de proporcionar respostas a perguntas como essas, centradas na investigação das implicações das idealizações e aproximações dos modelos científicos, eles se consolidam como uma alternativa para promover a aprendizagem tanto sobre os conceitos da Física, como de elementos sobre a natureza do conhecimento científico, em particular sobre o seu caráter representacional [4[4] L.A. Heidemann, I.S. Araujo e E.A. Veit, Rev. Bras. Ensino Fís. 38, 1504 (2016).]. Inseridos neste contexto, neste artigo, focados na avaliação da adequação das predições da Eq. 1 para representar a vazão de um fluido por um orifício em uma proveta de laboratório de 1 L, investigamos a concordância dessas predições com os dados experimentais coletados em casos em que água escoa por orifícios com diferentes diâmetros. Oferecendo uma alternativa para os casos em que o orifício do recipiente tem dimensões não desprezíveis e que perdas de energia não são desprezíveis, apresentamos uma expansão do modelo mobilizando conceitos pouco debatidos no campo da Física, como o de coeficiente de descarga Cd, um coeficiente usado para ajustar a vazão levando em consideração as perdas de energia durante o escoamento do fluido. Especificamente, tomamos uma correção da vazão representada na Eq. 1 denominada vazão corrigida ϕc, dada por:

(2) ϕ c = C d ϕ = C d A V = C d A 2 g Y .

Uma avaliação da capacidade descritiva das predições da Eq. 2 em relação aos dados também é realizada. Adotamos a noção de modelo científico de Mario Bunge como base para a construção dos modelos propostos, assumindo que “um modelo teórico é um sistema hipotético dedutivo que concerne a um objeto-modelo, que é, por sua vez, uma representação esquemática de uma coisa ou de uma situação real ou suposta como tal” [1[1] M. Bunge, Teoria e Realidade (Perspectiva, São Paulo, 1974)., p. 16]. A modelagem, por outro lado, é entendida “mais do que como uma ferramenta útil para a resolução de problemas, [. . . mas como uma] forma significativa para uma visão de ciência adequada à prática científica moderna, cuja essência está na criação de modelos” [10[10] R.V. Brandão, I.S. Araújo e E.A. Veit, Física na Escola 9, 10 (2008)., p. 11].

Em suma, oferecemos uma alternativa experimental para quem deseja explorar um problema de hidrostática com enfoque no processo de modelagem científica, procurando, ao mesmo tempo, fomentar a aprendizagem conceitual e a compreensão do caráter representacional do conhecimento. Na Seção 2 2. Um Modelo de Escoamento não Dissipativo A região norte do estado de Mato Grosso é um polo agrícola, com grande produção pecuária também. Enormes caixas de água são instaladas em muitas das fazendas, com altura de mais de 7 metros em relação ao solo, para garantir o abastecimento dos cochos de água para o gado, por exemplo. Em certas oportunidades, é preciso esvaziar as caixas de água, para limpeza ou outro motivo, o que provoca perguntas como: i. De que modo varia a altura da superfície da água em função do tempo? ii. Como varia a vazão em função do tempo ou do nível da água em relação ao orifício? iii. Qual é o tempo transcorrido até o nível da água alcançar o orifício? iv. De que forma muda o alcance do jato de água na medida em que o nível da água diminui? Para encontrar respostas para perguntas como essas, concebemos um objeto-modelo representado na Figura 1. Trata-se de um cilindro (inicialmente fechado por uma tampa) pelo qual um fluido contínuo escoa pelo orifício, situado na posição 2. Figura 1 Sistema S composto de um cilindro fechado contendo líquido volátil. O ponto 1 indica a superfície do líquido num dado instante e o ponto 2, a saída do líquido. Em uma primeira abordagem, vamos supor as seguintes idealizações: i. o fluido é incompressível, ou seja, a densidade do fluido ρ é constante em qualquer elemento de volume do cilindro; ii. o fluido é não viscoso, ou seja, é desprezada a conversão da energia cinética do fluido em energia interna por forças viscosas, como o contato do fluido com as paredes do cilindro; iii. o orifício possui uma entrada e saída arredondada, além de uma superfície interna lisa, minimizando assim as perdas por atrito e iv. não há efeitos de tensão superficial no fluido ao sair do orifício. Feitas essas considerações, pode-se assumir a conservação de energia no escoamento e, usando a equação de Bernoulli e a equação da Continuidade, pode-se eliminar a velocidade do fluido no ponto 1, concluindo-se que: (3) V 2 = 2 ρ ( P 1 − P 0 ) + ρ g Y 1 − r R 4 , onde V2 é a intensidade da velocidade do fluido no ponto 2; P0, a pressão atmosférica (igual à pressão P2 no ponto 2); P1, a pressão no ponto 1; g, a aceleração gravitacional local; Y, a altura da superfície do líquido no recipiente em relação ao ponto 2 em um dado instante do escoamento; r, o raio do orifício; e R, o raio do cilindro, como ilustrado na Figura 1. A situação particular que nos interessa aqui é a amplamente explorada nos livros didáticos, considerando a tampa do cilindro aberta. Nesse caso, P1 = P2 = Po, e a Eq. 3 fica reduzida a: (4) V 2 = 2 g Y 1 − r R 4 . Considerando ainda a idealização de que r ≪ R, ou seja, de que o orifício é muito menor do que a área da superfície superior do cilindro, assumimos que 1−rR4≈13 e, portanto, a Eq. 4 se reduz a: (5) V 2 = 2 g Y . Podemos encontrar uma solução analítica do tipo Y (t) considerando que a vazão ϕ pelo orifício, dada por ϕ = πr2V2, é igual à taxa de variação do volume V de líquido no recipiente acima do orifício, de modo que, usando a Eq. 5: (6) ϕ = π r 2 V 2 = π r 2 2 g Y = − d V d t = − d d t ( π R 2 Y ) = − π R 2 d Y d t . Reordenando os termos e integrando dos dois lados, temos: (7) ∫ H − h Y d Y ′ Y ′ = − r R 2 2 g ∫ 0 t d t ′ . Resolvendo as integrais e isolando a altura Y da superfície da água, temos: (8) Y = H − h − g 2 r R 2 t 2 . Na próxima seção, apresentamos um experimento realizado para investigar a adequação do modelo de escoamento não dissipativo para representar o escoamento da água por um orifício na lateral deem uma proveta de 1 L. Particularmente, avaliamos as predições da Eq. 8. , começamos apresentando os resultados de um experimento que visa validar empiricamente a Eq. 1. Os dados foram coletados por meio de videoanálise, utilizando o software livre Tracker2 2 Tracker, software livre da Open Source Physics. Acessível em: https://www.compadre.org/osp/. , durante o escoamento da água contida em uma proveta de 1L por um orifício na sua lateral. Da constatação de que o modelo utilizado não se adéqua ao evento investigado, apresentada na Seção 3 3. Investigação Experimental do Modelo de Escoamento não Dissipativo Para a investigação do modelo teórico exposto na Seção 2, foram coletados vídeos do escoamento da água contida em uma proveta de 1 L de volume, com uma câmera de smartphone de 30 quadros por segundo (um quadro de um dos vídeos é exposto na Figura 2). Para garantir melhor visibilidade do fluido nas imagens, usamos corante vermelho. Durante a investigação, foram gravados vídeos em seis condições diferentes4, em que a área do orifício foi progressivamente aumentada de aproximadamente 0,3% a 2,5% da área da superfície da água na proveta. Especificamente, os diâmetros d = 2r dos orifícios utilizados foram (3,4 ± 0,1) mm, (4,5 ± 0,1) mm, (5,2±0,1) mm, (7,1±0,1) mm, (8,3±0,1) mm e (10,0±0,1) mm. As outras características do aparato, usando as definições apresentadas na Figura 1, foram H = (0, 340 ± 0, 001) m, h = (0, 068 ± 0, 001) m, D = 2R = (63, 5 ± 0, 1) mm. Usamos o valor de g = 9,78 m/s2, que é a aceleração da gravidade no município de Sinop/MT. Figura 2 Um jato d´água sai pelo orifício lateral existente em uma proveta de 1 L. Tanto o comprimento da linha escura (L = 42,3 ± 0,1 cm) do plástico retangular branco na base da bancada quanto o espaçamento das linhas graduadas da proveta (“1000 ml − 200 ml” = 27,1 ± 0,1 cm) são as referências consideradas na videoanálise. Particularmente, foi coletada a posição da superfície da água na proveta em função do tempo e o alcance do jato de água do orifício em função do tempo. Os dados de posição e tempo foram então analisados com o software Origin®. Na Figura 3, são apresentados os dados experimentais e a predição do modelo (Eq. 8) para os diâmetros de orifício de 3,4 mm, 4,5 mm e 5,2 mm (Figura 3.a), e 7,1 mm, 8,3 mm e 10,0 mm (Figura 3.b). Figura 3 Nível do líquido, experimental (em símbolos) e estimado pelo modelo (equação 8, em linhas), em função do tempo, para os diâmetros de orifício de (a) 3,4 mm (triângulos azuis e linha tracejada azul), 4,5 mm (círculos pretos e linha tracejada vermelha), 5,2 mm (quadrados verdes e linha sólida vermelha) e (b) 7,1 mm (quadrados azuis e linha tracejada azul), 8,3 mm (estrelas bejes e linha sólida beje) e 10,0 mm (círculos alaranjados e linha tracejada alaranjada). Constata-se, na Figura 3, que as predições do modelo estão distantes dos dados experimentais. Para o diâmetro de 4,5 mm (raio do orifício com aproximadamente 7% do raio da área da superfície do líquido no cilindro), identifica-se uma maior proximidade entre as predições e os dados empíricos. Conforme se aumenta ou se diminui o tamanho do orifício de saída, o modelo passa a ser menos adequado para representar o evento investigado, demandando considerações sobre a dissipação de energia no sistema. Na próxima seção, será apresentada uma expansão do modelo teórico explorado até aqui, incluindo efeitos dissipativos. Na sequência, avaliaremos o poder preditivo desse modelo para representar os dados experimentais, especialmente nos casos em que o orifício tem maior diâmetro. , procede-se, na Seção 4 4. Um Modelo de Escoamento Dissipativo No modelo não dissipativo da seção anterior, não se considerou perdas de energia que poderiam ocorrer, por ex., devido ao atrito com as paredes do orifício, atrito viscoso e tensão superficial na saída do fluido pelo orifício. No intuito de ampliar o domínio de validade do modelo já investigado, mobilizaremos, primeiramente, algumas definições da hidrologia que serão importantes para o estudo realizado. O escoamento de fluidos em orifícios, tubos curtos e vertedouros é de relevância pelas suas diversas aplicações: projetos de irrigação, bacias de detenção para controle de cheias urbanas, caminhões pipa, entre outros [11–13]. Um elemento característico do escoamento é a relação entre a espessura da parede (e) e o diâmetro do orifício (d), como é ilustrado na Figura 4. Os orifícios de parede fina/delgada, como na Figura 4a, em que e < r, são aqueles em que o jato de fluido não tem significativa aderência com a parede interna do orifício. Nos orifícios de parede grossa/espessa, como na Figura 4b, em que r < e < 3r, o jato adere à parede interna do orifício. Nos casos em que e > 3r, convenciona-se chamar o orifício de duto de tubulação, e não mais de orifício. Figura 4 Orifícios de (a) parede fina e (b) parede espessa. É considerada uma tubulação quando e > 3r. Ambas as figuras foram inspiradas em [12, p. 352]. Outro elemento característico do escoamento é a contração da secção transversal do jato ao sair do orifício, como ilustrado na Figura 5, que influencia a determinação da vazão volumétrica do orifício. Figura 5 Seção transversal do orifício (A) e do jato contraído (AC). A figura foi inspirada na referência [10, p. 352] e na referência [11, p. 13]. A relação entre a área transversal do jato AC e a área do orifício A é denominada coeficiente de contração CA: (9) C A = A C A . Porto [12] relata que o valor médio de CA é por volta de 0,62 para orifícios circulares, dependendo tanto do diâmetro do orifício quanto da altura do líquido no recipiente. Hicks e Slaton [14], a partir de um modelo simplificado, estimaram o valor de CA em 0,5. Além do coeficiente de contração, será útil utilizar também o coeficiente de velocidade CV, que é definido como a razão entre a intensidades da velocidade da seção transversal do jato v2r considerando a dissipação de energia, e a intensidade da velocidade V2i obtida pela Eq. 5: (10) C V = v 2 r V 2 i = v 2 r 2 g Y . Desse modo, pode-se readequar a Eq. 6 considerando os valores de CA e CA, culminando no que é chamado de vazão corrigida ϕc, que é dada por: (11) ϕ c = C A C V ϕ = C d ϕ = C d A 2 g Y , onde Cd = CA CV é denominado coeficiente de descarga. Esse coeficiente, portanto, quantifica o quão menor é a vazão do líquido em comparação com a vazão de escoamento sem perdas de energia, de modo que um Cd igual a 1 representaria um escoamento não dissipativo em acordo com a Eq. 6. Porto [12] apresenta valores de Cd para orifícios circulares, verticais, de parede fina (em que a espessura da parede é menor do que o raio do orifício) em função da altura do líquido e dos diâmetros desses orifícios. Para d = 2 cm, Cd varia entre 0,648 e 0,653 para altura do líquido entre 60 cm e 20 cm, respectivamente. Desse modo, é adequado considerar Cd aproximadamente constante para muitos propósitos. Reforçando tal constatação, foram realizadas medidas com o orifício na base do recipiente com diâmetros pequenos de 4,43 e 12,6 mm, obtendo-se coeficientes de descarga de 0,76 a 0,67, respectivamente [14], quando a altura do líquido variava entre 50 e 25 cm. Feitas essas considerações sobre as perdas de energia no sistema, podemos encontrar uma solução analítica do tipo Y (t) realizando procedimentos similares aos usados para deduzir a Eq. 8, e considerando que a vazão ϕc pelo orifício é igual à taxa de variação do volume V de líquido no recipiente acima do orifício. Desse modo, usando a Eq. 11, temos: (12) ϕ c = − d V d t = − π R 2 d Y d t = C d π r 2 2 g Y . Reordenando os termos e integrando dos dois lados, temos: (13) ∫ H − h Y d Y ′ Y ′ = − C d r R 2 2 g ∫ 0 t d t ′ . Resolvendo as integrais e isolando o nível Y da superfície da água, temos: (14) Y = H − h − C d g 2 r R 2 t 2 . A Eq. 14 representa o nível do líquido em função do tempo. Resultado similar é encontrado em [14], embora não sejam apresentados detalhes da dedução da equação. Para mensurar o coeficiente de velocidade CV, dado pela Eq. 10, é necessário estimar a intensidade da velocidade na saída do orifício v2r, a qual podemos inferir a partir das equações da cinemática para o movimento de um elemento de massa dm ejetado. A Figura 6 (uma ampliação da parte inferior da Figura 1) representa o elemento de massa dm pontual saindo do orifício tendo, no momento em que é ejetado do cilindro (t = 0) velocidade inicial horizontal v2r e posição inicial x(0) = 0 e y(0) = y0. Figura 6 Trajetória parabólica do elemento de massa dm. Desprezando qualquer força dissipativa do ar durante o seu movimento, consideramos a componente vertical do movimento como retilíneo uniformemente variado com aceleração g, e a componente horizontal, como retilíneo e uniforme com velocidade de intensidade v2r. Como forma de diferenciar as grandezas mobilizadas nas deduções cinemáticas realizadas aqui das usadas nas deduções relacionadas com a hidrodinâmica, usamos a letra minúscula y para representar a componente vertical da posição de dm e t’ para representar o tempo contabilizado a partir da saída do elemento dm do cilindro. Das equações da cinemática, constatamos que a intensidade da velocidade inicial v0x do elemento dm é: (15) v 0 x = x D 2 y 0 g , onde xD é o alcance do jato. Substituindo a Eq. 15 na Eq. 10, e considerando v0x = v2r, temos: (16) C V = x D 2 y 0 Y . É importante destacar aqui que, enquanto o nível d’água no recipiente diminui, o alcance do jato d’água é variável, dependendo implicitamente da altura do líquido Y, ou seja, xD = xD(Y). No modelo não dissipativo, isso indicaria uma dependência entre xD e Y, da forma xD∝Y. Será útil, ainda, avaliar a perda de energia cinética κ do fluido em relação ao valor previsto no modelo não dissipativo em função do valor de CV, que é dada por: (17) κ = Δ K K = 1 2 d m ( V 2 i 2 − v 2 r 2 ) / 1 2 d m V 2 i 2 = ( 1 − C V 2 ) . No que segue, apresentamos a investigação experimental do modelo de escoamento dissipativo. , à exposição de uma expansão desse modelo, incluindo elementos dissipativos, que é contrastada empiricamente na Seção 5 5. Investigação Experimental do Modelo de Escoamento Dissipativo Para investigar o modelo de escoamento dissipativo, usamos os mesmos dados de vazão apresentados na Seção 3, quando avaliamos as predições do modelo tradicionalmente debatido nos livros didáticos, que é não dissipativo. Na Figura 7 expomos esses dados com a predição do modelo dissipativo, tomando Cd como um parâmetro de ajuste. Em uma primeira análise, consideramos o valor do coeficiente de descarga Cd constante durante todo o escoamento no ajuste da curva. Usaremos esse valor constante de Cd para investigar a dependência temporal de CV e CA durante o escoamento. Observa-se, na Figura 7, que a predição do modelo expandido tem boa concordância com os dados experimentais para todos os valores de diâmetro considerados no presente estudo. Figura 7 Nível do líquido, experimental (em símbolos) e estimado pelo modelo (equação 14, em linhas), em função do tempo, para os diâmetros de orifício de (a) 3,4 mm (triângulos azuis e linha tracejada azul), 4,5 mm (círculos pretos e linha tracejada vermelha), 5,2 mm (quadrados verdes e linha sólida vermelha) e (b) 7,1 mm (quadrados azuis e linha tracejada azul), 8,3 mm (estrelas bejes e linha sólida beje) e 10,0 mm (círculos alaranjados e linha tracejada alaranjada). Na Figura 8 e na Tabela 1, sintetizamos informações geométricas do aparato experimental utilizado, como o diâmetro do orifício (d), raio do orifício (r) e a espessura da parede do cilindro (e). Para os menores diâmetros, os valores de Cd ≈ 0, 9 indicam que a vazão é aproximadamente 10% menor do que a vazão sem dissipação de energia. Para diâmetros maiores, por volta de d > 5 mm, Cd diminui com o aumento do diâmetro do orifício. Também são informados os valores dos coeficientes de descarga (Cd), a relação entre o raio do orifício e a espessura da parede do recipiente, assim como a classificação da parede do cilindro segundo a Figura 4. Figura 8 Coeficiente de descarga em função do diâmetro do orifício. O tamanho dos círculos indica a incerteza do valor de Cd. Observa-se que, para diâmetros maiores de 5 mm, Cd diminui significativamente. Tabela 1 Propriedades geométricas dos aparatos experimentais explorados: diâmetro do orifício (d), raio do orifício (r) e espessura da parede do cilindro (e). Além disso, apresenta-se também o coeficiente de descarga (Cd), a relação entre e e r, e a consequente classificação da parede do orifício. d(± 0,1 mm) Cd± 0,02 r = d/2(± 0,1 mm) e(± 0,1 mm) Relação entree e r (e/r) Classificaçãoda parede 3,4 0,85 1,7 2,5 1,5 Grossa (r < e < 3r) 4,5 0,94 2,3 2,5 1,1 Transição entre grossa e fina 5,2 0,87 2,6 2,5 1,0 Transição entre grossa e fina 7,1 0,70 3,6 2,5 0,7 Fina (e < r) 8,3 0,58 4,2 2,5 0,6 Fina (e < r) 10,0 0,42 5,0 2,5 0,5 Fina (e < r) Pode-se observar tanto na Figura 8 quanto na Tabela 1 que o coeficiente de descarga teve pouca variação para os três menores orifícios. Para orifícios maiores, d > 4,5 mm, Cd diminui de forma linear (Cd = 1,37 − 0,096d), indicando que, para determinado nível do líquido, dentro do intervalo aqui pesquisado, a vazão diminui linearmente com o diâmetro do orifício. Para aprofundar a compreensão dessa diminuição de Cd = CA CV, investigamos o coeficiente de velocidade (CV) e o coeficiente de contração (CA) dos jatos. Para avaliar CV, utilizamos os mesmos vídeos gravados para a coleta dos dados de Y, coletando agora o alcance do jato xD usando o software Tracker. Na Figura 9, são expostos os valores de CV calculados com a Eq. 16 em função do nível do líquido Y para todos os escoamentos investigados. Figura 9 Coeficiente de velocidade em função do nível do líquido para todos os diâmetros de orifício investigados. As incertezas dos valores estimados de CV também são mostradas. Observa-se na Figura 9 que todos os CV são aproximadamente constantes dentro da faixa de incerteza para níveis do líquido Y acima de 10 cm. Para valores de Y menores que 10 cm, CV diminui para todos os escoamentos, com diferentes diâmetros de orifício. As curvas de CV para os casos de parede fina, com diâmetros de 7,1 mm, 8,3 mm e 10,0 mm, indicam um valor aproximadamente constante dentro da incerteza (0,97 ± 0,03) para valores de Y acima de 10 cm. Isso indica perda da energia cinética da ordem de 6%. De forma similar, as curvas CV para diâmetros de 4,5 mm e 5,2 mm (para situações de transição entre parede grossa a fina, respectivamente) sinalizam que essa grandeza é aproximadamente constante (0,91 ± 0,04) para valores de Y acima de 10 cm, indicando uma perda de energia da ordem de 17%. A maior redução de velocidade é observada na curva relacionada ao orifício de menor diâmetro, de 3,4 mm, situação de parede grossa, na qual CV = (0, 81 ± 0,04), indicando uma velocidade do fluido com valor aproximadamente 20% menor do que o valor obtido com o modelo não dissipativo em todo o escoamento do líquido. Esse caso não tem, no entanto, o maior coeficiente de descarga Cd ajustado (Figura 8), o que é uma aparente contradição. Como, de acordo com a Eq. 11, a vazão corrigida ϕc é igual ao produto do coeficiente Cd e a vazão ϕ, poderia se suspeitar que a maior perda de vazão e, supostamente, de energia cinética, deveria ocorrer no caso com menor Cd, ou seja, para o maior diâmetro mostrado na Figura 8. No entanto, o caso de maior diminuição de velocidade do jato de água foi o de menor diâmetro, como acabamos de ver. Para aprofundar essa suposta contradição dos resultados, vamos analisar o escoamento associado ao orifício de 8,3 mm. A partir dos valores de CV, podemos obter a perda de energia cinética κ por meio da Eq. 17. Na Figura 10 expomos, para o escoamento no orifício de 8,3 mm, os valores de CA, CV, Cd e κ em função do nível do líquido Y. O coeficiente de descarga (Cd) é o parâmetro de ajuste, igual a 0,58, ao longo de todo o intervalo de Y considerado. Os coeficientes de velocidade (CV), determinados pela Eq. 10, foram calculados utilizando os dados experimentais do alcance do jato (xD), da altura do líquido (Y) e do parâmetro experimental y0. Os valores do coeficiente de contração (CA) foram obtidos a partir dos dados de Cd e CV, por meio da relação CA = Cd/CV, e plotados na Figura 10. Figura 10 CA, CV, Cd e κ em função do nível do líquido Y, para o escoamento no orifício de 8,3 mm. Observa-se na Figura 10 que os valores de CA e CV são especulares em relação à linha horizontal tracejada com valor constante 0,76. Essa linha surge porque, quando o nível do líquido Y tende a zero, CA = CV, de tal modo que temos, aproximadamente, Cd = CACV = CA2 = CV2 = 0,58, e a reta de simetria passa em Cd=0,58 ≈ 0,76. CACV=Cd=0,58 ≈ 0,76. Constata-se também que CV é aproximadamente constante para valores de Y maiores do que 10 cm e em virtude de Cd = CA CV, CA é também praticamente constante, e nessa faixa a perda de energia cinética é baixa. Os resultados indicam, como esperado: (i) uma constância de CA para valores de Y maiores que 10 cm e (ii) um aumento de CA para Y menores que 10 cm; nessa faixa há uma perda significativa de energia cinética. Os valores de CA indicariam que deva ocorrer uma contração do jato do fluido, uma vez que há pouca perda de energia cinética, principalmente em posições da superfície do fluido distantes do orifício. Em uma configuração experimental similar à utilizada no presente trabalho [15], com um tubo de diâmetro de 10,16 cm e um orifício de saída de 1,59 cm, os coeficientes de contração foram obtidos mantendo-se o nível do líquido constante durante o escoamento. Os resultados desse trabalho indicam que a contração do jato aumentou ligeiramente de 0,40 a 0,50, com um valor médio aproximado de 0,47. Em relação à perda de energia cinética do fluido, pode-se especular que se deva ao atrito (rugosidade na borda e na superfície interior do orifício) e à pressão de Laplace5 [16] que gera uma tensão superficial no orifício. Essa tensão superficial pode fazer com que o líquido forme um menisco na borda do orifício. Para menores alturas do líquido, ocorre uma menor pressão hidrostática, o que possibilita que a tensão superficial da água tenda a estancar o fluxo. Extrand [17], investigando o início e o término do fluxo de líquidos em um orifício em uma parede vertical, identificou que, ao adicionar lentamente água em recipiente com orifício suficientemente pequeno, o líquido subia além do orifício. Nenhum líquido fluía através do orifício até que uma altura crítica fosse alcançada. Também constataram que essa altura crítica diminuía com o aumento do diâmetro do orifício. Na Figura 11, mostramos os valores de κ (perda percentual de energia cinética) em função de Y para todos os orifícios investigados. Constatamos que os escoamentos apresentam um comportamento bastante similar tanto para os orifícios 4,5 mm e 5,2 mm, quanto para os orifícios 7,1 mm, 8,3 mm e 10,0 mm. Para todos os eventos, exceto para d = 3,4 mm, se identifica um valor de κ constante na faixa de Y entre 0,15 m a 0,28 m, e posteriormente aumenta com a diminuição de Y. No escoamento com d = 3,4 mm, κ é praticamente constante em toda a faixa de Y considerada. A explicação do comportamento de κ da Figura 11 é similar à realizada no parágrafo anterior, em que analisamos o escoamento no orifício de 8,3 mm. Figura 11 Perda percentual de energia cinética em função do nível do líquido Y para os escoamentos em todos os orifícios investigados. Perante os resultados mostrados, podemos inferir que os dados experimentais dão apoio empírico ao presente modelo de escoamento dissipativo. Um estudo envolvendo três modelos para explicar o escoamento lateral em cano de PVC como alternativas ao modelo tradicional foi realizado por Luchese e Pinheiro [18]. No modelo 1, os autores introduzem um coeficiente constante à equação de Bernoulli no orifício de saída. Nos modelos 2 e 3, é introduzido, além do termo constante do modelo 1, um termo relacionado à resistência ao escoamento, proporcional à velocidade para o modelo 2 e proporcional ao quadrado da velocidade para o modelo 3. Os resultados experimentais obtidos, para tamanhos de orifícios similares aos utilizados no presente trabalho, respaldam satisfatoriamente o modelo 3. Esse termo proporcional ao quadrado da velocidade no modelo 3 indicaria uma diminuição da energia cinética em relação ao modelo tradicional, tal como foi demonstrado no presente trabalho. . Por fim, encerramos o artigo propondo reflexões sobre as implicações dos resultados para o ensino de Física e de hidrodinâmica, particularmente.

2. Um Modelo de Escoamento não Dissipativo

A região norte do estado de Mato Grosso é um polo agrícola, com grande produção pecuária também. Enormes caixas de água são instaladas em muitas das fazendas, com altura de mais de 7 metros em relação ao solo, para garantir o abastecimento dos cochos de água para o gado, por exemplo. Em certas oportunidades, é preciso esvaziar as caixas de água, para limpeza ou outro motivo, o que provoca perguntas como: i. De que modo varia a altura da superfície da água em função do tempo? ii. Como varia a vazão em função do tempo ou do nível da água em relação ao orifício? iii. Qual é o tempo transcorrido até o nível da água alcançar o orifício? iv. De que forma muda o alcance do jato de água na medida em que o nível da água diminui?

Para encontrar respostas para perguntas como essas, concebemos um objeto-modelo representado na Figura 1. Trata-se de um cilindro (inicialmente fechado por uma tampa) pelo qual um fluido contínuo escoa pelo orifício, situado na posição 2.

Figura 1
Sistema S composto de um cilindro fechado contendo líquido volátil. O ponto 1 indica a superfície do líquido num dado instante e o ponto 2, a saída do líquido.

Em uma primeira abordagem, vamos supor as seguintes idealizações: i. o fluido é incompressível, ou seja, a densidade do fluido ρ é constante em qualquer elemento de volume do cilindro; ii. o fluido é não viscoso, ou seja, é desprezada a conversão da energia cinética do fluido em energia interna por forças viscosas, como o contato do fluido com as paredes do cilindro; iii. o orifício possui uma entrada e saída arredondada, além de uma superfície interna lisa, minimizando assim as perdas por atrito e iv. não há efeitos de tensão superficial no fluido ao sair do orifício.

Feitas essas considerações, pode-se assumir a conservação de energia no escoamento e, usando a equação de Bernoulli e a equação da Continuidade, pode-se eliminar a velocidade do fluido no ponto 1, concluindo-se que:

(3) V 2 = 2 ρ ( P 1 P 0 ) + ρ g Y 1 r R 4 ,

onde V2 é a intensidade da velocidade do fluido no ponto 2; P0, a pressão atmosférica (igual à pressão P2 no ponto 2); P1, a pressão no ponto 1; g, a aceleração gravitacional local; Y, a altura da superfície do líquido no recipiente em relação ao ponto 2 em um dado instante do escoamento; r, o raio do orifício; e R, o raio do cilindro, como ilustrado na Figura 1.

A situação particular que nos interessa aqui é a amplamente explorada nos livros didáticos, considerando a tampa do cilindro aberta. Nesse caso, P1 = P2 = Po, e a Eq. 3 fica reduzida a:

(4) V 2 = 2 g Y 1 r R 4 .

Considerando ainda a idealização de que rR, ou seja, de que o orifício é muito menor do que a área da superfície superior do cilindro, assumimos que 1rR413 3 Como é exposto na Seção 3, nos experimentos que realizamos, o maior orifício que investigamos tem r = 5,0 mm, e o recipiente utilizado tem R = 31,8 mm. Utilizando o teorema de Taylor, podemos constatar que 11−r/R4≈1+12 rR4+34 rR8, de modo que, para o nosso caso, 11−r/R4≈1+0,00489+0,000072≈1, com um erro menor do que 0,5%, o que indica que a aproximação matemática considerada não terá impacto significativo nas predições do modelo. e, portanto, a Eq. 4 se reduz a:

(5) V 2 = 2 g Y .

Podemos encontrar uma solução analítica do tipo Y (t) considerando que a vazão ϕ pelo orifício, dada por ϕ = πr2V2, é igual à taxa de variação do volume V de líquido no recipiente acima do orifício, de modo que, usando a Eq. 5:

(6) ϕ = π r 2 V 2 = π r 2 2 g Y = d V d t = d d t ( π R 2 Y ) = π R 2 d Y d t .

Reordenando os termos e integrando dos dois lados, temos:

(7) H h Y d Y Y = r R 2 2 g 0 t d t .

Resolvendo as integrais e isolando a altura Y da superfície da água, temos:

(8) Y = H h g 2 r R 2 t 2 .

Na próxima seção, apresentamos um experimento realizado para investigar a adequação do modelo de escoamento não dissipativo para representar o escoamento da água por um orifício na lateral deem uma proveta de 1 L. Particularmente, avaliamos as predições da Eq. 8.

3. Investigação Experimental do Modelo de Escoamento não Dissipativo

Para a investigação do modelo teórico exposto na Seção 2 2. Um Modelo de Escoamento não Dissipativo A região norte do estado de Mato Grosso é um polo agrícola, com grande produção pecuária também. Enormes caixas de água são instaladas em muitas das fazendas, com altura de mais de 7 metros em relação ao solo, para garantir o abastecimento dos cochos de água para o gado, por exemplo. Em certas oportunidades, é preciso esvaziar as caixas de água, para limpeza ou outro motivo, o que provoca perguntas como: i. De que modo varia a altura da superfície da água em função do tempo? ii. Como varia a vazão em função do tempo ou do nível da água em relação ao orifício? iii. Qual é o tempo transcorrido até o nível da água alcançar o orifício? iv. De que forma muda o alcance do jato de água na medida em que o nível da água diminui? Para encontrar respostas para perguntas como essas, concebemos um objeto-modelo representado na Figura 1. Trata-se de um cilindro (inicialmente fechado por uma tampa) pelo qual um fluido contínuo escoa pelo orifício, situado na posição 2. Figura 1 Sistema S composto de um cilindro fechado contendo líquido volátil. O ponto 1 indica a superfície do líquido num dado instante e o ponto 2, a saída do líquido. Em uma primeira abordagem, vamos supor as seguintes idealizações: i. o fluido é incompressível, ou seja, a densidade do fluido ρ é constante em qualquer elemento de volume do cilindro; ii. o fluido é não viscoso, ou seja, é desprezada a conversão da energia cinética do fluido em energia interna por forças viscosas, como o contato do fluido com as paredes do cilindro; iii. o orifício possui uma entrada e saída arredondada, além de uma superfície interna lisa, minimizando assim as perdas por atrito e iv. não há efeitos de tensão superficial no fluido ao sair do orifício. Feitas essas considerações, pode-se assumir a conservação de energia no escoamento e, usando a equação de Bernoulli e a equação da Continuidade, pode-se eliminar a velocidade do fluido no ponto 1, concluindo-se que: (3) V 2 = 2 ρ ( P 1 − P 0 ) + ρ g Y 1 − r R 4 , onde V2 é a intensidade da velocidade do fluido no ponto 2; P0, a pressão atmosférica (igual à pressão P2 no ponto 2); P1, a pressão no ponto 1; g, a aceleração gravitacional local; Y, a altura da superfície do líquido no recipiente em relação ao ponto 2 em um dado instante do escoamento; r, o raio do orifício; e R, o raio do cilindro, como ilustrado na Figura 1. A situação particular que nos interessa aqui é a amplamente explorada nos livros didáticos, considerando a tampa do cilindro aberta. Nesse caso, P1 = P2 = Po, e a Eq. 3 fica reduzida a: (4) V 2 = 2 g Y 1 − r R 4 . Considerando ainda a idealização de que r ≪ R, ou seja, de que o orifício é muito menor do que a área da superfície superior do cilindro, assumimos que 1−rR4≈13 e, portanto, a Eq. 4 se reduz a: (5) V 2 = 2 g Y . Podemos encontrar uma solução analítica do tipo Y (t) considerando que a vazão ϕ pelo orifício, dada por ϕ = πr2V2, é igual à taxa de variação do volume V de líquido no recipiente acima do orifício, de modo que, usando a Eq. 5: (6) ϕ = π r 2 V 2 = π r 2 2 g Y = − d V d t = − d d t ( π R 2 Y ) = − π R 2 d Y d t . Reordenando os termos e integrando dos dois lados, temos: (7) ∫ H − h Y d Y ′ Y ′ = − r R 2 2 g ∫ 0 t d t ′ . Resolvendo as integrais e isolando a altura Y da superfície da água, temos: (8) Y = H − h − g 2 r R 2 t 2 . Na próxima seção, apresentamos um experimento realizado para investigar a adequação do modelo de escoamento não dissipativo para representar o escoamento da água por um orifício na lateral deem uma proveta de 1 L. Particularmente, avaliamos as predições da Eq. 8. , foram coletados vídeos do escoamento da água contida em uma proveta de 1 L de volume, com uma câmera de smartphone de 30 quadros por segundo (um quadro de um dos vídeos é exposto na Figura 2). Para garantir melhor visibilidade do fluido nas imagens, usamos corante vermelho. Durante a investigação, foram gravados vídeos em seis condições diferentes4 4 Os vídeos estão disponíveis em: http://www.if.ufrgs.br/gpef/modelagem/escoamento_agua/. , em que a área do orifício foi progressivamente aumentada de aproximadamente 0,3% a 2,5% da área da superfície da água na proveta. Especificamente, os diâmetros d = 2r dos orifícios utilizados foram (3,4 ± 0,1) mm, (4,5 ± 0,1) mm, (5,2±0,1) mm, (7,1±0,1) mm, (8,3±0,1) mm e (10,0±0,1) mm. As outras características do aparato, usando as definições apresentadas na Figura 1, foram H = (0, 340 ± 0, 001) m, h = (0, 068 ± 0, 001) m, D = 2R = (63, 5 ± 0, 1) mm. Usamos o valor de g = 9,78 m/s2, que é a aceleração da gravidade no município de Sinop/MT.

Figura 2
Um jato d´água sai pelo orifício lateral existente em uma proveta de 1 L. Tanto o comprimento da linha escura (L = 42,3 ± 0,1 cm) do plástico retangular branco na base da bancada quanto o espaçamento das linhas graduadas da proveta (“1000 ml − 200 ml” = 27,1 ± 0,1 cm) são as referências consideradas na videoanálise.

Particularmente, foi coletada a posição da superfície da água na proveta em função do tempo e o alcance do jato de água do orifício em função do tempo. Os dados de posição e tempo foram então analisados com o software Origin®.

Na Figura 3, são apresentados os dados experimentais e a predição do modelo (Eq. 8) para os diâmetros de orifício de 3,4 mm, 4,5 mm e 5,2 mm (Figura 3.a), e 7,1 mm, 8,3 mm e 10,0 mm (Figura 3.b).

Figura 3
Nível do líquido, experimental (em símbolos) e estimado pelo modelo (equação 8, em linhas), em função do tempo, para os diâmetros de orifício de (a) 3,4 mm (triângulos azuis e linha tracejada azul), 4,5 mm (círculos pretos e linha tracejada vermelha), 5,2 mm (quadrados verdes e linha sólida vermelha) e (b) 7,1 mm (quadrados azuis e linha tracejada azul), 8,3 mm (estrelas bejes e linha sólida beje) e 10,0 mm (círculos alaranjados e linha tracejada alaranjada).

Constata-se, na Figura 3, que as predições do modelo estão distantes dos dados experimentais. Para o diâmetro de 4,5 mm (raio do orifício com aproximadamente 7% do raio da área da superfície do líquido no cilindro), identifica-se uma maior proximidade entre as predições e os dados empíricos. Conforme se aumenta ou se diminui o tamanho do orifício de saída, o modelo passa a ser menos adequado para representar o evento investigado, demandando considerações sobre a dissipação de energia no sistema. Na próxima seção, será apresentada uma expansão do modelo teórico explorado até aqui, incluindo efeitos dissipativos. Na sequência, avaliaremos o poder preditivo desse modelo para representar os dados experimentais, especialmente nos casos em que o orifício tem maior diâmetro.

4. Um Modelo de Escoamento Dissipativo

No modelo não dissipativo da seção anterior, não se considerou perdas de energia que poderiam ocorrer, por ex., devido ao atrito com as paredes do orifício, atrito viscoso e tensão superficial na saída do fluido pelo orifício. No intuito de ampliar o domínio de validade do modelo já investigado, mobilizaremos, primeiramente, algumas definições da hidrologia que serão importantes para o estudo realizado.

O escoamento de fluidos em orifícios, tubos curtos e vertedouros é de relevância pelas suas diversas aplicações: projetos de irrigação, bacias de detenção para controle de cheias urbanas, caminhões pipa, entre outros [11[11] J.H. Lienhard, Journal of Fluids Engineering 106, 13 (1984).13[13] Y.K. Li, X.L. He, L.C. Qiu, J. Chen e Y. Han, IOP Conf. Series: Earth and Environmental Science 191, 012094 (2018).]. Um elemento característico do escoamento é a relação entre a espessura da parede (e) e o diâmetro do orifício (d), como é ilustrado na Figura 4. Os orifícios de parede fina/delgada, como na Figura 4a, em que er, são aqueles em que o jato de fluido não tem significativa aderência com a parede interna do orifício. Nos orifícios de parede grossa/espessa, como na Figura 4b, em que re < 3r, o jato adere à parede interna do orifício. Nos casos em que e > 3r, convenciona-se chamar o orifício de duto de tubulação, e não mais de orifício.

Figura 4
Orifícios de (a) parede fina e (b) parede espessa. É considerada uma tubulação quando e > 3r. Ambas as figuras foram inspiradas em [12[12] R.M. Porto, Hidráulica Básica (Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo, São Carlos, 2006), 4 ed., p. 352].

Outro elemento característico do escoamento é a contração da secção transversal do jato ao sair do orifício, como ilustrado na Figura 5, que influencia a determinação da vazão volumétrica do orifício.

Figura 5
Seção transversal do orifício (A) e do jato contraído (AC). A figura foi inspirada na referência [10[10] R.V. Brandão, I.S. Araújo e E.A. Veit, Física na Escola 9, 10 (2008)., p. 352] e na referência [11[11] J.H. Lienhard, Journal of Fluids Engineering 106, 13 (1984)., p. 13].

A relação entre a área transversal do jato AC e a área do orifício A é denominada coeficiente de contração CA:

(9) C A = A C A .

Porto [12[12] R.M. Porto, Hidráulica Básica (Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo, São Carlos, 2006), 4 ed.] relata que o valor médio de CA é por volta de 0,62 para orifícios circulares, dependendo tanto do diâmetro do orifício quanto da altura do líquido no recipiente. Hicks e Slaton [14[14] A. Hicks e W. Slaton, The Physics Teacher 52, 43 (2014).], a partir de um modelo simplificado, estimaram o valor de CA em 0,5.

Além do coeficiente de contração, será útil utilizar também o coeficiente de velocidade CV, que é definido como a razão entre a intensidades da velocidade da seção transversal do jato v2r considerando a dissipação de energia, e a intensidade da velocidade V2i obtida pela Eq. 5:

(10) C V = v 2 r V 2 i = v 2 r 2 g Y .

Desse modo, pode-se readequar a Eq. 6 considerando os valores de CA e CA, culminando no que é chamado de vazão corrigida ϕc, que é dada por:

(11) ϕ c = C A C V ϕ = C d ϕ = C d A 2 g Y ,

onde Cd = CA CV é denominado coeficiente de descarga. Esse coeficiente, portanto, quantifica o quão menor é a vazão do líquido em comparação com a vazão de escoamento sem perdas de energia, de modo que um Cd igual a 1 representaria um escoamento não dissipativo em acordo com a Eq. 6. Porto [12[12] R.M. Porto, Hidráulica Básica (Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo, São Carlos, 2006), 4 ed.] apresenta valores de Cd para orifícios circulares, verticais, de parede fina (em que a espessura da parede é menor do que o raio do orifício) em função da altura do líquido e dos diâmetros desses orifícios. Para d = 2 cm, Cd varia entre 0,648 e 0,653 para altura do líquido entre 60 cm e 20 cm, respectivamente. Desse modo, é adequado considerar Cd aproximadamente constante para muitos propósitos. Reforçando tal constatação, foram realizadas medidas com o orifício na base do recipiente com diâmetros pequenos de 4,43 e 12,6 mm, obtendo-se coeficientes de descarga de 0,76 a 0,67, respectivamente [14[14] A. Hicks e W. Slaton, The Physics Teacher 52, 43 (2014).], quando a altura do líquido variava entre 50 e 25 cm.

Feitas essas considerações sobre as perdas de energia no sistema, podemos encontrar uma solução analítica do tipo Y (t) realizando procedimentos similares aos usados para deduzir a Eq. 8, e considerando que a vazão ϕc pelo orifício é igual à taxa de variação do volume V de líquido no recipiente acima do orifício. Desse modo, usando a Eq. 11, temos:

(12) ϕ c = d V d t = π R 2 d Y d t = C d π r 2 2 g Y .

Reordenando os termos e integrando dos dois lados, temos:

(13) H h Y d Y Y = C d r R 2 2 g 0 t d t .

Resolvendo as integrais e isolando o nível Y da superfície da água, temos:

(14) Y = H h C d g 2 r R 2 t 2 .

A Eq. 14 representa o nível do líquido em função do tempo. Resultado similar é encontrado em [14[14] A. Hicks e W. Slaton, The Physics Teacher 52, 43 (2014).], embora não sejam apresentados detalhes da dedução da equação.

Para mensurar o coeficiente de velocidade CV, dado pela Eq. 10, é necessário estimar a intensidade da velocidade na saída do orifício v2r, a qual podemos inferir a partir das equações da cinemática para o movimento de um elemento de massa dm ejetado. A Figura 6 (uma ampliação da parte inferior da Figura 1) representa o elemento de massa dm pontual saindo do orifício tendo, no momento em que é ejetado do cilindro (t = 0) velocidade inicial horizontal v2r e posição inicial x(0) = 0 e y(0) = y0.

Figura 6
Trajetória parabólica do elemento de massa dm.

Desprezando qualquer força dissipativa do ar durante o seu movimento, consideramos a componente vertical do movimento como retilíneo uniformemente variado com aceleração g, e a componente horizontal, como retilíneo e uniforme com velocidade de intensidade v2r. Como forma de diferenciar as grandezas mobilizadas nas deduções cinemáticas realizadas aqui das usadas nas deduções relacionadas com a hidrodinâmica, usamos a letra minúscula y para representar a componente vertical da posição de dm e t’ para representar o tempo contabilizado a partir da saída do elemento dm do cilindro.

Das equações da cinemática, constatamos que a intensidade da velocidade inicial v0x do elemento dm é:

(15) v 0 x = x D 2 y 0 g ,

onde xD é o alcance do jato.

Substituindo a Eq. 15 na Eq. 10, e considerando v0x = v2r, temos:

(16) C V = x D 2 y 0 Y .

É importante destacar aqui que, enquanto o nível d’água no recipiente diminui, o alcance do jato d’água é variável, dependendo implicitamente da altura do líquido Y, ou seja, xD = xD(Y). No modelo não dissipativo, isso indicaria uma dependência entre xD e Y, da forma xDY.

Será útil, ainda, avaliar a perda de energia cinética κ do fluido em relação ao valor previsto no modelo não dissipativo em função do valor de CV, que é dada por:

(17) κ = Δ K K = 1 2 d m ( V 2 i 2 v 2 r 2 ) / 1 2 d m V 2 i 2 = ( 1 C V 2 ) .

No que segue, apresentamos a investigação experimental do modelo de escoamento dissipativo.

5. Investigação Experimental do Modelo de Escoamento Dissipativo

Para investigar o modelo de escoamento dissipativo, usamos os mesmos dados de vazão apresentados na Seção 3 3. Investigação Experimental do Modelo de Escoamento não Dissipativo Para a investigação do modelo teórico exposto na Seção 2, foram coletados vídeos do escoamento da água contida em uma proveta de 1 L de volume, com uma câmera de smartphone de 30 quadros por segundo (um quadro de um dos vídeos é exposto na Figura 2). Para garantir melhor visibilidade do fluido nas imagens, usamos corante vermelho. Durante a investigação, foram gravados vídeos em seis condições diferentes4, em que a área do orifício foi progressivamente aumentada de aproximadamente 0,3% a 2,5% da área da superfície da água na proveta. Especificamente, os diâmetros d = 2r dos orifícios utilizados foram (3,4 ± 0,1) mm, (4,5 ± 0,1) mm, (5,2±0,1) mm, (7,1±0,1) mm, (8,3±0,1) mm e (10,0±0,1) mm. As outras características do aparato, usando as definições apresentadas na Figura 1, foram H = (0, 340 ± 0, 001) m, h = (0, 068 ± 0, 001) m, D = 2R = (63, 5 ± 0, 1) mm. Usamos o valor de g = 9,78 m/s2, que é a aceleração da gravidade no município de Sinop/MT. Figura 2 Um jato d´água sai pelo orifício lateral existente em uma proveta de 1 L. Tanto o comprimento da linha escura (L = 42,3 ± 0,1 cm) do plástico retangular branco na base da bancada quanto o espaçamento das linhas graduadas da proveta (“1000 ml − 200 ml” = 27,1 ± 0,1 cm) são as referências consideradas na videoanálise. Particularmente, foi coletada a posição da superfície da água na proveta em função do tempo e o alcance do jato de água do orifício em função do tempo. Os dados de posição e tempo foram então analisados com o software Origin®. Na Figura 3, são apresentados os dados experimentais e a predição do modelo (Eq. 8) para os diâmetros de orifício de 3,4 mm, 4,5 mm e 5,2 mm (Figura 3.a), e 7,1 mm, 8,3 mm e 10,0 mm (Figura 3.b). Figura 3 Nível do líquido, experimental (em símbolos) e estimado pelo modelo (equação 8, em linhas), em função do tempo, para os diâmetros de orifício de (a) 3,4 mm (triângulos azuis e linha tracejada azul), 4,5 mm (círculos pretos e linha tracejada vermelha), 5,2 mm (quadrados verdes e linha sólida vermelha) e (b) 7,1 mm (quadrados azuis e linha tracejada azul), 8,3 mm (estrelas bejes e linha sólida beje) e 10,0 mm (círculos alaranjados e linha tracejada alaranjada). Constata-se, na Figura 3, que as predições do modelo estão distantes dos dados experimentais. Para o diâmetro de 4,5 mm (raio do orifício com aproximadamente 7% do raio da área da superfície do líquido no cilindro), identifica-se uma maior proximidade entre as predições e os dados empíricos. Conforme se aumenta ou se diminui o tamanho do orifício de saída, o modelo passa a ser menos adequado para representar o evento investigado, demandando considerações sobre a dissipação de energia no sistema. Na próxima seção, será apresentada uma expansão do modelo teórico explorado até aqui, incluindo efeitos dissipativos. Na sequência, avaliaremos o poder preditivo desse modelo para representar os dados experimentais, especialmente nos casos em que o orifício tem maior diâmetro. , quando avaliamos as predições do modelo tradicionalmente debatido nos livros didáticos, que é não dissipativo. Na Figura 7 expomos esses dados com a predição do modelo dissipativo, tomando Cd como um parâmetro de ajuste. Em uma primeira análise, consideramos o valor do coeficiente de descarga Cd constante durante todo o escoamento no ajuste da curva. Usaremos esse valor constante de Cd para investigar a dependência temporal de CV e CA durante o escoamento. Observa-se, na Figura 7, que a predição do modelo expandido tem boa concordância com os dados experimentais para todos os valores de diâmetro considerados no presente estudo.

Figura 7
Nível do líquido, experimental (em símbolos) e estimado pelo modelo (equação 14, em linhas), em função do tempo, para os diâmetros de orifício de (a) 3,4 mm (triângulos azuis e linha tracejada azul), 4,5 mm (círculos pretos e linha tracejada vermelha), 5,2 mm (quadrados verdes e linha sólida vermelha) e (b) 7,1 mm (quadrados azuis e linha tracejada azul), 8,3 mm (estrelas bejes e linha sólida beje) e 10,0 mm (círculos alaranjados e linha tracejada alaranjada).

Na Figura 8 e na Tabela 1, sintetizamos informações geométricas do aparato experimental utilizado, como o diâmetro do orifício (d), raio do orifício (r) e a espessura da parede do cilindro (e). Para os menores diâmetros, os valores de Cd ≈ 0, 9 indicam que a vazão é aproximadamente 10% menor do que a vazão sem dissipação de energia. Para diâmetros maiores, por volta de d > 5 mm, Cd diminui com o aumento do diâmetro do orifício. Também são informados os valores dos coeficientes de descarga (Cd), a relação entre o raio do orifício e a espessura da parede do recipiente, assim como a classificação da parede do cilindro segundo a Figura 4.

Figura 8
Coeficiente de descarga em função do diâmetro do orifício. O tamanho dos círculos indica a incerteza do valor de Cd. Observa-se que, para diâmetros maiores de 5 mm, Cd diminui significativamente.
Tabela 1
Propriedades geométricas dos aparatos experimentais explorados: diâmetro do orifício (d), raio do orifício (r) e espessura da parede do cilindro (e). Além disso, apresenta-se também o coeficiente de descarga (Cd), a relação entre e e r, e a consequente classificação da parede do orifício.

Pode-se observar tanto na Figura 8 quanto na Tabela 1 que o coeficiente de descarga teve pouca variação para os três menores orifícios. Para orifícios maiores, d > 4,5 mm, Cd diminui de forma linear (Cd = 1,37 − 0,096d), indicando que, para determinado nível do líquido, dentro do intervalo aqui pesquisado, a vazão diminui linearmente com o diâmetro do orifício.

Para aprofundar a compreensão dessa diminuição de Cd = CA CV, investigamos o coeficiente de velocidade (CV) e o coeficiente de contração (CA) dos jatos. Para avaliar CV, utilizamos os mesmos vídeos gravados para a coleta dos dados de Y, coletando agora o alcance do jato xD usando o software Tracker. Na Figura 9, são expostos os valores de CV calculados com a Eq. 16 em função do nível do líquido Y para todos os escoamentos investigados.

Figura 9
Coeficiente de velocidade em função do nível do líquido para todos os diâmetros de orifício investigados. As incertezas dos valores estimados de CV também são mostradas.

Observa-se na Figura 9 que todos os CV são aproximadamente constantes dentro da faixa de incerteza para níveis do líquido Y acima de 10 cm. Para valores de Y menores que 10 cm, CV diminui para todos os escoamentos, com diferentes diâmetros de orifício.

As curvas de CV para os casos de parede fina, com diâmetros de 7,1 mm, 8,3 mm e 10,0 mm, indicam um valor aproximadamente constante dentro da incerteza (0,97 ± 0,03) para valores de Y acima de 10 cm. Isso indica perda da energia cinética da ordem de 6%. De forma similar, as curvas CV para diâmetros de 4,5 mm e 5,2 mm (para situações de transição entre parede grossa a fina, respectivamente) sinalizam que essa grandeza é aproximadamente constante (0,91 ± 0,04) para valores de Y acima de 10 cm, indicando uma perda de energia da ordem de 17%.

A maior redução de velocidade é observada na curva relacionada ao orifício de menor diâmetro, de 3,4 mm, situação de parede grossa, na qual CV = (0, 81 ± 0,04), indicando uma velocidade do fluido com valor aproximadamente 20% menor do que o valor obtido com o modelo não dissipativo em todo o escoamento do líquido. Esse caso não tem, no entanto, o maior coeficiente de descarga Cd ajustado (Figura 8), o que é uma aparente contradição. Como, de acordo com a Eq. 11, a vazão corrigida ϕc é igual ao produto do coeficiente Cd e a vazão ϕ, poderia se suspeitar que a maior perda de vazão e, supostamente, de energia cinética, deveria ocorrer no caso com menor Cd, ou seja, para o maior diâmetro mostrado na Figura 8. No entanto, o caso de maior diminuição de velocidade do jato de água foi o de menor diâmetro, como acabamos de ver.

Para aprofundar essa suposta contradição dos resultados, vamos analisar o escoamento associado ao orifício de 8,3 mm. A partir dos valores de CV, podemos obter a perda de energia cinética κ por meio da Eq. 17. Na Figura 10 expomos, para o escoamento no orifício de 8,3 mm, os valores de CA, CV, Cd e κ em função do nível do líquido Y. O coeficiente de descarga (Cd) é o parâmetro de ajuste, igual a 0,58, ao longo de todo o intervalo de Y considerado. Os coeficientes de velocidade (CV), determinados pela Eq. 10, foram calculados utilizando os dados experimentais do alcance do jato (xD), da altura do líquido (Y) e do parâmetro experimental y0. Os valores do coeficiente de contração (CA) foram obtidos a partir dos dados de Cd e CV, por meio da relação CA = Cd/CV, e plotados na Figura 10.

Figura 10
CA, CV, Cd e κ em função do nível do líquido Y, para o escoamento no orifício de 8,3 mm.

Observa-se na Figura 10 que os valores de CA e CV são especulares em relação à linha horizontal tracejada com valor constante 0,76. Essa linha surge porque, quando o nível do líquido Y tende a zero, CA = CV, de tal modo que temos, aproximadamente, Cd = CACV = CA2 = CV2 = 0,58, e a reta de simetria passa em Cd=0,58 0,76. CACV=Cd=0,58 0,76. Constata-se também que CV é aproximadamente constante para valores de Y maiores do que 10 cm e em virtude de Cd = CA CV, CA é também praticamente constante, e nessa faixa a perda de energia cinética é baixa. Os resultados indicam, como esperado: (i) uma constância de CA para valores de Y maiores que 10 cm e (ii) um aumento de CA para Y menores que 10 cm; nessa faixa há uma perda significativa de energia cinética. Os valores de CA indicariam que deva ocorrer uma contração do jato do fluido, uma vez que há pouca perda de energia cinética, principalmente em posições da superfície do fluido distantes do orifício. Em uma configuração experimental similar à utilizada no presente trabalho [15[15] J.N. Libii, M. Hartenstein e J.D. Torres, Physics Education 36, 115 (2001).], com um tubo de diâmetro de 10,16 cm e um orifício de saída de 1,59 cm, os coeficientes de contração foram obtidos mantendo-se o nível do líquido constante durante o escoamento. Os resultados desse trabalho indicam que a contração do jato aumentou ligeiramente de 0,40 a 0,50, com um valor médio aproximado de 0,47.

Em relação à perda de energia cinética do fluido, pode-se especular que se deva ao atrito (rugosidade na borda e na superfície interior do orifício) e à pressão de Laplace5 5 A Lei de Laplace ou Lei Young-Laplace relaciona a variação de pressão na superfície que separa dois fluidos de distinta natureza com as forças de ligação molecular. [16[16] F.G. Wolf, L.O.E. dos Santos e P.C. Philippi, Rev. Bras. Ensino Fís. 28, 167 (2006).] que gera uma tensão superficial no orifício. Essa tensão superficial pode fazer com que o líquido forme um menisco na borda do orifício. Para menores alturas do líquido, ocorre uma menor pressão hidrostática, o que possibilita que a tensão superficial da água tenda a estancar o fluxo. Extrand [17[17] C.W. Extrand, Journal of Adhesion Science and Technology 32, 1142 (2018).], investigando o início e o término do fluxo de líquidos em um orifício em uma parede vertical, identificou que, ao adicionar lentamente água em recipiente com orifício suficientemente pequeno, o líquido subia além do orifício. Nenhum líquido fluía através do orifício até que uma altura crítica fosse alcançada. Também constataram que essa altura crítica diminuía com o aumento do diâmetro do orifício.

Na Figura 11, mostramos os valores de κ (perda percentual de energia cinética) em função de Y para todos os orifícios investigados. Constatamos que os escoamentos apresentam um comportamento bastante similar tanto para os orifícios 4,5 mm e 5,2 mm, quanto para os orifícios 7,1 mm, 8,3 mm e 10,0 mm. Para todos os eventos, exceto para d = 3,4 mm, se identifica um valor de κ constante na faixa de Y entre 0,15 m a 0,28 m, e posteriormente aumenta com a diminuição de Y. No escoamento com d = 3,4 mm, κ é praticamente constante em toda a faixa de Y considerada. A explicação do comportamento de κ da Figura 11 é similar à realizada no parágrafo anterior, em que analisamos o escoamento no orifício de 8,3 mm.

Figura 11
Perda percentual de energia cinética em função do nível do líquido Y para os escoamentos em todos os orifícios investigados.

Perante os resultados mostrados, podemos inferir que os dados experimentais dão apoio empírico ao presente modelo de escoamento dissipativo.

Um estudo envolvendo três modelos para explicar o escoamento lateral em cano de PVC como alternativas ao modelo tradicional foi realizado por Luchese e Pinheiro [18[18] T.C. Luchese e M.C. Pinheiro, Rev. Bras. Ensino Fís. 45, e20230044 (2023).]. No modelo 1, os autores introduzem um coeficiente constante à equação de Bernoulli no orifício de saída. Nos modelos 2 e 3, é introduzido, além do termo constante do modelo 1, um termo relacionado à resistência ao escoamento, proporcional à velocidade para o modelo 2 e proporcional ao quadrado da velocidade para o modelo 3. Os resultados experimentais obtidos, para tamanhos de orifícios similares aos utilizados no presente trabalho, respaldam satisfatoriamente o modelo 3. Esse termo proporcional ao quadrado da velocidade no modelo 3 indicaria uma diminuição da energia cinética em relação ao modelo tradicional, tal como foi demonstrado no presente trabalho.

6. Considerações Finais

Neste artigo, avaliamos a adequação do modelo tipicamente explorado em livros didáticos de Ensino Superior para representar o escoamento não dissipativo de líquidos em orifícios na lateral de um recipiente de 1 L. Usualmente, não são suficientemente debatidas as nuances do processo de modelagem científica, como as idealizações, hipóteses e simplificações adotadas nesse modelo, quando ele é explorado nesses livros. Além disso, as previsões apresentadas são raramente validadas experimentalmente. Mostramos que o modelo tradicional não é adequado para representar o escoamento em um recipiente de 1 L, mesmo quando o orifício tem diâmetro pequeno, com valores da ordem de 5% do diâmetro da superfície do fluido no recipiente. Por isso, expandimos o modelo teórico original considerando variáveis relacionadas com a dissipação da energia no escoamento. Mobilizamos conceitos típicos da área de hidrologia, como os de coeficiente de contração, coeficiente de velocidade e coeficiente de descarga, que usualmente não são tratados no ensino de Física, e que podem ser úteis para quem deseja compreender o escoamento de fluidos com mais profundidade do que o tema é tratado em livros de Física básica.

Neste artigo, apresentamos também o modelo de escoamento não dissipativo bastante abordado nos livros de Física, mas tivemos o cuidado de especificar a construção do modelo ressaltando as idealizações e simplificações consideradas. A clareza dessas idealizações nos possibilitou delinear a expansão do modelo com propriedade, proporcionando a predição do escoamento em casos em que ocorrem perdas de energia no escoamento. Os dados experimentais deram apoio empírico ao modelo dissipativo, que se mostrou capaz de fornecer boa descrição para os dados coletados.

Parte do presente trabalho resultou na elaboração de um produto educacional [19[19] J. Schisler e R.R. Campomanes, Produto Educacional: Estudo da vazão de fluido na lateral de um cilindro: Uma Proposta de Ensino por Investigação, disponível em:https://cms.ufmt.br/files/galleries/87/Produto%20Educacional/Produtos2023/JessicaPE.pdf, acessado em: 07/06/2024.
https://cms.ufmt.br/files/galleries/87/P...
] aplicado numa escola de Ensino Médio do município de Sinop/MT, obtendo resultados satisfatórios. Os resultados da presente pesquisa podem ser úteis tanto em cursos de Física, como em cursos de Engenharias, em disciplinas sobre hidráulica. As atividades experimentais podem ainda fazer parte de guias de aulas de laboratório.

Agradecimentos

Agradecemos aos árbitros pela leitura crítica e observações que contribuíram para a melhora do presente trabalho. A primeira autora agradece também à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Mato Grosso - FAPEMAT pela bolsa de estudos concedida para realização do mestrado.

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    T.C. Luchese e M.C. Pinheiro, Rev. Bras. Ensino Fís. 45, e20230044 (2023).
  • [19]
    J. Schisler e R.R. Campomanes, Produto Educacional: Estudo da vazão de fluido na lateral de um cilindro: Uma Proposta de Ensino por Investigação, disponível em:https://cms.ufmt.br/files/galleries/87/Produto%20Educacional/Produtos2023/JessicaPE.pdf, acessado em: 07/06/2024
    » https://cms.ufmt.br/files/galleries/87/Produto%20Educacional/Produtos2023/JessicaPE.pdf, acessado em: 07/06/2024
  • 1
    Ainda que usualmente os livros explicitem que o tamanho do orifício de saída é considerado pequeno comparado com a abertura do recipiente, uma consulta não exaustiva nos mostrou que é frequente que os livros não mencionem a idealização de que não ocorrem perdas de energia nesse modelo, o que é um aspecto fundamental da sua construção.
  • 2
    Tracker, software livre da Open Source Physics. Acessível em: https://www.compadre.org/osp/.
  • 3
    Como é exposto na Seção 3 3. Investigação Experimental do Modelo de Escoamento não Dissipativo Para a investigação do modelo teórico exposto na Seção 2, foram coletados vídeos do escoamento da água contida em uma proveta de 1 L de volume, com uma câmera de smartphone de 30 quadros por segundo (um quadro de um dos vídeos é exposto na Figura 2). Para garantir melhor visibilidade do fluido nas imagens, usamos corante vermelho. Durante a investigação, foram gravados vídeos em seis condições diferentes4, em que a área do orifício foi progressivamente aumentada de aproximadamente 0,3% a 2,5% da área da superfície da água na proveta. Especificamente, os diâmetros d = 2r dos orifícios utilizados foram (3,4 ± 0,1) mm, (4,5 ± 0,1) mm, (5,2±0,1) mm, (7,1±0,1) mm, (8,3±0,1) mm e (10,0±0,1) mm. As outras características do aparato, usando as definições apresentadas na Figura 1, foram H = (0, 340 ± 0, 001) m, h = (0, 068 ± 0, 001) m, D = 2R = (63, 5 ± 0, 1) mm. Usamos o valor de g = 9,78 m/s2, que é a aceleração da gravidade no município de Sinop/MT. Figura 2 Um jato d´água sai pelo orifício lateral existente em uma proveta de 1 L. Tanto o comprimento da linha escura (L = 42,3 ± 0,1 cm) do plástico retangular branco na base da bancada quanto o espaçamento das linhas graduadas da proveta (“1000 ml − 200 ml” = 27,1 ± 0,1 cm) são as referências consideradas na videoanálise. Particularmente, foi coletada a posição da superfície da água na proveta em função do tempo e o alcance do jato de água do orifício em função do tempo. Os dados de posição e tempo foram então analisados com o software Origin®. Na Figura 3, são apresentados os dados experimentais e a predição do modelo (Eq. 8) para os diâmetros de orifício de 3,4 mm, 4,5 mm e 5,2 mm (Figura 3.a), e 7,1 mm, 8,3 mm e 10,0 mm (Figura 3.b). Figura 3 Nível do líquido, experimental (em símbolos) e estimado pelo modelo (equação 8, em linhas), em função do tempo, para os diâmetros de orifício de (a) 3,4 mm (triângulos azuis e linha tracejada azul), 4,5 mm (círculos pretos e linha tracejada vermelha), 5,2 mm (quadrados verdes e linha sólida vermelha) e (b) 7,1 mm (quadrados azuis e linha tracejada azul), 8,3 mm (estrelas bejes e linha sólida beje) e 10,0 mm (círculos alaranjados e linha tracejada alaranjada). Constata-se, na Figura 3, que as predições do modelo estão distantes dos dados experimentais. Para o diâmetro de 4,5 mm (raio do orifício com aproximadamente 7% do raio da área da superfície do líquido no cilindro), identifica-se uma maior proximidade entre as predições e os dados empíricos. Conforme se aumenta ou se diminui o tamanho do orifício de saída, o modelo passa a ser menos adequado para representar o evento investigado, demandando considerações sobre a dissipação de energia no sistema. Na próxima seção, será apresentada uma expansão do modelo teórico explorado até aqui, incluindo efeitos dissipativos. Na sequência, avaliaremos o poder preditivo desse modelo para representar os dados experimentais, especialmente nos casos em que o orifício tem maior diâmetro. , nos experimentos que realizamos, o maior orifício que investigamos tem r = 5,0 mm, e o recipiente utilizado tem R = 31,8 mm. Utilizando o teorema de Taylor, podemos constatar que 11r/R41+12 rR4+34 rR8, de modo que, para o nosso caso, 11r/R41+0,00489+0,0000721, com um erro menor do que 0,5%, o que indica que a aproximação matemática considerada não terá impacto significativo nas predições do modelo.
  • 4
    Os vídeos estão disponíveis em: http://www.if.ufrgs.br/gpef/modelagem/escoamento_agua/.
  • 5
    A Lei de Laplace ou Lei Young-Laplace relaciona a variação de pressão na superfície que separa dois fluidos de distinta natureza com as forças de ligação molecular.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    17 Jun 2024
  • Revisado
    09 Ago 2024
  • Aceito
    13 Ago 2024
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