Resumos
O Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), à semelhança de outras instituições de ensino e pesquisa, também foi alvo de perseguições e expurgos durante a ditadura civil-militar, mas com certas especificidades por ser uma organização da sociedade civil. Identificado inicialmente como parceiro por segmentos militares e empresariais no sentido de propiciar ao país o domínio da tecnologia nuclear, aos poucos começou a ser visto pelos órgãos de informação e repressão como um espaço de opositores ao regime, devido às posições de muitos de seus pesquisadores em defesa da criação de um ambiente próprio para a pesquisa científica e o desenvolvimento tecnológico autônomo. Expurgos levados a cabo pela Direção da instituição afastaram suas principais lideranças e pesquisadores que viriam a assumir papel de destaque na física brasileira. Apesar de alguns apoios às ações repressivas, a maioria do quadro técnico-científico teve um importante papel de resistência, traduzida por variadas formas.
Palavras-chave: Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas; CBPF; ditadura militar; Brasil
The Brazilian Center for Physical Research (CBPF), like other teaching and research institutions, was also the target of persecution and purges during the civil-military dictatorship, but with certain specificities as it was a civil society organization. Initially identified as a partner by military and business segments in order to provide the country with control of nuclear technology, it gradually began to be seen by the information and repression system as an opponent to the regime, due to the positions of many of its researchers in defense of the creation of an environment suitable for scientific research and autonomous technological development. Purges carried out by the institution’s Director removed its main leaders and researchers who would come to assume a prominent role in Brazilian physics. Despite some support for repressive actions, the majority of the technical-scientific staff played an important role in resistance, translated in different strategies.
Keywords: Brazilian Center for Physical Research; CBPF; military dictatorship; Brazil
Introdução
A relação da ditadura civil-militar que governou o Brasil de 1964 a 1985 com a atividade de ciência e tecnologia foi marcada pela ambiguidade.1 Ao mesmo tempo em que lideranças da área acadêmica foram aposentadas ou exiladas, e estudantes foram presos, torturados e assassinados, o governo promoveu importante reforma no ensino superior, ampliou o número de vagas nas universidades, estimulou a pós-graduação e aumentou significativamente os recursos para a pesquisa. Alguns autores caracterizam essa relação contraditória como ‘modernização autoritária’, ou seja, ao mesmo tempo que se pretendia “limpar” as universidades e institutos de pesquisa dos “focos de subversão”, alijando importantes lideranças e reprimindo a livre manifestação de pensamento, o ensino superior e a pesquisa eram fortalecidos no país.2
Uma das instituições científicas que sentiu fortemente essa postura dicotômica do governo ditatorial foi o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), fundado em janeiro de 1949, no Rio de Janeiro, como uma instituição da sociedade civil, pouco mais de 3 anos após o lançamento das bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki, e a consequente corrida pelo domínio da tecnologia nuclear. Esta época também foi caracterizada pelo início da Guerra Fria e a perseguição no Brasil e em vários países do Ocidente a grupos considerados comunistas ou pró soviéticos.3
O CBPF surgiu como uma alternativa ao ambiente conservador e de forte influência positivista que imperava na Universidade do Brasil (antecessora da UFRJ), localizada no Rio de Janeiro. Ele promoveu a pesquisa científica, ajudando na constituição da física como um campo autônomo de conhecimento no Brasil, adquiriu reconhecimento internacional, auxiliou a nuclear outros grupos de física e formou parte significativa da nova geração de físicos brasileiros, sendo pioneiro na implantação da pós-graduação em física no Brasil.
Outro aspecto que caracterizava o CBPF era a ideia de muitos de seus pesquisadores, entre os quais destacava-se José Leite Lopes, de que o desenvolvimento da ciência poderia impulsionar o desenvolvimento econômico e social do Brasil, tornando o país mais autônomo tecnológica e politicamente.
2.Anos Iniciais
O CBPF foi criado pela iniciativa de alguns jovens físicos, particularmente José Leite Lopes, Cesar Lattes, Jayme Tiomno e Elisa Frota-Pessoa, que desejavam ter um espaço institucional no Rio para a realização de pesquisas em física.4 A Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, onde funcionava o Curso de Física, não fornecia um ambiente propício para a pesquisa, diferente do que acontecia na Universidade de São Paulo. Ela não tinha laboratórios e as aulas práticas eram dadas em outras instituições, como o Instituto Nacional de Tecnologia ou o Laboratório Nacional de Produção Mineral. Outro problema grave era a resistência à implantação do regime de tempo integral para os professores. A grande maioria possuía outras atividades profissionais, como escritórios de engenharia e advocacia, ou consultórios médicos, e iam à Universidade apenas para dar seus cursos. Diferentemente, esses jovens físicos queriam ter um espaço dedicado à ciência, onde os professores pudessem dedicar todo o seu tempo ao ensino e à pesquisa.
Pensaram inicialmente que esse local poderia ser a Fundação Getúlio Vargas, que após a deposição de Getúlio Vargas em 1945 foi redirecionada para a pesquisa pelo novo presidente, o engenheiro e economista Paulo Assis Ribeiro. Foram criados departamentos de física, matemática, geologia e biologia, que passaram a ser dirigidos respectivamente por Leite Lopes, Lélio Gama, Othon Leonardos e Antônio da Silva Mello. Contudo, um grupo ligado ao ex-presidente Getúlio Vargas, insatisfeito com o novo direcionamento da Fundação e liderado por Luiz Simões Lopes, destituiu o presidente e exonerou os diretores dos novos departamentos [6]. Isso foi uma grande frustração, mas o pequeno grupo de jovens físicos passou a acalentar, então, a ideia de um instituto de física dentro da própria Universidade do Brasil, porém dissociado da Faculdade Nacional de Filosofia [7].
O sonho do novo instituto começou a se mostrar factível quando Cesar Lattes, juntamente com Eugene Gardner, conseguiu detectar no Laboratório de Radiação da Universidade da Califórnia (hoje Lawrence Berkeley National Laboratory), em 1948, a produção artificial de mésons pi, hoje conhecidos como píons.5
A detecção foi rapidamente relatada na Science e o Laboratório na Califórnia fez uma forte divulgação da descoberta junto à grande mídia objetivando, entre outros aspectos, conseguir recursos junto à recém criada Comissão Americana de Energia Atômica. As notícias da imprensa americana foram replicadas no Brasil tornando Lattes uma espécie de herói nacional aos 24 anos e demonstrando que a ciência brasileira tinha grandes nomes capazes de desenvolver pesquisa nuclear de alta qualidade. No Brasil, Leite Lopes deu várias entrevistas à imprensa e palestras em instituições militares, e começou uma articulação visando a criação do novo instituto.
A notícia caiu aqui como uma bomba. Todos os jornais trazem notícias sobre o Lattes, classificando-o como grande vulto da ciência atômica, telegramas dos EUA etc. A impressão que tenho é que agora é o momento para fazer pressão e obter o Instituto de Física no Rio com tudo [7].
Lattes e Leite Lopes conseguiram entusiasmar João Alberto Lins de Barros, ex-ministro e homem de confiança de Getúlio Vargas, e o contra-almirante e ex-presidente da Academia Brasileira de Ciências, Álvaro Alberto da Motta e Silva. O primeiro ainda muito influente nos meios político e empresarial e o segundo um nome reconhecido nas áreas científica e militar.
Enquanto o grupo de jovens físicos vislumbrava a criação de um instituto para pesquisa e ensino de física, para os empresários e militares havia a expectativa de que a iniciativa permitiria que o Brasil dominasse a tecnologia nuclear, seja para a produção de energia para a indústria, seja para a produção de artefatos bélicos. Assim, no lugar de um instituto de física vinculado à Universidade do Brasil, como inicialmente imaginado pelo pequeno grupo de físicos, resolveu-se criar uma fundação privada, com mais liberdade para contratação de técnicos e utilização dos recursos. O registro oficial da fundação ocorreu em 15 de janeiro de 1949, tendo João Alberto como presidente, Álvaro Alberto como vice e Cesar Lattes como diretor científico. Formava-se uma aliança entre os setores industrial, militar e acadêmico, baseada na ideia de que todos buscavam o mesmo objetivo: o desenvolvimento da tecnologia nuclear. O tempo, contudo, mostraria que esse objetivo não estava tão alinhado entre os vários parceiros como se pensava.
Os recursos iniciais para o CBPF vieram de alguns cientistas com uma situação financeira confortável que apoiaram a iniciativa, de agências estrangeiras, como a Fundação Rockefeller e de grupos empresariais. A Universidade do Brasil disponibilizou um terreno em seu campus para construir o primeiro prédio do Centro, que foi financiado pelo banqueiro Mario d’Almeida.
Paralelamente, o Brasil ingressava no clima da Guerra Fria estabelecido entre Estados Unidos e União Soviética, assumindo o lado do primeiro. Em setembro de 1946, o presidente Eurico Gaspar Dutra reorganizou os vários setores de informação criados durante o governo Vargas, estabelecendo o Serviço Federal de Informações e Contra-Informações (SFIC), que tinha como objetivo subsidiar o Conselho de Segurança Nacional com relação a “ideologias extremistas”. O Partido Comunista Brasileiro, que havia sido tornado legal com o fim da ditadura Vargas em 1945, foi novamente posto na ilegalidade a partir de maio de 1947 com a consequente perseguição aos seus membros.
Em 29 de agosto de 1949, a União Soviética detonou seu primeiro artefato nuclear no campo de testes em Semipalatinsk, no Cazaquistão, ampliando a escalada da Guerra Fria e a corrida nuclear. Isso demonstrou definitivamente ao governo brasileiro a importância de se investir na nova tecnologia. Neste primeiro momento, o CBPF foi visto como parceiro por empresários e militares, e recebeu apoio financeiro significativo de um fundo secreto destinado a combater o comunismo, administrado pelo presidente da Federação das Indústrias, Evaldo Lotti. Lattes, que recebeu os recursos, não desconfiou da sua origem, apesar de nunca ter tido que assinar recibos ou fazer relatórios sobre o uso do dinheiro [10].
No início de 1951, foi criado o Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq), uma antiga aspiração da comunidade científica, mas viabilizado em grande medida pelo desejo do governo em direcionar a pesquisa científica e, em especial, estimular o desenvolvimento da tecnologia nuclear. Um sinal do papel estratégico previsto para o CNPq foi a forte presença militar: o presidente era o contra-almirante Álvaro Alberto e como vice-presidente o general Armando Dubois, contemplando a marinha e o exército. O CNPq transferiu significativos recursos para o CBPF para financiar principalmente a montagem de um sincrocíclotron para a pesquisa nuclear.6 No período de 1951 a 1954, o CBPF recebeu 75% dos recursos do CNPq destinados à área de física, a segunda maior, atrás apenas da biologia [13].
3.Cientistas na Mira das Agências de Informação
As bombas atômicas lançadas pelos Estados Unidos sobre Hiroshima e Nagasaki também levaram importantes físicos nos Estados Unidos, liderados principalmente por Leo Szilard e Albert Einstein, a se manifestarem contra a utilização da energia atômica para fins bélicos, e originando o Comitê de Emergência dos Cientistas Atômicos, num movimento que envolveu cientistas de vários países. Eles condenavam a corrida armamentista, alertando que uma guerra nuclear não teria vencedores [14]. Em agosto de 1948, foi realizado na cidade polonesa de Wroclaw o Congresso Mundial dos Intelectuais pela Paz, reunindo participantes de mais de 40 países e originando o Conselho Mundial da Paz. O físico da USP, Mário Schenberg, foi um dos participantes do encontro. Em novembro, foi realizado na França o Congresso Nacional dos Combatentes da Paz.
O governo da União Soviética percebeu que poderia instrumentalizar o discurso pacifista numa ação de propaganda contra os Estados Unidos, e determinou em novembro de 1949 que a tarefa central do movimento comunista deveria ser a luta pela paz [15]. Em 15 de março de 1950, o Congresso pela paz, realizado na Suécia, lançou o Apelo de Estocolmo, numa campanha pela proibição das armas atômicas. O Partido Comunista Brasileiro, com o suporte de jornais comunistas, se engajou fortemente na campanha, obtendo apoio não só daqueles que seguiam as orientações de Moscou, como de pessoas contrárias à corrida nuclear, como Cesar Lattes, diretor científico do CBPF [15].
Essas manifestações pela paz e contra uma corrida bélica nuclear eram monitoradas pelos serviços de inteligência do Brasil, à semelhança do que ocorria em outros países alinhados com os Estados Unidos [16]. Assim, em 6 de maio de 1950, o SFIC já registrava em suas fichas que segundo publicação do jornal Imprensa Popular, Cesar Lattes, “na qualidade de Presidente do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas e Nucleares, condena o uso da BOMBA ATÔMICA como arma de guerra” [grifo no original] [17]. A inclusão do termo ‘Nucleares’ no nome do Centro mostra como ele era associado a esta tecnologia. Assim, ao mesmo tempo em que Lattes recebia recursos do fundo anticomunista para implantação do CBPF, era monitorado pelos órgãos de segurança por atividades consideradas suspeitas – uma das muitas contradições que marcariam a relação do Centro com o regime militar.
Também o químico Jacques Abulafia Danon, que estava fazendo pós-graduação na França, era monitorado pelos órgãos de informação. Danon havia se formado pela Escola Nacional de Química, no Rio de Janeiro, e seguiu para Paris onde se vinculou ao Instituto do Rádio, dirigido por Irene Joliot Curie. Ele participou dos movimentos contra a perseguição aos membros do Partido Comunista no Brasil e compareceu ao Congresso Mundial da Paz, ocorrido de 20 a 25 de abril de 1949 em Paris. Em sua ficha no DOPS, consta que “é elemento de destaque no PCB, já havendo até tomado parte em Conferência em prol da paz realizada no estrangeiro” [18]. Em 1952, Danon e outros intelectuais brasileiros, como Jorge Amado e Carlos Scliar, foram expulsos da França pela participação em atividades consideradas comunistas – a Guerra Fria estava a pleno vapor. Ele passou, então, alguns meses no Centro de Física Nuclear, na Bélgica, junto com Mario Schenberg, que havia se exilado por conta das perseguições no Brasil.7
Ao retornar ao Brasil no fim de 1952, Danon procurou se integrar ao CBPF. Apesar de sua experiência de 4 anos em dois dos mais renomados centros de pesquisa em física nuclear, na França e na Bélgica, ele foi proibido pelo Conselho de Segurança Nacional, através do CNPq, de ser contratado. Assim, mesmo o CBPF sendo uma instituição privada, ele se via obrigado a atender às determinações do CNPq, que financiava suas pesquisas [19].
Outro tema que atraiu a atenção dos órgãos de informação ao longo da década de 1950 foram as discussões relacionadas ao controle das exportações de minerais radioativos e à defesa da soberania nacional. Desde meados da década de 1940, os Estados Unidos já mostravam interesse nas reservas brasileiras de areias monazíticas, ricas em tório. Por conta disso, foram realizados sucessivos acordos, vários deles secretos, entre os governos americano e brasileiro para mapeamento dos depósitos existentes no país e a exportação de areias monazíticas.8
Estes acordos de exportação de matérias-primas nucleares não eram, contudo, consenso entre as autoridades brasileiras. Os militares e cientistas defendiam maior controle sobre as reservas minerais e o desenvolvimento de tecnologia nuclear própria no Brasil. Álvaro Alberto, presidente do CNPq, propunha um acordo que ele denominou de ‘compensações específicas’, no qual a exportação dos recursos minerais teria como contrapartida o fornecimento de tecnologia para o desenvolvimento da indústria nuclear brasileira. Por outro lado, o Itamaraty, sob orientação do ministro de Relações Exteriores, João Neves da Fontoura, bem como vários empresários, consideravam que o Brasil não teria condições para desenvolver tecnologia nuclear e seria mais importante um alinhamento aos Estados Unidos, assumindo o papel de exportador de matérias primas [21, 22].
Em 1952, foi criada a Comissão de Exportação de Materiais Estratégicos (CEME) no âmbito do Ministério das Relações Exteriores, esvaziando os poderes do CNPq. E, logo em seguida, o governo brasileiro assinou um terceiro acordo secreto com os Estados Unidos que previa a troca de 5.000 toneladas de monazita, derivados de terras raras, e o tório resultante do beneficiamento, por 100.000 toneladas de trigo, que posteriormente passou a ser conhecido como “Acordo do Trigo”. Vazou para a imprensa a correspondência entre Juarez Távora, chefe do Gabinete Militar da Presidência da República, e a embaixada dos Estados Unidos discutindo a necessidade de retirar Álvaro Alberto da presidência do CNPq, considerado um empecilho para a realização do Acordo. Isso levou a uma grande crise e à criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito em 1956 [23].
Essa questão dos recursos minerais para a energia nuclear se somava à luta de vários segmentos pelo controle das riquezas nacionais. Em junho de 1956, foi realizado na sede do Ministério da Educação e Cultura, no Rio de Janeiro, o Congresso Nacional de Defesa dos Minérios, para discutir a necessidade de maior controle sobre a exportação de minerais radioativos e a proteção das riquezas minerais brasileiras. O Congresso, promovido pelos sindicatos e movimentos de esquerda, contou com a participação de vários físicos e geólogos.
O tema também foi analisado pelo Conselho de Segurança Nacional que, dois meses depois, em agosto de 1956, emitiu um relatório, onde orientava o governo a exercer “controle sobre o comércio – compra, armazenagem e venda, inclusive exportação – de materiais de aplicação no campo da energia nuclear e suspender imediatamente a exportação de urânio e tório até uma avaliação mais minuciosa da situação” [24]. A recomendação do Conselho foi obedecida pelo governo de Juscelino Kubitschek.
Mesmo assim, os órgãos de segurança e informação registraram nas fichas de cada um dos presentes a participação no referido congresso, entendendo-a como uma atitude suspeita. Na ficha de Jayme Tiomno no DOPS, que foi apenas como ouvinte, consta que “segundo dados reservados de 1956, compareceu ao ato de encerramento do Congresso Nacional de Defesa dos Minérios, realizado em 11/06/1956 no Ministério da Educação” [grifo nosso] [25]. Provavelmente, a indicação de fontes reservadas foi para dar um ar de clandestinidade ao encontro, mas o fato é que foi um evento público, na sede do Ministério, com a presença de várias autoridades, como o representante do ministro da Guerra, e noticiado em diversos jornais.9
Leite Lopes era um vigoroso crítico da dependência tanto científica, como tecnológica, a que o Brasil estava sujeito e foi um dos oradores do Congresso. Ele também foi convidado para depor na Comissão Parlamentar de Inquérito, onde denunciou a falta de uma política governamental, a entrega dos minerais para outros países e os empecilhos para o país desenvolver autonomamente uma tecnologia nuclear. Ele sabia que, com esse posicionamento, “não seria muito bem considerado por certos círculos” [27]. Ele também era membro do Conselho de Curadores do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), um centro de reflexão, onde era forte a ideia da necessidade de um desenvolvimento autônomo do país, conhecido como ‘nacional-desenvolvimentismo’, e que reunia importantes intelectuais e pensadores, como Hélio Jaguaribe, Nelson Werneck Sodré, Álvaro Vieira Pinto, entre outros. Com a ditadura, o ISEB foi fechado e seus membros perseguidos.
Outro elemento que colocou os pesquisadores do CBPF na mira dos órgãos de informação ainda antes do golpe civil-militar foi o clima tóxico e de denúncias existente dentro da Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil. A tentativa de alguns professores de implantar um ambiente de pesquisa e reflexão na Universidade teria um alto preço para eles. Isso aconteceu com professores de vários cursos da FNFi, como matemática e química, mas, no caso específico da física, recaiu principalmente sobre José Leite Lopes, Jayme Tiomno e Elisa Frota-Pessôa, que dividiam seu tempo entre a universidade e o CBPF. A pesquisa de alta qualidade e reconhecida internacionalmente que eles desenvolviam fazia com que recebessem frequentemente pesquisadores visitantes do exterior, inclusive vários prêmio Nobel, viajavam para participar de congressos e seminários em outros países, atraíam muitos estudantes que queriam vivenciar um ambiente de pesquisa e recebiam significativos recursos de agências de fomento internacionais e do CNPq para aquisição de livros, equipamentos para os laboratórios, realização de encontros, entre outros. Eles também atuavam em debates sobre a importância do apoio à pesquisa científica e ao desenvolvimento tecnológico nacional. Evidentemente, essas atividades causavam ciúmes e ameaçavam o status quo de catedráticos e professores mais antigos, que observavam com inveja o grande prestígio e reconhecimento dos jovens pesquisadores. Isso fez com que vários professores, incluindo os físicos relacionados ao CBPF, fossem alvo de denúncias anônimas.
Assim, por exemplo, em dezembro de 1960, um professor catedrático do Curso de Matemática denunciou a “existência do comunismo no meio universitário”.10 Segundo ele, os professores subversivos “são geralmente recrutados nos setores curriculares da matemática pura, da física e da química, ramos científicos que sofrem grandes avanços e que empolgam os soviets.” E complementa:
As expressões exponenciais desse grupo ocupam posições de destaque na esfera do ensino oficial. Manipulam vultuosas verbas; distribuem bolsas de estudo no país e no estrangeiro; organizam centros de estudos; contratam professores de fora para ministrarem cursos e conferências. Cercam suas atividades de ruidosa propaganda na imprensa e na TV [28].
Pouco tempo depois, em 4 de fevereiro de 1964, o catedrático de História Antiga e Medieval e ex-diretor da FNFi, Eremildo Luiz Vianna, fez outra denúncia, intitulada “Professores comunistas na Faculdade Nacional de Filosofia”. Ele acusava a existência de uma pretensa célula comunista denominada ‘Anchieta’, formada por 44 professores e auxiliares, e dirigida pelo catedrático de físico-química e ex-presidente do CNPq, João Cristóvão Cardoso. Também faziam parte da lista inúmeros alunos da Faculdade considerados subversivos por ele. No caso dos físicos que tinham vinculação com o CBPF, seja como pesquisadores, assistentes ou bolsistas, foram incluídos na denúncia José Leite Lopes, Jayme Tiomno, Elisa Frota-Pessôa, Alfredo Marques de Oliveira, Horácio Magalhães Macedo, Nicim Zagury, Sarah de Castro Barbosa e Ximenes Alexandrino [29]. Sobre Leite Lopes, dizia:
Muito inteligente, é o mais perigoso para a segurança nacional. Faz-se de democrata, obtendo quantias fabulosas dos Estados Unidos da América para distribuí-las, no entanto, com seus amigos físicos comunistas do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas… Viaja muito e é amigo do pessoal da Embaixada russa.
Enquanto os EE.UU nada fornecem para os professores de física democratas, o Sr. Leite Lopes obteve recentemente da Fundação Ford verbas imensas, com que financia alunos agitadores que são preparados para ocuparem cargos chave [28].
Tanto as denúncias como as anotações dos serviços de segurança tinham muitas vezes viés racista, misógino e machista. A denúncia contra Leopoldo Nachbin, por exemplo, dizia que ele era ligado às esquerdas internacionais judaicas e que ele “conseguiu ser elogiado e citado graciosamente por grandes nomes da matemática mundial, quase todos judeus” [28]. Já no registro sobre Elisa Frota-Pessôa constava que
Vive maritalmente com o físico comunista Jayme Tiomno. Julga-se a Madame Curie brasileira. Participa ativamente das injunções levadas pelo Partido junto ao Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, secundando o atual companheiro. É de constituição frágil, vive sempre doente” [grifos nossos] [30]
Quando houve o golpe civil-militar, foram instaladas duas comissões de inquérito no âmbito da Universidade do Brasil. Uma foi instituída pelo Conselho Universitário e presidida pelo prof. Paulo de Góes e a outra foi um Inquérito Policial Militar (IPM), dirigida pelo general Arcy da Rocha Nóbrega. Ambas as comissões chegaram à conclusão de que não havia célula comunista na Universidade e inocentaram os professores e alunos. Por outro lado, denunciaram o próprio Eremildo Vianna pelo mal uso de recursos públicos e a Congregação por não abrir concurso para titular de várias cadeiras, além de outras omissões, o que levou o catedrático de Estatística Geral e Aplicada, Jorge Kingston, a afirmar que a Comissão encerrou seus trabalhos de um modo infeliz, “pois fez acusações ao ex-diretor Eremildo Vianna e à Congregação e, nem ao menos, aplicou penalidades aos estudantes comprovadamente subversivos e desordeiros” [31].
Apesar dos professores terem sido inocentados nos dois inquéritos, as denúncias permaneceram registradas em suas fichas nos órgãos de informação, sem qualquer anotação de que haviam sido provadas inverídicas pelas comissões de inquérito.
No início da década de 1960, ainda antes do golpe, o CBPF vivia uma situação paradoxal. Por um lado, era considerado um centro de referência em física no Brasil e no exterior: possuía laboratórios de emulsões nucleares, estado sólido, química nuclear, radiação cósmica e um gerador Cockcroft Walton; nos seus pouco mais de 10 anos de existência, seus pesquisadores tinham publicado mais de 150 artigos nas mais prestigiadas revistas científicas; recebeu a visita de inúmeros físicos de reconhecimento mundial, como Chen Ning Yang, Hideki Yukawa, Leon Rosenfeld, Izidor Rabi, Emile Segré, entre vários outros, concedeu mais de 100 bolsas para estudantes brasileiros e de outros países, como Argentina, Peru e Estados Unidos; e ajudou a criar a Escola Latino-americana de Física, só para citar alguns de seus resultados. De acordo com um relatório produzido em 1960 por uma missão da Agência Internacional de Energia Atômica, no CBPF “encontram-se notáveis cientistas que gozam prestígio não só nacional, mas internacional e, claro, em suas áreas específicas; principalmente no campo teórico, eles são possivelmente os cientistas mais eminentes da América Latina” [32].
Por outro lado, a situação financeira era extremamente preocupante. Em 1954, houve uma crise na relação entre o CBPF e o CNPq em função de um desfalque cometido por um funcionário que atuava em ambas as instituições e geria significativa quantidade de recursos para o projeto de implantação do sincrocíclotron, o que levou à suspensão do fluxo de recursos proveniente desta fonte. Adicionalmente, João Alberto faleceu no início de 1955, enfraquecendo também a relação com os empresários. Mas, independentemente disso, começava a ficar evidente tanto para a classe empresarial, como para os militares, que havia uma significativa distância entre a pesquisa básica desenvolvida no CBPF e a tecnologia nuclear que almejavam, seja para fins de geração de energia ou militar. Os empresários e militares não tardaram a perceber que o CBPF era um centro de pesquisa em ciências e não um instituto de desenvolvimento tecnológico para aplicação direta na indústria e, aos poucos, os recursos dessas fontes foram minguando. O Centro conseguia sobreviver basicamente a partir de recursos federais, como emendas parlamentares ou subvenções do Ministério da Educação, mas era evidente para todos que essa situação não era sustentável por muito tempo.
A criação da Universidade de Brasília em dezembro de 1961 abriu uma nova perspectiva para o CBPF. A coordenação do projeto da nova universidade coube ao educador Anísio Teixeira, que logo envolveu Darcy Ribeiro. A ideia era criar uma universidade moderna, diferente do modelo universitário majoritário no país. A nova Universidade deveria ser gerida com base nos “princípios da liberdade de investigação, de ensino e de expressão” [33]. Diferente da maioria das universidades existentes no país, seria voltada para a pesquisa e a formação de cidadãos críticos, e não organizada com base no falido sistema de cátedras. Os pesquisadores do CBPF se envolveram fortemente no projeto: José Leite Lopes, Guido Beck, Gabriel de Almeida Fialho e Jayme Tiomno desenvolveram a proposta para o Instituto Central de Física, enquanto Jacques Danon, que tinha finalmente conseguido ingressar no CBPF em 1959, participou da elaboração da proposta para o Instituto Central de Química.
Darcy Ribeiro foi o primeiro reitor da UnB, enquanto Anísio Teixeira assumiu a presidência do Conselho Deliberativo. Após seis meses, Darcy foi convidado por João Goulart para assumir o Ministério da Educação, passando a reitoria para Anísio Teixeira e assumindo a presidência do Conselho, numa troca de funções. A vice-reitoria ficou com Almir de Castro, que acumulou com o cargo de diretor-executivo da CAPES. O físico experimental Roberto Salmeron, que havia participado da criação do CBPF e estava trabalhando na França, foi convidado para dirigir o Instituto Central de Física, mas, pouco depois de ter chegado à Brasília, foi convidado para assumir a Direção do Instituto Central de Ciências, uma espécie de Decania, que reuniria todos os institutos de ciência e seria o núcleo central da nova universidade.
Alguns pesquisadores, como Tiomno e Leite Lopes, consideraram que poder-se-ia garantir o futuro do CBPF vinculando-o à UnB. Diferentemente da Universidade do Brasil, a nova universidade daria grande estímulo à pesquisa e à pós-graduação. Segundo essa ideia, o CBPF seria a base do Instituto de Física da UnB, transferindo os equipamentos, a biblioteca e os próprios pesquisadores para a nova universidade.
Com a saída do general Edmundo Macedo Soares da presidência do CBPF em 1963, os pesquisadores resolveram eleger Darcy Ribeiro para a presidência e Almir de Castro como vice. Era uma forma de facilitar o processo de fusão com a UnB e possivelmente contar com apoio e recursos do governo João Goulart. Não foi uma eleição consensual, visto que alguns pesquisadores eram contra uma eventual transferência do CBPF para a UnB e outros achavam que a nomeação de Darcy Ribeiro iria politizar a instituição. Na verdade, a política sempre esteve presente na trajetória do CBPF, a começar pela sua fundação.
Com relação à transferência do CBPF para a UnB, alguns pesquisadores desconfiavam do lugar que a pesquisa, assim como o próprio CBPF, teriam na nova universidade, mesmo considerando seu caráter inovador. Numa entrevista realizada anos depois, Danon explicou um pouco as divergências que existiam no CBPF sobre a transferência para a UnB.
Claro que se a Universidade de Brasília fosse construída, ela teria uma importância, como realmente teve, que ultrapassaria de longe o Centro. Mas enquanto isso não estivesse consolidado, eu não queria ver o Centro prejudicado ou destruído pela criação de Brasília. Para ele [Darcy Ribeiro], o Centro passava, até de certo modo, a segundo plano, o que criou alguns choques [19].
Perseguições e Resistências
Com o golpe civil-militar de 1964, a situação modificou-se por completo: a UnB foi invadida pelos militares, e Anísio Teixeira e Almir de Castro foram exonerados. Almir de Castro também foi exonerado da Direção da CAPES, Darcy Ribeiro teve seus direitos políticos cassados e exilou-se no Uruguai e, pouco depois, Anísio Teixeira seguiu para os Estados Unidos. Havia receio entre os pesquisadores que o CBPF fosse fechado, seja por intervenção do governo militar, seja pela completa suspensão dos recursos vindos do setor público. Correu inclusive o boato de que o exército invadiria o CBPF, o que fez com que o chefe da pesquisa tecnológica do exército que atuava no CBPF, o tenente-coronel Argus Fagundes Moreira, chamasse um grupo de oficiais da Escola Técnica do Exército (hoje Instituto Militar de Engenharia) que se postaram na frente do Centro com metralhadoras [19]. Mas as forças militares estavam mais preocupadas em reprimir os estudantes que se entrincheiravam no prédio da Faculdade de Direito, no Centro da cidade.
Com as perseguições do regime militar, era necessário não só substituir Darcy Ribeiro na Presidência, devido ao seu exílio, como eleger uma nova Diretoria que fosse mais bem vista pelo governo militar, de forma a alterar a imagem como um “centro de comunistas”. Eles agiram rápido, Leite Lopes renunciou ao cargo de diretor científico e Jayme Tiomno colocou à disposição o de diretor do Departamento de Física Teórica, e apenas 15 dias após o golpe, em 14 de abril de 1964, uma nova Assembleia do Centro elegeu o deputado Lopo de Carvalho Coelho para presidente, o almirante Octacílio Cunha como vice, e o físico Hervásio Guimarães de Carvalho como diretor científico. O único que permaneceu foi o diretor-executivo José Machado de Faria.
Lopo Coelho era um político conservador e foi presidente da Assembleia Legislativa do recém criado Estado da Guanabara. Octacílio Cunha havia sido presidente do CNPq e da CNEN e, apesar de apoiar o golpe, era visto como um militar favorável ao desenvolvimento científico e tecnológico nacional, na mesma linha de Álvaro Alberto. Sua eleição teve grande apoio interno. Para se ter uma ideia, a Assembleia tinha apenas 19 presentes, mas com as procurações somava 66 votos no total. Destes, Cunha recebeu 63 votos. Por fim, Hervásio de Carvalho era pesquisador titular do CBPF e catedrático de Físico-Química e Eletroquímica na Escola Nacional de Engenharia da Universidade do Brasil. Ele havia sido colega de Leite Lopes na Faculdade de Química em Recife e foram juntos para o Rio estudar física na Faculdade Nacional de Filosofia. Hervásio era um físico conceituado e um dos fundadores do CBPF, e tinha bom trânsito nos meios militares, tendo, posteriormente, feito a formação da Escola Superior de Guerra.11
Portanto, a nomeação da nova Diretoria não foi consequência de uma intervenção do governo militar, como ocorreu em várias universidades e institutos de pesquisa, mas parte de uma estratégia de resistência e sobrevivência dos pesquisadores do CBPF. Pouco depois da eleição, Lopo Coelho foi designado representante do Brasil na Organização Internacional do Trabalho, na Suíça, assumindo Octacílio Cunha a presidência, primeiro interinamente e depois de forma efetiva. A estratégia pareceu exitosa num primeiro momento. Segundo relatório de Octacílio Cunha na Assembleia Geral, em março de 1968, o governo militar tinha inicialmente decidido retirar todo o apoio financeiro à instituição, mas “graças à nova Diretoria foi possível restabelecer um clima de confiança e continuar a receber apoio do governo, sem o qual esta instituição não poderia sobreviver” [35]. Evidentemente ele tentava se promover perante a Assembleia, mas de fato conseguiu manter os recursos para o custeio e ainda obteve um valor expressivo para concluir a construção do novo prédio do CBPF. O Ministério da Saúde havia doado a estrutura do prédio em 1960, mas faltava ainda a construção de 2 dos 6 andares projetados e as obras ficaram paradas por oito anos. Em 1968, o Centro recebeu NCz[dollar] 482.700,00 (equivalente a aproximadamente R[dollar] 8,5 milhões em valores de outubro de 2023) do governo para concluir as obras do novo prédio.
Por outro lado, diferente da expectativa dos membros do CBPF, Cunha se revelou uma pessoa extremamente autoritária e alinhada em termos práticos e ideológicos ao governo ditatorial. Conforme ele escreveu em um de seus relatórios, “a instituição vinha sendo dominada por um grupo nitidamente de esquerda … Felizmente, a Revolução de março de 1964 pôs fim a essa situação. O que sobrou da Diretoria marxista renunciou” [36].
Começou um clima de expurgos e perseguições no Centro. Hervásio de Carvalho fez uso de sua função como diretor científico e consequentemente presidente do Conselho Técnico-Científico para legitimar academicamente os atos autoritários de Octacílio Cunha. Uma de suas primeiras medidas foi afastar Adir Moisés Luis, instrutor de física nuclear, e Jaime Goldstein, instrutor no Departamento de Ensino.12 Já os recém-formados Carlos Mauricio Chaves e Fernando Bunchaft, que haviam recebido bolsa do Centro Latino-Americano de Física para desenvolver pesquisas e atuar como instrutores no CBPF, foram proibidos de usar os laboratórios do Centro. O físico Walter Baltensperger, que estava trabalhando como visitante no CBPF, e orientava os dois jovens, reclamou da atitude autoritária e recebeu como resposta uma ameaça: “Vossa Senhoria [poderá], se assim julgar necessário, reiterar sua apreciação aos atos da Diretoria, o que não deixarei de considerar então como documento básico para minha ação ulterior” [37]. Ele, então, interrompeu sua estada no Brasil e retornou à Suíça.
O terceiro assistente Alberto Passos Guimarães Filho teve melhor sorte. Cunha queria demiti-lo sob o argumento que o Inquérito Policial Militar da FNFi o havia apontado como membro da organização de base do Partido Comunista naquela universidade. Mas Alberto Passos havia sido contratado em 1 de fevereiro de 1964 e, pelos estatutos do CBPF, só poderia ser demitido com o aval do Conselho Técnico-Científico. A maioria dos membros do Conselho se opôs à sua demissão. Hervásio ainda tentou intimidar o CTC exigindo que cada um dos membros registrasse por escrito sua oposição à demissão “caso a ata da reunião fosse solicitada pelo Conselho de Segurança Nacional”, mas estes mantiveram suas posições [38, 39]. Porém, para fugir do clima de perseguição, Alberto Passos Guimarães seguiu logo depois para o doutorado na Universidade de Manchester, no Reino Unidos, retornando somente em 1971. Horácio Macedo, que atuava no laboratório de ensino, também foi demitido do CBPF em razão de responder a processo criminal por atividades subversivas [40].
Fora o clima de expurgos internos, a situação política no país era extremamente difícil e as ações dos órgãos de repressão também atingiam pesquisadores e estudantes do Centro. Em agosto de 1964, Leite Lopes foi preso quando ia buscar seu passaporte13 na Polícia Federal para participar de um congresso no exterior, solto pouco depois, exilou-se na França. Ramiro Porto Alegre Muniz foi levado encapuzado para a delegacia para depor e agredido por terem encontrado seu nome na agenda de telefones de uma pessoa que havia sido presa [38]. Sem dúvida, o clima era de medo.
A UnB foi especialmente visada: tropas ocuparam o campus, o reitor Anísio Teixeira foi demitido do cargo, todos os membros do Conselho Deliberativo foram destituídos e 15 professores foram presos. Porém, passados os expurgos de 1964, a ditadura pareceu arrefecer. Roberto Salmeron permaneceu na Direção do Instituto Central de Ciências e convidou Jayme Tiomno e Elisa Frota Pessôa para criar o Instituto de Física da UnB. Eles não viam perspectiva no CBPF, seja pelo autoritarismo de Octacílio Cunha, seja pelas crescentes crises financeiras pelas quais passava a instituição. Já outros pesquisadores do Centro, como Alfredo Marques e Jacques Danon, eram contra uma possível junção com a UnB e acreditavam que o CBPF voltaria a receber recursos e daria a volta por cima.
Vários alunos da Faculdade Nacional de Filosofia seguiram para Brasília com Tiomno e Elisa na expectativa de se dedicarem à pesquisa em física. Entretanto, o sonho da UnB durou pouco e, no final de 1965, 223 professores, entre eles Salmeron, Tiomno e Elisa, pediram demissão em função de uma nova intervenção militar na Universidade e em solidariedade aos colegas que tinham sido autoritariamente demitidos [41, 42]. Ao retornarem para o CBPF, Tiomno e Elisa foram boicotados pela Direção. Ele conseguiu que o CNPq transferisse para o CBPF recursos que tinha conseguido para a UnB, bastando para isso um aceite do presidente do Centro, o que não aconteceu, pois Cunha não queria que Tiomno ficasse como gestor dos recursos. Sem espaço no CBPF nem na FNFi, Tiomno se inscreveu no concurso para professor catedrático de Física Superior, que tinha sido aberto na USP.
A situação do CBPF era de completo esvaziamento de seu corpo científico devido principalmente à questão financeira, mas agravada a partir de 1964 pelos problemas com a Direção do CBPF. Muitos pesquisadores que foram fazer suas pós-graduações no exterior, ao retornar, não ficaram no CBPF: Antônio Luciano Videira foi para a USP, José de Lima Accioly seguiu para a UnB, e Alceu Pinho Filho, Erasmo Madureira Ferreira e Nicim Zagury pediram licença sem vencimento para se vincularem à PUC-RJ. Estes últimos queriam continuar colaborando gratuitamente com o CBPF, mas foram processados por abandono de emprego e tiveram sua entrada proibida no Centro.
Já com relação aos pesquisadores titulares, a situação era ainda mais grave: Lattes tinha ido para a USP; Samuel MacDowell foi para Princeton e depois para Yale: Moisés Nussenzveig foi também para Princeton e depois para Rochester; Luis Marques estava trabalhando na França. Guido Beck foi para Argentina em 1963 para trabalhar na Universidade Bariloche, permanecendo com licença sem vencimentos no CBPF. Em 1966, por exigência de Cunha, pediu rescisão de seu contrato de trabalho [43]. Roberto Salmeron, apesar de ser um dos fundadores do CBPF, não foi absorvido depois de ter deixado a UnB e retornou ao CERN, Tiomno e Elisa Frota-Pessôa estavam se transferindo para São Paulo e Leite Lopes estava no exílio em Paris. Dentre os pesquisadores titulares, permaneciam apenas Hervásio de Carvalho, Jacques Danon e Francisco Mendes de Oliveira Castro.
Também entre os recém-formados, o clima era de insatisfação. Muitos dos alunos que foram com Tiomno e Elisa para Brasília e receberam bolsas ao retornarem ao Rio para desenvolver pesquisas no CBPF sofreram perseguições. Isso fez com que fossem buscar outros caminhos: Miriná e Carlos Alberto Lima retornaram para a UnB, agora como professores; Marcelo Caminha Gomes foi para a USP fazer o doutorado com Tiomno; e muitos foram fazer suas pós-graduações fora do Brasil, como Sônia Frota-Pessôa; José Carlos Valladão de Mattos, Mário Novello, Sérgio Joffily, Alberto Santoro, Marcos Maia, Moacyr Souza e João dos Anjos. Numa entrevista, Novello lembrou o sábio conselho de José Leite Lopes14:
Vocês serão mais importantes quando recomeçar a estrutura normal do CBPF. Agora nós estamos numa estrutura totalmente anormal, houve uma invasão externa, não são cientistas que controlam o CBPF. Então seria importantíssimo que vocês fossem fazer suas formações da mais alta qualidade fora e depois ajudar a reestruturar o CBPF15.
Octacílio Cunha também soube se aproveitar do cargo. Através de um grande número de procurações, ele e José Machado de Faria controlavam as votações na Assembleia Geral. Uma das decisões tomadas foi que o presidente do CBPF, diferentemente do que vinha acontecendo desde sua fundação, poderia passar a ser remunerado pelo cargo. Em 1967, a Assembleia decidiu que o presidente e o diretor executivo poderiam receber a quantia equivalente ao vencimento do pesquisador titular, acrescida de 20% e 10%, respectivamente. E em 1969 foi aprovado um jeton por reunião do Conselho Curador no valor de 25% do salário base do pesquisador titular, limitada a duas por mês [44, 45].
Em dezembro de 1969, Hervásio de Carvalho foi nomeado para a presidência da CNEN, na época vinculada ao Ministério das Minas e Energia. Pouco depois, Octacílio Cunha foi contratado como seu assessor, ampliando sua remuneração e criando uma situação sui-generis: na CNEN, Hervásio era o presidente e Cunha seu assessor, já no CBPF, Cunha era o presidente e Hervásio um dos pesquisadores.
Até sua contratação como professor titular da USP em janeiro de 1968, Tiomno foi uma voz ativa, e muitas vezes isolada, nas poucas reuniões do Conselho Técnico-Científico, denunciando os atos autoritários e o esvaziamento do CBPF, especialmente do Departamento de Física Teórica, completamente desmantelado. Num documento para o CTC, ele denunciou que
… Eu próprio fui alvo dessa perseguição, conforme declarei há meses na última reunião deste Conselho, aliás a única além da presente, realizada neste semestre. Esclareci então que só decidi-me a fazer concurso de cátedra na USP por verificar que a política de “terra arrasada” adotada nestes últimos anos no CBPF e na FNFi tinha praticamente liquidado com a física nessas instituições [46].
Mas, sua decepção maior era com Jacques Danon, que começou a dar suporte aos atos de Octacílio Cunha e Hervásio de Carvalho. Como mencionado anteriormente, Danon tinha um passado de luta contra as perseguições aos militantes do Partido Comunista e havia sido até expulso da França por conta disso. Quando retornou da França, foi impedido pelo CSN de ingressar no CBPF, tendo sido aceito apenas em 1959, e mesmo assim com o voto contrário de Hervásio “por ser subversivo” [47]. Durante o processo de criação da UnB viajou com um pequeno grupo de cientistas para os países comunistas Polônia, Tchecoslováquia e União Soviética, sob a chefia do embaixador Paulo Carneiro, para conseguir equipamentos para os laboratórios da futura universidade, causando um mal-estar diplomático com os Estados Unidos.16 E logo após o golpe militar, foi conduzido coercitivamente para prestar depoimento. Porém, durante a presidência de Octacílio Cunha, Danon assumiu uma posição bastante pragmática, que lhe permitiria continuar suas pesquisas, o que fez com que Tiomno em 1967 o acusasse no CTC de apoiar medidas autoritárias [48]. No início de 1968, quando Hervásio deixou o cargo para fazer um curso na Escola Superior de Guerra, Danon foi nomeado diretor científico. Os órgãos de segurança alertaram Octacílio Cunha sobre o passado de Danon, mas este conseguiu mantê-lo no cargo, justificando que:
O professor Danon é um cientista de valor, dedicado ao trabalho científico e que durante minha gestão não teve nenhuma atitude que permitisse considerá-lo como contrário à revolução ou exercesse quaisquer atividades esquerdistas. Pelo contrário, em virtude de sua colaboração com a Diretoria atual e das atitudes que tomou durante uma crise fomentada na instituição por elementos de esquerda, passou a ser abertamente hostilizado por esses, que têm tentado por todas os modos desmoralizá-lo nos meios científicos, inclusive no estrangeiro [49].
Em março de 1967, o general Humberto Castelo Branco foi sucedido pelo general Arthur da Costa e Silva, que era de linha mais liberal, e a ditadura parecia estar mais branda. Houve uma campanha para o retorno dos cientistas e intelectuais que haviam deixado o país, que ficou conhecida como “Operação Retorno”. Leite Lopes voltou ao Brasil e assumiu a Direção do Departamento de Física Teórica. Paralelamente, a Faculdade Nacional de Filosofia foi desmembrada e criado o Instituto de Física, que passou a ser dirigido por Leite Lopes. Para ele, o novo Instituto, fora da FNFi, poderia finalmente ser o destino seguro para o CBPF.
Em novembro de 1968, o governo fez um decreto instituindo a reforma universitária, que atendia muitas das aspirações da comunidade acadêmica, e no mês seguinte baixou o ato mais duro da ditadura, o AI-5. Este permitia ao governo decretar o recesso do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e das Câmaras de Vereadores, intervir nos estados e municípios, suspender os direitos políticos, demitir e aposentar servidores públicos, entre outras arbitrariedades. Alguns estudos discutem os motivos que levaram o governo Costa e Silva a mudar de postura e baixar o AI-5. Segundo Rodrigo Motta, o governo e os grupos de direita se sentiam acuados e enfraquecidos com as manifestações da esquerda estudantil, as constantes críticas na imprensa e de intelectuais, e a perda de prestígio no Congresso. Um estopim foi o voto de grande parte dos congressistas da Arena, partido de sustentação do governo, contra retirar a imunidade parlamentar do deputado Márcio Moreira Alves, que havia feito duras críticas ao governo e se referido aos militares como um “santuário de torturadores”. Isso deu espaço para que adeptos de um aumento da repressão pelo governo autoritário e defensores do anticomunismo extremo ganhassem protagonismo, influenciando os militares [1].
As primeiras medidas do governo, em dezembro de 1968 e janeiro de 1969. foram decretar o recesso do Congresso Nacional e cassar deputados federais e ministros do Supremo Tribunal Federal. Foram montadas comissões sumárias de inquérito nos diversos ministérios, inclusive no MEC, denominada Comissão de Investigação Sumária do MEC (Cismec). Ela era dirigida por Jorge Boaventura de Souza e Silva, professor de Direito da Faculdade Nacional de Filosofia, diretor-geral do Departamento Nacional de Educação do MEC e ferrenho anticomunista.17 A ele coube a elaboração da lista de professores a serem aposentados compulsoriamente.
Em 25 de abril de 1969 era publicada a primeira lista de aposentadorias, e não deve ser motivo de surpresa que ela focasse principalmente nos professores da FNFi. No caso da Física, estavam listados José Leite Lopes, Elisa Frota-Pessôa, Sarah de Castro Barboza de Andrade e Plínio Sussekind Rocha. Até Tiomno, que havia se transferido para a USP, foi aposentado compulsoriamente da Universidade do Brasil, onde não pertencia mais aos seus quadros. Três dias depois, saiu uma nova lista de professores aposentados da USP, onde apareciam os nomes de Tiomno e Mario Schenberg, da Física [51].
Os cientistas aposentados, na grande maioria lideranças nas suas áreas, foram para o exterior ou começaram a buscar alternativas em outras instituições. Sarah foi contratada na PUC, e Tiomno, Leite Lopes e Elisa retornaram para o CBPF. Pouco depois, Leite Lopes foi alertado pelo embaixador americano que estava numa lista de pessoas a serem assassinadas. A própria embaixada providenciou sua partida e de seus familiares às pressas para os Estados Unidos. Posteriormente, ele se transferiu para a França, onde permaneceram por vários anos.
Para evitar que os professores fossem acolhidos em outros espaços de trabalho, o Governo editou em 21 de outubro o Ato Complementar 75, que determinava que qualquer instituição pública ou privada que recebesse recursos públicos não poderia contratar cientistas aposentados com base no AI-5.
Muitas instituições tentaram driblar a determinação com diversos subterfúgios, como montar uma comissão interna para estudar cada caso ou fazer diversos questionamentos como forma de protelar eventuais demissões. Esse foi o caso da PUC-RJ, que manteve a física Sarah de Castro Barboza de Andrade e o ex-catedrático da UB, o químico João Cristóvão Cardoso, em seus quadros. Já o CBPF assumiu uma postura diferente e, em 31 de outubro, apenas 10 dias após a promulgação do Ato Complementar, demitiu José Leite Lopes (que estava exilado nos Estados Unidos), Jayme Tiomno, Elisa Frota-Pessôa e inclusive Mario Schenberg, que estava dando uma disciplina na pós-graduação como professor convidado.
Os pesquisadores do Centro foram contrários à demissão dos físicos que haviam fundado o CBPF, mas Danon, que era o diretor científico, considerou que a manutenção dos três na instituição impediria o recebimento de verbas federais e ocasionaria o fechamento do Centro.
Consultei os meus colegas informalmente … A maioria não foi favorável [à demissão]. [Mas], era preferível manter viva a instituição, para que ela pudesse renascer. Inclusive, quem sabe um dia rever todos esses atos que, na minha opinião, não foram justificados em relação a esses colegas. O que certamente ocorrerá [19].
Alguns cientistas que estavam de licença do CBPF, trabalhando no exterior, como Samuel MacDowell, Fernando Souza Barros e Moysés Nussenzveig, pediram demissão da instituição brasileira em solidariedade aos três fundadores do Centro demitidos.
5.Acomodação e Arapongagem
Pouco tempo depois, houve nova mudança na Diretoria-Científica devido a problemas de gestão, pois Danon passava grande parte do tempo na França e terminava deixando algumas lacunas no dia a dia. Em seu lugar, assumiu Alfredo Marques. Ele tinha o objetivo de tentar trazer a normalidade ao CBPF: investiu nos cursos de pós-graduação, tentou recompor o quadro científico, apesar dos problemas financeiros, e ampliou o contato com os pesquisadores que estavam no exterior, enviando notícias sobre a instituição e remetendo as Notas de Física e cópias das teses e dissertações defendidas no CBPF.
Apesar dos baixos salários dos pesquisadores, a situação financeira do CBPF havia melhorado em função de uma articulação que teve início anos antes. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE, na época sem o ‘S’) possuía uma linha de financiamento para desenvolvimento tecnológico na indústria, e um pequeno percentual desses recursos deveria ser utilizado pelas empresas para a pesquisa científica, o que não acontecia. Houve, então, um movimento de vários cientistas com a participação do responsável pela gestão dos recursos no BNDE, José Pelúcio Ferreira, para que os recursos fossem repassados diretamente às universidades e institutos para financiar a pesquisa. Ainda em 1962/1963, quando Leite Lopes era diretor científico do CBPF, foi acertado repasse de recursos do BNDE para o Centro, mas isso só veio a ocorrer de fato em 1965. Num relatório, Cunha informou que, corrigindo os valores com base na inflação, o CBPF havia recebido entre 1964 e 1967 o valor total de NCr[dollar] 162.100,00, mais do que recebera nos 8 anos anteriores, que correspondia a NCr[dollar] 157.900,00 [35]. Porém, no mesmo relatório, Cunha confirmava que Guido Beck e Moysés Nussenzveig deixaram o CBPF por conta dos baixos salários. Como o CBPF era uma instituição privada e poderia estabelecer a tabela de vencimentos de sua equipe, é razoável supor que os baixos salários estavam vinculados também a uma política institucional, e não exclusivamente à falta de recursos.
Não foi instalada uma Assessoria Especial de Segurança e Informações (AESI) no CBPF, como ocorreu na maioria das universidades, que fazia a vigilância, censura e triagem para autorizar eventuais contratações ou demissões e expulsões, [52] mas os pesquisadores, bem como as movimentações internas, eram permanentemente monitorados.
É difícil saber com precisão como funcionava a vigilância sobre pesquisadores e técnicos do CBPF, visto que muitos arquivos foram destruídos nos anos finais da ditadura. Mas, a maior parte das informações sobre o CBPF que circulava no sistema repressivo vinha da “fonte das áreas de ciência e tecnologia” da Divisão de Segurança e Informações do Ministério das Minas e Energia.
Em uma denúncia sobre o mal uso de dinheiro público pela Diretoria, o almirante Henry British Lins de Barros, um dos fundadores do Centro, cita Lineu Faria da Câmara Leal como informante junto aos órgãos de segurança [44, 45]. Lineu Leal havia sido nomeado superintendente de pós-graduação da UFRJ e, paralelamente, Octacílio Cunha designou-o como encarregado geral de obras do CBPF e substituto eventual do diretor executivo do CBPF. Atividades bastante distintas, mas que davam acesso a informações nas duas instituições. Posteriormente, ele passou a ser informante do CENIMAR, o Centro de Informações da Marinha, junto ao setor estudantil, recebendo o codinome Eufrásio [53].
O fato é que esta fonte era extremamente bem informada. Assim, por exemplo, em 1971, o informante alertava que o CBPF recebeu notificação judicial relativa a processos interpostos por Jayme Tiomno, José Leite Lopes e Elisa Frota-Pessôa para readmissão, citando diversos detalhes sobre os processos. Em seu relatório, ele afirma que:
Os cientistas que ora tentam sua readmissão são declaradamente contra a Revolução de março de 1964 e sempre procuraram intoxicar a mocidade, deturpando e distorcendo verdades e procuraram, em círculo fechado, impedir que qualquer outro cientista que não comungasse de suas ideias tivesse acesso nos quadros brasileiros da ciência e tecnologia [54].
Tal documento mostra, em primeiro lugar, que o informante tinha acesso à Diretoria do CBPF e conhecia pessoalmente os três cientistas, ou reproduzia informações fornecidas por alguém que os conhecia.
Em dezembro de 1971, a mesma fonte alertava que estava previsto para março do ano seguinte a segunda reunião da Assembleia do Centro Latino Americano de Física (CLAF). Dizia que o CLAF abrigava cientistas exilados de outros países, sugeriu que o governo brasileiro exonerasse o diretor Roberto Bastos da Costa, e colocasse em seu lugar o coronel Wilson Moreira Bandeira de Mello, chefe do Departamento de Ensino e Intercâmbio Científico da CNEN. Em seu relatório, o informante fez questão de ressaltar que, apesar do CLAF ter um viés esquerdista, a Diretoria do CBPF não tinha qualquer responsabilidade sobre o Centro, pois a decisão de sediá-lo no CBPF era do governo brasileiro [55]. Ele tinha, pois, o cuidado de preservar a Diretoria do Centro de qualquer responsabilidade sobre os atos denunciados. Não se sabe em qual órgão do Ministério de Minas de Energia esta fonte estava instalada ou como se dava o acesso às informações, mas é sugestivo que ele recomende um funcionário da CNEN, que na época fazia parte do referido Ministério.
6.Nova Crise
Em 1972, a Diretoria do BNDE decidiu que não seria mais permitido utilizar recursos do FUNTEC para pagamento de salários ou manutenção das instituições, como vinha ocorrendo. Estes deveriam ser utilizados exclusivamente no desenvolvimento dos projetos de pesquisa. Extremamente dependente destes recursos para garantir o custeio institucional, mais uma vez a situação financeira se tornou crítica para o CBPF. E agora, diferente de períodos anteriores, não havia o prestígio dos grandes nomes para ajudar a alavancar os recursos.
Alguns pesquisadores do CBPF retomaram a ideia do Centro se vincular a uma universidade, de forma a garantir seu custeio, enquanto outros eram contrários, achando que este perderia sua autonomia. No final, a solução encontrada foi a incorporação à UFRJ. A Direção do CBPF queria que o CBPF mantivesse sua autonomia e identidade institucional, continuasse como sociedade civil e na sua sede da Praia Vermelha, e demandava um prazo de 3 anos para sua integração. A Universidade via a proposta com desconfiança e achava que a Direção do CBPF não tinha interesse de fato na incorporação. Temiam que, resolvidos os problemas financeiros imediatos, o CBPF descartaria a Universidade. O Instituto de Física da UFRJ era favorável a uma integração imediata e total, com a incorporação dos pesquisadores, laboratórios e a biblioteca [56].
O corpo técnico-científico do CBPF não se incomodava em assumir outras atividades ligadas ao ensino e à extensão, mas queriam preservar a pesquisa como principal atividade. Eles estavam revoltados com o processo autocrático, centralizado na Direção, e cobravam maior participação nas decisões [57]. Não havia, contudo, unanimidade sobre a melhor solução. É significativo que em outubro de 1972, os pesquisadores do CBPF enviaram um abaixo assinado ao ministro da Educação, Jarbas Passarinho, encabeçado por Cesar Lattes, Alfredo Marques e Jacques Danon, afirmando que seria uma perda para o país o fechamento de uma instituição de prestígio como o CBPF, mas sem fazer qualquer demanda ou sugestão específica. Possivelmente, foi o texto de consenso a que se conseguiu chegar [58].
Pouco depois, Octacílio Cunha e Luiz de Castro Faria, sub-reitor de Ensino para Graduados e Pesquisa da UFRJ, abortaram por completo a iniciativa, assinando um documento decidindo pela impossibilidade de integração do CBPF à UFRJ como órgão em sua estrutura, “devido às especificidades das duas instituições” [59].
A Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro expressou, então, o desejo de absorver o CBPF para formar seu Departamento de Física. Mas, no final, optou-se por um convênio com a Federação das Escolas Isoladas do Estados da Guanabara (FEFIEG, antecessora da UNIRIO) [60], que chegou a ser autorizado pelo Ministério da Educação, mas não foi levado adiante.
A situação financeira do CBPF era extremamente crítica: os salários não eram reajustados há vários anos, apesar da inflação elevada, linhas de pesquisa tinham sido paralisadas em função da falta de recursos para a manutenção dos equipamentos, foi suspensa a aquisição de periódicos e livros, e interrompido o programa de obras. Como consequência, parte significativa do pessoal qualificado estava se transferindo para outras instituições.
Além disso, continuavam as perseguições aos desafetos: Carlos Marcio do Amaral teve negado seu pedido de licença sem vencimentos para passar um período na USP, sendo forçado a se demitir; Solange de Barros, Aldo Carlos Moura Gonçalves, Nadine Lisbone e Luis Felipe A. Castro foram demitidos de forma arbitrária; também o técnico Luiz Felipe Villares de Paiva foi demitido por se manifestar contra os atos autoritários.18 Pesquisadores enviaram cartas à Sociedade Brasileira de Física denunciando as decisões autoritárias, e as condições salariais e de trabalho [62] Contudo, a falta de lideranças dificultava uma articulação organizada junto a autoridades, políticos ou associações científicas.
A solução só começaria a se desenhar após o falecimento de Octacílio Cunha em 6 de outubro de 1974. A Assembleia do CBPF elegeu o general Macedo Soares, que já havia sido presidente de 1955 a 1963, com a expectativa de que ele conseguiria debelar a crise na instituição. Engenheiro metalúrgico, com pós-graduação na França, ele era da linha do desenvolvimento nacionalista do Exército. Macedo Soares foi um dos articuladores para a criação da Companhia Siderúrgica Nacional, dando ao Brasil autonomia na produção de aço, e foi seu primeiro diretor técnico. Era uma pessoa bastante influente: havia sido presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) e da Confederação Nacional da Indústria (CNI), e ministro da Indústria e Comércio do governo Costa e Silva. Além disso, tinha boas relações com Ernesto Geisel, que havia sido seu aluno e tinha assumido a presidência da República em março daquele ano.
Macedo Soares utilizou seus contatos e influência para tentar solucionar o problema financeiro do Centro. A primeira coisa foi destravar o convênio com a FEFIEG, parado desde fins de 1972, e conseguiu a liberação dos recursos do MEC. Ele procurou os presidentes do BNDE e do CNPq, além dos ministros da Educação e do Planejamento. Também acertou um convênio com a CNEN, pelo qual o CBPF daria um curso preparatório de física para engenheiros e técnicos de nível superior da área de energia nuclear para futuro ingresso em pós-graduações. Mas os recursos obtidos resolviam problemas pontuais e davam fôlego por alguns meses, a grande dificuldade era garantir o pagamento da folha de pessoal e dos direitos trabalhistas, que estavam cada vez mais atrasados.
Sem ver uma solução a partir dos contatos realizados, em novembro de 1975, Macedo Soares procurou o presidente Geisel. Ele preparou uma longa carta falando da criação e da excelência do Centro, de como sempre tinha funcionado a partir de recursos públicos, do considerável patrimônio em termos de prédios, equipamentos e biblioteca, e da necessidade de encontrar uma solução definitiva. Ele teve o cuidado de informar que em 1963 “elementos de esquerda elegeram Darcy Ribeiro presidente do Centro”, mas a produção continuou normalmente, pois a maioria dos pesquisadores não se envolveu nos “problemas políticos que agitavam o país nesse período”, e que o Centro mantinha uma estreita colaboração com o Instituto Militar de Engenharia. Por fim, ele dizia que um governo que estava fazendo grandes investimentos em ciência e tecnologia não podia deixar uma instituição como o CBPF se extinguir [63].
Geisel atendeu o pedido de Macedo Soares e determinou ao ministro Reis Velloso, do Planejamento, que encontrasse uma solução. Nessa época, o CNPq era subordinado ao Ministério do Planejamento, e já possuía vários institutos de pesquisa vinculados, como o Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e o Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação (IBBD, posteriormente renomeado IBICT). Era, pois, justificável que tivesse também um instituto voltado para a área de física.
A partir daí, a situação teve um rápido desdobramento: no mês seguinte (dezembro de 1975) foi realizada uma Assembleia Geral do CBPF, onde foi formalizada a decisão de extinguir o Centro enquanto sociedade privada, demitir todos os funcionários e incorporar os bens ao patrimônio do CNPq. Em janeiro de 1976, foi criado o CBPF como instituto de pesquisa do CNPq.
Para a Direção, foi convidado Antônio Cesar Olinto, doutor em física teórica pelo MIT, e que era desde 1968 diretor do Instituto Brasileiro de Informática, uma unidade do IBGE, também vinculado ao Ministério do Planejamento. Para Olinto, era a oportunidade de retornar para um espaço de física e de pesquisa. Ele encontrou uma instituição esvaziada e um ambiente contraditório: por um lado, havia a tristeza com o fim do ‘antigo’ CBPF e a insatisfação de estar num órgão subordinado ao governo militar, por outro, o alívio pela recuperação do valor dos salários e a possibilidade de voltar a receber investimentos para a pesquisa.
Entretanto, com a subordinação ao CNPq, surgia um novo problema: o CBPF passou a sofrer ingerência da Assessoria de Segurança e Informação (ASI) que funcionava no CNPq. Assim, quando começou o processo de recontratação do quadro, Olinto foi pressionado para não contratar Jacques Danon, Alberto Passos Guimarães e Ramiro de Porto Alegre Muniz. Contudo, ele ignorou as orientações, e manteve a contratação dos três pesquisadores. Ele recebeu, então, pressão do chefe da ASI para demiti-los sob a alegação de que eram de esquerda, mas conseguiu segurá-los no cargo e a situação terminou se acomodando. Paradoxalmente, Olinto não foi pressionado para não contratar os físicos argentinos Carlos Guido Bollini e Juan José Giambiagi que vieram para o Brasil fugindo da ditadura na Argentina. Possivelmente, eles ainda não tinham entrado nos registros do DOPS19.
Estas perseguições, denominadas ‘cassação branca’, eram comuns e na maioria das vezes não documentadas: pesquisadores, professores e estudantes tinham negados seu visto para uma viagem ao exterior, a bolsa aprovada pelo Conselho Deliberativo do CNPq não era implementada, ou a nomeação para cargos públicos não era efetivada, entre outros casos. Principalmente a partir da segunda metade da década de 1970, isso começou a ser denunciado, juntamente com o movimento pelo retorno dos exilados. Os pesquisadores do I Encontro de Física da Matéria Condensada, realizada em Cambuquira, em maio de 1978, fizeram um abaixo assinado, encaminhado ao presidente do CNPq denunciando as cassações brancas e seu impacto no trabalho de pesquisa [64]. Segundo relatório do SNI,
Trata-se de campanha iniciada por componentes da SBPC, que dia a dia, vem crescendo e se tornando obrigatória em todas as reuniões, congressos e simpósios que tem como participantes, representantes da comunidade científica.
Conforme a opinião de cientistas, liderados por JOSÉ BERNARDO GOLDEMBERG, SÍLVIO SALINAS e JACQUES ABULAFIA DANON, todos da SBF (Sociedade Brasileira de Física), com apoio de reitores de algumas universidades, as “Cassações Brancas” representam obstáculos feitos pelos órgãos de Segurança do Governo, através de desaconselhamentos para bolsas de estudos, afastamentos do País, auxílios e em casos de contratação de pessoal, impedindo aos pesquisadores de exercerem livremente suas atividades profissionais [65].
Numa reportagem feita pela Folha de São Paulo, foi denunciado o caso de um professor do CBPF que “não tem conseguido nem apoio financeiro nem licença para desenvolver seu projeto científico”, e na PUC-RJ “há professores que não conseguem obter licença para viagens de propósitos científicos, um desses docentes já foi diretor do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas”, mas sem especificar os nomes [66].
7.Reparação Moral
Após forte pressão da sociedade brasileira, em 28 de agosto de 1979 foi promulgada a Lei da Anistia. Era um processo planejado e controlado pelo regime, que permitia o retorno dos exilados, restauração de direitos civis aos políticos que foram afastados de seus cargos, liberação dos presos políticos e reintegração de pessoas que tinham sido demitidas ou aposentadas compulsoriamente. A anistia também foi aplicada a agentes da ditadura, como torturadores e membros dos esquadrões da morte. Isso os livrou de punições, diferente do que ocorreu na Argentina, e ainda é fonte de tensão na sociedade brasileira. A anistia não significou, contudo, o desmonte imediato do sistema repressivo e de informações dos órgãos de segurança, e aqueles que tinham sido aposentados ou tiveram seus direitos cassados continuavam a ser monitorados. Assim, por exemplo, em setembro de 1979, a DSI do Ministério dos Transportes divulgou uma lista de “comunistas e simpatizantes” que, no entender deles, continuavam desenvolvendo ações subversivas. Nesta, constava que Jayme Tiomno “continua em suas atividades esquerdistas, inclusive na SBPC, infiltrada de comunista há aproximadamente 10 anos atrás” [67].
A Lei de Anistia determinava que aqueles que haviam sido demitidos ou aposentados teriam que solicitar sua reintegração dentro de um prazo de 120 dias, e suas petições seriam avaliadas por uma comissão. Muitos professores aposentados compulsoriamente recusaram-se a solicitar sua reabilitação. Hersch Moyses Nussenzveig, diretor do Instituto de Física da USP e amigo pessoal de Tiomno, escreveu convidando-o a solicitar sua reintegração e afirmando que seria muito bem-vindo. Mas Tiomno recusou-se a solicitar a reintegração, não havia pedido para ser aposentado e agora não pediria para ser readmitido [68]. Mario Schenberg teve uma atitude semelhante com relação à USP. Porém, mesmo sem ter sido formalmente reintegrado, simplesmente começou a dar palestras, participar de seminários e até orientar estudantes, e ninguém se atreveu a contestar. Da mesma forma, Elisa recusou-se a solicitar sua reintegração na UFRJ. Leite Lopes, que ainda se encontrava em Estrasburgo, como professor do Centro de Pesquisas Nucleares da Universidade Louis Pasteur, por sua vez, concordou em solicitar sua reintegração à UFRJ sob a condição de que poderia continuar passando parte de seu tempo na França.
Logo após a publicação da anistia, todos os integrantes do Centro assinaram uma carta aberta enviada ao presidente do CNPq, José Dion de Melo Telles, solicitando a reintegração de Tiomno, Elisa e Leite Lopes. O retorno deles não era, contudo, uma questão simples. Em primeiro lugar, os órgãos de informação estavam acompanhando e se manifestando sobre essa movimentação para a reintegração dos três [69]. Havia também um imbróglio administrativo, visto que eles foram demitidos da sociedade civil CBPF e agora deveriam ser recontratados pela autarquia CNPq. Por fim, havia muito ressentimento por terem sido demitidos do Centro que haviam fundado. Tiomno, por exemplo, se recusava a ir ao CBPF para participar dos encontros do Grupo de Relatividade e Cosmologia, o que fez com que os encontros fossem realizados na PUC para que ele pudesse participar [44] Conforme já mencionado, além dos três pesquisadores titulares, houve inúmeras perseguições, demissões e pessoas que se desligaram do Centro.
Antônio Olinto havia assumido a Direção do recém-criado Laboratório de Computação Científica e o diretor interino do CBPF, o físico Roberto Lobo, montou uma espécie de “estratégia de reabilitação” dos antigos membros para tentar superar os ressentimentos e trazer de volta os pesquisadores que saíram na época da repressão. Se não fosse possível como contratados, ao menos como parceiros. Em 23 de novembro de 1979, o CBPF realizou uma cerimônia para a qual foram convidados todos os que haviam sido afastados em decorrência do AI-5 ou por decisão do CBPF, bem como aqueles que pediram demissão em protesto ou simplesmente deixaram a instituição por oposição às atitudes autoritárias da Direção. O nome já era bastante indicativo: ‘Sessão Pública de Reparação Moral e Reinício da Colaboração’. Não era uma situação fácil, pois não era possível simplesmente esquecer o passado e continuar em frente como se nada tivesse acontecido. Tiomno foi indicado para fazer um discurso em nome dos perseguidos. Muito emocionado, listou várias das injustiças que haviam sido perpetradas no ‘antigo Centro’. Ele mencionou as muitas pessoas que foram forçadas a pedir licença, tiveram suas bolsas suspensas e seus contratos de trabalho arbitrariamente cancelados devido a ordem de algum oficial militar. Era preciso afirmar e reafirmar o que aconteceu para haver uma possibilidade de trabalharem juntos novamente no ‘novo Centro’ [47].
Para os membros mais jovens do CBPF, Tiomno, Elisa e Leite Lopes eram quase personagens míticos, que participaram da criação do Centro e físicos de renome internacional, que mereciam grande respeito. A situação era desconfortável não por terem compactuado com ações arbitrárias, mas por estarem trabalhando numa instituição que havia cometido inúmeras arbitrariedades. Além disso, houve situações especialmente delicadas, como a exigência do CNPq de que o currículo do pesquisador a ser reintegrado fosse avaliado por um membro do CBPF, de forma a definir em que nível da carreira seria enquadrado. No caso de Jayme Tiomno, esta tarefa coube ao seu ex-aluno Mario Novello, que, constrangido, redigiu a recomendação [44].
Leite Lopes também decidiu reintegrar-se ao Centro, mas com a condição de que pudesse ficar afastado. Os serviços de segurança reclamaram do que eles consideravam muita “generosidade” para com ele [70]. Numa carta a Haity Moussatché, que também havia sido aposentado compulsoriamente da Fiocruz e estava no exterior, Leite Lopes desabafou: “A verdade é que somos marcados, somos ex-exilados, quer dizer, ex-condenados, e tanto no CNPq como na Universidade, apenas toleram-me” [71].
Havia também a questão de como se adaptar à nova estrutura administrativa do CBPF. Jayme Tiomno foi inicialmente designado como chefe do Departamento Científico, correspondente ao cargo de diretor científico do ‘antigo Centro’. No entanto, quando a fundação privada foi fundada, em 1949, o presidente do Centro não era um físico, mas uma figura de prestígio nacional, que tinha funções de representação, enquanto o diretor científico era o responsável por orientar o desenvolvimento científico da instituição. Neste novo momento, o CBPF não tinha mais presidente, e seu diretor, Roberto Lobo, era físico e queria ser o responsável pelo direcionamento científico do Centro, causando alguns atritos com Tiomno. Na verdade, desde sua incorporação ao CNPq não havia sido estabelecida ainda uma estrutura organizacional formal, com uma clara definição das funções de cada um dos setores. Depois de dois anos, foi estabelecido o Regimento, acabando com a função de chefe do Departamento Científico. Tiomno foi, então, nomeado chefe do Departamento de Relatividade e Partículas.
Em 1985, foi criado o Ministério da Ciência e Tecnologia, e o novo ministro, Renato Archer, iniciou um esforço para trazer de volta os cientistas que tinham ido para o exterior, ou, ao menos, incentivar uma colaboração com aqueles que já estavam bem estabelecidos e não tinham desejo ou possibilidade de retornar. Os pesquisadores do CBPF iniciaram, então, um movimento para trazer Leite Lopes definitivamente de volta da França e torná-lo diretor do Centro, o que aconteceu no ano seguinte.
8.Conclusão
À semelhança de outras universidades e institutos de pesquisa, o CBPF também foi vítima do desmonte provocado pela ditadura civil-militar implantada através do golpe de 1964, mas com certas especificidades.
Criado através da aliança de jovens físicos, que desejavam ter um espaço institucional para trabalhar com pesquisa, com setores empresariais e militares, o CBPF foi visto, num primeiro momento, como importante ator para o domínio da tecnologia nuclear no Brasil, seja para a produção de energia, seja para fins militares. Contudo, com o passar do tempo, essa relação foi mudando devido a alguns fatores. O primeiro deles foi a percepção de que havia uma grande distância entre a pesquisa científica desenvolvida pelo grupo de físicos e a capacitação tecnológica almejada.
Outro fator foi a defesa da ciência e tecnologia e de educação de qualidade como elementos fundamentais para a promoção do desenvolvimento econômico e social e a soberania nacional. Essa proposta se inseria dentro de uma linha de pensamento conhecida como ‘nacional-desenvolvimentismo’, e que distinguia os interesses do Brasil dos de outros países, principalmente os Estados Unidos. Em função disso, eram, muitas vezes, vistos como antiamericanos ou comunistas.
O terceiro fator era a tentativa de implantar um ambiente de pesquisa na universidade, com a formação de novos pesquisadores, a criação da pós-graduação e a reforma no sistema universitário. Esta proposta ameaçava o status quo existente na Universidade do Brasil e os colocou em rota de colisão com professores catedráticos mais tradicionais, que viam como principal função da universidade a formação de profissionais e de professores para o ensino básico. Para muitos desses professores, a tentativa de mudança nas universidades se confundia com uma transformação política e ideológica mais ampla, constituindo-se numa subversão, tanto da universidade, como da ordem social e política vigente. Numa entrevista realizada em 1977, ao ser perguntado por que o CBPF tinha sido identificado como um local de comunistas, Leite Lopes respondeu:
Porque o Centro quebrou o negócio… Havia professores engenheiros que eram empregados em outras firmas para fazer engenharia. O Centro acabou com isso. Tinha uma equipe de jovens formados no exterior, conhecidos no exterior, pelo menos por um certo número de físicos com quem trabalharam, e que implantaram um regime diferente. Isso era alvo. Isso quebrava interesses [27].
Por fim, houve a eleição de Darcy Ribeiro e Almir de Castro para presidente e vice do CBPF, o que passou a ideia de alinhamento com o governo de João Goulart.
Conforme já mencionado, não houve uma intervenção externa, como ocorreu em inúmeras universidades e instituições de pesquisa. A eleição de uma nova Diretoria fazia parte de um plano de resistência do Centro, que visava blindá-lo de um eventual desmonte pelo governo e da suspensão dos recursos, através da eleição de uma Diretoria que fosse bem vista pelo governo. A estratégia pareceu ter sucesso de início: não houve interferência policial-militar, nem suspensão dos recursos públicos que garantiam a sua manutenção. Pelo contrário, foram conseguidos recursos adicionais para a conclusão do novo prédio, cujas obras estavam paradas há alguns anos. Por outro lado, a Diretoria se mostrou autoritária e alinhada com o pensamento do governo militar. Ela importou para dentro do CBPF as perseguições e expurgos que estavam acontecendo nas universidades e em vários segmentos da sociedade, criando um clima interno tenso e promovendo um esvaziamento institucional, em especial de suas principais lideranças. Pesquisadores foram processados, boicotados, perseguidos e demitidos, a ponto de, em certo momento, ter apenas três titulares em atividade no Centro.
Dentre os pesquisadores e técnicos, houve alguns casos de apoio às medidas de Cunha por alinhamento ao pensamento do governo militar ou pelo que poderíamos caracterizar como pragmatismo, ou seja, apesar de não apoiarem o golpe, colaboraram com a Direção, dando sustentação científica, com vistas a tentar garantir a manutenção da instituição e de seu espaço de trabalho, mesmo às custas do apoio ao expurgo de colegas.
Porém, a grande parte do corpo técnico-científico assumiu um papel de resistência e de defesa dos valores que levaram à criação do CBPF. Houve diferentes formas de resistência, como o envio dos jovens para o exterior para fazerem suas pós-graduações e retornarem quando a situação estivesse mais calma, garantindo a continuidade do Centro; impedimento da demissão de colegas; denúncias das perseguições nos órgãos colegiados internos e associações científicas; transferência para outras instituições; e recusa em cumprir ordens dos órgãos de segurança e informação. Também houve casos de militares que, independentemente de questões ideológicas, agiram para proteger o Centro e membros de seu corpo técnico-científico de violências externas.
Como ocorreu em outros locais, também no CBPF as relações pessoais muitas vezes se impuseram às posições políticas e ideológicas e pesquisadores foram protegidos em função de sua relação com a Direção do órgão, apesar de seu passado de esquerda. Além disso, pessoas que apoiavam o governo foram designadas para cargos no serviço público ou conseguiram aproveitar o clima autoritário para criar práticas que os beneficiava financeiramente.
Não havia um órgão de segurança e informação interno ao CBPF, como ocorreu em inúmeras universidades e no próprio CNPq. Contudo, com a colaboração da Direção, agentes puderam monitorar membros do CBPF, em especial seus pesquisadores. Com a incorporação do CBPF ao CNPq, o monitoramento, que estava inicialmente localizado em órgão do Ministério das Minas e Energia, passou para o âmbito da Secretaria de Planejamento (SEPLAN), ao qual o CNPq estava vinculado.
A adesão da Diretoria do CBPF às perseguições impostas pelo regime militar não resultou, contudo, numa garantia da continuidade institucional. Ele se beneficiou inicialmente dos recursos do FUNTEC, negociados ainda pela Diretoria anterior ao golpe civil-militar, e de verbas do MEC para a construção do novo prédio. Porém, com a decisão do BNDE de não mais financiar salários e a manutenção da instituição, o CBPF se viu na iminência de extinção. Não é claro porque o presidente da República se preocupou em buscar uma solução para o CBPF e apoiou sua transferência para o setor público. Pode ter sido pelo desejo de manter uma instituição científica de prestígio, reforçando a infraestrutura científica do país, ou para atender o pedido pessoal de um amigo, no caso o novo presidente do CBPF.
A dificuldade de encontrar uma solução para o Centro e as divisões internas sobre o caminho mais adequado a ser seguido foi reflexo direto da ausência de uma liderança científica legítima, capaz de articular e viabilizar uma solução. Isso só foi possível devido ao prestígio e as articulações do novo presidente do Centro.
Por fim, com o enfraquecimento do regime militar e a lei da Anistia, foi fundamental a pressão dos pesquisadores e a sensibilidade da nova Direção para criar um ambiente receptivo, que permitisse que pesquisadores demitidos e afastados se sentissem confortáveis para retornar ou voltar a interagir com o Centro.
Agradecimentos
Agradeço a Olival Freire Jr., Antônio Augusto Passos Videira, Rodrigo Patto Sá Motta, Gilberto Hochman e Alberto Passos Guimarães pelo compartilhamento de informações e materiais, aos pareceristas, que deram importantes sugestões, e a Mário Novello, Nicim Zagury, Antônio Cesar Olinto, Marcelo Otávio Caminha Gomes, Carlos Alberto da Silva Lima, Miriná Lima, José Goldemberg e Sônia Frota-Pessôa pelas entrevistas concedidas. Os apoios foram fundamentais para a produção deste artigo.
Referências
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- 4 [4] J.E.F. Clemente, Ciência e política durante a ditadura militar (1964-1979): o caso da comunidade brasileira de físicos. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal da Bahia, Salvador (2005).
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- 6 [6] M.C. D’Araújo, em: Fundação Getulio Vargas: concretização de um ideal (Editora FGV, Rio de Janeiro, 1999).
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- 13 [13] J.C. Ribeiro, Declaração no plenário do Conselho Deliberativo do CNPq (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1955).
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- 17 [17] FICHA verde sobre Cesar Lattes (Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 19–).
- 18 [18] FICHA verde sobre Jacques Abulafia Danon (Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 19–).
-
19 [19] J.A. Danon, Jacques Danon (depoimento, 1977), disponível em https://www18.fgv.br/cpdoc/storage/historal/arq/Entrevista481.pdf
» https://www18.fgv.br/cpdoc/storage/historal/arq/Entrevista481.pdf - 20 [20] S. Motoyama, em: O Almirante e o novo Prometeu: Álvaro Alberto e a C&T (Editora Unesp, São Paulo, 1996).
- 21 [21] D.S.V. Jesus, Política Hoje 20, 829 (2011).
- 22 [22] A.M.R. Andrade e T.L. Santos, Parcerias Estratégicas 14, 225 (2009).
- 23 [23] D. Salles, Energia atômica – um inquérito que abalou o Brasil (Editora Fulgor, São Paulo, 1958).
- 24 [24] POLÍTICA Nacional de Energia Nuclear, apreciada pelo Conselho de Segurança Nacional e adotada pelo governo (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1956).
- 25 [25] RELATÓRIO da Divisão de Informações do DOPS sobre Jayme Tiomno (Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1972).
-
26 [26] A VOZ Operária, disponível em: https://www.marxists.org/portugues/tematica/jornais/voz-operaria/pdf/per154512_1956_00370.pdf
» https://www.marxists.org/portugues/tematica/jornais/voz-operaria/pdf/per154512_1956_00370.pdf -
27 [27] J.L. Lopes, José Leite Lopes (depoimento, 1977), disponível em: https://www18.fgv.br/cpdoc/storage/historal/arq/Entrevista494.pdf
» https://www18.fgv.br/cpdoc/storage/historal/arq/Entrevista494.pdf - 28 [28] PROFESSORES comunistas da Faculdade Nacional de Filosofia (Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1964), série Boletim Reservado, dossiê 23, notação 04/02/1964, folha 12.
- 29 [29] PROFESSORES comunistas da Faculdade Nacional de Filosofia (Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1964), série Boletim Reservado, dossiê 23, notação 04/02/1964, folhas 5-24.
- 30 [30] FICHA verde de Elisa Frota-Pessôa (Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 19–).
- 31 [31] ATA da Reunião Extraordinária da Congregação da Faculdade Nacional de Filosofia (Arquivo da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1964).
- 32 [32] Projeto apresentado ao Fundo Especial das Nações Unidas para a organização de um curso de pós-graduação em física pelo CBPF (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1960).
- 33 [33] UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA, Estatuto da Universidade de Brasília (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1965).
- 34 [34] DOCUMENTOS referentes à Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara dos Deputados, 31/08/1956 a 23/10/1956 (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1956).
- 35 [35] O. Cunha, Relatório apresentado à Assembleia Geral Extraordinária (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1968).
- 36 [36] O. Cunha, Resposta às denúncias de corrupção na Direção do CBPF (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1972).
- 37 [37] O. Cunha para W. Baltensperger (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1964), correspondência.
- 38 [38] A.P. Guimarães, Forças de Atração: crônicas de uma carreira científica no Brasil (Publicação Independente, Rio de Janeiro, 2021).
-
39 [39] M.M. Alves, Correio da Manhã, disponível em: https://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=089842_07&pagfis=57503
» https://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=089842_07&pagfis=57503 - 40 [40] INFORME do Setor de Segurança e Informações da CNEN para a Agência Central do SNI em 27/09/72 (Arquivo Nacional, Serviço Nacional de Informações, Rio de Janeiro, 1972).
- 41 [41] R.A. Salmeron, A universidade interrompida: Brasília 1964–1965 (Editora UnB, Brasília, 2012).
-
42 [42] J.M.F. Bassalo, O Instituto Central de Física Pura e Aplicada da Universidade de Brasília, em 1965, disponível em: https://cbpfindex.cbpf.br/publication_pdfs/CS01012.2012_06_26_16_31_21.pdf
» https://cbpfindex.cbpf.br/publication_pdfs/CS01012.2012_06_26_16_31_21.pdf - 43 [43] G. Beck para O. Cunha, em: Guido Beck: the career of a theoretical physicist seen through his correspondence, organizado por A.A.P. Videira e C. Puig (Livraria da Física, São Paulo, 2020).
- 44 [44] H.B. Lins de Barros, Denúncia sobre irregularidades na Direção do CBPF, 26/04/11972 (Arquivo Nacional, Serviço Nacional de Informações, Rio de Janeiro, 1972).
- 45 [45] O. Cunha, Resposta para Setor de Segurança e Informações da CNEN (Arquivo Nacional, Serviço Nacional de Informações, Rio de Janeiro, 1972).
- 46 [46] J. Tiomno, Discurso no CTC do CBPF (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1967).
- 47 [47] J. Tiomno, Palestra proferida na Sessão pública de reparação moral e reinício da colaboração, CBPF (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1979).
- 48 [48] J. Tiomno, Declarações que o professor Jayme Tiomno foi impedido pelo Presidente do CBPF de fazer em sua Assembleia Geral de 29/12/1967 (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1967).
- 49 [49] O. Cunha, Informe confidencial (Arquivo Nacional, Serviço Nacional de Informações, Rio de Janeiro, 1969).
-
50 [50] C. Caldas, Professor Jorge Boaventura de Souza e Silva, disponível em https://jorgeboaventura.wordpress.com/
» https://jorgeboaventura.wordpress.com/ - 51 [51] J.B. Souza e Silva, Ofício secreto n◦ 15/69 para ministro da Educação e Cultura (Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, Brasília, 1969).
- 52 [52] R.P.S Motta, Topoi 9, 30 (2008).
-
53 [53] CENTRO DE INFORMAÇÕES DA MARINHA, Ficha de Lineu Faria da Câmara Leal, disponível em: https://www.ufmg.br/brasildoc/temas/3-informantes-infiltrados-agentes-e-centros-de-repressao/3-1-cenimar/ Acesso em 19/09/2022.
» https://www.ufmg.br/brasildoc/temas/3-informantes-infiltrados-agentes-e-centros-de-repressao/3-1-cenimar/ - 54 [54] DIVISÃO DE SEGURANÇA E INFORMAÇÕES DO MINISTÉRIO DAS MINAS E ENERGIA, Infiltração da esquerda nos setores de ciência e tecnologia (Arquivo Nacional, Serviço Nacional de Informações, Rio de Janeiro, 1971), informação n. 30/1182/71.
- 55 [55] DIVISÃO DE SEGURANÇA E INFORMAÇÕES DO MINISTÉRIO DAS MINAS E ENERGIA, Infiltração de esquerda nos setores de ciência e tecnologia (Arquivo Nacional, Serviço Nacional de Informações, Rio de Janeiro, 1971), informação n. 10/1190/71/BSB-08.12.71.
- 56 [56] A. Macedo para L.C. Faria (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1972), correspondência.
- 57 [57] ABAIXO-ASSINADO de pesquisadores e técnicos aos diretores do CBPF (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1972).
- 58 [58] ABAIXO-ASSINADO dos pesquisadores do CBPF a J. Passarinho, ministro de Educação e Cultura (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1972).
- 59 [59] DOCUMENTO assinado por Octacílio Cunha, presidente do CBPF, e Luiz de Castro Faria, sub-reitor de Ensino para Graduados e Pesquisa da UFRJ (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1972).
-
60 [60] UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, História, disponível em: www.unirio.br/institucional/historia
» www.unirio.br/institucional/historia - 61 [61] A.G. Pinho para J. Danon (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1973), correspondência.
- 62 [62] A.G. Pinho para A.P. Guimarães (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1975), correspondência.
- 63 [63] E.M.S. Silva para E. Geisel (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1973), correspondência.
- 64 [64] J. Goldemberg para J.D.M. Telles (Arquivo Nacional, Serviço Nacional de Informações, Rio de Janeiro, 1978), correspondência.
- 65 [65] AGÊNCIA CENTRAL DO SERVIÇO NACIONAL DE INFORMAÇÕES, Cassações Brancas (Arquivo Nacional, Serviço Nacional de Informações, Rio de Janeiro, 1978), informação n. 0582/19/AC/78.
- 66 [66] FOLHA de São Paulo (Arquivo Nacional, Serviço Nacional de Informações, Rio de Janeiro, 1978).
- 67 [67] DIVISÃO DE SEGURANÇA E INFORMAÇÕES DO MINISTÉRIO DOS TRANSPORTES, Infiltração nos diversos setores de atividades (Arquivo Nacional, Serviço Nacional de Informações, Rio de Janeiro, 1979), informação n. 575.
- 68 [68] J. Tiomno para J. Goldemberg (Arquivo de História da Ciência do Museu de Astronomia e Ciências Afins, Rio de Janeiro, 1979), correspondência.
- 69 [69] RELATÓRIO do Departamento Geral de Investigações Especiais do DOPS (Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1979).
- 70 [70] SERVIÇO NACIONAL DE INFORMAÇÕES, Relatório sobre a “Admissão do professor José Leite Lopes pelo CNPq” (Arquivo Nacional, Serviço Nacional de Informações, Rio de Janeiro, 1980).
- 71 [71] J.L. Lopes para C. Moussatché e H. Moussatché (Casa de Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 1982), correspondência.
- 72 [72] W.D. Brewer, A.T. Tolmasquim, Jayme Tiomno: a Life for Science, a Life for Brazil (Springer, Suíça, 2020).
-
1
Uma versão preliminar deste trabalho foi apresentada no 18° Seminário Nacional de História da Ciência e da Tecnologia, no Simpósio História da Ciência e Tecnologia no Brasil – 1945–2000, realizado na USP, em setembro de 2022.
-
2
Ver, por exemplo, Motta [1].
- 3
- 4
- 5
- 6
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Com a volta do Partido Comunista à legalidade em 1946, Schenberg concorreu a uma cadeira na Assembleia Legislativa de São Paulo. Ele foi eleito como suplente e assumiu a função no final de 1947. Com a nova lei que jogava novamente o PCB na ilegalidade, Schenberg foi preso. Pouco depois, ele foi autorizado a deixar o país para participar do Congresso Internacional de Intelectuais pela Paz, em Wrocław, exilando-se em seguida na França e depois na Bélgica.
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O primeiro acordo secreto para exportação de areias monazitas data de julho de 1945, seguido por outros em fevereiro de 1952 e em agosto de 1954. Em novembro de 1948 foi assinado um acordo Brasil-EUA para mapeamento das jazidas para levantamento dos recursos minerais brasileiros. Ver Motoyama [20].
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Ver, por exemplo, A Voz Operária [26].
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Apesar da denúncia ser anônima, ele se identifica indiretamente ao dizer que é catedrático do Curso de Matemática e se refere aos outros dois catedráticos do Departamento, levando a conclusão de que o denunciante era o catedrático de Geometria, Ernesto Luiz de Oliveira Júnior.
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Hervásio de Carvalho foi citado na Comissão Parlamentar de Inquérito como um dos autores, junto com os americanos Max White e Donald Campbell, dos chamados ‘documentos secretos’ relacionados à tentativa de deposição de Álvaro Alberto e interferência na política sobre os minerais radioativos. Hervásio, contudo, foi inocentado por Juarez Távora, chefe do Gabinete Militar do presidente Café Filho, que afirmou que ele mesmo tinha anotado o nome de Hervásio nos documentos para lembrar de consultá-lo sobre o assunto, [23, 34].
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12
Instrutor era o primeiro nível da carreira, anterior ao de assistente.
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13
Era necessário visto de saída para poder viajar ao exterior.
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Leite Lopes retornou ao Brasil em 1967. A ditadura tinha arrefecido e foi lançada pela SBPC e outras associações uma campanha para trazer de volta ao Brasil cientistas que haviam se exilado logo após o golpe de 1964. Esse movimento foi chamado de Operação Retorno.
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Entrevista concedida por Mario Novello ao autor do artigo em 29/08/2019.
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O Brasil tinha um superavit com os países da Europa Oriental por conta da exportação de café, que o governo resolveu trocar por equipamentos para os laboratórios.
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17
Jorge Boaventura de Souza e Silva era seguidor das doutrinas de Gustavo Barroso e Plínio Salgado, dois expoentes da Ação Integralista Brasileira [50].
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Num ofício de Alceu G. Pinho, presidente da SBF, para Jacques Danon, o primeiro diz que o assunto levou o Conselho e a Diretoria da SBF a manifestarem preocupação por ferir a ética que rege o funcionamento de instituições científicas [61].
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19
Informações fornecidas por Antônio Cesar Olinto em entrevista ao autor do artigo.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
15 Jan 2024 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
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Recebido
26 Set 2023 -
Revisado
07 Nov 2023 -
Aceito
09 Nov 2023