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Professores de Física da cidade de São Paulo: um olhar relacional para a desigualdade educacional

Physics teachers in the city of São Paulo: a relational perspective at educational inequality

Resumos

Este artigo busca refletir sobre as desigualdades educacionais e sociais e sua relação com a representatividade de docentes licenciados nas disciplinas de Ciências da Natureza. Fez-se um recorte espacial para as capitais do Brasil e o uso de técnicas estatísticas e de geoprocessamento através dos dados dos Censo Escolar (2019) e Catálogo de Escolas. Os resultados apontam a baixa representatividade de docentes com Licenciatura em Física atuando nas aulas de Física, em comparação à Química e Biologia, tanto na rede pública estadual quanto na privada. Aprofunda-se a discussão para a cidade de São Paulo, contemplando suas diferenciações quantitativas de docentes licenciados e localizando-os no território, a partir das porções territoriais com populações em vulnerabilidade socioeconômica. Os professores licenciados em Física apresentaram variações de suas formações na distribuição no espaço urbano, sendo sub-representados nos espaços de vulnerabilidade social e econômica. Complementarmente, foi realizado um estudo desses docentes considerando variáveis como gênero e raça, sendo os que lecionam Física, majoritariamente declarantes brancos e masculinos. A partir de uma abordagem interdisciplinar, buscou-se compreender a relação entre escola, território e professores em áreas urbanas, destacando a necessidade de reflexões políticas e formativas para fortalecer o ensino de Física na Educação Básica.

Palavras-chave:
Ensino de Física; Formação Docente; Desigualdade Social; Estudos Urbanos


This article aims to reflect on educational and social inequalities and their relationship with the representation of licensed teachers in the Natural Sciences disciplines. A spatial cut was made for the capitals of Brazil and the use of statistical and geoprocessing techniques using data from the School Census (2019) and School Catalog. The results point to the low representation of teachers with a degree in Physics working in Physics classes, compared to Chemistry and Biology, both in the state and private schools. The discussion is deepened for the city of São Paulo, considering its quantitative differences in licensed teachers and locating them in the territory, based on the territorial portions with socioeconomically vulnerable populations. Teachers with degrees in Physics presented variations in their training in the distribution in urban space, being underrepresented in spaces of social and economic vulnerability. In addition, he carried out a study of these teachers based on variables such as gender and race, with those who declared teaching Physics being mostly white and male. Using an interdisciplinary approach, the aim was to understand the relationship between school, territory, and teachers in urban areas, highlighting the need for political and formative reflections to strengthen the teaching of Physics in Basic Education.

Keywords
Physic Teaching; Teaching Training; Social Inequalities; Urban Studies


1. Introdução

O espaço social é o lugar onde as pessoas vivem e trabalham, onde assumem suas tarefas cotidianas e profissionais. Esse espaço não se configura unicamente como o lugar onde ocupamos fisicamente, mas também remete às condições culturais e sociais de existência. Para Pierre Bourdieu [1[1] P. Bourdieu, Miséria do mundo (Vozes, Petrópolis, 2012).] os ’efeitos do lugar’ suscitam naqueles que vivem a experiência objetiva, a justaposição de posições sociais também associados ao território. É no espaço social (ou campo) que as propriedades dos indivíduos se situam e são comparadas entre si. Ao vivermos no contexto neoliberal em que a posse se torna uma condição sine qua non para a participação no jogo social [2[2] C. Laval, Foucault e Bourdieu: e a questão neoliberal (Elefante, São Paulo, 2018).], o lugar onde se habita é uma demonstração importante de hierarquização e distinção social [1[1] P. Bourdieu, Miséria do mundo (Vozes, Petrópolis, 2012).].

Nesse sentido, o acesso ao saneamento básico, a oferta de bens culturais e a qualidade dos serviços prestados ao público podem ser considerados exemplos das manifestações objetivas de como o espaço social se transforma no lugar de distinção entre os indivíduos. Assim, a construção do juízo de valor e do sentido estético se dá no espaço onde se operam as mais distintas formas de socialização e aquisição cultural. Ao passo que o lugar se torna uma condição importante de reconhecimento do valor simbólico dos indivíduos, o espaço social não pode ser descaracterizado nas análises sobre os agentes que nele vivem.

Ou seja, no que tange ao território, em diálogo com a sociologia urbana, especialmente no espaço intra-urbano e na constituição das cidades, há a concordância que os efeitos de lugar fazem parte dos processos sociais e, portanto, estão imbricados na espacialidade. Assim, tornando a presença do e no espaço como marcadores sociais relevantes no debate sobre a segregação intra e entre grupos [3[3] F. Villaça, Espaço intra-urbano no Brasil (Studio Nobel/ FAPESP, São Paulo, 2001).]. Partindo desse contexto que se concebe o espaço urbano como um produto da ação humana, que implica na manifestação e mediação de estruturas de poder nele existentes, bem como na compreensão do território como resultado das configurações espaciais específicas entre agentes e suas trajetórias. Ademais, segundo Villaça [3[3] F. Villaça, Espaço intra-urbano no Brasil (Studio Nobel/ FAPESP, São Paulo, 2001).], a estrutura nacional, conflito de classe e a dominação política e econômica são dimensões no espaço intra-urbano que se manifestam na estrutura espacial, aprofundando e atuando nos processos de desigualdade social. Assim, a segregação socioespacial se torna instrumento de dominação, através da condição simbólica e social, bem como no exercício da dominação do intra-urbano, que resulta na distribuição desigual das apropriações no território através do acesso aos bens culturais e sociais das frações de classes [3[3] F. Villaça, Espaço intra-urbano no Brasil (Studio Nobel/ FAPESP, São Paulo, 2001).]. Nesta perspectiva, considerando que as metrópoles brasileiras se constituíram sócio-historicamente de maneira similar, assim como a própria concepção de Estado (circunscritas no espaço-tempo), é de se esperar que tais configurações espaciais tendam a se assemelhar, em maior ou menor grau [3[3] F. Villaça, Espaço intra-urbano no Brasil (Studio Nobel/ FAPESP, São Paulo, 2001).]. Desta forma, este estudo ainda que dê enfoque para o recorte da capital paulista, busca diálogos com as demais capitais brasileiras colocando a questão educacional como protagonista neste processo.

Outro elemento de análise relevante refere-se aos instrumentos de governança das cidades, e, portanto, faz parte da compreensão do território entender as políticas que dele e nele se constituem. Assim, contextualizá-los torna-se parte relevante para a estruturação do que se entende pelo espaço social estudado. Nesta direção, o Plano Diretor é um instrumento legal, com primazia participativa e democrática, em que se esboçam as diretrizes e desenvolvimentos espaciais da cidade por determinado período [4[4] BRASIL, Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001. Brasília, 2001. Disponível em:https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm#:$\sim$:text=LEI%20No%2010.257%2C%20DE%2010%20DE%20JULHO%20DE%202001.&text=Regulamenta%20os%20arts.%20182%20e,urbana%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias.&text=Art.,Par%C3%A1grafo%20%C3%BAnico.
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]. Um dos seus desdobramentos legais pode implicar na legislação de ordenamento, como a de uso e ocupação do solo. Considerando interesses difusos, tais instrumentos tendem a incorporar esforços e tensões de diversos agentes, como, por exemplo, os do setor imobiliário e da sociedade civil organizada [5[5] S.P. Bernardini, Cadernos Metrópole 14, 135 (2012).]. Nesta direção, em uma leitura bourdieusiana, podemos considerá-lo como um instrumento simbólico, produto de tensionamentos e forças atuantes conforme diferentes interesses, difusos e divergentes entre os agentes [6[6] P. Bourdieu, Sociologia geral (Vozes, Petrópolis, 2021), v. 2.]. Em uma aproximação educacional, assim como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é a base e diretrizes para a educação brasileira, o Plano Diretor apresenta diretrizes para o planejamento territorial na municipalidade1 1 Na cidade de São Paulo, o Plano Diretor, enquanto política de desenvolvimento urbano, possui base jurídica na lei 16.050 de 31 de julho de 2014, e tem-se, entre seus desdobramentos, a consolidação, por exemplo, em um dos instrumentos de parcelamento, uso e ocupação do solo (no caso particular, da cidade de São Paulo, a lei número 16.402, de 22 de março de 2016). No momento da produção deste artigo, o Plano Diretor estava sendo revisto, conforme período determinado para revisão. .

No que tange à ocupação do solo na cidade, as diretrizes e conceitos que regem o ordenamento territorial, como a qualificação das atividades sociais e econômicas da cidade, são baseadas em diferentes elementos objetivos de análise. Pode-se citar os adensamentos demográficos e os incentivos à integração de uso de transportes, de instalação de equipamentos sociais ou promoções à conservação ambiental. Para isso, uma das estratégias se refere a delimitação de ‘Zonas’ as quais são concebidas como porções territoriais com parâmetros específicos, tanto para parcelamento, uso e ocupação do território. Sendo assim, cada zona possui características específicas e interesses específicos (e.g., industriais; comerciais; de preservação ambiental e cultural; de estruturação urbana).

Dentre as zonas territoriais, este artigo tem como foco as ‘Zonas Especiais de Interesse Social’ (ZEIS). Tais áreas podem ser compreendidas como um instrumento de política urbana para a promoção da integração de populações de baixa renda à estrutura urbana, sob princípios como função social da propriedade e o direito à cidade [4[4] BRASIL, Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001. Brasília, 2001. Disponível em:https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm#:$\sim$:text=LEI%20No%2010.257%2C%20DE%2010%20DE%20JULHO%20DE%202001.&text=Regulamenta%20os%20arts.%20182%20e,urbana%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias.&text=Art.,Par%C3%A1grafo%20%C3%BAnico.
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, 7[7] R. Rolnik e P.F. Santoro, Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) em Cidades Brasileiras: Trajetória Recente de Implementação de um Instrumento de Política Fundiária (Lincoln Institute of Land Policy, Cambridge, 2013).]. Esta concepção, institucional e conceitual na legislatura urbana brasileira remonta à efervescência de movimentos sociais e ao período de redemocratização dos anos de 1980. Tais experiências, de regularização fundiária e integração destas áreas e das populações residentes, foram concretizadas inicialmente por algumas cidades como Recife (Pernambuco) e Diadema (São Paulo) e, posteriormente, em outras cidades nos anos de 1990 [7[7] R. Rolnik e P.F. Santoro, Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) em Cidades Brasileiras: Trajetória Recente de Implementação de um Instrumento de Política Fundiária (Lincoln Institute of Land Policy, Cambridge, 2013)., 8[8] MINISTÉRIO DAS CIDADES, Como delimitar e regulamentar Zonas Especiais de Interesse Social, disponível em:https://www.gov.br/cidades/pt-br/assuntos/publicacoes/arquivos/arquivos/guia_zeis_final.pdf.
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]. No entanto, foi com a aprovação do Estatuto da Cidade [4[4] BRASIL, Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001. Brasília, 2001. Disponível em:https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm#:$\sim$:text=LEI%20No%2010.257%2C%20DE%2010%20DE%20JULHO%20DE%202001.&text=Regulamenta%20os%20arts.%20182%20e,urbana%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias.&text=Art.,Par%C3%A1grafo%20%C3%BAnico.
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] que as ZEIS foram incorporadas como um dos instrumentos de gestão urbana nos Planos Diretores municipais, sob primazia democrática e cidadã para a ocupação do território urbano sendo prioritariamente para habitação de interesse social. O debate sociológico da ZEIS indica-a como um dos instrumentos urbanísticos estratégicos contra a exclusão social e uma potencialidade para uma gestão democrática e participativa do espaço urbano segregado, ainda que se reconheçam seus desafios [9[9] R. Rolnik, em: Instrumentos urbanísticos contra a exclusão social, editado por RolnikR. e R. Cymbalista (Escrituras Editora, São Paulo, 1997).].

No que tange às ZEIS da cidade de São Paulo [10[10] SÃO PAULO, Lei n. 16.050, de 31 de julho de 2014, disponível em:https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-16050-de-31-de-julho-de-2014.
https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/...
, 11[11] SÃO PAULO, Lei n. 16.402, de 22 de março de 2016, disponível em:https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-16402-de-22-de-marco-de-2016.
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], elas são subdivididas em cinco categorias (ZEIS-1; ZEIS-2; ZEIS-3; ZEIS-4; ZEIS-5). Cada uma delas possui características distintas, como áreas com favelas e assentamentos precários, áreas com imóveis ociosos ou subutilizados, ou lotes não edificados. No entanto, as cinco categorias de ZEIS se unificam em um valor característico de uma ZEIS: são porções do território, reconhecidas na municipalidade, para adequações ou reformulações de políticas públicas para populações de baixa renda, como regularização fundiária ou melhorias urbanísticas [10[10] SÃO PAULO, Lei n. 16.050, de 31 de julho de 2014, disponível em:https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-16050-de-31-de-julho-de-2014.
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, 11[11] SÃO PAULO, Lei n. 16.402, de 22 de março de 2016, disponível em:https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-16402-de-22-de-marco-de-2016.
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].

Para a delimitação metodológica nesta pesquisa, especifica-se o estudo na ZEIS-1, pois é nesta zona que há territórios com a presença de assentamentos precários, favelas ou loteamentos irregulares, e com tendência à concentração de populações socioeconomicamente vulnerabilizadas [10[10] SÃO PAULO, Lei n. 16.050, de 31 de julho de 2014, disponível em:https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-16050-de-31-de-julho-de-2014.
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, 11[11] SÃO PAULO, Lei n. 16.402, de 22 de março de 2016, disponível em:https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-16402-de-22-de-marco-de-2016.
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].

Se a desigualdade é uma das facetas explicitadas na consolidação das cidades, especialmente circunscritas em alguns territórios excluídos social e economicamente, caberia refletir de modo concomitante sobre as desigualdades educacionais, incluindo, por exemplo, aquelas relacionadas a formação docente, bem como aos problemas inerentes à escola e a formação dos alunos. Nesta direção, remonta-se aos desafios debatidos sobre essa temática em suas diversas facetas como, por exemplo, da complexidade da formação de professores sob à prismática acadêmica, profissional e política [12[12] A. Nóvoa, Cadernos de Pesquisa 47, 1106 (2017)., 13[13] D. Saviani, Revista Brasileira de Educação 14, 143 (2009).]. Soma-se a isso a historicidade temporal reduzida da formação de professores habilitados em Física ou Química na Educação Básica [14[14] A.I. Ruiz, M.N. Ramos e M. Hingel, Escassez de professores no Ensino Médio: Propostas estruturais e emergenciais (Ministério da Educação, Brasília, 2007).,15[15] BRASIL, Censo Escolar 2013: Perfil da docência no ensino médio regular, disponível em:https://download.inep.gov.br/publicacoes/institucionais/estatisticas_e_indicadores/censo_escolar_2013_perfil_da_docencia_no_ensino_medio_regular.pdf.
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,16[16] A.M. Bof, L.Z. Caseiro e F.C. Mundim, Cadernos de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais 9, 11 (2023).] no país. No eixo disciplinar da Física, além da baixa habilitação dos docentes que lecionam nessa disciplina na rede pública estadual brasileira, há ainda perfis sub-representados, como os das mulheres e dos indígenas [17[17] M.M. Nascimento, Revista Brasileira de Ensino de Física 42, e20200187 (2020).]. Para além do direito e acesso à educação, Soares, Alves e Fonseca [18[18] J.F. Soares, M.T.G. Alves e J.A. Fonseca, Rev. Bras. Estud. Popul. 38, e0167 (2021).] exploram, a partir de dados longitudinais do Censo Escolar (de 2007 a 2015), como há irregularidades na constância e permanência dos discentes nas escola, sendo a desigualdade um dos pilares que reforçam a evasão escolar. Os autores apontam que as populações de meninos pretos são as mais propensas a uma trajetória educacional irregular. Ademais, capital cultural, econômico e social e a relação escola e família, parecem ser instrumentos conceituais sociológicos pertinentes para compreender as trajetórias escolares ou os destinos escolares dos jovens, em especial, os estudantes na periferia das cidades [19[19] M.A. Nogueira, Paidéia 8, 91 (1998).,20[20] G.S. Perosa, F. Lebaron e C.K.S. Leite, Pró-Posições 26, 99 (2015).,21[21] L. Massi, L.R. Muzzeti e D.M. Sucifier, Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação 12, 1854 (2017).].

Nesta perspectiva, essas são apenas algumas camadas que, sobrepostas, parecem convergir e complexificar as questões educacionais. Com isso, a pesquisa apresentada propõe investigar a distribuição de docentes, com perfil formativo nas licenciaturas (e seus casos dissonantes), nas disciplinas específicas que lecionam partindo da grande área das Ciências da Natureza e suas Tecnologias (CNT), ou seja, compreendidas pelas áreas disciplinares de Física, Química e Biologia. Partindo do panorama inicial, serão mobilizados dados e reflexões para uma análise relacional da formação dos docentes do ensino médio paulista e sua distribuição no território.

Para isso, são mobilizados dois conceitos centrais para o estudo analítico proposto: a caracterização das Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) e os espaços das práticas culturais. Enquanto o primeiro evoca o espaço das propriedades estigmatizadas (favelas, guetos, assentamentos), o segundo propõe reconhecer a escola como o lugar de oposição ao destino social, o lugar dotado de oportunidades de apropriação de bens simbólicos como, em nosso estudo, o conhecimento científico. Assim, questiona-se: como as desigualdades educacionais e sociais no território se relacionam com a representatividade de docentes licenciados nas disciplinas específicas de Ciências da Natureza?

Partindo desse debate, as etapas dessa pesquisa foram: 1. Apresentar os dados do Censo Escolar (2019) nas capitais brasileiras e representar os docentes licenciados (de Física, Química e Biologia) nas redes de escolas públicas estaduais e privadas; 2. Analisar a cidade de São Paulo e suas desigualdades sócio-territoriais através dos estudos sobre a representatividade de docentes licenciados nas áreas de Física, Química e Biologia nas redes de escolas estaduais e privadas; compreender como se apresenta a distribuição territorial dos docentes licenciados; e, por fim, discutiremos as formações dos docentes que atuam em disciplinas de Ciências Naturais e os aspectos sociais que definem as desigualdades entre alunos no contexto da educação pública estadual paulistana2 2 Um adendo torna-se necessário para justificar o período escolhido dos dados e o perfil de questionamento apresentado. A BNCC e o Novo Ensino Médio foram políticas educacionais públicas que inviabilizam os estudos das áreas específicas, visto que atualmente não se pode analisar ensino de física separado de química ou biologia. Contudo, a reformulação da educação básica no âmbito federativo, como já vem sendo tratado em trabalhos sobre a temática, busca escamotear a falta de professores das áreas de física e química. Esse trabalho, portanto, foca no período “final” do antigo ensino médio onde se pode reconhecer nos dados a relação direta professor de física e disciplina de física. .

2. Metodologia

Ao propor reflexões sobre as interfaces do contexto socioeconômico das escolas em relação às desigualdades e o Ensino de Ciências, este trabalho desdobra-se na estruturação metodológica que busca a representação e construção do mundo social, através da análise de dados quantitativos. Dessa forma, há uma aproximação com os estudos de Pierre Bourdieu [5[5] S.P. Bernardini, Cadernos Metrópole 14, 135 (2012)., 22[22] P. Bourdieu, Sociologia geral (Vozes, Petrópolis, 2020), v. 1.] que apresenta uma sociologia prática voltada para a compreensão dos atos de classificação e suas análises, tanto no campo acadêmico quanto na construção do mundo social como um todo, realizando um recorte de um contínuo marcado no tempo social e histórico [22[22] P. Bourdieu, Sociologia geral (Vozes, Petrópolis, 2020), v. 1.].

Para a ‘construção do mundo social’, contida na compreensão dos problemas de interesse deste trabalho, fez-se uso de técnicas versadas ao geoprocessamento com uso do software QGIS, versão 3.14 [23[23] QGIS Geographic Information System. Geospatial Foundation Project, disponível em:https://qgis.org/.
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] e análises estatísticas. No que tange ao geoprocessamento, trata-se de um conjunto de tecnologias para gestão de informações espaciais, que são executadas por ferramentas de Sistemas de Informação Geográficas (SIG) [24[24] P.A. Burrough e R.A. Mcdonnell, Principles of geographical information systems (Oxford Univerty Press, Oxford, 1998).,25[25] A.B. Silva, Sistemas de informações geo-referenciadas: conceitos e fundamentos (UNICAMP, Campinas, 2010).,26[26] M.J. Smith, M.F. Goodchild e P.A. Longley, Geospatial Analysis: A Comprehensive Guide to Principles, Techniques and Software Tools (Winchelsea Press, Winchelsea, 2018).,27[27] J.I. Miranda, Fundamentos de Sistemas de Informações Geográficas (Embrapa, Brasília, 2019).]. Portanto, o QGIS é incorporado neste estudo enquanto um dos elementos do SIG, constituindo-se como um dos softwares que possibilitam a implementação das técnicas georreferenciais, desde o armazenamento das informações geoespaciais até as análises sobre o território. Vale sinalizar, todavia, que esses conhecimentos versam sobre a gestão da geoinformação e contemplam diversas áreas basilares, como por exemplo, cartografia, sistemas de informação geográfica, infraestrutura e modelagem de dados espaciais. Neste contexto, à luz da literatura [24[24] P.A. Burrough e R.A. Mcdonnell, Principles of geographical information systems (Oxford Univerty Press, Oxford, 1998).,25[25] A.B. Silva, Sistemas de informações geo-referenciadas: conceitos e fundamentos (UNICAMP, Campinas, 2010).,26[26] M.J. Smith, M.F. Goodchild e P.A. Longley, Geospatial Analysis: A Comprehensive Guide to Principles, Techniques and Software Tools (Winchelsea Press, Winchelsea, 2018).,27[27] J.I. Miranda, Fundamentos de Sistemas de Informações Geográficas (Embrapa, Brasília, 2019).], emergem aplicações em diversas áreas do conhecimento já consolidadas, como às questões ambientais, a gestão de riscos e desastres, geologia, agroeconomia e planejamento urbano. Ademais, com potencialidades a serem exploradas as questões educacionais, como a deste estudo.

Isto posto, partindo dos resultados obtidos, foram feitas incorporações de uma leitura da sociologia urbana sobre a constituição da cidade, especialmente da cidade de São Paulo. Tais instrumentalizações contribuíram para a tentativa de representação da realidade objetivada, a partir de um recorte do contínuo, com a estruturação de modelagens com microdados.

Nos microdados, cabe apontar, há informações no tempo histórico e social do Brasil que aliadas aos debates na Sociologia da Ciência e da Educação podem ser utilizados para refletir sobre a temática proposta neste objeto de pesquisa. Aproximando-se mais uma vez de Bourdieu [22[22] P. Bourdieu, Sociologia geral (Vozes, Petrópolis, 2020), v. 1.] em seus estudos sobre a institucionalização e os atos simbólicos da pesquisa, é necessário declarar que não há a pretensão de reduzir os problemas sociais e educacionais complexos às estatísticas. À luz de Bourdieu [22[22] P. Bourdieu, Sociologia geral (Vozes, Petrópolis, 2020), v. 1.], não há possibilidade de sujeitar à simplicidade os problemas sociais cujas mudanças são constantes, tanto do ponto de vista das políticas públicas como das produções culturais, tal qual atreladas aos processos educacionais que delas dependem. Contudo, tais ferramentas podem, complementarmente, subsidiar a compreender se a pergunta de pesquisa condiz com a experiência social dos agentes e se a prática sociológica proposta converge para uma realidade marcada no tempo histórico analisado.

Ressalta-se que, por utilizar de um instrumental primário já pré-estabelecido e desenvolvido por agências (e.g., Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, ou outras), as variáveis ‘pré-classificadas’ por estas instituições já se encontram disponibilizadas nos metadados dos microdados, e, portanto, sendo tais classificações as que estruturam este trabalho. Tal aspecto é importante, pois há certa similaridade com as reflexões de Pierre Bourdieu [22[22] P. Bourdieu, Sociologia geral (Vozes, Petrópolis, 2020), v. 1.] quanto a gênese das classificações, em que exemplifica a tipologia idealizada a partir de representação das variáveis pelas instituições. Nesta direção, pode-se citar o caso da variável “sexo” indicada binariamente como “Feminino” ou “Masculino” em que há uma incorporação de uma classificação dos agentes sociais já pré-definida pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Este trabalho, neste sentido, possui clareza, por exemplo, desta não binariedade e da necessidade da representação da pluralidade de gênero onde sua não incorporação, em uma leitura bourdieusiana, pode ser concebida como uma não legitimidade social.

Isto posto, a estruturação metodológica deu-se a partir de modelagens e uso dos microdados do INEP em dois momentos distintos. Em um primeiro momento, para as delimitações espaciais das escolas localizadas nas capitais brasileiras e o distrito federal, constituindo-se em 28 cidades; no segundo momento, realizaram-se desdobramentos e estudos específicos para a capital São Paulo.

Desta forma, a estrutura em dados deu-se a partir de alguns recortes metodológicos objetivando apenas o contexto da rede pública estadual3 3 Para evitar repetições ou dissociações entre termos, este trabalho mantém o uso de ‘rede pública estadual’, bem como ‘pública’ ou ‘estadual’, para as escolas sob administração dos Estados (ou no caso de Brasília, pelo Distrito Federal). Desta forma, o uso apenas do termo ‘pública’ não está associado às redes ‘públicas municipais’ ou às ‘redes públicas federais’. e a rede privada, com recorte para o Ensino Médio (ensino regular) e associados às disciplinas de Ciências Naturais e suas Tecnologias (CNT), isto é, Física, Química e Biologia. Para tanto, fez-se uso do Censo Escolar em sua completude (base de escolas; base de matrículas; base de turmas e base de docentes) do ano de 2019 e do Catálogo de Escolas, ambos do INEP. A incorporação metodológica sobre a territorialização do espaço urbano (com uso da Lei de Zoneamento de São Paulo) e dos Níveis Socioeconômicos (NSEs) das escolas [28[28] M.T.G. Alves, C.G. Rodrigues e A.S. Senkevics, Cadernos de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais 9, 159 (2023)., 29[29] INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, Nota Técnica n. 16, de 31 de julho de 2023, disponível em:https://www.gov.br/mec/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/conselhos-e-orgaos-colegiados/comissao-intergovernamental-fundeb/Nota_Tecnica_16_2023.pdf.
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] também foi estruturante para o recorte em São Paulo.

A partir dos metadados disponibilizados em cada um dos microdados e dos objetivos delineados, teve-se como premissa as articulações entre as bases: (i) todas as bases possuíam uma variável comum, a saber: o código da escola; (ii) para todos os microdados houve um recorte para as cidades de interesse, onde se indicava a cidade da escola; (iii) para a base de matrículas e turmas, a etapa de ensino considerada foi o Ensino Médio (regular); (iv) para a base de professores, foram relacionados docentes que declararam lecionar em disciplinas de Física, Química ou Biologia; (v) as escolas precisavam também estar declaradas no Catálogo de Escolas, garantindo maior segurança metodológica dos dados; (vi) ainda, a escola deveria ser da rede pública estadual ou privada.

As bases foram transacionadas, propiciando articulações e junções entre elas. Foi realizada uma etapa de validações intrabase e entre as bases. Tem-se como exemplo de validação entre bases: na base de matrículas, era possível realizar a contagem da quantidade de alunos do Ensino Médio na escola, a partir da variável direta de quantidade de alunos por etapa (1◦, 2◦ e 3◦ ano). Por outro lado, na base de turmas, havia a possibilidade de associar a quantidade de matrículas por escola, a partir da quantidade de discentes por turmas. Desta forma, foi possível inferir uma nova variável comparativa e artificial, que teria que ser verdadeira para a condição de que o total de alunos do Ensino Médio (base matrículas), fosse igual a variável da quantidade de matrículas (base de turmas). Outra comparação foi entre as bases de Matrícula, de Turma e de Docentes, considerando a quantidade de turmas contidas em cada uma das bases.

A Figura 1 ilustra, esquematicamente, as principais macro etapas da estrutura analítica, sinalizando a etapa de compilação das bases de dados (microdados); processamentos primários, com seleção e adequação dos dados; validações entre e intrabases; processamentos secundários, com as técnicas estatísticas e de geoprocessamento; e os dados de saída, aptos à apresentação.

Figura 1
Estruturação dos dados em macro etapas. Fonte: Autores, a partir do desenho metodológico.

3. Principais Resultados e Conclusões Preliminares

3.1. As capitais brasileiras: as diferençaseducacionais que as unem

Considerando o interesse em compreender como se dá a representação de docentes licenciados (de Física, Química e Biologia) nas capitais brasileiras, faz-se necessário refletir, na primazia, como é a representação de escolas e de discentes nas esferas estaduais e privadas nas capitais. Justifica-se, pois, é nesta representação que os docentes estão inseridos. Ademais, poderia haver sobrerrepresentações ou sub-representações entre as capitais. Esta ponderação é importante ser justificada devido aos possíveis volumes diferenciados, tanto de escolas quanto de alunos em cada capital, o que desdobraria em problemas complexos e específicos para cada uma das redes. No que se refere ao recorte das capitais justifica-se pela perspectiva de consolidação do espaço intra-urbano e por ter um uma processo histórico-social-político de urbanização [3[3] F. Villaça, Espaço intra-urbano no Brasil (Studio Nobel/ FAPESP, São Paulo, 2001).]. Ademais, estes territórios tendem a ser dotados de uma urbanidade cujo diálogo entre eles torna-se plausível, seja na perspectiva do urbano, seja na perspectiva de uma educação urbana.

Isto posto, a Tabela 1 propõe apresentar a dimensão das redes estaduais e privadas das capitais. Há duas seções, para a rede pública estadual e para a rede privada. No eixo vertical estão dispostas as capitais e no eixo horizontal as quantidades absolutas e suas representatividades (em porcentagens) tanto do volume global de escolas e alunos no Ensino Médio (regular).

Tabela 1
Representação da dimensão da rede pública estadual e privada nas capitais, do Ensino Médio (regular), em discentes e escolas associadas. Fonte: Autores, com base nos dados do Censo Escolar 2019 e Catálogo de Escolas do INEP.

Dos dados, pode-se depreender que os volumes globais, em porcentagens, da representação de alunos da rede pública estadual para todas as capitais tenderam a ser de cerca de 76,60%. No entanto, há capitais com volumes díspares e superiores como Manaus (93,04%), Boa Vista (91,90%), Rio Branco (91,04%) ou Porto Velho (90,12%). Ou ainda, os inferiores com aumento na representatividade de discentes na rede privada como é o caso de Aracaju, em que cerca de 60% dos discentes estavam na rede estadual ou João Pessoa com cerca de 62,60%. No entanto, tais representações precisam ser ponderadas nas análises devido às diferenciações de volumes globais das quantidades de discentes. Considerando a rede estadual e privada, a capital São Paulo, por exemplo, possui cerca de 365.704 discentes, enquanto Vitória possui 12.513 estudantes. Ao realizar estas ponderações, portanto, pode haver fatores que complexificam as demandas e a organização da própria rede, ou seja, cada qual possui suas limitações e complexidades, distintas entre si. Nesse sentido é salutar apontar que não se pretende elaborar correlações diretas como: ’maiores quantidades’, ’maiores desafios’.

Isto posto, concentramos nosso interesse em compreender como se dá a distribuição de docentes com (ou sem) licenciatura específica, na disciplina em que lecionam. Tal interesse deve-se, sobretudo, considerando a articulação dicotômica “Estadual” e “Privada”, carregando-se, portanto, uma classificação simbólica de acesso à Educação, seja por vias pública ou por uma “monetização” da educação a partir da rede privada.

As Tabelas 2 e 3 estão esquematicamente dispostas, respectivamente, para as redes pública estadual e privada. Ambas estruturadas na vertical pelas capitais dos Estados brasileiros e do Distrito Federal (Brasília). Na horizontal, considerando o contexto da Física, Química, Biologia, indica-se a representação da quantidade de docentes que declararam lecionar a disciplina, a quantidade de docentes que declararam possuir graduação na disciplina específica em que leciona (e.g, Licenciatura em Física (Lic Fis), Licenciatura em Química (Lic Qui), Licenciatura em Ciências Biológicas (Lic Bio)) e a porcentagem desta representação.

Tabela 2
Representação docente para a rede pública estadual, com ou sem licenciatura específica, da área disciplinar em que leciona. Recorte para as disciplinas de Ciências da Natureza, compreendido pelas áreas disciplinares de Física, Química e Biologia. Fonte: Autores, com base nos dados do Censo Escolar 2019 e Catálogo de Escolas do INEP.
Tabela 3
Representação docente para a rede privada, com ou sem licenciatura específica, da área disciplinar em que leciona. Recorte para as disciplinas de Ciências da Natureza, compreendido pelas áreas disciplinares de Física, Química e Biologia. Fonte: Autores, com base nos dados do Censo Escolar 2019 e Catálogo de Escolas do INEP.

Em uma perspectiva macrossociológica, para as capitais, há discrepâncias quantitativas absolutas nos números de docentes entre as capitais. Em especial, para a cidade de São Paulo, pois não há quantitativos semelhantes, em números absolutos, com as demais capitais em ambas as redes de ensino. Nesta direção, portanto, as porcentagens devem ser cautelosamente analisadas devido à quantidade de docentes (São Paulo, por exemplo, possui cerca de 1.869 docentes que declararam dar aulas de Física em uma escola pública estadual, enquanto no extremo oposto, Vitória possui cerca de 35 docentes). Desta forma, para além de realizar uma leitura vertical, isto é, entre as capitais, é válido realizar uma leitura horizontal dos dados desdobrando-se na desigualdade intra-capital.

No entanto, algumas inferências sobre esta dimensão do mundo social, objetivado, podem ser realizadas. Há uma tendência de menores representatividades de docentes que lecionam na disciplina de Física e possuem licenciatura em Física (Lic Fis) se comparado à Química e Biologia, sendo essas, respectivamente, as que possuem as maiores representatividades de docentes com licenciatura específica, seja nas escolas das redes pública estadual ou privada. Assim, ao analisar o volume global das capitais brasileiras, têm-se que há desigualdades nas representações, seja entre redes de ensino, seja entre as três áreas disciplinares ou entre as cidades selecionadas.

Na rede pública estadual, por exemplo, considerando todas as capitais, apenas cerca de 33,90% dos docentes que declararam lecionar em uma disciplina de Física possuíam a licenciatura em Física como formação. Para Química este valor alcança os 54,67% e Biologia 72,87%. As desigualdades na formação, portanto, chegam a intervalos proporcionais de quase 20% e 40%, quando comparados Física e Química, e Física e Biologia, respectivamente. Ademais, ao analisar as representações em porcentagem entre Física e Química das 27 cidades, apenas Belém, Palmas e Rio Branco possuem representações com mais docentes com Licenciatura em Física lecionando a disciplina de Física do que docentes com Licenciatura em Química (Lic Qui) lecionando Química. Todas as demais possuem mais Licenciados em Química lecionando aulas em Química do que Licenciados em Física lecionando em aulas de Física (ainda que haja certa homogeneidade e valores não tão díspares, como ocorre com a Biologia). Ainda, ao comparar Física e Biologia, apenas Vitória possui baixa representatividade de Licenciados em Ciências Biológicas (Lic Bio) que lecionam Biologia, as demais 26 capitais, sem exceção, possuem os maiores quantitativos na Biologia. Um adendo deve ser realizado para Salvador e Cuiabá. Cuiabá possui um dos menores índices de representação de docentes que lecionam Física e que possuem Licenciatura em Física (2,67%), bem como docentes que lecionam Biologia com Licenciatura em Ciências Biológicas (3,23%). No entanto, o valor chega a 87,34% para Química, uma das maiores representações entre as capitais4 4 Devido à baixa representatividade de docentes com Lic Fis (lecionando Física) ou com Lic Bio (lecionando Biologia) na rede pública estadual de Cuiabá, optou-se por avaliar a integridade dos dados para a capital. Após as (re)validações, verificou-se que os dados estavam íntegros. Desta forma, optou-se por validar quais eram as trajetórias formativas destes docentes, assim como foi executado para a capital paulista e que será apresentado ao longo deste estudo. Nesta direção, para a rede pública estadual da capital mato-grossense, tem-se que dos 76 docentes que declararam lecionar Física, 46 possuíam Bacharelado em Física, 8 não declararam o curso superior realizado, 5 possuíam Licenciatura em Matemática, 3 docentes com Engenharia Elétrica, 2 com Pedagogia (Licenciatura), 2 Ciências Biológicas (Licenciatura), 2 Ciências Naturais (Licenciatura), 2 com Licenciatura em Física (vide Tabela 2). Os demais docentes estavam concentrados em outros cursos. Para Biologia, dos 93 docentes declarantes em lecionar a disciplina, 34 possuíam Ciências Biológicas (Bacharelado), 3 Licenciatura em Ciências Biológicas (vide Tabela 2), 3 com Licenciatura em Matemática, e os demais docentes em outras trajetórias formativas. . Em Salvador, permanece a desigualdade entre as áreas disciplinares, porém com representações inferiores às demais capitais (11,75% em Física, 18,32% em Química e 39,62% em Biologia).

As desigualdades entre os domínios do saber não são diferentes para a rede privada se comparadas à estadual, porém, há uma elevação substancial nas representações para a Física. Mais uma vez, ao analisar as capitais, cerca de 55,95% (ante 33,90% da rede pública estadual) dos docentes que lecionam Física na rede privada possuíam a Licenciatura específica, enquanto as disciplinas de Química e Biologia foram respectivamente 62,54% e 70,51%. No entanto, algumas capitais possuem certo equilíbrio entre as áreas e até em porcentagens, tendo a Física como uma das maiores representações como em Florianópolis (66% com Lic Fis, lecionando Física; 59,57% com Lic Qui, lecionando Química; 49,06% com Lic Bio, lecionando Biologia) ou Teresina (82,28% com Lic Fis, lecionando Física; 73,86% com Lic Qui, lecionando Química; 67,86% com Lic Bio, lecionando Biologia).

Ao dar ênfase em São Paulo, considerando o volume global de docentes, a capital paulista pode ser concebida à parte, porém, cabe apontar o quão desigual ela é, seja entre as áreas disciplinares, seja entre as redes de ensino. Ao focalizar na rede pública estadual, tem-se que São Paulo possui uma das menores representatividades (em porcentagens), entre as capitais, de professores que lecionam Física e que possuem Licenciatura em Física (apenas 17,17% dos docentes que lecionam Física, possuem Licenciatura em Física em São Paulo). Para Química não é diferente, São Paulo possui umas das menores representações se comparada às demais capitais, apenas 43,85% dos docentes que lecionam Química, possuem Licenciatura em Química. Para Biologia, há uma inversão. A capital paulista é a que possui uma das maiores representações de licenciados em Ciências Biológicas, entre as capitais, chegando a 88,62% de todos os docentes que lecionam Biologia.

A desigualdade entre as áreas disciplinares permanece mesmo para a rede privada paulista, tendo a Física como uma das áreas disciplinares com as menores representatividades de Licenciados, se comparada com Química e Biologia. Ainda que os valores sejam substanciais e superiores aos da rede estadual, na rede privada cerca de 49,11% dos docentes que lecionam Física possuíam Licenciatura em Física; 60,19% que lecionavam Química, possuíam Licenciatura em Química; e cerca de 80,07% que lecionavam Biologia, possuíam Licenciatura em Ciências Biológicas. A Biologia, por sua vez, permaneceu na ordem de grandeza dos 80% tanto para a rede pública estadual quanto na rede privada, não havendo tantas variações, como ocorre para a Física (diferença de cerca de 32% se comparada entre as redes pública estadual versus privada) ou Química (diferença de 16,3% entre a estadual e a privada).

Novamente, estes recortes de um contínuo desvelam um prismático relacional e triangular das desigualdades, seja entre: (i) as áreas disciplinares Física, Química, Biologia; (ii) entre as redes estaduais e privada, (iii) e entre as capitais e nas próprias capitais.

Dá-se luz, especialmente, para como as formações docentes estão implicadas e representadas na desigualdade. Dos dados, a priori, considerando um recorte para as capitais, parece haver uma questão estrutural e nacional sobre a formação docente em Física, quando comparado à Química e Biologia. Cabe questionar: Por que é na Física que há baixa representatividade de licenciados em Física? Para além das respostas clássicas como falta de interesse dos jovens em seguir as carreiras docentes, alto índice de evasões e condições de trabalho precárias, ainda, pode-se introduzir ao debate como o acesso ao conhecimento também é um elemento de segregação social. Em outras palavras, considerando que para se ter interesse pela área de Física é necessário que a mesma se faça reconhecer no ambiente educacional. Ademais, deve ser questionável também para as áreas de Biologia e Química como os quantitativos de docentes licenciados (nas disciplinas específicas que lecionam) não estejam em 100%.

Esta pesquisa, contudo, não pode ser concebida como um afronte aos professores, que mesmo não licenciados nas disciplinas que atuam, as lecionam com os desafios impostos em suas condições precárias de trabalho. Em suma, é necessário evitar uma perspectiva de culpabilizar o que não é culpabilizável. O que se questiona são os desafios que estes professores precisam lidar ao enfrentarem salas de aulas superlotadas e lecionarem conteúdos nos quais não tiveram a oportunidade, em uma educação formal, de se apropriarem em toda sua complexidade. À exemplo, Slovinscki, Alves-Brito e Massoni [30[30] L. Slovinscki, A. Alves-Brito e N.T. Massoni, Revista Brasileira de Ensino de Física 45, e20230110 (2023).] ao abordarem sobre o Ensino de Astronomia no Brasil, ilustram parte dessas dificuldades. Os autores apontam o impacto na educação da ausência de docentes habilitados (i.e., Licenciados em Física que, mesmo estes, teriam alguns entraves devido à opcionalidade da astronomia na grade curricular), ou a ausência destes saberes em currículos das Licenciaturas em Química ou Biologia. Para além, é sabido da complexidade de alguns conhecimentos da Física e da sua perenidade no que se refere aos desafios a serem ensinados na Educação Básica, bem como ao uso de concepções não científicas, pelos alunos na resolução de problemas físicos [31[31] G.S. Marcom e M.U. Kleinke, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 33, 72 (2016)., 32[32] M.F. Barroso, G. Rubini e T. Silva, Revista Brasileira de Ensino de Física 40, e4402 (2018).].

Estes desdobramentos, portanto, nos direcionam para uma nova investigação deste mundo social, tendo como eixo as Ciências Naturais no Ensino Médio. Como a desigualdade social e cultural paulistana, já concebida também entre as capitais, pode estar contida em seu território? Isto é, como o volume e representações de docentes estão implicados também nas representações discentes, e se articulam nas porções territoriais, especialmente, em uma cidade segregada (e que tem na sua representação, uma externalização da apropriação diferenciada do território) tendo a falta de acesso como uma das facetas das suas desigualdades?

3.2. A cidade de São Paulo: uma segregaçãosocioespacial e a formação docente

Ao delimitar o escopo territorial em São Paulo, algumas ponderações metodológicas foram incorporadas. Considerando a rede de ensino estadual paulista, há as Escolas Técnicas Estaduais (ETECs), sob a autarquia estadual Centro Paula e Souza, e, portanto, com uma gestão e orçamentos diferenciados da rede pública estadual regular. Tais escolas, além de fornecerem o ensino médio regular, propiciam uma formação técnica profissionalizante e seu ingresso está contido em um processo seletivo competitivo. Desta forma, em algumas delas, há a opção de um ensino médio regular e, de forma apartada, cursos técnicos em contraturnos ou a opção de ensino médio integrado ao técnico. Considerando, a priori, tais diferenciações e tendo por objetivo compreender e detalhar as redes pública estadual e privada de ensino na cidade, tais escolas foram excluídas do corpus de análise. Vale sinalizar que a capital paulista possui 44 ETECs, e apenas 15 estavam contidas no corpus inicial da pesquisa, pois forneciam o ensino médio regular e, assim, foram desconsideradas. As demais ETECs eram exclusivamente de ensino médio não regular e por consequência já não estavam contempladas no escopo inicial da pesquisa. Numa perspectiva territorial, também foram incorporadas informações georreferenciais das escolas e excluídas as instituições que não as possuíam (7 exclusões). Das duas regras metodológicas, totalizaram-se 22 instituições eliminadas. Desta forma, se para a seção de uma análise macrossociológica das capitais, São Paulo possuía cerca de 1.298 escolas (conforme Tabela 1), nestas novas reflexões, o corpus de pesquisa resultou em 1.276 instituições, 5.881 docentes que, juntos, lecionavam as disciplinas de Ciências da Natureza (Física, Química, Biologia).

Houve também a incorporação metodológica de leitura sociológica sobre a cidade e seus instrumentos legais, especialmente sobre os marcos regulatórios, como a lei de uso e ocupação do solo urbano e do plano diretor estratégico [3[3] F. Villaça, Espaço intra-urbano no Brasil (Studio Nobel/ FAPESP, São Paulo, 2001)., 10[10] SÃO PAULO, Lei n. 16.050, de 31 de julho de 2014, disponível em:https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-16050-de-31-de-julho-de-2014.
https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/...
, 11[11] SÃO PAULO, Lei n. 16.402, de 22 de março de 2016, disponível em:https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-16402-de-22-de-marco-de-2016.
https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/...
]. Tais contornos metodológicos se justificam, uma vez que são um dos elementos basilares para compreender o espaço intra-urbano. Portanto, considerando a primazia desta desigualdade já classificada e estabelecida no mundo social de interesse e expressa na representação territorial de São Paulo, caberia refletir, e instrumentalizá-la, para tentar compreender a realidade do contexto territorial da escola. Nesse sentido, a análise das escolas foram, assim, sobrepostas aos debates sobre as regiões do território classificadas a partir das Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS).

A partir de técnicas de geoprocessamento modeladas no software QGIS 3.14, realizou-se a inferência da localização da escola no tecido urbano, categorizando-as em 3 seções: (i) escolas que estavam localizadas na porção do território ZEIS-1; (ii) escolas que estavam localizadas nas mediações da porção ZEIS-1 com até 400 metros de distância da ZEIS-15 5 A determinação de 400 metros deu-se, especialmente, considerando um deslocamento ativo (e.g., na modalidade a pé), entre as áreas limítrofes da ZEIS-1 e a possível dinâmica que ocorra nestas porções. Tal incorporação, deve-se, sobretudo, para um não recorte binário entre “Dentro e Fora da ZEIS-1”, contemplando assim, uma mediação fronteiriça (ainda que fictícia na representação da realidade) destes territórios. Ademais, deve-se sinalizar que enquanto política pública de concessão de vagas a escolas, há uma primazia de estabelecimento de vagas na proximidade do local de moradia. Contempla-se na cidade de São Paulo, também, uma concessão de transporte escolar para distâncias superiores à 1.000 metros. ; (iii) escolas que estavam localizadas a uma distância maior que 400 metros de uma ZEIS-1. A Figura 2 ilustra o mapa da cidade de São Paulo em sua região metropolitana, com os seus distritos e as escolas georreferenciadas (ano 2019). O mapa foi realizado a partir da projeção do Sirgas 2000, referencial geodésico adotado para o Brasil e com escala de 1:300.000.

Figura 2
Mapa da cidade de São Paulo, com o georreferenciamento das escolas de interesse, nas localidades (i) escolas na ZEIS-1 (em vermelho); (ii) escolas localizadas até 400 metros de uma ZEIS-1 (em amarelo); (iii) escolas localizadas em porções distantes a pelo menos 400 metros da ZEIS-1 (em verde). Fonte: Autores, com base nos dados do Censo Escolar 2019, Catálogo de Escolas do INEP, da Lei de uso e ocupação do solo urbano e do plano diretor estratégico de São Paulo.

Espacialmente, a cidade de São Paulo possui cerca de 96 distritos e, deles, pode-se desdobrar quão desiguais são, seja em renda, oferta de trabalho, idade média de mortalidade ou mesmo na fruição e sobreposições das desigualdades nos espaços educativos [20[20] G.S. Perosa, F. Lebaron e C.K.S. Leite, Pró-Posições 26, 99 (2015)., 33[33] REDE NOSSA SÃO PAULO, Mapa da desigualdade (2023), disponível em:https://institutocidadessustentaveis.shinyapps.io/mapadesigualdadesaopaulo/.
https://institutocidadessustentaveis.shi...
].

Do mapa, pode-se observar uma das características das apropriações distintas do espaço urbano: há uma tendência de precarização das condições de qualidade de vida e de residência de populações mais vulneráveis nas porções mais distantes da região central da cidade, conferindo uma espacialização das periferias (às bordas da cidade). Não à toa, tal representação também está implícita no mapa das escolas, tendo as escolas em vermelho posicionadas em locais mais periféricos da cidade (locais da ZEIS-1). No entanto, deve-se salientar que a cidade de São Paulo possui peculiaridades no que se refere as desigualdades, a saber: (i) entre distritos e intra distrital; (ii) em uma perspectiva centro-periferia, ou mais especificamente, por anéis concêntricos [34[34] S.P. Taschner e L.M.M. Bógus, em: O futuro das metrópoles: Desigualdade e governabilidade, editado por L.C.Q. Ribeiro (Observatório da Metrópole, Rio de Janeiro, 2015).]; (iii) ou ainda, por setores, tendo o quadrante sudoeste com as melhores condições de existência [3[3] F. Villaça, Espaço intra-urbano no Brasil (Studio Nobel/ FAPESP, São Paulo, 2001)., 35[35] F. Villaça, Estudos Avançados 25, 37 (2011).]. Isto posto, e em uma perspectiva bourdieusiana, considera-se as práticas culturais e as propriedades dos agentes ancoradas nas relações sociais inscritas na cidade, bem como na compreensão dos docentes como promotores das condições de acesso simbólico e físico no contexto territorial dos discentes.

Ainda sem uma leitura territorial dos dados, para a cidade de São Paulo, e retomando a transversalidade sobre as formações docentes e os espaços em que ocupam, isso é, nas áreas do saber e nas redes de ensino público estadual e privada, tem-se na Figura 3 a representação de docentes licenciados e não licenciados na área disciplinar em que atuam para cada rede de ensino na cidade de São Paulo em 2019.

Figura 3
Representação docente com (ou sem) licenciatura específica na área disciplinar em que leciona, em porcentagens, para as redes pública estadual e privada de ensino da cidade de São Paulo. Autores, com base nos dados do Censo Escolar 2019.

Em consonância com as representações já sinalizadas nas Tabelas 2 e 3, a capital paulista possui diferenciações significativas no que tange os docentes sem licenciatura específica nas disciplinas de Ciências da Natureza e suas Tecnologia (CNT). Dentre os que lecionam nessa área, a Física possui menores representações do saber específico independente da rede de ensino.

Ainda, ao comparar a rede pública estadual e privada, observa-se diferenciações marcantes na distribuição proporcional da formação docente, especialmente para a Física. Da Figura 3, enquanto para a rede estadual a porcentagem de docentes com licenciatura em Física é de 16,81%, na rede privada há uma elevação para 49,17%. Esta diferença, ainda que diminuta, é válida também para Química com cerca de 43,17% dos docentes licenciados em Química na rede estadual e 60,05% na rede privada. A Biologia apresenta números mais animadores tendo na rede pública estadual cerca de 88,78% com licenciatura em Ciências Biológicas e 79,93% na rede privada.

Desdobrando o estudo para uma espacialização dos docentes pelo território paulistano, optou-se por incorporar o Nível Socioeconômico (NSE) das escolas. Justifica-se, o uso do NSE visto que é um dos índices potenciais para o desvelamento das desigualdades [28[28] M.T.G. Alves, C.G. Rodrigues e A.S. Senkevics, Cadernos de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais 9, 159 (2023).] e, considerando o recorte espacial, ainda apresenta a possibilidade de análises relacionais a partir da perspectiva macrossociológica. Em outras palavras, se pretende complementar os dados já utilizados e apreender novas interpretações partindo da metodologia urbana empregada. Para tanto, fez-se uso do NSE das escolas atualizados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) [29[29] INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, Nota Técnica n. 16, de 31 de julho de 2023, disponível em:https://www.gov.br/mec/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/conselhos-e-orgaos-colegiados/comissao-intergovernamental-fundeb/Nota_Tecnica_16_2023.pdf.
https://www.gov.br/mec/pt-br/acesso-a-in...
] a partir da proposta de classificação de Alves, Rodrigues e Senkevics [28[28] M.T.G. Alves, C.G. Rodrigues e A.S. Senkevics, Cadernos de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais 9, 159 (2023).]. Este NSE (global) é constituído a partir de três níveis e que serão brevemente apresentados objetivando sua macro-caracterização: (i) NSE primário refere-se aos estudantes. É compreendido a partir da média de NSE dos estudantes através de dados do SAEB e ENEM (de 2007 a 2019); (ii) um NSE secundário, à luz do contexto sócio-administrativo e territorial da escola, ou seja, considera-se a localização da escola (urbano/rural), bem como o índice de Desenvolvimento Humano do município e a relação de alunos participantes do Programa Federal Bolsa Família; (iii) e um terciário, ponderando a transferência dos estudantes entre escolas. A consolidação e a discretização destes três níveis leva a um único NSE (global) que é utilizado neste trabalho.

Isto posto, tem-se a formulação da Tabela 4. Nesta, se apresenta a segregação das redes pública estadual e privada, e para cada uma a espacialização das escolas pelo território nos três conjuntos delimitados: (i) ZEIS-1; (ii) até 400m ZEIS-1; e (iii) maior que 400m ZEIS-1. Ademais, a tabela foi estruturada contendo três eixos de interesse:

  • (a)

    quantidade de escolas e os respectivos NSE (Nível Socioeconômico) por quartis [28[28] M.T.G. Alves, C.G. Rodrigues e A.S. Senkevics, Cadernos de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais 9, 159 (2023)., 29[29] INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, Nota Técnica n. 16, de 31 de julho de 2023, disponível em:https://www.gov.br/mec/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/conselhos-e-orgaos-colegiados/comissao-intergovernamental-fundeb/Nota_Tecnica_16_2023.pdf.
    https://www.gov.br/mec/pt-br/acesso-a-in...
    ]. Cabe apontar que o quartil possibilita depreender análises de dispersão e tendências de centralidade a partir das quatro subdivisões iguais dos dados, possibilitando comparar grupos distintos (ainda que não seja um método exaustivo). Por exemplo, tem-se o quartil inferior que concentra os 25% com os menores valores (i.e., do valor mínimo ao valor do quartil inferior), na sequência, os outros 25%, do quartil inferior à mediana, mais 25% contemplando o intervalo da mediana ao quartil superior, e mais 25% dos dados, do quartil superior ao valor máximo. Apenas como exemplo, ainda que sem muitas reflexões, para a rede pública estadual na porção de ZEIS-1, há 125 escolas sendo que 25% delas estavam na menor faixa do NSE de 0,2715 a 0,5607, os demais 25% de 0,5607 a 0,6959, e assim por diante. No entanto, para as escolas localizadas na porção de ‘Até 400 metros da ZEIS-1’, os 25% das escolas com menores faixas de NSEs possuíam o intervalo de 0,2197 a 0,7119, o que já é superior ao 0,5607 da ZEIS-1, e, portanto, com diferenciações entre os grupos (‘ZEIS-1’ e ‘Até 400 metros ZEIS-1’) dos 25% de escolas públicas estaduais com os menores NSEs;

  • (b)

    o outro eixo está associado as delimitações da representação de docentes licenciados na disciplina específica em que lecionam;

  • (c)

    uma dimensionalidade introdutória sobre os turnos de aulas.

Tabela 4
Representação das escolas, docentes e turnos de aulas, na rede pública estadual e privada da capital paulista, contextualizada a partir do seu território. Uma aproximação com o mundo social. Ano 2019. Fonte: Autores, com base nos dados do Censo Escolar 2019, Catálogo de Escolas do INEP, da Lei de uso e ocupação do solo urbano e do plano diretor estratégico de São Paulo, e da base de NSEs das escolas.

Para a depreensão de uma interpretação relacional dos dados, sugere-se uma leitura lateralizada e vertical dos dados da tabela, pois nela, tanto há uma perspectiva por território quanto das variáveis selecionadas.

A constituição desta realidade imediata, portanto, pode-se depreender que as desigualdades de acesso ao conhecimento científico formalizado a partir da aproximação com um docente com licenciatura específica perpassa, não apenas as diferenciações entre as redes pública estadual e privada, mas também as disciplinas Física, Química ou Biologia conforme depreendido pelas Tabelas 2 e 3. Para a Física, há indícios de um agravamento também na distribuição pelo território, conforme apresentado na Tabela 4.

Na própria rede estadual em que consta apenas cerca de 16,81% de docentes com habilitação em Física, eles tendem a se distribuir pouco homogeneamente pelo território. Nas porções de ZEIS-1 este índice chega a 11,24%; em até 400 metros da ZEIS-1 acresce 5%, totalizando cerca de 16,40%; e para a porção de escolas distante maior que 400 metros da ZEIS-1 totaliza-se cerca de 22,05% (ou seja, uma diferença de cerca de 11% se comparado com a ZEIS-1). Desta forma, percebe-se a lógica de uma economia simbólica, tendo o conhecimento em ensino de física como um recurso escasso (o professor licenciado em Física), ou seja, a desigualdade se sobrepõe também na distribuição desse bem simbólico.

Ainda que os quantitativos absolutos precisem ser ponderados, na rede privada, os valores são ainda mais díspares (entre si): sendo 29,41% na ZEIS-1; 38,23% em até 400 metros da ZEIS-1; e 59,71% para maior que 400 metros da ZEIS-1. Aliás, esta última porção do território é a que tem o maior quantitativo de docentes, o que é razoavelmente esperado, haja vista que tenderia a haver um mercado de capital mais pujante e com populações com maiores condições de propiciar um investimento financeiro em um ensino privado e, portanto, transfigurando o capital econômico em um capital cultural (e social) institucionalizados na escola.

De qualquer forma, a leitura lateralizada e verticalizada para a seção de docentes com licenciatura específica e porções do território nos possibilita empreender que nos territórios das ZEIS-1, para a rede pública estadual, as diferenças entre Física, Química e Biologia permanecem. E ainda, que há certa homogeneidade entre as representações para Química e Biologia (na ordem de grandeza) nos três territórios.

Tais desigualdades somam-se ao turno de aulas dos discentes, os quais estão indiretamente associados à externalidade das diferenciações de turnos de aulas pelo território6 6 Para a determinação dos turnos das turmas foi realizado a modelagem a partir do microdados do Censo Escolar (base de turmas), conforme explicitado nas junções dos microdados, na seção de metodologia. No entanto, cabe apontar os horários segmentados: (i) Matutino, turmas com aulas com início até 12 horas; (ii) Vespertino, turmas com início às 13 horas até 17 horas; (iii) Noturno, turmas com início das aulas a partir das 18 horas. (isto é, ainda que o recorte para determinação dos turnos das turmas seja das turmas de Física, Química e Biologia, não haveria variações de turnos para uma mesma turma para as demais disciplinas). Na rede estadual paulista cerca de 31,86% das turmas estavam associadas ao período noturno, porém na porção de ZEIS-1 esta representação foi a 44,35%. Este percentual cai para 15,74% na porção distante à 400 metros de uma ZEIS-1. No sentido inverso, na rede privada, o estudo é majoritariamente matutino com 94,60% das turmas, inclusive as únicas 53 turmas que estavam localizadas em uma escola na porção territorial ZEIS-1 eram do turno diurno. Soma-se ao debate os NSE das escolas, seja na perspectiva das diferenciações das redes estadual e privada, seja entre os territórios. Ainda, encontra-se tais distinções entre uma mesma rede e suas diferenças pelo território.

Na Tabela 4, se na rede estadual a mediana do NSE na porção ‘ZEIS-1’ é de 0,6959, na porção ‘Maior que 400 metros ZEIS-1’ o valor chega a 1,0628. Ademais, os NSE das escolas localizadas na ZEIS-1 tendem a ser mais homogêneos do que nas outras porções. Como exemplo, observa-se entre o limite superior e o máximo um intervalo de apenas 0,30 para as escolas da ZEIS-1, enquanto que para as localizadas em ‘Maior que 400 metros ZEIS-1’ há uma diferença de 0,7070. Ainda, 50% das escolas da ZEIS-1 estão na faixa de NSE entre 0,5606 (limite inferior) e 0,7951 (limite superior), enquanto que na ‘Maior que 400 metros ZEIS-1’ o limite inferior é de 0,9480 (já apresentando valor acima do limite superior do NSE das escolas da ZEIS-1) e possui limite superior de 1,1775. Assim, além de corroborar para a leitura urbana empreendida, o NSE concede indícios relevantes para a compreensão das desigualdades aqui estudadas.

Para além da segregação territorial da escola, optou-se por compreender por porção do território como se apresenta as categorias de gênero, raça e faixa etária, entre os docentes que lecionam na cidade de São Paulo. Na Tabela 5, consolidam-se para as redes pública estadual e privada.

Tabela 5
Perfil em gênero, raça e faixa etária, dos docentes que declaram lecionar Física na cidade de São Paulo. Fonte: Autores, com base nos dados do Censo Escolar 2019, Catálogo de Escolas do INEP, da Lei de uso e ocupação do solo urbano e do plano diretor estratégico de São Paulo.

Dos dados, pode-se depreender que a representação de docentes com Licenciatura em Física é majoritariamente declarante masculino (74,42%), branco (70,16%) e entre 31 a 60 anos (80%). Tais indicativos tendem a estar em consonância com a literatura que aponta para a baixa representatividade de docentes abaixo dos 30 anos, podendo-se antever a ausência de docentes nas escolas, bem como os desafios da formação de professores na contemporaneidade [13[13] D. Saviani, Revista Brasileira de Educação 14, 143 (2009)., 16[16] A.M. Bof, L.Z. Caseiro e F.C. Mundim, Cadernos de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais 9, 11 (2023)., 36[36] R.C. Barbosa, J.F. Junior e P.L. Junior, Revista Brasileira de Ensino de Física 45, e20230210 (2023).]. Assim como observa-se na disparidade de gênero, seja na Educação ou nas Ciências Naturais mas, mais especificamente, no campo da Física [17[17] M.M. Nascimento, Revista Brasileira de Ensino de Física 42, e20200187 (2020)., 37[37] B.D.L.P. Ramos, A.P. Ibaldo e J.S.S. Martins, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 40, 134 (2023).]. No entanto, com ressalvas devido ao baixo quantitativo absoluto, sinaliza-se a maior representação de docentes declarantes pardos (com ou sem licenciatura em física) na rede estadual na porção de escolas da ZEIS-1, se comparado com as demais localidades.

Considerando os dados sobre os docentes não licenciados na disciplina que lecionam, uma pergunta residual permanece: quais as formações (graduações) destes docentes? Para tanto, realizou-se um recorte para compreender, em cada uma das áreas disciplinares da CN, quais eram os principais cursos de formação dos docentes. A Tabela 6 ilustra a esquemática proposta, apresentando parte dos cursos, a quantidade de docentes e a representação global para docentes não licenciados na disciplina específica, mas que lecionavam: Física, Química ou Biologia.

Tabela 6
Tabela das trajetórias formativas de docentes, da rede pública estadual e privada privada da capital paulista, que declaram lecionar uma turma de Física, Química ou Biologia, porém não possuíam Licenciatura na área específica. Fonte: Autores, com base nos dados do Censo Escolar 2019 e do Catálogo de Escolas do INEP.

Vale sinalizar que os cursos de graduações poderiam estar declarados em até três cursos, a partir da base de docentes (microdados do Censo Escolar). Os valores atribuídos eram codificados por valores alfanuméricos em que, por exemplo, o código 145F18 era o correspondente à Matemática (Licenciatura) e o 142P01 a de Pedagogia (Licenciatura). Assim podemos compreender que a trajetória formativa Matemática (Licenciatura) e Pedagogia (Licenciatura) era composta pela combinação dos códigos 145F18 e 142P01. Desta forma, foi realizado um processo de ordenamento e compilação destas variáveis de forma que cada docente tenha a trajetória formativa declarada e possibilitando o agrupamento desta trajetória com outros docentes7 7 Foi realizado uma modelagem de forma a não haver permutações e apenas combinações, isto é, a ordem dos cursos de graduações declarados não importavam. Isto é, se foi declarado pelo docente “épsilon” (i) “Matemática (Licenciatura)” e (ii) Pedagogia (Licenciatura)”; e uma possível declaração inversa por outro docente “zeta” (i) “Pedagogia (Licenciatura)” e (ii) “Matemática (Licenciatura)”; épsilon e zeta possuíam a mesma trajetória formativa. com mesmo perfil.

Isto posto, considerando a rede pública estadual e a disciplina de Física, cerca de 1.529 docentes que lecionavam Física não possuíam Licenciatura em Física (vide Tabela 4, em que haviam cerca de 1.838 docentes lecionando Física, sendo 309 com Lic Fis e 1.529 sem Lic Fis). Desta forma, ao buscar compreender quais eram seus cursos de graduação, obteve-se cerca de 147 combinações (trajetórias formativas distintas), no entanto, cerca de 80% dos docentes concentravam-se em seis trajetórias formativas. Sendo assim, tem-se 609 docentes que representa quase 39,79% dos professores não licenciados em Física, mas que possuíam Licenciatura em Matemática (o quantitativo absoluto de 609 docentes é quase o dobro de docentes com Lic Fis, que é de 309). Segue-se o grupo de 15,30% (234 docentes) com formação em Licenciatura em Ciências Biológicas; posteriormente 156 docentes (10,20%) com formação em Pedagogia (Lic) e Matemática (Lic); 125 docentes (8,18%) em Química (Lic); 65 professores (4,25%) com Pedagogia (Lic) e Ciências Biológicas (Lic); e 41 docentes (2,68%) com formação em Ciências Biológicas (Lic) e Matemática (Lic). Na rede privada, tem-se cerca de 144 (36,18%) docentes com formação em Matemática (Lic); 40 professores (10,05%) formados em Química (Lic); 30 docentes (7,54%) em Ciências Biológicas (Lic); 28 docentes formados (7,08%) em Física (Bacharelado); 17 professores (4,27%) com Pedagogia (Lic) e Matemática (Lic); 16 docentes (4,02%) não declarantes quanto a trajetória formativa; 15 docentes (3,77%) com formação em Ciências Naturais (Lic); e 6 professores (1,51%) com formação em Matemática (Bacharelado). Assim, observa-se que para a Física, seja na rede pública estadual ou na rede privada da capital paulista, os docentes sem formação na área específica que lecionam possuem majoritariamente formações associadas à Matemática.

Ainda na rede pública estadual, no que tange à área disciplinar da Química, dos 696 docentes que não possuíam Licenciatura em Química (vide Tabela 4, tendo 1.224 docentes lecionando Química e 528 declarantes com Lic Qui), cerca de 340 possuíam Licenciatura em Ciências Biológicas (o que representa cerca de 48,85% dos sem Lic Qui); seguidos da trajetória formativa Pedagogia (Licenciatura) e Ciências Biológicas (Licenciatura), com cerca de 87 docentes (12,50%). Na rede privada, dos 296 docentes sem Licenciatura em Química, permanece a trajetória formativa Ciências Biológicas (Licenciatura) como a trajetória majoritária com cerca de 96 docentes (32,43%) seguido da trajetória Química (Bacharelado) com 37 docentes (12,50%).

Diferentemente da Física e Química, docentes não licenciados em Ciências Biológicas e que lecionavam Biologia, além de serem relativamente poucos (em valores globais), suas trajetórias formativas eram mais esparsas e pulverizadas entre os cursos. Por exemplo, para Biologia, tem-se que na rede estadual, cerca de 153 docentes não possuíam Licenciatura em Ciências Biológicas (vide Tabela 4, tendo 1.364 lecionando Biologia e com Lic Bio 1.211). Destes, a trajetória formativa estava em 10,46% (16 docentes) para Educação Física (Licenciatura); 10,46% (16 docentes) em Ciências Naturais (Licenciatura); 9,15% (14 docentes) com Pedagogia (Licenciatura) e Ciências Biológicas (Bacharelado); e 5,88% (9 docentes) com a trajetória formativa Pedagogia (Licenciatura) e Ciências Naturais (Licenciatura). Desta forma, ao considerar as três últimas trajetórias formativas mencionadas, pelo menos, cerca de 25% dos docentes (39 agentes sociais) que não possuíam Licenciatura em Ciências Biológicas, ao menos, possuíam alguma semelhança com seu eixo curricular. Ou seja, sendo a Biologia já com altas representatividades de docentes com Licenciatura em Ciências Biológicas (cerca de 85,15%, vide Tabela 4), os docentes que não possuíam a Licenciatura específica, possuíam outros cursos correlatos ao eixo temático, o que não ocorre com a Física e Química. Pelo contrário, dos dados depreende-se que os correlatos às Ciências Naturais e Biológicas, estão também atuando nas disciplinas de Física e Química.

Ainda que o estudo tenha considerado apenas a dimensão da capital paulista, para o Ensino Médio e tendo um recorte para as Ciências Naturais, a não formação adequada à disciplina em que leciona vai contra o promulgado pelo Plano Nacional de Educação (2014–2024) [38[38] BRASIL, Lei n. 13.005, de 25 de junho de 2014, disponível em:https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm.
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_a...
]. Nele, foi instituída entre as metas, uma adequação quanto a proporção de docentes com formação superior compatível com a área de conhecimento que lecionam na educação básica.

4. Considerações Finais

Este estudo se propôs a refletir sobre como as desigualdades educacionais e sociais se relacionam com a representatividade de docentes licenciados nas disciplinas de Ciências da Natureza tendo a Física, Química e Biologia como representantes das áreas disciplinares correlatas no Ensino Médio regular. Assim, incorporando a intersecionalidade e a interdisciplinaridade nos estudos, debate-se sobre como as desigualdades estão presentes no território, na realidade objetiva imediata dos estudantes, especialmente nas condições sociais que acarretam posturas frente à escola e que se associam aos efeitos de lugar [1[1] P. Bourdieu, Miséria do mundo (Vozes, Petrópolis, 2012).]. Nesta direção, e em complementaridade com a sociologia urbana e a constituição das cidades [3[3] F. Villaça, Espaço intra-urbano no Brasil (Studio Nobel/ FAPESP, São Paulo, 2001).], questiona-se como a escola enquanto ambiente institucionalizado é reflexo e parte desta territorialidade desigual.

Para tanto, fez-se uso de uma abordagem quantitativa e descritiva para promover reflexões sobre a pergunta de pesquisa e subsidiar entendimentos sobre a condição da realidade social presente nos dados neste trabalho. Portanto, considera-se que este estudo possui um recorte do contínuo histórico e do mundo social pré-classificado [22[22] P. Bourdieu, Sociologia geral (Vozes, Petrópolis, 2020), v. 1.]. Parte-se, assim, da leitura bourdieusiana para a interpretação deste estudo social, com uso de técnicas de geoprocessamento e estatísticas, buscando articular: os microdados do Censo Escolar e do Catálogo de Escolas do INEP; estudos sobre nível socioeconômico (NSE) das escolas [28[28] M.T.G. Alves, C.G. Rodrigues e A.S. Senkevics, Cadernos de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais 9, 159 (2023)., 29[29] INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, Nota Técnica n. 16, de 31 de julho de 2023, disponível em:https://www.gov.br/mec/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/conselhos-e-orgaos-colegiados/comissao-intergovernamental-fundeb/Nota_Tecnica_16_2023.pdf.
https://www.gov.br/mec/pt-br/acesso-a-in...
]; e o plano diretor [10[10] SÃO PAULO, Lei n. 16.050, de 31 de julho de 2014, disponível em:https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-16050-de-31-de-julho-de-2014.
https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/...
] e a lei de zoneamento da cidade de São Paulo [11[11] SÃO PAULO, Lei n. 16.402, de 22 de março de 2016, disponível em:https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-16402-de-22-de-marco-de-2016.
https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/...
], para uma leitura urbana e educacional.

Sendo assim, estabeleceram-se elementos de análise que visam articular a compreensão da dimensão da rede pública estadual e privada das capitais brasileiras e do distrito federal, a partir dos quantitativos de escolas, em especial, de discentes e docentes. Ainda, para as capitais optou-se por compreender a representação dos docentes com ou sem licenciatura específica para a Física, Química e Biologia, tanto para a rede pública estadual quanto na rede privada. Nesta direção, observou-se as disparidades de quantitativos absolutos na representação das escolas, tanto de docentes como discentes entre as capitais. No que tange a formação docente com licenciatura específica, tem-se a Física com as menores representações formativas em Licenciatura em Física, em comparação a Química e a Biologia. Em uma perspectiva macrossociológica, este cenário se repete na maioria das capitais, entre as redes de ensino e entre as áreas disciplinares, portanto, em um prismático desigual e contemporâneo que tende a ser um desafio nacional à curto e longo prazo para as capitais brasileiras.

Ao direcionar o estudo para a capital paulista, uma das representações simbólicas de um espaço segregado e com apropriação diferenciada do território por frações distintas de classe [3[3] F. Villaça, Espaço intra-urbano no Brasil (Studio Nobel/ FAPESP, São Paulo, 2001).], a questão educacional é pujante à área da Física. É na capital paulista que há uma das menores representações de docentes lecionando Física com Licenciatura em Física, contrapondo-se como uma das maiores representações percentuais de docentes com Licenciatura em Ciências Biológicas. Não obstante, numa perspectiva urbana, a cidade de São Paulo é um exemplo e tende a ser uma representação da consolidação sócio-histórica das metrópoles brasileiras com suas desigualdades socioeconômicas tendo na luta de classes uma das forças estruturantes do espaço intra-urbano [3[3] F. Villaça, Espaço intra-urbano no Brasil (Studio Nobel/ FAPESP, São Paulo, 2001).].

Isto posto, focalizando o estudo para São Paulo, e potencializando a questão urbana, localizou-se as escolas e os agentes sociais pelo território, bem como incrementou-se a segregação simbólica do espaço desigual em três porções: escolas localizadas na ZEIS-1; localizadas em até 400 metros da ZEIS-1; e localizadas em regiões maiores que 400 metros da ZEIS-1. Partindo de uma análise das economias simbólicas, há uma pequena representatividade de docentes com licenciatura em Física na porção da ZEIS-1 em detrimento das demais porções do territórios. Ainda, revela-se, como são nas porções da ZEIS-1 as menores representações nos intervalos de NSE das escolas, o que de certa forma, são indicações da realidade social destes espaços.

Ainda, na explicitação das representações de turmas nos turnos (matutino, vespertino e noturno), tem-se na ZEIS-1 as maiores indicativos de turmas no noturno. Soma-se ao debate, para além da dicotomia ‘pública estadual’ e ‘privada’, a explicitação da desigualdade intra-rede. Nesta direção, mesmo na rede pública estadual observa-se as desigualdades de fruição do espaço territorial e no espaço institucionalizado (o escolar), como, por exemplo, na apropriação do conhecimento científico na representação objetiva (e simbólica) de que um docente com licenciatura em Física representa.

Na complementariedade da formação docente, objetivou-se estabelecer uma compreensão introdutória sobre o perfil dos docentes que lecionavam Física e que possuíam licenciatura em Física. Nesta perspectiva, compreendeu-se em relação a gênero, raça e faixa etária, como se dava a representação na cidade de São Paulo, e em segundo momento, buscamos compreender qual era a trajetória formativa dos que não possuíam licenciatura em Física como graduação.

Para o primeiro, obteve-se que os docentes licenciados em Física são em sua maioria declarantes masculinos e brancos, projetando, portanto, o amplo e necessário debate da branquitude e da desigualdade de gênero no ensino de física. No que se refere a faixa etária deles, há uma concentração dos 30 a 60 anos, o que por sua vez, projeta-se a baixa representação de docentes com idades inferiores, o que talvez exemplificaria um relativo esvaziamento de novos docentes de Física nas escolas devido à não entrada de recém formados, dialogando assim, com os desafios na formação profissional e ao “apagão” de professores indicado na literatura [14[14] A.I. Ruiz, M.N. Ramos e M. Hingel, Escassez de professores no Ensino Médio: Propostas estruturais e emergenciais (Ministério da Educação, Brasília, 2007).,15[15] BRASIL, Censo Escolar 2013: Perfil da docência no ensino médio regular, disponível em:https://download.inep.gov.br/publicacoes/institucionais/estatisticas_e_indicadores/censo_escolar_2013_perfil_da_docencia_no_ensino_medio_regular.pdf.
https://download.inep.gov.br/publicacoes...
,16[16] A.M. Bof, L.Z. Caseiro e F.C. Mundim, Cadernos de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais 9, 11 (2023).]. Ainda, a formação docente para os não licenciados em Física também é um desafio, o que já é sinalizado na complexidade de ensinar conteúdos aos quais não tiveram oportunidade de apropriá-los, especialmente na trajetória formativa.

Assim, a nossa pergunta residual sobre a formação destes docentes (não licenciados em Física) fez-se necessária. Cerca de 52% dos docentes que lecionavam Física e que não possuíam licenciatura em física (1.529 docentes), possuíam alguma associação com Matemática (809 docentes). Em Química, a incorporação das trajetórias atreladas às ciências biológicas é uma das sobrerrepresentações. No entanto, em Biologia, mesmo os docentes sem licenciatura em Ciências Biológicas em suas trajetórias formativas possuíam algum eixo comum a área disciplinar, como por exemplo Ciências Naturais ou Biológicas (bacharelado).

É importante salientar que a pesquisa não se configura como um estudo do processo de aprendizado ou sobre as avaliações de desempenho dos alunos, mas se põe em debate a necessidade de uma perspectiva institucionalizada para reflexão de como, enquanto sociedade, consideramos o que se torna fundamental à educação científica e quais caminhos devem ser percorridos para alcançar tais objetivos. Ademais, apresenta-se nesse estudo como o grupo docente da Física tende a ser um tanto heterônomo se comparado ao da Química e – especialmente à Biologia, haja vista que a Biologia possui maior alcance em termos da inserção de professores nas salas de aulas de ciências da natureza em relação às demais áreas. Ainda, busca-se contribuir para debates acerca da apropriação de conteúdos e a não correspondência da trajetória acadêmica dos docentes com as disciplinas em que lecionam, bem como isto pode ser refletido na formação discente.

Isto posto, tem-se como reflexão final indicar a necessidade de se promover discussões sobre os desafios para (re)pensar academicamente e socialmente a participação e inserção de docentes licenciados em Física nas aulas de Física na Educação Básica (ou na composição do eixo de Ciências da Natureza). Ademais, questiona-se como as políticas públicas para o ensino de física visam superar a preocupante propensão da carência de docentes na formação na educação básica em âmbito nacional. Em especial, busca-se trazer caminhos a partir da territorialidade para compreender como a repactuação do novo Plano Nacional da Educação pode indicar o enfrentamento desses problemas. Para tanto, seja na disciplinaridade e seu protagonismo, seja no debate da interdisciplinaridade para a formação Ciências da Natureza e suas Tecnologias, faz-se necessário apontar como os saberes da Física estão contemplados explicitamente nas aulas de ciências. Nesta direção, espera-se que esse trabalho vise promover o reconhecimento do saber científico enquanto elemento basilar para a formação contemporânea, baseado no entendimento que o acesso ao conhecimento físico é parte fundamental para o efetivo exercício da participação social, para a vigilância da democracia e na busca pela justiça social.

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    INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, Nota Técnica n. 16, de 31 de julho de 2023, disponível em:https://www.gov.br/mec/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/conselhos-e-orgaos-colegiados/comissao-intergovernamental-fundeb/Nota_Tecnica_16_2023.pdf
    » https://www.gov.br/mec/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/conselhos-e-orgaos-colegiados/comissao-intergovernamental-fundeb/Nota_Tecnica_16_2023.pdf
  • [30]
    L. Slovinscki, A. Alves-Brito e N.T. Massoni, Revista Brasileira de Ensino de Física 45, e20230110 (2023).
  • [31]
    G.S. Marcom e M.U. Kleinke, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 33, 72 (2016).
  • [32]
    M.F. Barroso, G. Rubini e T. Silva, Revista Brasileira de Ensino de Física 40, e4402 (2018).
  • [33]
    REDE NOSSA SÃO PAULO, Mapa da desigualdade (2023), disponível em:https://institutocidadessustentaveis.shinyapps.io/mapadesigualdadesaopaulo/
    » https://institutocidadessustentaveis.shinyapps.io/mapadesigualdadesaopaulo/
  • [34]
    S.P. Taschner e L.M.M. Bógus, em: O futuro das metrópoles: Desigualdade e governabilidade, editado por L.C.Q. Ribeiro (Observatório da Metrópole, Rio de Janeiro, 2015).
  • [35]
    F. Villaça, Estudos Avançados 25, 37 (2011).
  • [36]
    R.C. Barbosa, J.F. Junior e P.L. Junior, Revista Brasileira de Ensino de Física 45, e20230210 (2023).
  • [37]
    B.D.L.P. Ramos, A.P. Ibaldo e J.S.S. Martins, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 40, 134 (2023).
  • [38]
    BRASIL, Lei n. 13.005, de 25 de junho de 2014, disponível em:https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm.
    » https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm.
  • 1
    Na cidade de São Paulo, o Plano Diretor, enquanto política de desenvolvimento urbano, possui base jurídica na lei 16.050 de 31 de julho de 2014, e tem-se, entre seus desdobramentos, a consolidação, por exemplo, em um dos instrumentos de parcelamento, uso e ocupação do solo (no caso particular, da cidade de São Paulo, a lei número 16.402, de 22 de março de 2016). No momento da produção deste artigo, o Plano Diretor estava sendo revisto, conforme período determinado para revisão.
  • 2
    Um adendo torna-se necessário para justificar o período escolhido dos dados e o perfil de questionamento apresentado. A BNCC e o Novo Ensino Médio foram políticas educacionais públicas que inviabilizam os estudos das áreas específicas, visto que atualmente não se pode analisar ensino de física separado de química ou biologia. Contudo, a reformulação da educação básica no âmbito federativo, como já vem sendo tratado em trabalhos sobre a temática, busca escamotear a falta de professores das áreas de física e química. Esse trabalho, portanto, foca no período “final” do antigo ensino médio onde se pode reconhecer nos dados a relação direta professor de física e disciplina de física.
  • 3
    Para evitar repetições ou dissociações entre termos, este trabalho mantém o uso de ‘rede pública estadual’, bem como ‘pública’ ou ‘estadual’, para as escolas sob administração dos Estados (ou no caso de Brasília, pelo Distrito Federal). Desta forma, o uso apenas do termo ‘pública’ não está associado às redes ‘públicas municipais’ ou às ‘redes públicas federais’.
  • 4
    Devido à baixa representatividade de docentes com Lic Fis (lecionando Física) ou com Lic Bio (lecionando Biologia) na rede pública estadual de Cuiabá, optou-se por avaliar a integridade dos dados para a capital. Após as (re)validações, verificou-se que os dados estavam íntegros. Desta forma, optou-se por validar quais eram as trajetórias formativas destes docentes, assim como foi executado para a capital paulista e que será apresentado ao longo deste estudo. Nesta direção, para a rede pública estadual da capital mato-grossense, tem-se que dos 76 docentes que declararam lecionar Física, 46 possuíam Bacharelado em Física, 8 não declararam o curso superior realizado, 5 possuíam Licenciatura em Matemática, 3 docentes com Engenharia Elétrica, 2 com Pedagogia (Licenciatura), 2 Ciências Biológicas (Licenciatura), 2 Ciências Naturais (Licenciatura), 2 com Licenciatura em Física (vide Tabela 2). Os demais docentes estavam concentrados em outros cursos. Para Biologia, dos 93 docentes declarantes em lecionar a disciplina, 34 possuíam Ciências Biológicas (Bacharelado), 3 Licenciatura em Ciências Biológicas (vide Tabela 2), 3 com Licenciatura em Matemática, e os demais docentes em outras trajetórias formativas.
  • 5
    A determinação de 400 metros deu-se, especialmente, considerando um deslocamento ativo (e.g., na modalidade a pé), entre as áreas limítrofes da ZEIS-1 e a possível dinâmica que ocorra nestas porções. Tal incorporação, deve-se, sobretudo, para um não recorte binário entre “Dentro e Fora da ZEIS-1”, contemplando assim, uma mediação fronteiriça (ainda que fictícia na representação da realidade) destes territórios. Ademais, deve-se sinalizar que enquanto política pública de concessão de vagas a escolas, há uma primazia de estabelecimento de vagas na proximidade do local de moradia. Contempla-se na cidade de São Paulo, também, uma concessão de transporte escolar para distâncias superiores à 1.000 metros.
  • 6
    Para a determinação dos turnos das turmas foi realizado a modelagem a partir do microdados do Censo Escolar (base de turmas), conforme explicitado nas junções dos microdados, na seção de metodologia. No entanto, cabe apontar os horários segmentados: (i) Matutino, turmas com aulas com início até 12 horas; (ii) Vespertino, turmas com início às 13 horas até 17 horas; (iii) Noturno, turmas com início das aulas a partir das 18 horas.
  • 7
    Foi realizado uma modelagem de forma a não haver permutações e apenas combinações, isto é, a ordem dos cursos de graduações declarados não importavam. Isto é, se foi declarado pelo docente “épsilon” (i) “Matemática (Licenciatura)” e (ii) Pedagogia (Licenciatura)”; e uma possível declaração inversa por outro docente “zeta” (i) “Pedagogia (Licenciatura)” e (ii) “Matemática (Licenciatura)”; épsilon e zeta possuíam a mesma trajetória formativa.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    12 Jun 2024
  • Aceito
    31 Jul 2024
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