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Sobre as Relações entre Complexidade e Transdisciplinaridade em saúde

Resumo:

São analisadas, de modo sistemático, as condições de desenvolvimento e uso dos conceitos de transdiciplinaridade e complexidade, visando aprofundar algumas questões epistemológicas e teóricas apenas esboçadas numa abordagem multidimensional do Setor Saúde proposta por Mário Chaves. Em paralelo, discutem-se algumas perspectivas de integração teórica desses conceitos, na tentativa de contribuir para a reflexão sobre as bases conceituais e metodológicas da pesquisa no campo científico da Saúde Coletiva.

Palavras-chave:
Complexidade; Transdiciplinaridade; Epistemlogia; Saúde

Summary:

This pape ris aimed at analysing systematically the consitions of development and use of the concepts of transdiciplinarity and complexity, approaching some epistemological and theoretical questions drafted in a multidimensional modeling of the health sector as proposed by Mario Chaves. In parallel, perspectives of theoretical integration of such concepts are discussed as a contribuition to the epistemological foudations of research in the scientific field of Public Health.

Key words:
Complexity; Transdiciplinarity; Epistemology; Health

INTRODUÇÃO

O professor Mario Chaves publicou recentemente nesta revista um texto marcante e provocativo11. CHAVES, M. Complexidade e Transdiciplinaridade: Uma abordagem multidimensional do Setor Saúde. Revista Brasileira de Educação Médica 22(1):7-18, 1998., no qual propõe uma abordagem multidimensional do Setor Saúde. Nesse ensaio, retoma e atualiza o fio de sua contribuição pioneira à reflexão epistemológica em saúde, de certo modo por ele inaugurada no Brasil com o pequeno clássico Saúde & Sistemas (1972).22. CHAVES, M. Saúde e Sistemas. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1978. 205 p. O desafio de polemizar com o mestre, em foce de suas provocações, dá lugar a admiração por quem consegue, através dos anos, manter a mente aberta ao novo, sem perder o necessário rigor metodológico nem o entusiasmo pela discussão de princípios e fundamentos filosóficos da prática social em saúde. Mas, nem que seja por dever de ofício, devemos exercer nossa capacidade crítica a fim de fazer avançar o pensamento em saúde porque, como diz Chaves na abertura de seu ensaio, parafraseando Amílcar Cabral, é imperativo nesse momento "melhor compreender para melhor agir".

No texto em pauta, Chaves apresenta claramente suas segundas intenções de um modo notavelmente preciso: precisamos lutar contra o processo de contínua fragmentação do conhecimento em tempos disciplinares cada vez mais restritos. Poro isso, assume um posicionamento pragmático perante a natureza multifacetada do Setor Saúde, construído a partir dos conceitos básicos de 'complexidade' e 'transdisciplinaridade', Coerentemente, a conclusão de sua investida consiste numa proposta de ação que não será aqui debatida porque extrapola os limites de minha competência. Aproveitando a rara oportunidade de dialogar diretamente com um dos mais importantes ideólogos na área da saúde no Brasil, prefiro dar continuidade a algumas reflexões sobre os conceitos selecionados, que tenho cometido recentemente.33. ALMETOA FILHO, N. Paradigmas em Epidemiologia. 1° Congresso Brasileiro de Epidemiologia. Epidemiologia e Desigualdade Social: Os Desafios do Final do Século, Anais, Campinas-SP, 2 a 6 de setembro de 1990.)-(55. PAIM, J. & ALMEIDA FILHO, N. Saúde Coletiva: uma "nova saúde pública" ou campo aberto a novos paradigmas? Revista Saúde Pública, 32 (4):299-316, 1998.

O conceito de transdisciplinaridade é resumido no ensaio em pauta principalmente com base nas concepções piagetianas, articuladas à proposição de uma epistemologia genética. Efetivamente, trata-se de uma formulação que, não obstante seu potencial, foi originalmente concebida por Jean Piaget enquanto um metaprojeto, um devir inalcançável, e não como um conceito senso-estrito. As proposições posteriores de seus discípulos, principalmente no campo da filosofia da Educação, conforme a sistematização de Jantsch,66. JANTSCH, E. Vers l’interdisciplinarité el la transdisciplinarité dans l'enseignement et l'innovation. In: Vários Autores. L'interdisciplinarité. Paris, OCDE, 1972. não conseguem escapar do idealismo neokantiano e sua avaliação otimista do potencial transformador da práxis humana. Aí encontro o primeiro elemento de crítica ao argumento do mestre, quando ele propõe que o sonho piagetiano (ou, mais precisamente, de seus herdeiros intelectuais) da transdisciplinaridade seria hoje uma realidade.

O conceito de complexidade, por sua vez, é sumarizado no texto de Chaves a partir de uma retificação da suposta conotação do senso comum, que o toma como equivalente a caos, desordem e obscuridade, para valorizá-lo como fundamento de uma "nova ciência". No que concerne à definição do que é efetivamente complexidade, Chaves11. CHAVES, M. Complexidade e Transdiciplinaridade: Uma abordagem multidimensional do Setor Saúde. Revista Brasileira de Educação Médica 22(1):7-18, 1998. seleciona dois importantes aspectos: por um lado, complexidade como a propriedade dos sistemas que "mantém a distinção entre as partes, (... que) associa sem tirar a identidade das partes que a compõem, mas sempre considerando que o todo é maior que a soma das partes". Por outro lado, a complexidade aparece no seu texto referida em passant como a coexistência de mundos entrelaçados num mesmo espaço-tempo. Aqui também encontro um importante ponto de debate com o mestre: em minha opinião, suas opções frente à polissemia do conceito de complexidade privilegiam justamente aqueles aspectos de mais difícil operacionalização nos processos concretos de produção de conhecimento.

Frente ao dilema de tratar a complexidade como teoria ou como paradigma, Chaves prefere seguir Edgar Morin,77. MORIN, E. Scicnce avec conscience. Paris, Fayard, 1990. profeta do holismo epistemológico deste fim de século, com a expressão "pensamento complexo". Aqui, encontra-se uma referência à capacidade do pensamento complexo de lidar com a incerteza e a possibilidade de auto-organização, além de sua dependência da noção de "unidade do conhecimento". Desse modo, nosso autor busca articular os dois conceitos, considerando a complexidade em um nível superior de abrangência em relação à transdisciplinaridade. Para Chaves11. CHAVES, M. Complexidade e Transdiciplinaridade: Uma abordagem multidimensional do Setor Saúde. Revista Brasileira de Educação Médica 22(1):7-18, 1998., complexidade refere-se a uma propriedade totalizante do “Mundo Real” (grifado pelo autor em seu texto), ao passo que transdisciplinaridade seria seu equivalente na esfera do conhecimento. Em suas próprias palavras: "A complexidade está para o mundo real como a transdisciplinaridade está para o mundo acadêmico".

É nessa tentativa de síntese que identifico o principal foco de minha crítica ao texto em pauta, sob três aspectos. Em primeiro lugar, sua adesão no abstracionismo de Morin que, apesar de expressar um pensamento criativo, fascinante e sedutor, cada vez mais afasta-se do rigor epistemológico necessário aos embates pela consolidação de novos formas de prática cientifica. Em segundo lugar, creio que sua definição quase estruturalista de transdisciplinaridade, com ênfase em disciplinas, superposições, interstícios e espaços vazios, perde a oportunidade de considerar o caráter transitivo, praxiológico e "desancorado" daquele conceito. Em terceiro lugar, seu tratamento das relações entre transdisciplinaridade e complexidade, propondo uma duvidosa equivalência de nível simultânea a urna especificidade teórica, resulta em hierarquização e discriminação dos espaços de aplicação dos conceitos.

Neste ensaio, respeitosamente dedicado a Mario Chaves, tenho a pretensão de contribuir para o avanço desta importante área de reflexão, analisando os conceitos de transdisciplinaridade e complexidade. Preliminarmente, apresentarei de modo sistemático e um pouco mais detalhado o que penso sobre as condições de desenvolvimento e uso de tais conceitos. Em paralelo, buscarei discutir algumas perspectivas de integração conceituai desses conceitos no âmbito da Saúde. Dessa maneira, pretendo complementar o texto em discussão aprofundando algumas questões epistemológicas e teóricas apenas esboçadas pelo mestre Chaves.

TRANSDISCIPLINARIDADE

Recentemente, tive a oportunidade de avaliar criticamente as definições de disciplinaridade e seus correlatos (multidisciplinaridade, pluridisciplinaridade, interdisciplinaridade, transdisciplinaridade), com a pretensão de definir mais precisamente o conceito de transdisciplinaridade numa perspectiva pragmática,44. ALMETDA FILHO, N. Transdisciplinaridade e Saúde Coletiva. Ciência & Saúde Coletiva II (1/2):5-20, 1997. explorando suas possibilidades de aplicação no campo científica, da Saúde Coletiva.55. PAIM, J. & ALMEIDA FILHO, N. Saúde Coletiva: uma "nova saúde pública" ou campo aberto a novos paradigmas? Revista Saúde Pública, 32 (4):299-316, 1998. Em face da necessidade de uma fundamentação epistemológica para a crítica à conceituação piagetiana de transdisciplinaridade adotada por Chaves, destaco nesta seção alguns aspectos deste importante debate, buscando retomar uma perspectiva materialista-histórica da ciência enquanto modo de produção e campo social88. BOURDTEU, P. O Campo Cientifico. In: Ortiz, R. (org.) Pierre Bourdieu. São Paulo, Editora Ática, 1983, p.122-155..

O ideal renascentista do cientista-sábio-artista-governante e o movimento iluminista do enciclopedismo, exemplificados pelo talento múltiplo dos pioneiros cientistas - que eram simultaneamente físicos, médicos, filósofos, matemáticos, astrônomos, naturalistas, literatos e políticos -, eram, em certa medida, marginais em relação à história da ciência. De fato, a ampliação do escopo da nascente prática institucional da ciência, com suas sociedades e academias, produzia campos disciplinares cada vez mais rigorosamente delimitados, como se fossem territórios inexplorados, demarcados e apropriados por seus desbravadores. Na arena científica, mais e mais se valorizava a especialização, tanto no sentido de criação de novas disciplinas científicas quanto na direção de subdivisões internas nos próprios campos disciplinares. Podemos, em princípio, designar esta estratégia de organização histórico institucional da ciência, baseada na fragmentação do objeto e numa crescente especialização do sujeito científico, como disciplinaridade.

À guisa de complementação ao texto de Chaves, que se refere à etimologia da palavra complexidade, cabe uma breve revisão da história etimológica do termo 'disciplina' e seus derivados99. REY, A. Dictionnaire Historique de la Langue Française. Paris, Dictionnaire Le Robert, 1993.. Contemporaneamente, a palavra disciplina conota organização, rigor, ascetismo, continuidade ou perseverança no enfrentamento de problemas. O antônimo 'indisciplina' refere-se, em geral, a um defeito de conduta de alguém que não segue as regras ou que carece de efetividade por excessiva dispersão. Em Latim, a palavra discipulus parece ter sido empregada inicialmente em oposição a magister, num contexto de iniciação religiosa, intelectual ou artística. Os discipuli eram originalmente os seguidores de um mestre, de uma escola ou de um grupo, passando em seguida a designar aqueles que aderiam à filosofia ou ao método de uma escola de pensamento. Disciplina inicialmente significava a ação de aprender, de instruir-se; em seguida, a palavra foi empregada para referir­se a um tipo particular de iniciação, a uma doutrina, a um método de ensino. Posteriormente, veio a conotar o ensino­aprendizado em geral, incluindo todas as formas de educação e formação. Por metonímia, com a organização das primeiras universidades ainda no contexto da escolástica, disciplina passou a designar uma matéria ensinada, um ramo particular do conhecimento, o que depois viria a se chamar de "ciência". Por extensão, a disciplina tomou-se equivalente a princípios, regras e métodos característicos de uma ciência particular.

No momento atual de expansão da ciência, tem sido retomada uma abordagem sintética do problema do conhecimento, com a formação de novos campos disciplinares e interdisciplinares1010. MAHEU, R. Introduction. In: Vários Autores. Science et Synthese. Paris, Gallimard, 1967, p.10-18.. Nessa perspectiva, de algum modo se contempla a produção de objetos complexos, aqueles que não se subordinam a uma aproximação meramente explicativa. Trata-se então não apenas de explicar, produzir uma descrição rigorosa ou uma classificação precisa, mas também de construir a compreensão de uma dada questão científica. Podemos concordar que esta estratégia sintética de construção de um dado campo científico configura um paradigma alternativo que, seguindo Morin,77. MORIN, E. Scicnce avec conscience. Paris, Fayard, 1990. designamos como o paradigma da elucidação. Assim, elucidar significa abordar as especificidades e os enigmas dos eventos, processos, fenômenos, na natureza, na hist"ória e na sociedade, enquanto uma síntese provisória de múltiplas determinações.

Para além da disciplinaridade, a noção originalmente piagetiana de “interdisciplinaridade” implica uma axiomática comum a um grupo de disciplinas científicas conexas, cujas relações são definidas a partir de um nível hierárquico superior, ocupado por uma delas. Esta última, geralmente determinada por referência à sua proximidade frente a uma temática unificada, atua não somente como integradora e mediadora da circulação dos discursos disciplinares, mas principalmente como coordenadora do campo disciplinar.

Por outro lado, ainda dentro da linhagem teórica Piaget­Jantsch-Morin a que se filia Mario Chaves, a idéia de 'transdiciplinaridade' indica uma integração das disciplinas de um campo particular sobre a base de uma axiomática geral compartilhada. Baseada num sistema de vários níveis e com objetivos diversificados, sua coordenação é assegurada por referência a uma base de conhecimento comum, com tendência à horizontalização das relações interdisciplinares. Desse modo, a transdisciplinaridade implica a criação de um campo novo que idealmente seria capaz de desenvolver uma autono­mia teórica e metodológica perante as disciplinas que o originaram, como teria ocorrido com a moderna ecologia, oriunda da biologia evolucionista, em sua interface com a química orgânica e as geociências.

Em outra oportunidade44. ALMETDA FILHO, N. Transdisciplinaridade e Saúde Coletiva. Ciência & Saúde Coletiva II (1/2):5-20, 1997., considerei que alguns postulados de base da definição de transdisciplinaridade de Jantsch seriam merecedores de um tratamento crítico. Primeiro, destaquei para exame o pressuposto de que os campos científicos constituem estruturas disciplinares, compostas por uma axiomático teórica e certamente compreendendo uma matriz metodológica. Segundo, identifiquei uma expectativa de que as relações interdisciplinares tenderiam à convergência, com reciprocidade, mútuo enriquecimento, fecundação e aprendizagem conjuntas, definidas pela temática e pela axiomática dos campos disciplinares. Por último, encontrei o dogma otimista de que a comunicação interdisciplinar é desejável e factível, podendo ser realizada pela tradução de princípios e conceitos entre as disciplinas.

Com a pretensão de elaborar uma crítica lógica e pragmática da abordagem piagetiana, no texto referido44. ALMETDA FILHO, N. Transdisciplinaridade e Saúde Coletiva. Ciência & Saúde Coletiva II (1/2):5-20, 1997., propus uma série de pressupostos alternativos, buscando pelo menos maner o que chamei de “equivalência de nível”.

Primeiro, concordando com a posição de Bourdieu88. BOURDTEU, P. O Campo Cientifico. In: Ortiz, R. (org.) Pierre Bourdieu. São Paulo, Editora Ática, 1983, p.122-155. de que os campos científicos de fato não são estruturados e sim instituídos por uma práxis, para a constituição de uma ciência, mais do que uma axiomática intradisciplinar, contribuem decisivamente elementos simbólicos, éticos, políticos. Admitindo que não são os campos disciplinares que interagem entre sí, mas sim os sujeitos que os constroem na prática científica cotidiana, não existiriam campos vazios, ou pelo menos preenchidos por entidades abstratas (princípios, conceitos, teorias, modelos). Os espaços institucionais da ciência seriam permanentemente ocupados por sujeitos da ciência, agentes históricos, organizados em grupos sociais peculiares que têm sido denominados "comunidades científicas", estruturados nas matrizes de pensamento e conduta denominadas como ‘paradigmas’1111. KUHN, T. The Structure of Scientific Revolutions. Chicago: University of Chicago Press, 1970..

Segundo, o paradigma não se torna dominante senão por meio de uma luta pela hegemonia que se trava em cada campo disciplinar. Como a comunicação "franca" interparadigmática não se exerce, as relações interdisciplinares em princípio tenderiam mais ao conflito do que ao diálogo, resultando em relações de poder político. Na realidade, apesar das interações potencialmente possíveis no espaço da comunicação interdisciplinar e interparadigmática, o poder político tem natureza e determinações muito distintas do poder técnico, mesmo em âmbitos de aplicação por definição valorizadores do poder técnico, como deve ser o caso da arena científica1212. TESTA, M. Pensar em Saúde. Porto Alegre, Artes Médicas, 1989..

Enfim, terminei por concluir que a comunicação interdisciplinar é impossível, rejeitando o essencial do esquema analisado, da seguinte maneira44. ALMETDA FILHO, N. Transdisciplinaridade e Saúde Coletiva. Ciência & Saúde Coletiva II (1/2):5-20, 1997.:

"Os princípios e conceitos fundamentais que compõem uma dada axiomática teórica e uma matriz metodológica qualquer não podem ser decodificados, traduzidos e recombinados simplesmente porque axiomáticas e matrizes não são somente princípios e conceitos. Mais ainda, o que faz uma disciplina ou um paradigma é muito mais do que apenas uma combinação métodológica. Somente a quem já se encontra 'dentro' de um dado paradigma, e que por isso já o incorpora (traz no seu corpo, faz dele seu corpo, e por ele possuído, etc.), é dado ver o seu objeto privilegiado."

A partir desta argumentação, avancei uma proposta de definição da transdisciplinaridade com base na possibilidade de comunicação não entre campos disciplinares mas entre agentes em cada campo, por meio da circulação não dos discursos (pela via da tradução) mas pelo trânsito dos sujeitos dos discursos'. Frente a um dado objeto complexo, cada um dos campos disciplinares que a ele se relacionam tem acesso somente a uma faceta particular deste objeto. Por seu turno, os agentes da prática cientifica que tiverem acesso a uma formação transdisciplinar são capazes de transitar entre pelo menos dois campos disciplinares, enquanto os especialistas permanecem restritos a seus respectivos campos.

Apresentei um exemplo dessa proposição, que certamente vale a pena reproduzir no contexto desta crítica-homenagem. Consideremos o objeto complexo da Saúde Coletiva, "cercado" pelos campos disciplinares da Epidemiologia, da Clínica, da Biologia e das Ciências Sociais em Saúde. Cada um desses campos disciplinares dispõe de um ponto de observação privilegiado em relação a cada faceta do complexo saúde­doença-cuidado; nenhum deles, no entanto, é capaz de apreender todos os ângulos do objeto. Vejamos agora os nossos agentes: a, especializado em Antropologia Médica e em Ecologia, transita do campo das Gências Sociais para o campo da Biologia; b, é portador de uma dupla formação em Imunobiologia e em Clínica Médica, podendo deslocar-se do campo biológico para o campo clinico sem dificuldades; c, é capaz de atravessar os campos da Clínico, da Epidemiologia e das Ciências Sociais em Saúde; finalmente, d possui uma formação na subárea que tem sido denominada Epidemiologia Social. Os "especialistas" são competentes nos conteúdos e na linguagem de seus respectivos campos disciplinares, tal como o são seus colegas "transdisciplinares", porém, diferentemente desses, serão incapazes de transitar entre os campos. Para a elaboração de um discurso coordenado eficiente (resultante de operações de produção de conhecimento de diversas naturezas), relativamente válido como objeto-modelo sintético destinado a orientar a ação sobre aquele complexo de múltiplas determinações, quem estará mais capacitado a realizar a necessária circulação de conhecimento: o especialista ou o profissional transdisciplinar?

Assim, para além de uma síntese paradigmática no âmbito de cada campo científico, será necessária uma síntese transdisciplinar construída na prática transitiva dos agentes científicos particulares. A síntese paradigmática permite uma participação interessada inclusive dos especialistas, que poderão ter seu viés disciplinar enriquecido com a portes transdisciplinares. Porém somente a segunda síntese será capaz de dar conta do objeto complexo por meio de totalizações provisórias, construídas por uma prática cotidiana "transversal" dos sujeitos do conhecimento e operadas na concretude de seus aparelhos cognitivos. Finalizei o texto-base deste argumento44. ALMETDA FILHO, N. Transdisciplinaridade e Saúde Coletiva. Ciência & Saúde Coletiva II (1/2):5-20, 1997. comentando sobre o perfil dos novos sujeitos do conhecimento, mutantes metodológicos prontos para o trânsito interdisciplinar, transversais, "operadores transdisciplinares da ciência", capazes de transpassar fronteiras, a vontade nos diferentes campos de transformação, agentes transformadores e transformantes. Avaliando o potencial de aplicação dessa concepção alternativa de transdisciplinaridade ao contexto da saúde pública contemporânea, Paim & Almeida Filho55. PAIM, J. & ALMEIDA FILHO, N. Saúde Coletiva: uma "nova saúde pública" ou campo aberto a novos paradigmas? Revista Saúde Pública, 32 (4):299-316, 1998. adiantam que a formação desses agentes seria essencialmente "anfíbia", com etapas sucessivas de treinamento-socialização­enculturação nos distintos campos científicos que estruturam o campo de práticas da Saúde Coletiva.

Em quê essa concepção de transdisciplinaridade difere da noção devida a Piaget-Jantsch-Morin? Creio que a resposta a esta questão se encontra na relação entre ciência enquanto rede de instituições do campo científico e ciência como modo de produção de conhecimento, mediada em todas as instâncias pelo conceito de prática científica. Em suma, trata-se de uma abordagem materialista-histórica da ciência, fundamentando uma definição pragmática da transdisciplinaridade como processo, estratégia de ação, modalidade de prática, e não como propriedade ou atributo de relações modelares entre campos disciplinares. Dessa maneira, fará mais sentido assinalar o caráter instrumental da transdisciplinaridade como via de transformação da "ciência normal" ciência “revolucionária”, para respeitar a terminologia kuhniana, na emergência de novos paradigmas no campo científico.

COMPLEXIDADE

Uma série de elementos epistemológicos e metodológicos têm sido propostos como tendência alternativa para a ciência contemporânea, agrupados sob o rótulo de "novo paradigma". Alguns proponentes desses novos enfoques1313. RUELLE, D. Hasord et Chaos. Paris, Odile Jacob, 1991.)-(1515. PERCIVAL, I. Chaos: a science for the real world. In: Hall N (ed.) Exploring Chaos. New York, Norton, 1994, p.11-22. privilegiam os componentes analíticos formais que poderiam justificar a denominação genérica, para estas propostas, de teoria do caos ou da não-linearidade. Tais propostas se apresentam quase como um "neossistemismo", atualizando e expandindo algumas posições da teoria dos sistemas gerais que havia alcançado certa influência no panorama científico dos anos 50 e 6022. CHAVES, M. Saúde e Sistemas. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1978. 205 p.. Por esse motivo, a terminologia "teoria dos sistemas dinâmicos" tem sido empregada com certa frequência paro designar os modelos complexos gerados no contexto de propostas de um paradigma científico alternativo1616. ATLAN, H. Entre le Crystal et la Fumée. Paris, Seuil, 1981.)-(1818. LEWIN, R. Complexity - Life at the edge of chaos. New York, Memillan, 1992..

Portanto, a abordagem da complexidade não constitui rigorosamente uma nova concepção. Apesar disso, concordo que a categoria 'complexidade' designa um paradigma que, apesar de não trazer novidades, bravamente luta para tornar-se dominante em diversos campos de conhecimento neste fim de milênio. Seu oponente é o velho e bem-firmado reducionismo cartesiano, que tem subsidiado a maior parte dos avanços científicos e tecnológicos da moderna sociedade industrial. Sem dúvida, o reducionismo valoriza acima de tudo a simplicidade e parcimônia como elementos fundamentais de seus objetos e modelos. Apenas por brevidade, chamemo-lo de “Paradigma S” (paradigma da simplicidade, ou da simplificação, como prefere Chaves).

Hoje em dia, em muitos campos de conhecimento e disciplinas científicas anuncia-se que o Paradigma S teria exaurido sua capacidade de apreender as complexas realidades concretas da natureza, história e cultura humanas e, por conseguinte, teria alcançado seus limites como um terreno fértil para o avanço da ciência. Pensadores e cientistas de diversos campos de pesquisa (uma curta lista: Wiener, von Bertallanfy, Prigogine, Thom, Boulding, Matura na, Simon, Atlan, Lorenz, Morin, entre outros), desde a inauguração da perspectiva sistêmica, vêm propondo formas alternativas de superação das debilidades do reducionismo. A articulação sistemática desse desenvolvimento crítico resultou na composição de novos campos interdisciplinares, como a Ciência da Informação e a Cibernética. Mais recentemente, essas propostas foram finalmente unificadas, conformando o que veio a ser designado como "paradigma da complexidade" ou, abreviadamente, Paradigma C.

Não me parece adequada, como propõe Mario Chaves, a designação da categoria 'complexidade' para resumir o conjunto de propriedades dos objetos concretos, realçando as raízes empíricas dos processos complexos como elementos essenciais para a constituição do novo paradigma. A idéia de complexidade seria, dessa forma, tomada como eixo principal que unificaria parcialmente as diversas contribuições em direção a um paradigma cientifico alternativo. Trata-se de uma aplicação generalizada da premissa de que, ao contrário da abordagem reducionista do positivismo, que tem como objetivo uma simplificação da realidade, a pesquisa cientifica dentro de um novo paradigma deve respeitar a complexidade inerente aos processos concretos da natureza, da sociedade e da história em busca de sua essencialidade1515. PERCIVAL, I. Chaos: a science for the real world. In: Hall N (ed.) Exploring Chaos. New York, Norton, 1994, p.11-22.),(1919. ROBSON, C. Real World Research. Oxford, Blackwell, 1996.. Em minha opinião, o Paradigma C, produto da cultura e da história humanas como qualquer outra construção social, resulta de uma prática social-intelectual-institucional chamada ciência, não sendo definível, numa perspectiva essencialista, por sua maior ou menor aproximação a processos factuais de uma realidade absoluta.

Nessa altura, é preciso considerar uma distinção fundamental entre simples, complicado e complexo. Nesse conjunto de definições, 'simplicidade' resulta de analysis, i.e., da operação que fragmenta o sistema nas unidades mais simples possíveis. Isto equivale à redução cartesiana das relações e processos sistêmicos às formas elementares de determinação, que constituem "modelos simples". A transição da simplicidade à complexidade não é linear e direta, tendo a noção de complica­ção como o nível imediatamente superior.

Complicado é um sistema que apenas multiplica nexos da mesma natureza (por exemplo, nexos causais) entre elementos do sistema de um mesmo nível hierárquico. Multiplicar os elementos de um dado sistema não é suficiente para nele "introduzir" complexidade. Consideremos como ilustração desse aspecto a definição epidemiológica de multicausalidade. Esta implica uma modelagem da complicação mas não da complexidade, na medida em que não indica hierarquia nem incorpo­ra a diversidade complexa dos nexos presentes na realidade. Todas as interconexões entre os componentes são do mesmo tipo, tornando-o um sistema monótono. Trata-se de uma outra faceta do reducionismo, no sentido de que esta forma de modelar a realidade reduz a diversidade dos nexos existentes em qualquer fenômeno ou processo a relações estandardizadas.

A incorporação de diferentes formas elementares de determinação num mesmo modelo permite defini-lo como "modelo complicado de segunda ordem". Abordagens transdisciplinares são especialmente indicadas para construir e operar modelos desse tipo, dispositivos intuitivos para a articulação de diferentes formas de determinação, incluindo a transformação de componentes em fatores por meio de definições de variáveis tipo "proxy". Estes podem assumir a forma de modelos prototípicos para a desejada integração entre as ciências sociais (para processos macrossociais representados como relações de composição na base do modelo), lógica e semântica justificando anamorfoses que produzem o link entre a base do modelo e os fatores modelados) e as ciências clínicas e da saúde pública (responsáveis pela modelagem dos riscos, doenças ou outros efeitos sobre a saúde). De fato, todas as relações internas do modelo convergem para um desenlace, assim visto como a finalização do processo. A despeito do poder heurístico superior desse modelo em relação ao modelo precedente, ele ainda opera no domínio da complicação (mas não da complexidade), posto que nele não há qualquer tratamento da transformação dos fenômenos na dimensão temporal.

De fato, complexidade implica a noção de transformação. Nenhum dos modelos baseados na complicação, por mais sofisticados e articulados que sejam, considera a "flecha-do-tempo"1717. PRIGOCINE, I. & STENGERS, I. La Nouvelle Alliance. Paris, Gallimard , 1986.. Mesmo em suas versões mais desenvolvidas, tais modelos têm-se mostrado reducionistas, monótonos ou finalísticos e, acima de tudo, têm a bordado a realidade complexa por "cortes de congelamento", ou seja, por intermédio da paralisia de seu elemento mais fundan1ental, a natureza dinâmica do ser. Um sistema, mesmo o mais intricado, que sempre converge para o mesmo output fixo, nunca será um sistema dinâmico, já de há muito nos ensinou o mestre Mario Chaves22. CHAVES, M. Saúde e Sistemas. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1978. 205 p.. É por isso que a noção de retroalimentação se revelou tão crucial para a teoria dos sistemas. Na mesma medida, isso explica por que a idéia de 'iteração' se torna chave para definir a não-linearidade nos sistemas dinâmicos.

Várias possibilidades se apresentam no sentido de uma definição da complexidade a partir de uma perspectiva epistemológica mais rigorosa2020. SANTOS, B. S. Introdução a uma Ciência Pós-Moderna. Rio, Graal, 1989.),(2121. SAMAJA, J. Epistemologia e Metodología. Buenos Aires, Eudeba, 1994.. Assim, podemos catalogar como "modalidades" teóricas da complexidade as seguintes categorias:

Sistemas dinâmicos - compreendem estruturas sistêmicas abertas, em constante transformação, totalidades formadas por partes inter-relacionadas, elementos, conexões e parâmetros mutantes22. CHAVES, M. Saúde e Sistemas. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1978. 205 p.),(33. ALMETOA FILHO, N. Paradigmas em Epidemiologia. 1° Congresso Brasileiro de Epidemiologia. Epidemiologia e Desigualdade Social: Os Desafios do Final do Século, Anais, Campinas-SP, 2 a 6 de setembro de 1990.),(1616. ATLAN, H. Entre le Crystal et la Fumée. Paris, Seuil, 1981.),(1717. PRIGOCINE, I. & STENGERS, I. La Nouvelle Alliance. Paris, Gallimard , 1986.;

Não-linearidade - no sentido da propriedade de interconexões sistémicas que vão além das relações dose-resposta, produzindo efeitos que tendem a exceder a previsão dado um conjunto de determinantes1313. RUELLE, D. Hasord et Chaos. Paris, Odile Jacob, 1991.)-(1515. PERCIVAL, I. Chaos: a science for the real world. In: Hall N (ed.) Exploring Chaos. New York, Norton, 1994, p.11-22.. A complexidade de um modelo pode ser entendida como sua natureza não­finalista, correspondendo na linguagem da teoria dos sistemas à propriedade de retroalimentação de um modelo explicativo sistêmico;

Emergência - definida como a ocorrência do imprevisto, transgressão das leis conhecidas da determinação, engendrando o "radicalmente novo". Em outras palavras, trata-se de um processo de determinação desconhecida, concernente à ocorrência de algo que previamente não existia no sistema77. MORIN, E. Scicnce avec conscience. Paris, Fayard, 1990.. Formalmente, implica urna descontinuidade na dinâmica do sistema, gerando o que um novo ramo do cálculo matemático chamaria de "catástrofes", de acordo com René Thom2222. THOM, R. La Theorie des Catastrophes et ses Applications. In: Reflexions sur des nouvelles approches dans l'étude des systémes. Chatenay, Ecam, 1975.;

Borrosidade (fuzziness) - referida à propriedade da im­precisão de limites entre elementos dos sistemas, qualidade de uma realidade a-limitada, resultante da transgressão da lógica formal de conjuntos ou o efeito do "borramento" dos limites entre os elementos intra-sistêmicos e os limites entre o sistema e o contexto (ou supersistema)2323. McNEILLI, D. & FREIBERGER, P. Fuzzy Logic. New York Simon & Schuster, 1993.;

Fractalidade - uma nova geometria do microinfinito, desenvolvida por Mandelbrot2424. MANDELBROT, B. Fractais - a geometry of nature. In: Hall N (ed.) Exploring Chaos. New York, Norton , 1994, p.122-135. como solução para analisar graficamente os padrões repetidos das relações não-lineares;

Caos - na prática definido corno sensitividade às condições iniciais mais imprevisibilidade do sistema como um todo. Neste aspecto, merece registro que cientistas norte-amerianos, como Lorenz1414. LORENZ, E. The Essence of Chaos. Seattle, University of Chicago Press, 1993., chegam a propor que todos os tópicos listados acima compreendem a teoria do caos, sendo a complexidade meramente uma de suas propriedades.

Numa perspectiva pragmática, buscando acercar a questão da complexidade a partir de uma abordagem descritiva, podemos desenvolver um roteiro para o reconhecimento da complexidade onde ela se manifesta, ou seja, nos objetos-modelos ou nos quadros teóricos do Paradigma C.

O que é um objeto complexo? Para responder a esta questão, devemos considerar que a atribuição de complexidade pode assumir distintas manifestações. Em primeiro lugar, o objeto complexo é minimamente um objeto-modelo sistêmico, ou seja, faz parte de um sistema de totalidades parciais e pode ser compreendido ele mesmo como um sistema, também incorporando totalidades parciais de nível hierárquico inferior. Em segundo lugar, podemos chamar de objeto complexo aquele que, em sua forma de objeto heurístico2525. BUNGE, M. Teoria e Realidad. Barcelona, Ariel, 1972., não pode ser explicado por modelos lineares de determinação. Em outras palavras, trata-se de um objeto-modelo submetido a funções não­lineares de determinação. Por isso, o objeto complexo não possibilita a predição, nem a partir dele se pode diretamente gerar tecnologia.

COMENTÁRIO FINAL: COMPLEXIDADE E TRANSDISCIPLINARIDADE EM SAÚDE

Cresce no campo científico a consciência de que a ciência se configura cada vez mais corno uma prática epistemológica de construção de modelos2525. BUNGE, M. Teoria e Realidad. Barcelona, Ariel, 1972., de formulação e solução de problemas num mundo em constante mutação2020. SANTOS, B. S. Introdução a uma Ciência Pós-Moderna. Rio, Graal, 1989.),(2121. SAMAJA, J. Epistemologia e Metodología. Buenos Aires, Eudeba, 1994.. De certo modo, antropocentrismo típico do cientista de tradição cartesiana parece não ter mais lugar numa ciência que valoriza cada vez mais a descentração e a relatividade77. MORIN, E. Scicnce avec conscience. Paris, Fayard, 1990.. A crise resultante dessa mudança de valores da ciência ocorre porque a prática científica está continuamente produzindo não somente novas formas para referenciar os mesmos velhos objetos, mas de fato objetos radicalmente novos, realmente emergentes, objetos complexos.

Vimos acima que conceitualmente o objeto complexo é sintético, não-linear, múltiplo, plural e emergente. Para uma abordagem respeitosa destes intrigantes atributos, a organização convencional da ciência, em disciplinas autônomas e até estanques, precisa ser superada por novas modalidades da práxis cientifica, instaurando formas alternativas de disciplinaridade. Sabemos também que metodologicamente o objeto complexo é aquele que pode ser apreendido em múltiplos estados de existência, dado que opera em distintos níveis da realidade. O objeto complexo é multifacetado, alvo de diversas miradas, fonte de múltiplos discursos, extravasando os recortes disciplinares da ciência. Daí que, para construí-lo como referente, são necessárias operações transdisciplinares de síntese, produzindo modelos sintéticos, e, para designá-lo apropriadamente, é preciso o recurso à polissemia resultante do cruzamento de distintos discursos disciplinares.

No campo da Saúde Coletiva, no contexto do Paradigma C, vários autores têm defendido o emprego de modelos sistêmicos complexos em geral para abordar diferentes questões de pesquisa: Attinger2626. ATTINGER, E. O. Dynamic Modeling and Health Policy Research. In: Methodological Foundations for Research on the Determinants of Health Development. Genebra, WHO/RPD/SOC, 1985, p. 56-74., pioneiramente, propõe a análise de políticas de saúde a partir de modelos dinâmicos desde uma perspectiva teórica da complexidade, capazes de integrar os níveis micro e macro e as transformações dos sistemas de saúde; Olsen & Schaffer2727. OLSEN, L & SCHAFFER, W. Chaos versus noise periodicity: alternative hypotheses for childhood epidemics. Science, 249:499-504, 1990. e Phillippe2828. PHILIPPE, P. Chaos, Population Biology and Epidemiology. Human Biology 65(4):525-546, 1993., entre outros, estudaram a dinâmica das epidemias como fenômenos caóticos não-lineares; Castellanos2929. CASTELLANOS, P. L. Avances Metodológicos en Epidemiologia. I Congresso Brasileiro de Epidemiologia, Anais. Campinas, Abrasco, 1990, p. 201-216., Almeida-Filho33. ALMETOA FILHO, N. Paradigmas em Epidemiologia. 1° Congresso Brasileiro de Epidemiologia. Epidemiologia e Desigualdade Social: Os Desafios do Final do Século, Anais, Campinas-SP, 2 a 6 de setembro de 1990., e Breilh3030. BREILH, J. Reprodução social e investigação em Saúde Coletiva. Construção do Pensamento e Debate. In: Costa, D.C. (Org.) Epidemiologia, Teoria e Objeto. Hucitec/Abrasco, São Paulo, 1990, 137-165., independente mas simultaneamente, sistematizaram propostas equivalentes e complementares de uso destas novas abordagens paradigmáticas para a construção metodológica do objeto da pesquisa epidemiológica. Tais propostas vêm sendo ampliaadas e difundidas com o objetivo de fomentar uma produção científica concreta, capaz de efetivamente alimentar um possível paradigma novo44. ALMETDA FILHO, N. Transdisciplinaridade e Saúde Coletiva. Ciência & Saúde Coletiva II (1/2):5-20, 1997.),(55. PAIM, J. & ALMEIDA FILHO, N. Saúde Coletiva: uma "nova saúde pública" ou campo aberto a novos paradigmas? Revista Saúde Pública, 32 (4):299-316, 1998.),(3131. SCHRAMM, R. F. Castiel LO. Processo Saúde/Doença e Complexidade em Epidemiologia. Cad. Saúde Pública 8(4):379-390, 1992.)-(3535. KOOPMAN, L. Comment: Emerging Objects and Methods in Epidemiology. American Journal of Public Health 86(5):630-632, 1996..

A esse esforço de construção teórica agrega-se agora a importante contribuição de Mario Chaves, muito bem-vinda na medida em que amplia as possibilidades de construção da nova geração de modelos do setor saúde, baseados na noção de Promoç3o da Saúde. Espero que esta modesta colaboração, complementando e aprofundando possíveis lacunas no ensaio do mestre, possa auxiliar na compreensão da dinâmica dos sistemas de saúde no sentido de sua efetiva transformação.

AGRADECIMENTO

Este texto insere-se no Projeto Integrado "Elementos de Crítica Epistemológica da Epidemiologia (para a construção de um novo paradigma científico em saúde)", financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico-CNPq (Processo 520.573/95.1). Jaimilson Paim e Denise Coutinho muito contribuíram, com críticas e sugestões, para aprimorar forma e conteúdo de uma versão preliminar do manuscrito.

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    *Cometbários ao artigo “Complexidade e Transdisciplinaridade: uma abordagem multidimensional ao setor de saúde” publicado na Revista Brasileira de Educação Médica 22(1)7-18.
  • 2
    (Ensaio dedicado a Mario Chaves)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Out 2020
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 1998
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