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Análise de necessidades formativas de docentes ingressantes numa universidade pública

Analysis of formative necessities of freshman professors at a public university

Resumos

Discute pesquisa sobre necessidades formativas de docentes universitários. Entende necessidade como distância entre uma situação real e uma ideal, nos níveis subjetivo e objetivo (Benedito; Imbernón; Félez, 2001). Utilizou-se de questionário, com perguntas fechadas e abertas, aplicado a docentes recém-admitidos numa universidade pública. Os resultados contrapõem-se às demandas dos professores (nível subjetivo), voltadas notadamente para a dimensão técnica, a necessidade de a formação continuada considerar as características da universidade no/do mundo atual (nível objetivo), exigindo da função docente competência técnica e científica e atuação em dimensões igualmente importantes, como a cultural, a ética, a estética, a tecnológica, a ambiental.

ensino superior; necessidade de formação profissional; formação continuada de professores


In this article, formative necessities of university professors are addressed. Necessity is understood as the distance between a real situation, and an ideal one, both the subjective and the objective levels being considered (Benedito; Imbernón; Félez, 2001). A questionnaire with closed and open questions was applied to newly hired professors at a public university. The results oppose the demands of professors (subjective level), mainly focused upon the technical dimension. The need of continuing education to consider the characteristics of universities in/of the world today (objective level) demands from the teaching profession technical and scientific expertise, besides that; a performance on equally important dimensions, such as the cultural, ethical, esthetical, technological and environmental ones

higher education; necessity of professional education; continuing education for professors


Introdução

A presente pesquisa insere-se no contexto da proposta de um programa de formação continuada de docentes atuantes em cursos de graduação de uma universidade pública, especialmente dirigido aos recém-contratados. Tendo aderido ao Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), a partir de 2009, a instituição ampliou consideravelmente seu número de cursos de graduação e, por consequência, seu quadro docente, contando, à época da coleta de dados, com 52% de professores novos.

O intuito da realização desta pesquisa foi, então, o de embasar a proposta de formação por meio de dados obtidos diretamente junto aos professores, em contraposição à ideia de pacote pré-elaborado. Assim, justifica-se o estudo com base em autores como Roegiers, Wouters e Gérard (1992ROEGIERS, Xavier; WOUTERS, Pascale; GÉRARD, François-Marie. Du concept d'analyse des besoins en formation à sa mise en oeuvre: formation et technologies. Revue Européenne des Professionnels de la Formation, Thessaloniki, v. 1, n. 2-3, p. 32-42, 1992.), que advogam a necessidade de ancorar as políticas institucionais na elucidação de dados sobre a formação e as necessidades formativas de seus membros. Esses autores atribuem ao levantamento e análise de necessidades de formação a função precípua de regulação, a fim de garantir que a instituição não se equivoque quanto ao tipo de formação e, mais amplamente, quanto ao tipo de ação a ser implementada.

Na mesma direção, Lang (1987LANG, Vincent. De l'expression des besoins à l'analyse des pratiques dans la formation des enseignants. Recherche et Formation, Lyon, France, n. 2, p. 37-49, 1987. Disponível em: <http://ife.ens-lyon.fr/publications/edition-electronique/recherche-et-formation/RR002-03.pdf>. Acesso em: 31 maio 2013.
http://ife.ens-lyon.fr/publications/edit...
, p. 38-39)1 1 Todas as citações de textos estrangeiros são apresentadas em tradução livre, de minha autoria. defende que

A análise das necessidades é considerada como precondição necessária a todo plano de formação e entendida como envolvendo práticas e escolhas heterogêneas. De modo muito formal, a análise das necessidades se inscreve no seguinte esquema de conjunto, lógico e cronológico: parte de uma expressão das necessidades [...]; ela é interpretada em uma definição das necessidades (análise das necessidades em sentido estrito), que é reelaborada em termos de necessidades de formação: estas são organizadas, 'operacionalizadas' em termos de plano de formação.

O presente artigo circunscreve-se nas duas primeiras etapas do esquema sugerido. Ele traduz e analisa as necessidades formativas de docentes universitários, procurando responder à seguinte questão de pesquisa: como se configuram as necessidades formativas de docentes recém-admitidos numa universidade pública?

O texto se inicia tecendo considerações acerca dos conceitos de necessidade e de necessidades formativas, que serviram de base às análises empreendidas na pesquisa que originou este artigo, e, em seguida, explicita como esta foi construída e caracteriza os sujeitos que a compuseram. Depois, apresenta e discute os dados que possibilitaram problematizar a questão formulada e, por fim, traça considerações acerca dos principais achados.

Necessidades formativas de docentes: algumas referências

O termo necessidade, notadamente polissêmico, será entendido, com base em Roegiers, Wouters e Gérard (1992ROEGIERS, Xavier; WOUTERS, Pascale; GÉRARD, François-Marie. Du concept d'analyse des besoins en formation à sa mise en oeuvre: formation et technologies. Revue Européenne des Professionnels de la Formation, Thessaloniki, v. 1, n. 2-3, p. 32-42, 1992.), como a distância entre uma situação real e uma ideal. Os autores ainda classificam o termo como ambíguo, por comportar conotações de caráter objetivo e subjetivo - objetivo, porque reflete uma necessidade natural e social; subjetivo, porque só existe por meio do filtro das percepções do indivíduo acerca da realidade, tratando-se, portanto, de uma construção mental.

Tais percepções podem ser reveladas por meio de três polos: o da representação da situação atual, expressa em termos de problemas, disfunções, exigências, dificuldades, defeitos; o da representação da situação esperada, manifestada por desejo, aspiração, motivação; e o da representação das perspectivas de ação, nas quais a necessidade se exprime por meio de ações a serem realizadas. A expressão de uma necessidade não depende da existência simultânea desses três polos, bastando que um deles seja explicitado pelo indivíduo para que se configure como tal (Bourgeois apud Roegiers; Wouters; Gerard, 1992ROEGIERS, Xavier; WOUTERS, Pascale; GÉRARD, François-Marie. Du concept d'analyse des besoins en formation à sa mise en oeuvre: formation et technologies. Revue Européenne des Professionnels de la Formation, Thessaloniki, v. 1, n. 2-3, p. 32-42, 1992.).

O presente artigo foi erigido com base nos dois primeiros polos, a partir do levantamento das dificuldades sentidas pelos docentes e da proposta de temas de interesse a serem trabalhados no processo de formação continuada.

Ao serem analisadas as necessidades assim expressas, a fim de derivar suas consequências para a construção do programa de formação continuada dos docentes, é importante problematizar a questão em relação às dimensões de objetividade e subjetividade antes referidas. Nesse sentido, Benedito, Imbernón e Félez (2001BENEDITO ANTOLI, Vicente; IMBERNÓN MUÑOZ, Francisco; FÉLEZ RODRÍGUEZ, Beatriz. Necesidades y propuestas de formación del profesorado novel de la Universidad de Barcelona: profesorado. Revista de Currículum y Formación del Profesorado, Granada, España, v. 5, n. 2, p. 1-24, 2001. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10481/19020>. Acesso em: 30 mar. 2013.
http://hdl.handle.net/10481/19020...
, p. 3) indicam que as necessidades, tal como são sentidas e expressas pelos professores, têm, sim, de ser consideradas, porém não em termos absolutos. Assentam essa indicação nas seguintes questões:

Se um grupo de docentes novos não utiliza, por exemplo, recursos audiovisuais nem tampouco os exige, devemos interpretar que não necessitam deles? Mas como poderiam requerer certo tipo de formação no uso desses recursos se os desconhecerem ou não tiverem os conhecimentos adequados para fazê-lo? A formação do professorado novo, então, deve responder unicamente às suas demandas pessoais ou deve acrescentar também certos critérios institucionais e/ou econômicos? (Benedito; Imbernón; Félez, 2001, p. 3).

Com base em tais questões, Benedito, Imbernón e Félez (2001BENEDITO ANTOLI, Vicente; IMBERNÓN MUÑOZ, Francisco; FÉLEZ RODRÍGUEZ, Beatriz. Necesidades y propuestas de formación del profesorado novel de la Universidad de Barcelona: profesorado. Revista de Currículum y Formación del Profesorado, Granada, España, v. 5, n. 2, p. 1-24, 2001. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10481/19020>. Acesso em: 30 mar. 2013.
http://hdl.handle.net/10481/19020...
, p. 3) propõem que a necessidade formativa seja entendida, numa perspectiva dual e dialética, como sendo

[...] tanto o conjunto de aspectos considerados inerentes ao desenvolvimento dos professores novos sem o qual se pode afirmar que possuem uma carência formativa, como o que o professorado manifesta como necessário e do qual deseja obter uma capacitação para poder realizá-lo.

Defendem, então, que a análise de necessidades seja sensível a essa natureza dual, ponto de vista considerado no estudo dos dados desta pesquisa.

Posto isso, é importante configurar o que caracteriza a função de docência na universidade hoje. De acordo com Cunha e Zanchet (2010CUNHA, Maria Isabel; ZANCHET, Beatriz Maria. A problemática dos professores iniciantes: tendência e prática investigativa no espaço universitário. Educação, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 189-197, set./dez. 2010., p. 191),

Para ensinar, o domínio do conteúdo específico é condição necessária, mas não suficiente. Os professores universitários enquanto profissionais, sejam os iniciantes ou os mais experientes, teriam de possuir conhecimentos, habilidades e atitudes próprias de suas tarefas e de seus compromissos.

Que tarefas seriam essas? Estepa et al. (2005ESTEPA, Paulino; MAYOR, Cristina; HERNÁNDEZ, Elena; SÁNCHEZ, Marita; RODRÍGUEZ, José; ALTOPIEDI, Mariana; JESÚS, Juan. Las necesidades formativas de docentes de los profesores universitarios. Revista Fuentes, Sevilla, España, n. 6, p. 1-22, 2005. ) defendem que o professor universitário, a par de ser um conhecedor de sua matéria de ensino, um expert em técnicas e um pesquisador, seja um guia e supervisor da formação científica dos estudantes. Apontam quatro eixos de responsabilidade docente - os processos de ensino e aprendizagem, a ação tutorial, as atividades de desenvolvimento profissional e os serviços à comunidade -, cujo cumprimento estaria relacionado a quatro dimensões: a pedagógica; a profissional; a intelectual; e a artística e criativa. Por sua vez, essas dimensões seriam vivenciadas por meio de um perfil de professor

[...] flexível, aberto à mudança, capaz de analisar seu ensino, crítico consigo mesmo, com um amplo domínio de destrezas cognitivas e relacionais, capaz de trabalhar em equipe e de investigar inclusive sobre sua própria forma de ensinar. (Estepa et al., 2005, p. 3).

Tal modo de conceber a tarefa docente está pautado pela ideia de construção de conhecimentos, ao invés de sua simples transmissão, e pela concepção do saber como passível de mudança e transformação, e não fixo e imutável. Nessa acepção, os mesmos autores postulam que a formação dos professores universitários seja constituída por temas como o planejamento do ensino; a metodologia; os sistemas de avaliação; o agrupamento dos alunos numa universidade que se pretende para todos e na qual todos possam ter acesso à construção dos conhecimentos; a participação em tarefas; a tomada de decisões, etc. Acrescentam a estas as necessidades de que o docente universitário

[...] provoque e motive os alunos no entusiasmo da busca da verdade e que colabore em um trabalho de equipe fundamentalmente, esquecendo o individualismo no desenvolvimento das tarefas docentes. Deve ser um professor tolerante com qualquer questionamento, já que deve partir da perspectiva dos alunos para começar uma investigação que o aproxime do conhecimento, sendo o próprio professor que deve conduzir o aluno na busca do saber. (Estepa et al., 2005, p. 4).

Embora esses autores se refiram à realidade europeia, suas ideias e propostas podem ser entendidas como compatíveis com a universidade brasileira, razão pela qual foram tomadas como referência para o presente estudo, cuja construção será a seguir explicitada.

A construção da pesquisa e as principais características de seus participantes

A pesquisa utilizou, como instrumento de coleta de dados, um questionário com perguntas fechadas e abertas, contendo, ainda, a solicitação final de que cada docente criasse uma imagem para representar sua experiência de ensino nessa universidade até então.

O questionário foi aplicado, no ano de 2011, a 253 docentes que haviam ingressado naquela instituição nos dois anos anteriores, dos quais 99 responderam (39%), o que se considera um índice importante, podendo significar, hipoteticamente, uma valorização da atividade de ensino pelos respondentes.

À época da coleta dos dados, a maioria (58%) estava na faixa etária entre 31 e 40 anos, 30% tinham entre 41 e 50 anos e apenas 3% tinham entre 51 e 60 anos - nenhum professor estava além dessa faixa. Chama a atenção a existência de 9% de docentes com menos de 30 anos.

Quanto à titulação, a quase totalidade (97%) possuía título de doutor, estando os outros 3% matriculados em cursos de doutorado ou em fase final de obtenção desse título. Cerca de 10% dos docentes haviam realizado estágio de pós-doutorado antes de ingressarem na instituição.

Essa configuração indica que os docentes então recém-contratados por essa universidade eram jovens, com formação acadêmica completa quanto à titulação, obtida durante as últimas décadas, época em que essa carreira se configurou fortemente pelas exigências de pesquisa e de produção científica.

Uma característica interessante dos respondentes é a sua procedência em relação à área do conhecimento. Predominaram aqueles advindos da área de Ciências Exatas (45,5%), seguidos dos de Humanidades (29,3%) e de Ciências Biológicas (25,3%). Pode ser que isso se deva a uma maior dificuldade de traduzir conhecimentos de áreas consideradas "mais duras" em conteúdos de ensino e de aprendizagem, daí aguçando o interesse desses docentes em participar da pesquisa, cientes da finalidade com a qual fora realizada: embasar ações de formação continuada. Será interessante verificar se essa tendência se expressa em pesquisas correlatas.

Também convém destacar que, em média, 70% dos respondentes declararam ter algum tipo de formação pedagógica, com destaque para os da área de Humanidades.

Quanto ao tipo de formação pedagógica, o maior percentual (52,5%) é o dos docentes que informaram terem-na obtido em cursos de licenciatura - também predominando os da área de Humanidades -, seguidos dos que a obtiveram no doutorado (38,4%) e no mestrado (33,3%). Note-se, portanto, o significativo percentual de bacharéis que também ensinam.

Outra questão a ser discutida é: o que pensam os docentes quando informam que tiveram formação pedagógica na pós-graduação stricto sensu? As respostas discursivas parecem indicar que, para eles, o aprofundamento nos conteúdos de ensino obtidos nesses cursos é o elemento essencial, como evidenciam os seguintes depoimentos: "[aprendi] conhecimentos que também foram importantes para a aplicação no ensino superior" (D212 2 Os docentes foram identificados com números alocados aleatoriamente. ; ou "O conteúdo/conhecimento técnico de [x área] necessário para dar boas aulas na universidade não vem da licenciatura" (D32). Tais afirmações, ao mesmo tempo que contrariam o que vem sendo revelado pelas pesquisas na área de formação de professores sobre o que é ser professor e sobre como se aprende a sê-lo, indicam uma forte direção para as políticas e práticas de formação continuada de docentes das universidades e coincidem com a constatação feita por Cunha e Zanchet (2010CUNHA, Maria Isabel; ZANCHET, Beatriz Maria. A problemática dos professores iniciantes: tendência e prática investigativa no espaço universitário. Educação, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 189-197, set./dez. 2010., p. 191):

Dado que a formação acadêmica dos cursos de formação privilegia os saberes das matérias de ensino, os professores iniciantes se instituem a partir de uma perspectiva conteudista, acreditando, inicialmente, que o domínio do conteúdo é a chave da sua docência.

Ainda a título de caracterização dos respondentes, os dados revelam que a maioria absoluta (86,2%) tinha experiência docente antes de ingressar na universidade em que a pesquisa se realizou.

Nota-se, ainda, que tal experiência se concentra, marcadamente, no nível de ensino superior (89,5%). Embora os docentes de todas as áreas tenham indicado experiência nas outras etapas de ensino, são baixos esses percentuais, exceto para os da área de Humanidades.

Quanto ao tempo de experiência, predomina a faixa de um a cinco anos, o que permite caracterizar os respondentes, em sua maioria, como iniciantes, de acordo com o que apontam Huberman (1995HUBERMAN, Michäel. O ciclo de vida profissional dos professores. In: NÓVOA, A. (Org.). Vidas de professores. 2. ed. Porto, Portugal: Porto Ed., 1995. p. 31-61.) e Marcelo (1999), entre outros.

Em qualquer nível de ensino, verifica-se um equilíbrio entre a experiência em estabelecimentos de ensino públicos e privados, com leve predominância deste último, especialmente no ensino superior (56% em públicos e 63% em privados, tendo, muitos desses professores, atuado em instituições das duas naturezas). Nota-se, ainda, que o tempo de experiência em ensino privado suplanta o cumprido no ensino público.

Essas são características importantes que, aliadas às oriundas dos dados a seguir descritos, têm potencialidade para orientar políticas e práticas de formação continuada de docentes na universidade.

O que os participantes da pesquisa revelam acerca de suas necessidades formativas

Esta seção apresenta os dados referentes ao que os participantes foram instados a apontar: dificuldades encontradas no início de sua carreira universitária; a que/a quem as atribuíam; o que/quem os ajudava a superar tais dificuldades; quais temas (e de que maneira) gostariam que a formação pedagógica na universidade abordasse. Também serão apresentados os resultados referentes às imagens criadas por eles, representando a experiência vivida, até então, nessa instituição.

Dificuldades sentidas

Em ordem decrescente de frequência, foram citadas as dificuldades relacionadas aos aspectos institucionais (31%) e didático-pedagógicos (26%) e aos estudantes (20%). Um percentual menor de docentes citou a insegurança advinda da inexperiência (5%), a ausência de interlocução com os pares (3%) e a dificuldade de conciliar as atividades profissionais com as de pós-graduação em curso. Foi pequeno o percentual dos professores (3%) que incluíram, entre as dificuldades sentidas, aquelas referentes à falta de trabalho integrado com seus pares. Apenas um participante afirmou não ter sentido qualquer tipo de dificuldade.

Por ter envolvido um número maior de respondentes, especificam-se, a seguir, as três primeiras categorias de dificuldades.

Entre os que alegaram dificuldades de natureza institucional, prevaleceram os docentes que as atribuíram à infraestrutura inadequada, seguidos dos que indicaram: o pouco tempo de preparo versus o grande número de alunos; os trâmites burocráticos; os entraves proporcionados pela lucratividade; a instabilidade no emprego; a restrição de recursos para inovação; a evasão de estudantes; a falta de atividades práticas, de laboratório e de campo, devido à escassez de recursos financeiros; e, finalmente, a impossibilidade de realização de atividades de iniciação científica, pesquisa e extensão. Ressalte-se que a maioria absoluta dessas respostas se referia a instituições de natureza privada.

Quanto às dificuldades de caráter didático-pedagógico, o maior número de respostas recaiu sobre a falta de fundamentação teórica nessa área, dificultando o reconhecimento do papel fundamental do saber didático-pedagógico e a compreensão dos processos de ensino e aprendizagem, notadamente quanto ao planejamento do conteúdo e à avaliação. Uma parte desses docentes aludiu a dificuldades de manter os estudantes motivados e de entender as demandas heterogêneas destes, impossibilitando adequar o currículo às suas demandas profissionais. Um número pequeno de docentes (quatro) citou dificuldades de ordem eminentemente técnica, quer no próprio processo de ensino (dosar o tempo de aula, preparar material didático), quer nas características pessoais (tom de voz, timidez, dificuldade de falar em público). Um dado importante, relatado por dois docentes, foi a falta de domínio profundo do conteúdo da disciplina sob sua responsabilidade. Finalmente, chamou a atenção o fato de apenas um docente ter indicado dificuldade de fazer os alunos pensarem autônoma e cientificamente e de outro deles ter relatado receio de ser desaprovado pelos alunos quanto ao método de ensino empregado nas aulas.

O terceiro conjunto de respostas diz respeito diretamente aos alunos, atribuindo a eles a causa das dificuldades sofridas no início da docência. Entre estas, destacam-se: relacionamento professor-aluno (expresso assim mesmo, de forma genérica); baixo nível de experiências; e falta de motivação/interesse, manifestada pelos estudantes que, aliás, segundo os respondentes, vem crescendo nos últimos anos. Houve ainda respostas isoladas, dadas por docentes, indicando a grande heterogeneidade dos alunos (um docente) e a baixa procura pelos cursos de licenciatura, em virtude da desvalorização da carreira do magistério do ensino básico (um docente).

Razões das dificuldades

Quando convidados a explicar a que atribuíam as dificuldades sentidas, a maioria dos respondentes (37%) responsabilizou a instituição de ensino por elas, tendo predominado as razões referentes às características mercadológicas das instituições privadas (carga de trabalho elevada, falta de tempo para preparação das aulas, altas taxas de mensalidade cobradas dos alunos e evasão destes); as deficiências de infraestrutura; a falta de cobrança de responsabilidades, no caso de instituições públicas; tradições administrativas arcaicas; excesso de funções atribuídas ao professor.

Em segundo lugar, apareceram, relatadas por 17% dos respondentes, as razões atribuídas ao próprio docente como causa de suas dificuldades. É citada, pela quase totalidade, a pouca experiência em sala de aula. Houve, ainda, quem alegasse má formação docente (um professor); dificuldade de avaliação dos alunos (um professor); e falta de maturidade para compreender as diferentes visões de mundo dos estudantes (um professor).

Em seguida, vieram as razões afetas aos estudantes, citadas por 11% dos respondentes, com predomínio da alegação de má formação proporcionada àqueles pelo ensino médio e do cansaço que manifestam, por serem de cursos noturnos. Também foram lembrados o descompromisso com os estudos (dois docentes) e questões referentes à educação familiar deficiente (dois docentes).

Por último, foram citadas razões referentes à política de ensino (6%), tanto de nível básico - denunciando sua desvalorização - quanto de nível superior, com forte alusão ao predomínio da valorização da pesquisa e pós-graduação, em detrimento do ensino de graduação.

O que/quem contribuiu para superar as dificuldades

A grande contribuição recebida pelos docentes iniciantes parece ter advindo dos colegas de trabalho, como citado por 38% dos respondentes. Em seguida, aparece o empenho/compromisso pessoal (24%) - a maioria relata ter buscado a superação de suas dificuldades, por meio de participação em eventos, leitura de livros, artigos científicos. Houve, também, quem relatasse a busca por atrair a atenção dos alunos nas aulas e o apelo à criatividade pessoal para atingir essa finalidade.

A disposição e a colaboração dos alunos foram apontadas por 6% dos docentes; dos coordenadores de cursos, por 5%; dos técnicos e funcionários, por 4%; dos amigos e familiares, por 2%; e da instituição, por 2%.

Chama a atenção, por um lado, o fato de 7% dos docentes terem dito que ninguém os ajudou, até porque não tinha o que ser feito (D45). Por outro lado, dois respondentes lembraram a contribuição de professores tomados como referência para suas aulas e dois mencionaram a contribuição de experiências anteriores de docência em outros níveis de ensino.

Temas requisitados

A maior concentração de dados (25% dos respondentes) se deu em torno da solicitação de formas específicas de trabalho pedagógico, tais como: trabalho de campo (8%), trato pedagógico com disciplinas da área de Ciências Exatas (4%), trabalho com projetos (3%), educação a distância (2%), inclusão de recursos tecnológicos no ensino (2%), problem based learning (2%). Ainda dentro dessa categoria, encontraram-se solicitações - feitas cada uma por um docente - como: planejamento de aulas; dinâmicas de trabalho pedagógico; trabalho com ensino, pesquisa e extensão nas licenciaturas; ensino de Ciências. Uma parcela dos docentes (15%) apontou temas genéricos, como metodologia de ensino e aprendizagem e ferramentas didático-pedagógicas.

Outros 15% requereram que a formação pedagógica envolvesse o tema da avaliação, tendo 10% formulado sua solicitação de modo genérico, enquanto os demais especificaram aspectos, como avaliação de projetos de ensino (quatro docentes) e influência da realidade socioeconômica dos alunos na avaliação (um docente).

Houve, ainda, demandas mais diretamente relacionadas à formação voltada para a aprendizagem dos alunos (7%). Nessa categoria, encontram-se quatro docentes interessados em discutir o trato com alunos ingressantes por reserva de vagas, pela via da política de ações afirmativas, e o respeito pelas diferenças. Merece destaque uma dessas demandas, que diz:

[...] Também é importante refletir sobre a questão dos alunos que ingressam na universidade pela reserva de vagas, visando [a] diminuir o preconceito que ainda parece existir entre alguns professores e alunos. De maneira mais específica, gostaria de discutir a questão dos indígenas e o que a universidade e professores poderiam fazer, em termos pedagógicos, para superar as dificuldades que esses alunos têm encontrado. Não podemos esperar que apenas os alunos se adaptem à universidade. É importante que também nós nos esforcemos para contribuir para seu sucesso escolar (D39).

Necessidades apontadas, cada uma por um docente, também apareceram, tais como: ensinar alunos a dedicarem mais tempo à leitura; lidar com a geração internet; elaborar mapas conceituais; e trabalhar didaticamente com diferentes estilos de aprendizagem.

A formação referente aos currículos dos cursos foi objeto de solicitação por parte de 5% dos respondentes, entre os quais, dois gostariam de discutir o escopo da disciplina dentro da formação global do profissional a ser formado e, outros três aludiram genericamente à revisão do currículo, à ambientalização curricular e à necessidade de revisão do projeto pedagógico de um curso específico.

Dos temas requeridos, 10% foram agrupados na categoria outros, por apresentarem formulações esparsas, entre as quais se destaca a de discussões relativas aos direitos e deveres/ética, apontadas por dois docentes.

Formas de abordagem dos temas

Neste tópico, um dado chama atenção: o de apenas 50% dos docentes terem respondido a essa questão. Entre esses, predominou a sugestão de que a formação se desse por meio de eventos de realização pontual e de curta duração, entre os quais foram citados, com maior frequência, seminários e palestras. Oficinas/workshops, mesas redondas e programas ou cursos também foram indicados. Além desses, houve referência, em menor proporção, a plenárias, atividades que envolvam alunos e docentes em algum momento do curso, reuniões específicas com o conselho do departamento. Dois respondentes citaram a realização de eventos online, como fóruns de discussões e videoconferências. Quanto à abrangência, 9% dos docentes sugeriram que os eventos fossem referentes a cada área do conhecimento.

Contrastando com as demandas focadas em eventos, 8% dos respondentes sugeriram modalidades processuais, sendo citadas: a divulgação de experiências positivas por meio de informativos eletrônicos, blogs e fóruns e a edição de guia informativo, com indicação de textos para leitura pelos novos docentes. Apenas um professor apresentou sugestão de atividade formativa de caráter processual:

Que se crie um grupo, com encontros mensais ou a cada dois meses, para discutir assuntos de necessidade dos professores, tendo, inclusive, um ambiente virtual para consulta e apoio aos docentes. Uma espécie de formação continuada aos professores do ensino superior para todos os docentes da [cita nome da instituição de ensino superior (IES)] interessados. (D82).

Por fim, 5% dos respondentes apresentaram sugestões mais genéricas, indicando ora somente o local de ocorrência das atividades formativas (em todos os campi da universidade), ora as instâncias em que deveriam ocorrer (em todas as instâncias da universidade e não só entre os docentes), ora a modalidade das atividades, variando entre "um misto de presenciais e online" ou somente pela via da educação a distância.

Imagens representativas da experiência de ensino na universidade

O questionário solicitava que os professores criassem uma imagem para representar sua experiência na universidade em que trabalhavam naquele momento. Explicitava que eles poderiam expressá-la por meio de palavras, figura(s), desenho(s) ou outra forma.

Embora nem todos tenham respondido, foi significativo o percentual dos que o fizeram (74%). Um dado interessante, que merece ser explorado em análises específicas a esse respeito, é o de que 52% dos docentes se expressaram por palavras e apenas 22% por desenhos ou figuras. As imagens criadas3 3 Como cada docente criou uma só imagem, o texto se refere ora à quantidade de imagens, ora à de docentes. por 40 docentes4 4 A partir desse ponto, utilizam-se as referências numéricas em frequências absolutas, por se entender que a apresentação em percentuais tornaria o texto confuso, pois se trataria das porcentagens de porcentagens. faziam referência a aspectos relativos à atividade docente especificamente na instituição em que atuavam, enquanto os demais 34 referiram-se a características da profissão docente em si.

Quanto aos aspectos referentes à atividade docente na instituição, a maioria absoluta das imagens (33) tinha caráter positivo - utilizando expressões como satisfação, orgulho, desafio e assemelhadas - enquanto as outras sete denotavam uma visão negativa do trabalho dos docentes nessa universidade. Em ambos os casos, alguns criaram imagens e metáforas e outros usaram adjetivos para expressar sua relação com esse momento de início de carreira. Eis alguns exemplos de imagens representativas do primeiro caso:

Escolhi o sol para representar minha experiência, para representar a energia e alegria com minha experiência no ensino aqui na [cita nome da IES], até o presente momento. Estou contente em participar do corpo docente da [cita nome da IES]... (D91).

Um trem que passa ao longe, vigoroso, sem atropelos. Acho que penso nesse fôlego que a [cita nome da IES] pretende e que nos tem proposto: um fôlego com tônus, que tem de ser bem distribuído ao longo da jornada, num ritmo permanente, mas que, por isso mesmo, seja forte sem ser devastador, alucinado, desenfreado. [...] (D56).

D71 expressou sua imagem por meio da figura de uma lâmpada voando no céu como se fosse um balão, cercada de outros balões, e justificou-a assim:

Aqui nós podemos sonhar, imaginar, realizar. Mas, tudo isso deve ser acompanhado de muita criatividade, inteligência e responsabilidade.

Por sua vez, D49 escolheu a imagem de um muro no qual havia a seguinte inscrição: "Tempo é arte! Nós manipulamos o tempo". Como justificativa da escolha dessa imagem, explicou:

Porque gosto de saber que trabalho em uma instituição que valoriza a expressão de liberdade de seus alunos, não os subestimando, mas exigindo deles o máximo. Isso demonstra capacidade de acreditar no ser humano e no potencial de desenvolvimento por meio da educação. E, também, porque acredito que a [cita o nome da IES], ainda jovem universidade, tem potencial para crescer e se consolidar ainda mais com o decorrer do tempo.

Entre os que se expressaram por meio de adjetivos, encontramos, por exemplo:

Sou muito feliz na [cita o nome da IES]. As atividades de docência e o contato constante com os alunos sempre me alegram, o que me motiva a oferecer atividades de extensão e pesquisa. Creio que esta seja a realidade do ensino na [cita o nome da IES]. (D28).

Agradável desafio. Porque penso estar contribuindo com a consolidação do campus [X], o que faço com prazer. (D61).

Por outro lado, os sete docentes que apontaram aspectos negativos da IES estão vinculados a cursos ou campi novos e denunciam condições institucionais desfavoráveis, principalmente quanto a: a) aspectos físicos (lousa ruim; sala pequena, em proporção ao tamanho da turma); e b) outros, como quantidade de docentes ainda insuficiente, considerando o crescimento do número de alunos a cada ano - devido ao atraso na liberação de contratações pelo Ministério da Educação (MEC) -, a assimetria de informações, a falta de infraestrutura e a burocracia.

Destaque-se que, desses sete docentes, três pertenciam a um curso novo, com projeto pedagógico diferenciado, cuja estrutura depende, intrinsecamente, dos serviços municipais, levando ao apontamento de aspectos negativos relacionados à falta de suporte institucional, à delegação da formação a terceiros e à falta de integração entre ensino e extensão, dificultando as condições de pesquisa. Um dos docentes ilustra essas dificuldades, identificando sua experiência na universidade com a figura de alguém que carrega o mundo nas costas (D9).

Quanto às características da profissão docente, quatro respondentes as associaram às dificuldades sentidas, quer especificamente relacionadas ao início da docência, quer à carreira docente nas universidades.

No primeiro caso, estão duas imagens com referências específicas às dificuldades encontradas no início da docência. Uma delas é a de um gato, cujo autor a explicou assim:

Bom, eu me imagino como um gato, assustado diante da situação nova, desconhecida, mas que vai tateando para ver o que pode e o que não pode fazer, o quanto pode ou não avançar, mas que enfrenta a situação, às vezes se arrepiando, às vezes se escondendo, às vezes se colocando à espreita, mas sempre com coragem. (D47).

O outro docente se diz "um aprendiz sem mestre" e explica: "O caminho vai sendo descoberto à medida que se caminha, errando-se algumas encruzilhadas" (D16).

No segundo caso, estão outros dois docentes que construíram suas imagens em torno das dificuldades geradas pelo excesso de tarefas exigidas pela universidade versus a escassez de tempo para realizá-las. D37, por exemplo, identificou-se com a figura de "uma contorcionista"!

Dos 34 professores que fizeram referência a características da profissão docente, a metade pareceu associá-la a uma valoração positiva, percebendo-a como desafiante e gratificante, traduzindo-a, também, em expressões como: amor, compromisso, perseverança, seriedade, honestidade, criatividade, realização existencial. Evidenciam-se, a título de exemplo, duas dessas manifestações:

[Penso em] mudanças, desafios, comprometimento. Por entender que esses são pontos importantes e que estão sendo realizados na busca contínua da qualidade de ensino. (D98).

Para mim, a atividade docente faz parte de um objetivo que é o de transformar o mundo por meio de pessoas que podem contribuir para o bem da sociedade, começando com o trabalho individual, que pode crescer, se estendendo para a casa, o trabalho e a sociedade. (D55).

Um grupo composto por 13 docentes construiu imagens referentes, especificamente, ao ensino, atribuindo também, nesse caso, valor positivo às suas vivências e expectativas. Exemplo ilustrativo de tal assertiva é:

Dedicação e prazer no ensinamento: para um futuro transformador! Os aspectos implícitos nessa frase envolvem: a grande satisfação da atuação como professor; o prazer dedicado à preparação das aulas; a busca pelo constante aprimoramento didático; o sentimento de realização ao facilitar a aquisição e/ou ampliação do conhecimento; a consciência da responsabilidade social, pessoal e coletiva no processo de formação dos alunos; o almejo de proporcionar aos alunos conhecimentos reflexivos, inovadores, e inquietudes, preparando-os como atores transformadores de nosso futuro. (D87).

Considerações acerca dos dados

Se, como mencionado no início do artigo, necessidade for considerada como a distância entre uma situação real e uma situação ideal, alguns resultados chamam a atenção, a julgar pelas análises: das dificuldades sentidas pelos participantes da pesquisa; das razões às quais elas são atribuídas; dos temas de interesse para a formação continuada; e das imagens que eles fazem da docência na instituição em que atuam:

− Quanto às dificuldades percebidas, há uma ênfase maior nas condições estruturais das instituições do que nas próprias dificuldades didático-pedagógicas dos docentes.

− Mesmo assim, é relativamente elevado o número dos que apontam dificuldades de caráter didático-pedagógico, porém, indicando aspectos mais técnicos e formulados de modo genérico (planejamento, conteúdo, avaliação).

− Os apoios recebidos no início da carreira docente - a maioria, como apresentado na caracterização dos participantes, vivida em instituições particulares - advieram dos próprios colegas de trabalho e do compromisso pessoal dos docentes, não havendo relatos de apoios institucionais obtidos naquele momento. Essa constatação colide com os achados da produção acadêmica na área de formação de professores nas últimas décadas, mais especificamente quanto aos professores iniciantes, apontando o apoio institucional como condição indispensável ao sucesso da inserção profissional.

− Ao indicarem temas de interesse para a formação continuada, aparecem alusões a planejamento e metodologia de ensino, referidas a formas específicas de trabalho pedagógico, tais como: trabalho de campo, trato pedagógico com disciplinas da área de Ciências Exatas, trabalho com projetos, entre outros, contrastando com o escopo mais genérico pelo qual as dificuldades foram apontadas.

− As modalidades indicadas pelos respondentes sobre como a formação deveria se dar estão relacionadas com eventos e não com processos - sendo estes indicados somente por 8%, com grande apelo aos meios eletrônicos de ensino e aprendizagem, como chats, fóruns, etc. Pode-se, então, constatar que a demanda apresentada pela maioria dos docentes está na contramão das produções acadêmicas na área de formação de professores, que indicam a pertinência das estratégias de formação centradas em processos que, como tal, são contínuos e referidos à prática pedagógica concreta.

− O conjunto de informações, oriundo da análise das imagens indicadas pelos docentes para representar sua experiência na instituição na qual atuavam, no momento da coleta de dados, mostra a predominância de visões bastante positivas tanto da instituição - parecendo haver orgulho de pertencimento a ela e concordância com seus princípios e políticas - quanto da função docente, apesar das dificuldades inerentes ao início da docência (para a maioria) e ao início da vida naquela instituição (para alguns deles). São dados que corroboram a ideia de que a docência não se dá no vazio, mas está referida às condições objetivas de sua produção.

Se, de outro lado, os dados forem problematizados à luz da proposta de Benedito, Imbernón e Félez (2001BENEDITO ANTOLI, Vicente; IMBERNÓN MUÑOZ, Francisco; FÉLEZ RODRÍGUEZ, Beatriz. Necesidades y propuestas de formación del profesorado novel de la Universidad de Barcelona: profesorado. Revista de Currículum y Formación del Profesorado, Granada, España, v. 5, n. 2, p. 1-24, 2001. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10481/19020>. Acesso em: 30 mar. 2013.
http://hdl.handle.net/10481/19020...
), em que se analisem as necessidades, do ponto de vista tanto subjetivo quanto objetivo, considerando as características das tarefas docentes na universidade atual, verifica-se que os respondentes fizeram pouca ou nenhuma alusão a alguns aspectos fundamentais:

─ Apenas um docente apontou a dificuldade de fazer os estudantes "pensarem autônoma e cientificamente" e somente um atribuiu a razão de suas dificuldades à sua "falta de maturidade para compreender as diferentes visões de mundo dos estudantes".

─ Foram poucos os que requisitaram formação continuada referente à aprendizagem dos estudantes e à avaliação da aprendizagem e do ensino (nenhum nesse último aspecto).

─ Muito poucos solicitaram o estudo de temas referentes: ao tratamento pedagógico com estudantes de origens culturais diferentes; a direitos, deveres e ética; a currículos; às relações entre ensino, pesquisa e extensão; à investigação sobre sua própria forma de ensinar.

─ Nenhuma alusão foi feita, por exemplo: à ação tutorial; às dimensões intelectual, artística e criativa da função docente; à flexibilidade; à abertura à mudança; às destrezas cognitivas e relacionais; ao trabalho em equipe - todos esses aspectos considerados, pelos autores referenciados, como indispensáveis ao desempenho da função docente nas universidades.

Considerações finais

Os dados apresentados carregam certo tom alentador, pois indicam a existência de muitos docentes para quem o ensino de graduação merece cuidado e atenção, contrariando a ideia generalizada de que, hoje em dia, eles se interessariam somente pela pesquisa. Estaria essa resposta positiva relacionada ao fato de se ter entrevistado professores novos na carreira e/ou na instituição em que os dados foram recolhidos? Se sim, mais uma forte razão haverá para que a instituição aposte na oferta de apoio pedagógico sistemático, por meio de políticas e práticas de formação continuada no local de trabalho.

Os resultados obtidos também sugerem a direção à qual se deveriam endereçar com mais ênfase tais políticas e práticas. Há que se problematizar a diferença entre a percepção (subjetiva, portanto) das necessidades de formação por parte dos docentes, cotejando-as com as postas pela universidade e pelo mundo atual e futuro. Nesse sentido, a visão técnica que ainda parece prevalecer nas percepções desses docentes tem de ser superada, ao mirar-se, com Estepa et al. (2005ESTEPA, Paulino; MAYOR, Cristina; HERNÁNDEZ, Elena; SÁNCHEZ, Marita; RODRÍGUEZ, José; ALTOPIEDI, Mariana; JESÚS, Juan. Las necesidades formativas de docentes de los profesores universitarios. Revista Fuentes, Sevilla, España, n. 6, p. 1-22, 2005. ), a perspectiva de que o professor universitário, a par de ser um conhecedor de sua matéria de ensino, um expert em técnicas e um pesquisador, seja um guia e supervisor da formação científica dos estudantes. A essa dimensão, acrescentem-se outras igualmente importantes, como a cultural, a ética, a estética, a tecnológica, a ambiental, na perspectiva de uma universidade para todos e de um mundo no qual todos possam ter lugar.

  • BENEDITO ANTOLI, Vicente; IMBERNÓN MUÑOZ, Francisco; FÉLEZ RODRÍGUEZ, Beatriz. Necesidades y propuestas de formación del profesorado novel de la Universidad de Barcelona: profesorado. Revista de Currículum y Formación del Profesorado, Granada, España, v. 5, n. 2, p. 1-24, 2001. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10481/19020>. Acesso em: 30 mar. 2013.
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  • CUNHA, Maria Isabel; ZANCHET, Beatriz Maria. A problemática dos professores iniciantes: tendência e prática investigativa no espaço universitário. Educação, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 189-197, set./dez. 2010.
  • ESTEPA, Paulino; MAYOR, Cristina; HERNÁNDEZ, Elena; SÁNCHEZ, Marita; RODRÍGUEZ, José; ALTOPIEDI, Mariana; JESÚS, Juan. Las necesidades formativas de docentes de los profesores universitarios. Revista Fuentes, Sevilla, España, n. 6, p. 1-22, 2005.
  • HUBERMAN, Michäel. O ciclo de vida profissional dos professores. In: NÓVOA, A. (Org.). Vidas de professores. 2. ed. Porto, Portugal: Porto Ed., 1995. p. 31-61.
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  • MARCELO GARCÍA, Carlos. Formação de professores: para uma mudança educativa. Porto, Portugal: Porto Ed., 1999.
  • ROEGIERS, Xavier; WOUTERS, Pascale; GÉRARD, François-Marie. Du concept d'analyse des besoins en formation à sa mise en oeuvre: formation et technologies. Revue Européenne des Professionnels de la Formation, Thessaloniki, v. 1, n. 2-3, p. 32-42, 1992.
  • 1
    Todas as citações de textos estrangeiros são apresentadas em tradução livre, de minha autoria.
  • 2
    Os docentes foram identificados com números alocados aleatoriamente.
  • 3
    Como cada docente criou uma só imagem, o texto se refere ora à quantidade de imagens, ora à de docentes.
  • 4
    A partir desse ponto, utilizam-se as referências numéricas em frequências absolutas, por se entender que a apresentação em percentuais tornaria o texto confuso, pois se trataria das porcentagens de porcentagens.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2015

Histórico

  • Recebido
    06 Jun 2014
  • Revisado
    10 Nov 2014
  • Aceito
    04 Dez 2014
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