Projeto Saúde Brumadinho: insegurança alimentar e nutricional versus condições socioeconômicas e dimensões do sistema alimentar após desastre

Lopes, Mariana Souza; Freitas, Patrícia Pinheiro de; Nascimento-Souza, Mary Anne; Peixoto, Sérgio Viana; Lopes, Aline Cristine Souza

doi:10.1590/1980-549720220007.supl.2.1

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Revista Brasileira de Epidemiologia

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Sumário

Artigo Original • Rev. bras. Epidemiol. 25 (Supl 2) • 2022 • https://doi.org/10.1590/1980-549720220007.supl.2.1 copiar

Projeto Saúde Brumadinho: insegurança alimentar e nutricional versus condições socioeconômicas e dimensões do sistema alimentar após desastre

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RESUMO

Objetivo:

Descrever a situação de insegurança alimentar das famílias segundo as características socioeconômicas e dimensões do sistema alimentar em Brumadinho, Minas Gerais, Brasil, após desastre.

Métodos:

Estudo descritivo com foco no domicílio realizado pela linha de base do Projeto Saúde Brumadinho. A insegurança alimentar, desfecho principal, foi avaliada pela Escala Brasileira de Insegurança Alimentar curta. Outras variáveis investigadas foram: socioeconômicas; estrato geográfico do domicílio; ativos (bens); renda; despesas familiares; cultivo de alimentos e criação de animais para consumo. Foram realizadas análises descritivas comparando a insegurança alimentar do domicílio segundo as demais variáveis pelo teste χ² para comparação das proporções.

Resultados:

Dos domicílios investigados (n=1.441), 35,1% estavam em situação de insegurança alimentar. As famílias em insegurança alimentar apresentavam: menores prevalências de domicílios de alvenaria com revestimento (91,4%; IC95% 87,7%−94,1% vs. 96,7%; IC95% 94,9%−97,8%); maior proporção de fossa rudimentar (16,9%; IC95% 13,3%−21,2% vs. 9,4%; IC95% 7,4−11,9); menor prevalência de domicílios próprios e quitados (63,9%; IC95% 56,8−70,5 vs. 77,3%; IC95% 72,3−81,7); e redução da renda após o rompimento da barragem (33,0%; IC95% 27,1−39,6 vs. 14,1%; IC95% 11,2−17,6), quando comparadas àquelas em segurança alimentar.

Conclusão:

A prevalência de insegurança alimentar foi elevada, com relato de redução da renda das famílias após o rompimento da barragem. Ademais, boa parte dos domicílios apresentava pior qualidade estrutural e escoamento de esgoto. Esses resultados evidenciam a vulnerabilidade das famílias e possível violação do direito humano à alimentação adequada, denotando a urgência de ações reparadoras contínuas.

Palavras-chave:
Colapso estrutural; Desastres provocados pelo homem; Fatores socioeconômicos; Saúde; Segurança alimentar e nutricional

Variáveis		Total (n=1.441) % (IC95%)	IA (n=499) % (IC95%)	SA (n=942) % (IC95%)	p-valor
Número de pessoas no domicílio; média±desvio padrão		2,7±2,3	2,9±9,4	2,6± 6,3	0,025 ^* * Teste Estatístico t de Student;
Manteve moradia no domicílio após rompimento da barragem		78,1 (74,3–81,5)	77,4 (70,2–83,2)	78,6 (73,5–83,0)	0,774^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott.
Estrato geográfico do domicílio
	Não atingida diretamente	96,2 (96,2–96,2)	96,3 (95,8–96,8)	96,1 (95,8–96,4)	0,078^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott.
	Diretamente atingida	2,4 (2,4–2,4)	2,0 (1,7–2,4)	2,6 (2,4–2,8)
	Região de mineração	1,4 (1,4–1,4)	1,7 (1,3–1,9)	1,3 (1,1–1,4)
Iluminação elétrica		99,3 (98,7–99,7)	99,2 (98,0–99,7)	99,4 (98,3–99,8)	0,615^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott.
Material nas paredes externas do domicílio
	Alvenaria com revestimento	94,9 (93,3–96,1)	91,4 (87,7–94,1)ᵃ	96,7 (94,9–97,8)^b	0,004 ^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott.
	Alvenaria sem revestimento	3,4 (2,5–4,8)	6,2 (4,1–9,4)ᵃ	2,0 (1,1–3,5)^b
	Madeira, palha, taipa não revestida ou outro material	1,7 (1,0–2,7)	2,3 (0,1–5,4)	1,3 (0,1–2,4)
Número de cômodos, média ± desvio padrão		7,0±9,2	6,5±15,5	7,5±12,8	<0,001 ^* * Teste Estatístico t de Student;
Número de banheiros, média ± desvio padrão		1,9±0,4	1,9±0,4	1,4±0,6	<0,001 ^* * Teste Estatístico t de Student;
Local de lançamento do esgoto
	Rede geral de esgoto	50,0 (48,6–51,3)	52,3 (46,9–57,7)	48,4 (45,2–51,7)	0,001 ^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott.
	Fossa séptica	36,5 (34,6–38,5)	29,6 (24,1–35,8)ᵃ	40,5 (37,1–44,0)^b
	Fossa rudimentar	12,0 (10,2–13,7)	16,9 (13,3–21,2)ᵃ	9,4 (7,4–11,9)^b
	Outro (vala ou terreno; direto para rio ou córrego; outros)	1,4 (0,1–2,2)	0,1 (0,0–2,5)	1,6 (0,1–2,7)
Destino do lixo
	Coletado diretamente por serviço de limpeza	95,9 (94,7–96,7)	96,1 (94,0–97,5)	95,7 (94,0–96,9)	0,533^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott.
	Queimado ou enterrado	2,4 (1,6–3,6)	1,9 (0,1–4,0)	2,7 (1,7–4,4)
	Outro	1,7 (1,4–2,0)	1,9 (1,1–3,0)	1,6 (1,0–2,4)

Variáveis			Total (n=1.441) % (IC 95%)^* * Cedida por familiar ou não, ou por empregador;	IA (n=499) % (IC 95%)^* * Cedida por familiar ou não, ou por empregador;	SA (n=942) % (IC 95%)^* * Cedida por familiar ou não, ou por empregador;	p-valor
Ativos
	Situação atual da moradia
		Própria e quitada	72,6 (68,7–76,2)	63,9 (56,8–70,5)ᵃ	77,3 (72,3–81,7)^b	0,005 ^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott; Atual Programa Auxílio Brasil;
		Própria e não quitada	4,8 (2,9–7,7)	4,2 (2,0–8,6)	5,1 (2,6–9,8)
		Alugada	13,9 (11,4–16,8)	17,7 (13,1–23,5)ᵃ	11,7 (9,0–15,2)^b
		Casa de familiar ou amigo, cedida ou outra condição^* * Cedida por familiar ou não, ou por empregador;	8,7 (6,3–11,8)	14,1 (9,0–21,6)ᵃ	05,8 (4,2–8,0)^b
	Situação de moradia antes do rompimento da barragem
		Própria e quitada	77,1 (73,1–80,6)	70,2 (63,7–75,9)ᵃ	80,7 (75,4–85,1)^b	0,024 ^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott; Atual Programa Auxílio Brasil;
		Própria e não quitada	5,1 (3,1–8,2)	4,6 (2,2–9,4)	5,3 (2,7–10,4)
		Alugada	14,6 (12,0–17,6)	19,4 (14,4–25,6)ᵃ	11,9 (9,1–15,4)^b
		Casa de familiar ou amigo, cedida ou outra condição^* * Cedida por familiar ou não, ou por empregador;	3,2 (2,0–5,1)	5,8 (3,2–10,2)ᵃ	2,0 (1,0–3,8)^b
Renda
	Beneficiário do Programa Bolsa Família^‡		6,8 (5,2–8,8)	10,0 (7,0–14,1)	5,1 (3,4–7,7)	0,015 ^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott; Atual Programa Auxílio Brasil;
	Benefício Assistencial de Prestação Continuada		1,6 (0,1–2,8)	1,8 (0,1–3,6)	1,2 (0,0–3,2)	0,465^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott; Atual Programa Auxílio Brasil;
	Renda total do domicílio (em reais); média ± desvio padrão		2.088,00±104,20	1.209,90±105,24	2.607,22±176,02	<0,001 ^§ § Teste estatístico t de Student.
	Renda do domicílio após o rompimento da barragem
		Não sofreu qualquer alteração	39,4 (35,5–43,4)	30,2 (24,5–36,5)ᵃ	44,2 (39,6–48,9)^b	<0,001 ^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott; Atual Programa Auxílio Brasil;
		Aumentou	39,9 (36,1–43,8)	36,8 (30,3–43,8)ᵃ	41,7 (37,3–46,2)^b
		Diminuiu	20,7 (17,9–23,7)	33,0 (27,1–39,6)ᵃ	14,1 (11,2–17,6)^b
	Recebe/recebeu benefícios decorrentes do rompimento da barragem		89,3 (86,8–91,3)	90,5 (86,1–93,6)	88,8 (85,6–91,3)	0,486^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott; Atual Programa Auxílio Brasil;
Despesas
	Despesas do domicílio após o rompimento da barragem
		Não sofreu alteração	27,0 (23,6–30,7)	16,1 (11,9–21,5)ᵃ	32,5 (28,2–37,0)^b	<0,001 ^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott; Atual Programa Auxílio Brasil;
		Aumentou	72,1 (68,4–75,4)	82,3 (76,9–86,8)	66,8 (62,3–71,1)
		Diminuiu	0,1 (0,0–1,8)	1,5 (0,0–4,0)	0,1 (0,0–1,8)
	Despesas com alimentação após o rompimento da barragem
		Não sofreu alteração	6,3 (3,8–10,3)	5,7 (1,7–17,2)	6,7 (4,4–10,2)	0,617^† † Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott; Atual Programa Auxílio Brasil;
		Aumentou	95,5 (88,6–95,2)	92,5 (82,2–97,1)	92,5 (88,9–95,0)
		Diminuiu	1,2 (0,1–2,5)	1,8 (0,0–5,2)	0,1 (0,0–2,3)

Variáveis	Atualmente		p-valor^* * Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott.	Antes do rompimento da barragem		p-valor^* * Teste estatístico de χ2 de Pearson com correção de Rao-Scott.
	IA	SA		IA	SA
	% (IC95%)	% (IC95%)		% (IC95%)	% (IC95%)
Plantio de frutas e/ou hortaliças	98,3 (94,9–99,4)	96,8 (94,4–98,2)	0,327	91,5 (84,5–95,5)	95,9 (93,1–97,6)	0,101
Criação de animais para consumo doméstico (galinha, porco, cabra e bovinos)	90,0 (81,9–95,4)	94,5 (89,0–97,3)	0,299	88,5 (80,2–93,6)	95,5 (91,1–97,8)	0,004

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E-mail: revbrepi@usp.br

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[1] AUTORA CORRESPONDENTE: Aline Cristine Souza Lopes. Avenida Professor Alfredo Balena, 190, Santa Efigenia, CEP: 30130-100, Belo Horizonte (MG), Brasil. E-mail: alinelopesenf@gmail.com