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Tendência da mortalidade por insuficiência cardíaca no Brasil: 1998 a 2019

ABSTRACT

Objetivo:

Analisar a tendência da mortalidade por insuficiência cardíaca (IC) em brasileiros com 50 anos ou mais, em um período de 21 anos.

Métodos:

Estudo ecológico com análise de série temporal da mortalidade por IC no Brasil, segundo regiões e Unidades Federativas (UF), em indivíduos com 50 anos ou mais, no período de 1998 a 2019. Foram incluídos todos os óbitos registrados que tinham por causa básica a IC, codificada na Classificação Internacional de Doenças como I50, no período de 1998 a 2019. Os dados foram obtidos no Sistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde. As análises estatísticas foram realizadas no programa Stata 11.1, por meio do cálculo do coeficiente de mortalidade por IC por 100 mil habitantes. Na análise de tendência, foi utilizada a regressão de Prais-Winsten.

Resultados:

Entre os anos de 1998 a 2019, foram registrados 567.789 óbitos por IC em adultos com idade acima de 50 anos, o que corresponde à taxa média de 75,5 a cada 100 mil habitantes. A tendência foi decrescente por sexo, regiões e em 23 UF. As maiores taxas de mortalidade observadas ocorreram nas idades mais avançadas em todas as regiões do país.

Conclusão:

A tendência das taxas de mortalidade por IC entre as UF e regiões brasileiras foi decrescente ao longo de 21 anos. Houve tendência crescente da mortalidade por IC na região Norte e na categoria outros estabelecimentos de saúde.

Palavras-chave:
Insuficiência cardíaca; Idosos; Estudos de séries temporais; Mortalidade

ABSTRACT

Objective:

To analyze the trend of mortality from heart failure in Brazilians aged 50 years and over, within 21 years.

Methods:

Ecological study with time series analysis of mortality from heart failure in Brazil, according to regions and Federation Units, in individuals aged 50 years or older in the period from 1998 to 2019. Deaths that had heart failure as the underlying cause (coded as I50 according to the International Classification of Diseases) that occurred during the study period were included in the study. Data were obtained from the Mortality Information System of the Brazilian Ministry of Health. Statistical analyses were performed using the Stata 11.1 program, by estimating the mortality rate due to heart failure per 100 thousand inhabitants. In the trend analysis, the Prais-Winsten regression was used.

Results:

Between 1998 and 2019, 567,789 deaths from heart failure were recorded in adults aged over 50 years, which corresponds to an average rate of 75.5 per 100 thousand inhabitants. There was a downward trend per sex, regions, and in 23 Federation Units. The highest mortality rates were observed for older ages in all regions of the country.

Conclusion:

The trend in mortality rates from heart failure among Federation Units and Brazilian regions was downward over 21 years. There was an upward trend in mortality from heart failure in the northern region and in the category “other health facilities.”

Keywords:
Heart failure; Aged; Time series studies; Mortality

INTRODUÇÃO

A insuficiência cardíaca (IC) é uma doença cardiovascular (DCV) em que o coração pode apresentar alterações estruturais ou funcionais que causam a incapacidade do enchimento ventricular e, consequentemente, a ejeção de sangue em quantidade insatisfatória para suprir as necessidades do corpo. Em alguns casos, o débito cardíaco está preservado, porém a ejeção de sangue ocorre com elevadas pressões de enchimento no repouso ou no esforço11. Rohde LE, Montera MW, Bocchi EA, Clausell NO, Albuquerque DC, Rassi S. Diretriz brasileira de insuficiência cardíaca crônica e aguda. Arq Bras Cardiol 2018; 111(3): 436-539. https://doi.org/10.5935/abc.20180190
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.

As DCV estão entre as principais causas de morte no mundo, embora tenha sido observada tendência de redução da incidência e mortalidade em vários países, como Colômbia, países da Europa Ocidental, Estados Unidos e Canadá, bem como no Brasil22. Nichols M, Townsend N, Scarborough P, Rayner M. Cardiovascular disease in Europe 2014: epidemiological update. Euro Heart J 2014; 35(42): 2950-9. https://doi.org/10.1093/eurheartj/ehu299
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,33. Mozaffarian D, Benjamin EJ, Go AS, Arnett DK, Blaha MJ, Cushman M, et al. Heart disease and stroke statistics--2015 update: a report from the American Heart Association. Circulation 2015; 131(4): e29-322. https://doi.org/10.1161/CIR.0000000000000152
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,44. Pérez-Flórez M, Achcar JA. Socioeconomic inequalities in mortality due to cardiovascular diseases: Pacific Region of Colombia, 2002-2015. Cienc Saude Colet 2021; 26(suppl 3): 5201-14. https://doi.org/10.1590/1413-812320212611.3.02562020
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,55. Malta DC, Andrade SSCA, Oliveira TP, Moura L, Prado RR, Souza MFM. Probabilidade de morte prematura por doenças crônicas não transmissíveis, Brasil e regiões, projeções para 2025. Rev Bras Epidemiol 2019; 22: E190030. https://doi.org/10.1590/1980-549720190030
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. A IC é considerada a doença mais prevalente, com estimativa de 23 milhões de pessoas afetadas pela doença66. Freitas AKE, Cirino RHD. Manejo ambulatorial da insuficiência cardíaca crônica. Rev Med UFPR 2017; 4(3): 123-36. http://dx.doi.org/10.5380/rmu.v4i3.56397.g33902
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, e a projeção para 2030 é de aumento de 46%, afetando mais de 8 milhões de pessoas77. Bozkurt B, Khalaf S. Heart failure in women. Methodist Debakey Cardiovasc J 2017; 13(4): 216-23. https://doi.org/10.14797/mdcj-13-4-216
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.

No Brasil, a IC é a principal causa de hospitalização no Sistema Único de Saúde (SUS). Entre os anos de 2008 e 2018, foram contabilizados mais de 2 milhões de internações e mais de 252 mil óbitos. Em 2019, a taxa de mortalidade por DCV foi de 1,74 óbitos por 100 mil habitantes, o que corresponde a 364.132 óbitos. Já a IC ocupou 12,9% das internações, totalizando, em média, 196.271 mil internações, com taxa de mortalidade de 11,48 óbitos por 100 mil habitantes nesse mesmo ano. As elevadas taxas de internação e mortalidade geram gastos para o serviço de saúde que ultrapassam os 3 bilhões de reais88. Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS Tecnologia da Informação a Serviço do SUS. Informações hospitalares do SUS por local de internação – Brasil no período de 2019. [Internet]. 2019 [cited on Aug. 30, 2021]. Available at: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sih/cnv/sxuf.def
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1010. Santos ROS, Santos SCM, Santos GA, Azevedo MLF, Oliveira TPF, Aragão IPB. Insuficiência cardíaca no Brasil: enfoque nas internações hospitalares no período de 2010 a 2019. Rev Saúde 2021; 12 (2): 37-40. https://doi.org/10.21727/rs.v12i2.2496
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.

A faixa etária de maior prevalência de IC é a dos idosos, que comumente apresentam múltiplas morbidades associadas, como hipertensão arterial, diabetes, doença renal e pulmonar crônica, que estão relacionadas ao aumento de risco de IC11. Rohde LE, Montera MW, Bocchi EA, Clausell NO, Albuquerque DC, Rassi S. Diretriz brasileira de insuficiência cardíaca crônica e aguda. Arq Bras Cardiol 2018; 111(3): 436-539. https://doi.org/10.5935/abc.20180190
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. Contudo, apesar de os indivíduos com 60 anos estarem presentes na maioria dos estudos sobre IC, há aumento da doença na faixa etária de 50 anos. Dessa forma, conhecer a magnitude da doença nessa faixa etária permite intervenções e manejos capazes de melhorar o prognóstico e a sobrevida desses indivíduos, principalmente na identificação dos fatores de riscos que são potencializados durante o processo do envelhecimento, que causam modificações nos órgãos e, consequentemente, aumentam a mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis55. Malta DC, Andrade SSCA, Oliveira TP, Moura L, Prado RR, Souza MFM. Probabilidade de morte prematura por doenças crônicas não transmissíveis, Brasil e regiões, projeções para 2025. Rev Bras Epidemiol 2019; 22: E190030. https://doi.org/10.1590/1980-549720190030
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,1111. Mesquita ET, Jorge AJL, Rabelo LM, Souza Jr CV. Understanding hospitalization in patients with heart failure. International Journal of Cardiovascular Sciences 2017; 30(1): 81-90. https://doi.org/10.5935/2359-4802.20160060
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,1212. Testa G, Cacciatore F, Bianco A, Della-Morte D, Mazzella F, Galizia G, et al. Chronic obstructive pulmonary disease and long-term mortality in elderly subjects with chronic heart failure. Aging Clin Exp Res 2017; 29(6): 1157-64. https://doi.org/10.1007/s40520-016-0720-5
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.

Mesmo com avanços no tratamento e manejo da IC, ela ainda é um importante problema de saúde pública por sua alta incidência, pela perda da qualidade de vida dos indivíduos afetados, pelas altas taxas de hospitalização, pela mortalidade e pelos elevados gastos econômicos aos serviços de saúde99. Pereira FAC, Correia DMS. A insuficiência cardíaca em uma cidade brasileira mineira: um panorama epidemiológico de 10 anos. Enferm Foco 2020; 11(2): 139-45. https://doi.org/10.21675/2357-707X.2020.v11.n2.2902
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. Além disso, os dados epidemiológicos de mortalidade por IC apresentam disparidades no país. Dessa forma, o acompanhamento da IC segundo as regiões brasileiras permite subsidiar e intensificar propostas de ações de planejamento de promoção e prevenção à saúde. Assim, o objetivo do estudo foi analisar a tendência de mortalidade por IC no Brasil, segundo regiões e Unidades Federativas (UF), em indivíduos com 50 anos ou mais, em um período de 21 anos.

MÉTODOS

Estudo ecológico com análise de série temporal da mortalidade por IC no Brasil, segundo regiões e UF, em indivíduos com 50 anos ou mais, no período de 1998 a 2019.

Os dados foram obtidos no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde (MS), por meio do Departamento de Informática do SUS (DATASUS). Foram utilizadas estimativas populacionais entre os anos de 1980 e 2012 e a projeção de população de 2000 a 2030, por sexo e faixa etária, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Foram incluídos no estudo todos os óbitos registrados pela causa básica de IC, codificada na Classificação Internacional de Doenças como I50, no período de 1998 a 2019, nos indivíduos de 50 anos ou mais residentes no Brasil. A coleta de dados também foi subdivida em regiões e UF brasileiras.

O Brasil é o maior país da América do Sul, com extensão territorial de 8.540.345,538 km2. É subdividido em cinco regiões (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste) e apresenta 27 UF. Sua projeção populacional, referente à data de 4 de novembro de 2021, é de 213.811.593 habitantes, sendo a maior proporção de pessoas do sexo feminino (51,8%). O Índice de Desenvolvimento Humano é de 0,778, enquanto o índice de Gini é de 0,6401313. Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada. Mato Grosso, Centro-Oeste [Internet]. 2017. [cited on Nov. 10, 2021]. Atlas do Desenvolvimento Humano 2017. Available at: http://atlasbrasil.org.br/perfil/uf/51
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.

As variáveis de interesse do estudo foram: sexo (feminino; masculino); faixa etária (50 a 59 anos; 60 a 69 anos; 70 a 79 anos; 80 anos ou mais); ano de ocorrência (1998 a 2019); local de residência (Brasil; regiões brasileiras; UF); local de ocorrência do óbito (domicílio; hospital; outro estabelecimento de saúde; via pública; outros). A variável outro estabelecimento de saúde faz referência aos Centros de Saúde/Unidade Básica de Saúde (UBS), policlínicas, consultórios, clínicas, Unidade Móvel Terrestre, entre outros.

O banco de dados foi construído em planilha do Microsoft Excel®. Para demonstrar a evolução espaçotemporal, foram calculadas médias móveis da taxa de mortalidade (por 100 mil habitantes) agregadas por UF. Foram construídas dez séries de quatro anos (1998–2001, 2000–2003, 2002–2005, 2004–2007, 2006–2009, 2008–2011, 2010–2013, 2012–2015, 2014–2017, 2016–2019). Para a construção dos mapas temáticos, foi utilizado o software ArcGis versão 10.5, com malha digital em formato shapefile disponibilizada pelo IBGE.

Para o cálculo das taxas de mortalidade por IC, foi montada a seguinte fórmula: o número de óbitos residentes por IC foi o numerador; a população total de residentes foi o denominador; e, ao fim, o resultado foi multiplicado por 100 mil. A taxa de mortalidade foi padronizada por idade pelo método direto, tendo como referência a população padrão mundial da Organização Mundial da Saúde, baseada no Censo de 2010 e em projeções da população mundial para o período 2000–2025. Taxas brutas foram calculadas por macrorregião brasileira e UF. Foram estimadas as proporções de óbitos por causas mal definidas e IC em relação ao total de óbitos (mortalidade geral) no período de 1998 a 2019.

Para calcular a variação percentual anual (VPA) das taxas, na análise de tendência, foi utilizada a regressão de Prais-Winsten1414. Antunes JLF, Cardoso MRA. Uso da análise de séries temporais em estudos epidemiológicos. Epidemiol Serv Saúde 2015; 24(3): 565-76. https://doi.org/10.5123/s1679-49742015000300024
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. A variável dependente foi a taxa de mortalidade por IC, enquanto a variável independente correspondeu aos anos da série histórica. A estimação quantitativa da tendência é calculada pela seguinte expressão: VAP=[–1+10b]*100%. Quando a taxa é positiva, a série temporal é considerada crescente; quando negativa, é classificada como decrescente; e é tida como estacionária quando não há diferença significativa entre seu valor e zero (p>0,05)1414. Antunes JLF, Cardoso MRA. Uso da análise de séries temporais em estudos epidemiológicos. Epidemiol Serv Saúde 2015; 24(3): 565-76. https://doi.org/10.5123/s1679-49742015000300024
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. Essa análise foi realizada por meio do software Stata 11.1.

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Júlio Müller (Certificado de Apresentação para Apreciação Ética — CAAE: 41330620.1.0000.5541), sob parecer no 4.513.048.

RESULTADOS

Entre os anos de 1998 e 2019, foram registrados 567.789 óbitos por IC em adultos com idade acima de 50 anos. No período, a taxa média foi de 75,5 óbitos por 100 mil habitantes, e a maior proporção foi do sexo feminino (n=299.093; 52,67%).

Nas regiões brasileiras, a maior taxa de mortalidade foi constatada na região Sul (86,93 óbitos/100.000 habitantes), com a maior proporção de óbitos na região Sudeste (n=266.916; 47,01%). Ambas, porém, apresentaram tendência decrescente (VPA: -4,83; intervalo de confiança — IC95% -5,28–-4,37/VPA -3,98; IC95% -4,80–-3,16, respectivamente), assim como as regiões Norte (VPA -3,16; IC95% -3,45–-2,88) e Centro-Oeste (VPA -5,81; IC95% -6,43–-5,17). Já a região Nordeste teve tendência crescente (VPA 2,67; IC95% 3,39–1,96). As regiões Norte e Nordeste exibiram as menores taxas de mortalidade nos últimos anos, com 62,12 e 69,51 óbitos/100 mil habitantes, respectivamente (Tabela 1). Nessas regiões, as proporções por causas mal definidas apresentaram os maiores valores, porém com redução ao longo dos anos (VPA -91,88; IC95% -96,59–-80,70; VPA -96,87; IC95% -99,54–-78,83), respectivamente (Material Suplementar).

Tabela 1.
Número, porcentagem de óbitos, taxa média por 100 mil habitantes e tendência de mortalidade por insuficiência cardíaca, segundo Unidade da Federação. Brasil, 1998 a 2019.

Na Figura 1, foi calculada a distribuição espacial das taxas anuais médias da mortalidade por IC entre as UF. As maiores taxas de mortalidade relacionadas à IC foram observadas no período de 1998 a 2007, em que a maioria das UF obteve taxas entre 75,0 e 150,0 óbitos/100 mil habitantes, com suavização ao longo dos anos de estudo. Nos quatro primeiros triênios, Paraná, Mato Grosso, Distrito Federal, Goiás, Minais Gerais e Tocantins apresentaram altas taxas de mortalidade (100,0 a 150,0 óbitos/100 mil habitantes). Ao longo dos anos, essas taxas demonstraram redução, variando entre 25,0 e 75,0 óbitos/100 mil habitantes (Figura 1).

Figura 1.
Distribuição espacial das médias móveis das taxas de mortalidade por insuficiência cardíaca entre brasileiros acima de 50 anos de idade. Brasil, 1998–2019.

Entre as 27 UF, as maiores taxas de mortalidade por IC, no período estudado, foram no Paraná (98,13 óbitos/100 mil habitantes), Goiás (93,22 óbitos/100 mil habitantes) e Minas Gerais (89,9 óbitos/100 mil habitantes). A tendência foi estacionária em Roraima (VPA 1,22; IC95% -2,44–5,02), no Piauí (VPA -2,02; IC95% -4,38–0,39), Paraíba (VPA -0,69; IC95% -2,80–1,47) e no Maranhão (VPA -100; IC95% -0,96–0,97). Os demais estados apresentaram tendência decrescente (Tabela 1).

A tendência da mortalidade por IC foi decrescente entre os sexos ao longo dos anos analisados. No sexo masculino, as maiores taxas de mortalidade foram observadas nas regiões Centro-Oeste e Sul do país. Entretanto, houve redução da taxa ao longo dos anos na região Centro-Oeste. Com relação ao sexo feminino, as menores taxas foram verificadas nas regiões Norte e Nordeste, sendo de 54,76 e 63,22 óbitos/100 mil habitantes, respectivamente (Figura 2a).

Figura 2.
Taxa de mortalidade por insuficiência cardíaca segundo sexo e faixa etária, por regiões. Brasil, 1998 a 2019.

A taxa de mortalidade por IC, por faixa etária, aumentou com o avançar da idade em todas as regiões brasileiras, com maior ocorrência nos indivíduos com 80 anos ou mais (n=257.277; 45,31%). A tendência da ocorrência de IC ao longo dos anos foi decrescente em todas as faixas etárias analisadas (50 a 59 anos: VPA -4,94; IC95% -5,38–-4,49; 60 a 69 anos: VPA -4,87; IC95% -5,65–-4,10; 70 a 79 anos: VPA -4,68; IC95% -5,14–-4,21; 80 anos e mais: VPA -2,68; IC95% -3,08–-2,29) (Figura 2b).

Com relação ao local de ocorrência, a maior proporção de óbitos por IC foi no hospital (n=406.771; 71,64%). Apenas para outros estabelecimentos de saúde (VPA 7,60; IC95% 3,92–11,42), a tendência foi crescente (Tabela 2).

Tabela 2.
Tendência da mortalidade proporcional da insuficiência cardíaca, por local de ocorrência, por regiões brasileiras. Brasil, 1998 a 2019.

DISCUSSÃO

Este estudo analisou a tendência de mortalidade por IC no Brasil apresentando um panorama espacial das taxas de mortalidade em todas as UF e regiões do país, de 1998 a 2019. As análises mostraram que a tendência de mortalidade por IC em indivíduos brasileiros com mais de 50 anos foi decrescente ao longo de 21 anos, e essa tendência também ocorreu em ambos os sexos e em 23 UF. Esses resultados podem estar associados a ações de prevenção, ao controle das comorbidades associadas à IC, ao avanço do tratamento medicamentoso, à maior adesão ao tratamento e sua continuidade, assim como à mudança do estilo de vida11. Rohde LE, Montera MW, Bocchi EA, Clausell NO, Albuquerque DC, Rassi S. Diretriz brasileira de insuficiência cardíaca crônica e aguda. Arq Bras Cardiol 2018; 111(3): 436-539. https://doi.org/10.5935/abc.20180190
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,1515. Ziaeian B, Fonarow GC. Epidemiology and aetiology of heart failure. Nat Rev Cardiol 2016; 13(6): 368-78. https://doi.org/10.1038/nrcardio.2016.25
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Poucos dados epidemiológicos da IC são conhecidos, especialmente em países de média renda, como o Brasil. Contudo é de conhecimento na literatura científica que, em países desenvolvidos, há estabilização e redução da incidência da mortalidade por IC11. Rohde LE, Montera MW, Bocchi EA, Clausell NO, Albuquerque DC, Rassi S. Diretriz brasileira de insuficiência cardíaca crônica e aguda. Arq Bras Cardiol 2018; 111(3): 436-539. https://doi.org/10.5935/abc.20180190
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,1515. Ziaeian B, Fonarow GC. Epidemiology and aetiology of heart failure. Nat Rev Cardiol 2016; 13(6): 368-78. https://doi.org/10.1038/nrcardio.2016.25
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.

Apesar das diferenças metodológicas, outro estudo realizado no Brasil, no período de 2008 a 2015, apresentou declínio significativo, de 10,7%, na taxa de mortalidade por IC1616. Fernandes ADF, Fernandes GC, Mazza MR, Knijnik LM, Fernandes GS, Vilela AT, et al. Insuficiência cardíaca no Brasil subdesenvolvido: análise de tendência de dez anos. Arq Bras Cardiol 2020; 114(2): 222-31. https://doi.org/10.36660/abc.20180321
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. A pesquisa conduzida por Santos et al.1717. Santos SC, Vilela PB, Oliveira GMM. Mortalidade por insuficiência cardíaca e desenvolvimento socioeconômico no Brasil, 1980 a 2018. Arq Bras Cardiol 2021; 117(5): 944-51. https://doi.org/10.36660/abc.20200902
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, apesar de não apresentar uma análise de variação percentual anual, verificou a redução das taxas de mortalidade por IC no Brasil, progressivamente, de 2008 até 2018. Outros países que exibiram tendência decrescente ao longo dos anos foram Argentina, Espanha e Estados Unidos1818. Ciapponi A, Alcaraz A, Calderón M, Matta MG, Chaparro M, Soto N, et al. Burden of heart failure in Latin America: a systematic review and meta-analysis. Rev Esp Cardiol (Engl Ed) 2016; 69(11): 1051-60. https://doi.org/10.1016/j.rec.2016.04.054
https://doi.org/10.1016/j.rec.2016.04.05...
,1919. Go AS, Mozaffarian D, Roger VL, Benjamin EJ, Berry JD, Blaha MJ, et al. Heart disease and stroke statistics--2014 update: a report from the American Heart Association. Circulation 2014; 129(3): e28-292. https://doi.org/10.1161/01.cir.0000441139.02102.80
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,2020. Méndez-Bailón M, Jiménez-García R, Hernández-Barrera V, Comín-Colet J, Esteban-Hernández J, Miguel-Díez J, et al. Significant and constant increase in hospitalization due to heart failure in Spain over 15 year period. Eur J Intern Med 2019; 64: 48-56. https://doi.org/10.1016/j.ejim.2019.02.019
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.

Dessa forma, o desenvolvimento do país ao longo dos anos pode ter contribuído para a redução da mortalidade por IC, e os fatores associados são a implementação de políticas públicas, a ampliação das redes de saúde, a ampliação da cobertura da Atenção Primária de Saúde (APS) e a facilidade de acesso a esses serviços, bem como o crescimento socioeconômico e a diminuição da desigualdade social1717. Santos SC, Vilela PB, Oliveira GMM. Mortalidade por insuficiência cardíaca e desenvolvimento socioeconômico no Brasil, 1980 a 2018. Arq Bras Cardiol 2021; 117(5): 944-51. https://doi.org/10.36660/abc.20200902
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. Entre 2000 e 2016, houve a expansão das APS por meio da Estratégia Saúde da Família (ESF) e o aumento de repasses financeiros destinados à atenção básica, ambos considerados as principais iniciativas do país, que contribuíram significativamente para a redução da internação por IC2121. Albuquerque MV, Viana ALA, Lima LD, Ferreira MP, Fusaro ER, Iozzi FL. Desigualdades regionais na saúde: mudanças observadas no Brasil de 2000 a 2016. Ciênc Saúde Colet 2017; 22(4): 1055-64. https://doi.org/10.1590/1413-81232017224.26862016
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,2222. Albuquerque NLS, Oliveira FJG, Machado LD, Araújo TL, Caetano JÁ, Aquino PS. Determinantes sociais em saúde e internações por insuficiência cardíaca no Brasil. Rev Esc Enferm USP 2020; 54: e03641. https://doi.org/10.1590/S1980-220X2019002503641
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.

Outro fator que pode ter impactado essa redução é o plano de enfrentamento global das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), incluindo a DCV, do qual o Brasil faz parte e que tem como meta principal a redução, até 2030, da mortalidade precoce em 2% ao ano, principalmente em indivíduos menores de 70 anos de idade2323. Brasil. Ministério da Saúde. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas e agravos não transmissíveis no Brasil 2021-2030. Brasília: Ministério da Saúde; 2021.. Além disso, a diretriz de IC embasada em evidências científicas atuais propõe diagnósticos, tratamentos e intervenções terapêuticas inovadoras e mais eficazes, que têm impacto positivo na prática clínica, nos dados epidemiológicos, além de subsidiar informações para a elaboração de micropolíticas nas diversas esferas de saúde e regiões do país2424. Marcondes-Braga FG, Moura LAZ, Issa VS, Vieira JL, Rohde LE, Simões MV, et al. Atualização de tópicos emergentes da Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca – 2021. Arq Brasil Cardiol 2021; 116(6): 1174-212. https://doi.org/10.36660/abc.20210367
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No que se refere às regiões, o Sudeste teve a maior ocorrência de mortalidade por IC, assim como descrito em outros estudos2525. Souza Júnior EV, Silva Filho BF, Nunes GA, Rosa RS, Boery RNSO, Boery EN. Perfil epidemiológico da morbimortalidade por insuficiência cardíaca no Brasil entre 2013 a 2017. Enfermería Actual Costa Rica 2020; 39: 156-69. http://dx.doi.org/10.15517/revenf.v0i39.41155
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,2626. Gheno J, Linch GFC, Paz AA, Weis AH. Morbimortalidade hospitalar de idosos com insuficiência cardíaca conforme as regiões brasileiras. Rev Enferm UFPE on-line 2021; 15: e245366. https://doi.org/10.5205/1981-8963.2021.245366
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. Essa região é caracterizada, em sua maior parte, pela população idosa. Além disso, apresenta o maior número de hospitais e disponibilidade de acesso a serviços especializados2727. Kaufman R, Azevedo VMP, Xavier RMA, Gelle M, Chaves RBM, Castier MB. Evolution of heart failure-related hospital admissions and mortality rates: a 12-year analysis. Int J Cardiovasc Sci 2015; 28(4): 276-81., o que permite um diagnóstico mais preciso nos atestados de óbito. É importante considerar que a classificação da causa do óbito pode ser prejudicada em regiões menos favorecidas com serviços especializados, o que acarreta risco maior de erro na identificação da causa básica do óbito.

Entre 23 UF, a tendência da taxa de mortalidade por IC foi decrescente. Estudo realizado na Paraíba mostrou que, entre os anos de 2008 e 2017, houve redução de 2,5%1616. Fernandes ADF, Fernandes GC, Mazza MR, Knijnik LM, Fernandes GS, Vilela AT, et al. Insuficiência cardíaca no Brasil subdesenvolvido: análise de tendência de dez anos. Arq Bras Cardiol 2020; 114(2): 222-31. https://doi.org/10.36660/abc.20180321
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, e, em São Paulo, quando comparadas as taxas dos anos de 1992–1993 com as de 2008–2009, revelou-se diminuição de 29%2828. Godoy HL, Silveira JA, Segalla E, Almeida DR. Hospitalization and mortality rates for heart failure in public hospitals in São Paulo. Arq Brasil Cardiol 2011; 97(5): 402-7. https://doi.org/10.1590/s0066-782x2011005000096
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. As disparidades encontradas entre as UF e regiões brasileiras podem ter relação com características culturais, demográficas e socioeconômicas, com as diversidades da etiologia da doença e com a implementação de políticas voltadas à IC, assim como indicar a fragilidade das notificações/subnotificação dos casos, do acesso aos serviços de saúde e de sua distribuição2929. Albuquerque DC, Souza Neto JD, Bacal F, Rohde LEP, Bernardez-Pereira S, Berwanger O, et al. I registro brasileiro de insuficiência cardíaca – aspectos clínicos, qualidade assistencial e desfechos hospitalares. Arq Bras Cardiol 2015; 104(6): 433-42. https://doi.org/10.5935/abc.20150031
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,3030. Timóteo AT. Heart failure trends in Paraíba: earlier diagnosis or better treatment? - That is one of the questions. Arq Bras Cardiol 2020; 114(2): 232-3. https://doi.org/10.36660/abc.20190898
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.

Apesar dessas fragilidades, observa-se a tendência de redução das mortes por IC, bem como por causas mal definidas, indicando melhoria qualitativa das estatísticas de mortalidade. No entanto, as regiões Norte e Nordeste mantêm elevados índices, comprometendo, assim, as análises da mortalidade segundo as causas de morte.

As maiores taxas de mortalidade ocorreram no sexo masculino, enquanto a maior proporção de óbitos foi entre indivíduos do sexo feminino, assim como em outro estudo, que obteve achado semelhante1818. Ciapponi A, Alcaraz A, Calderón M, Matta MG, Chaparro M, Soto N, et al. Burden of heart failure in Latin America: a systematic review and meta-analysis. Rev Esp Cardiol (Engl Ed) 2016; 69(11): 1051-60. https://doi.org/10.1016/j.rec.2016.04.054
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. O aumento da taxa na população masculina pode estar relacionado à maior vulnerabilidade às doenças crônicas, ao pior prognóstico da doença, bem como à falta do hábito de frequentar os serviços de saúde por parte dessa população3131. Nascimento WO, Santos AMR, Ribeiro IP, Oliveira ADS. Perfil do idoso com insuficiência cardíaca internado em um hospital de urgência. Cogitare Enferm 2016; 21(4): 1-10. http://dx.doi.org/10.5380/ce.v21i4.47084
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Entre as faixas etárias, a tendência de mortalidade foi decrescente. No entanto, as maiores taxas de mortalidade ocorreram em indivíduos com 80 anos ou mais. A mortalidade nessas pessoas é homogênea em todas as regiões do País. Apesar das diferenças socioeconômicas e culturais, tal resultado mostra que a população tem tido acesso mais amplo aos serviços de saúde especializados, o que contribui para a maior sobrevida desses indivíduos. Consequentemente, as taxas elevadas de mortalidade são deslocadas para as idades mais avançadas1515. Ziaeian B, Fonarow GC. Epidemiology and aetiology of heart failure. Nat Rev Cardiol 2016; 13(6): 368-78. https://doi.org/10.1038/nrcardio.2016.25
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,3232. Gouveia MRA, Ascenção RMSS, Fiorentino F, Costa JNMPG, Broeiro-Gonçalves PM, Fonseca MCFG, et al. Os custos da insuficiência cardíaca em Portugal e a sua evolução previsível com o envelhecimento da população. Revista Portuguesa de Cardiologia 2020; 39(1): 3-11. https://doi.org/10.1016/j.repc.2019.09.006
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.

Esses dados tendem a aumentar com o envelhecimento populacional no Brasil, que reforça a necessidade de políticas públicas que contemplem essa população e lhe proporcionem maior qualidade de vida e a manutenção de sua capacidade funcional3333. Silva MMBS, Marinho CS, Sampaio ES, Silva RS, Pires CGS, Fraga ÉN. Qualidade de vida de idosos com insuficiência cardíaca. Ciencia y Enfermeira 2021; 27: 8. https://doi.org/10.29393/CE27-8QVMM60008
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. Além disso, as altas taxas de morbidade e mortalidade por IC nos idosos decorrem de fatores físicos e psíquicos2929. Albuquerque DC, Souza Neto JD, Bacal F, Rohde LEP, Bernardez-Pereira S, Berwanger O, et al. I registro brasileiro de insuficiência cardíaca – aspectos clínicos, qualidade assistencial e desfechos hospitalares. Arq Bras Cardiol 2015; 104(6): 433-42. https://doi.org/10.5935/abc.20150031
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. Neles, o cenário clínico é complexo, com a presença de múltiplos sinais e sintomas associados a outras comorbidades1111. Mesquita ET, Jorge AJL, Rabelo LM, Souza Jr CV. Understanding hospitalization in patients with heart failure. International Journal of Cardiovascular Sciences 2017; 30(1): 81-90. https://doi.org/10.5935/2359-4802.20160060
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. A fadiga e a dispneia são os principais sintomas que podem repercutir na realização de atividades da vida diária e social desses indivíduos. Além dos comprometimentos físicos, pacientes com IC podem apresentar sintomas depressivos que diminuem sua capacidade para o autocuidado, levando à baixa adesão ao tratamento da doença e à piora do quadro clínico geral, fatores que aumentam o risco de internações recorrentes3434. Freedland KE, Carney RM, Rich MW, Steinmeyer BC, Rubin EH. Cognitive behavior therapy for depression and self-care in heart failure patients: a randomized clinical trial. JAMA Intern Med 2015; 175(11): 1773-82. https://doi.org/10.1001/jamainternmed.2015.5220
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,3535. Tinoco JMVP, Souza BPS, Oliveira, SX, Oliveira JA, Mesquita ET, Cavalcanti ACD. Association between depressive symptoms and quality of life in outpatients and inpatients with heart failure. Rev Esc Enferm USP 2021; 55: e03686. https://doi.org/10.1590/S1980-220X2019030903686
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.

Com relação ao local de ocorrência dos óbitos, as maiores taxas foram encontradas no âmbito hospitalar. Os pacientes com IC apresentam complicações em decorrência das comorbidades associadas e da evolução crônica da doença, que geram internações recorrentes1717. Santos SC, Vilela PB, Oliveira GMM. Mortalidade por insuficiência cardíaca e desenvolvimento socioeconômico no Brasil, 1980 a 2018. Arq Bras Cardiol 2021; 117(5): 944-51. https://doi.org/10.36660/abc.20200902
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. Além disso, em muitas situações, o indivíduo com IC é internado somente em condições clínicas graves, pela dificuldade de acesso aos serviços de saúde especializados ou, até mesmo, pela indisponibilidade de leitos hospitalares3636. Dourado MB, Oliveira FS, Gama GGG. Perfis clínico e epidemiológico de idosos com insuficiência cardíaca. Rev Enferm UFPE on line 2019; 13(2): 408-15. https://doi.org/10.5205/1981-8963-v13i02a236661p408-415-2019
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Neste estudo, todavia, foi possível constatar uma tendência crescente de ocorrências de óbitos por IC na categoria outros estabelecimentos de saúde, o que mostra que os indivíduos com IC podem ter sido encaminhados para serviços de saúde menos complexos, e o óbito ter ocorrido em razão do manejo e da assistência inadequados. Além disso, tal resultado pode ser atribuído ao fortalecimento e à expansão da APS, assim como à articulação dos serviços de urgência, que ampliam as respostas de abordagem da IC nos diversos níveis de saúde3737. Malta DC, Oliveira TP, Santos MAS, Andrade SSCA, Silva MMA. Avanços do plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis no Brasil, 2011-2015. Epidemiol Serv Saúde 2016; 25(2): 373-90. http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742016000200016
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Na literatura, existe uma lacuna de estudos sobre mortalidade por IC nesses serviços de saúde, razão pela qual há necessidade de realização de pesquisas que visem identificar os fatores contribuintes para esse aumento e apontar especificamente qual o estabelecimento de saúde em questão, pois no SIM não há separação nesta categoria, que inclui Centros de Saúde/UBS, policlínicas, consultórios, clínicas, Unidade Móvel Terrestre, entre outros.

Embora este estudo apresente limitações relacionadas aos aspectos próprios das pesquisas realizadas com bases de dados secundários, como erro de classificação do óbito e informações apresentadas de forma agregada (a exemplo da categoria outros estabelecimentos de saúde), os resultados obtidos são relevantes, pois possibilitaram a visualização das áreas geográficas de maior taxa de mortalidade por IC nas regiões brasileiras, no período de 21 anos. Nesse sentido, os achados da presente investigação demonstram a relevância da temática enquanto problema de saúde pública, principalmente na faixa etária estudada (idosos), sendo necessária a elaboração de políticas de saúde que considerem aspectos nacionais e regionais. Além disso, é importante haver pesquisas futuras para a identificação de fatores que contribuem para o decréscimo da mortalidade por IC, permitindo a intensificação do cuidado com esses pacientes, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida.

Concluímos que a tendência das taxas de mortalidade por IC em adultos com 50 anos ou mais entre as UF e regiões brasileiras foi decrescente ao longo de 21 anos. Existe uma variação importante entre as UF, contudo a faixa etária de 80 anos ou mais foi a que apresentou maiores taxas de mortalidade. Além disso, houve tendência crescente da mortalidade por IC na categoria outros estabelecimentos de saúde.

Com os resultados obtidos, o estudo permitiu traçar o diagnóstico situacional da mortalidade por IC no Brasil e levantar a importância do desenvolvimento de pesquisas que subsidiem estratégias e promovam políticas públicas as quais visem a melhorias no processo de envelhecimento com qualidade e a melhores condições de saúde para essa população.

  • Fonte de financiamento: nenhuma.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    08 Abr 2022
  • Revisado
    20 Jun 2022
  • Aceito
    20 Jun 2022
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