Open-access Artrite reumatoide: perfil de pacientes e sobrecarga de cuidadores

Resumo

Objetivo:  Descrever o perfil de pacientes com Artrite Reumatoide (AR) e seus cuidadores, atendidos no Ambulatório de Reumatologia de um hospital de ensino, e avaliar sobrecarga dos cuidadores.

Método:  Estudo transversal com 41 pacientes e seus cuidadores, utilizando-se questionário de identificação com variáveis clínico-demográficas; Escala de Sobrecarga do Cuidador de Zarith e Health Assessment Questionnaire. Realizaram-se análises descritivas, comparação entre variáveis clínico-demográficas e estado funcional dos pacientes, correlação entre variáveis sociodemográficas e níveis de sobrecarga dos cuidadores.

Resultados:  Prevalência de pacientes do sexo feminino (87,8%); média de idade de 64,4 anos (±12,9); tempo médio de diagnóstico da AR de 13,5 anos (±8,5); predomínio de deficiência moderada (39,0%); menor deficiência no domínio Higiene (1,6;±0,5) e maior deficiência nos domínios Outras atividades do dia a dia (2,1;±0,6), Alcance (2,0;±0,7) e Pegada (2,0;±0,7). Os cuidadores eram mulheres (73,2%); faixa etária entre 17 e 81 anos (média: 46,8; ±15,1); ensino médio completo (41,4%); grau de parentesco: 56,2% filhos e 36,6% cônjuges. Dezoito (44,0%) cuidadores apresentaram sobrecarga, sendo 9 (22,0%) com sobrecarga ligeira e 9 (22,0%) com sobrecarga intensa. Maior incidência de sobrecarga intensa entre cônjuges (12,2%) e sobrecarga ligeira entre filhos (12,2%).

Conclusão:  A baixa ocorrência de sobrecarga entre cuidadores pode estar relacionada ao perfil dos doentes, que apresentaram bons níveis de independência para o autocuidado. O perfil dos cuidadores e prevalência de cônjuges e filhos com sobrecarga evidencia a necessidade e a importância de os profissionais do serviço implementarem ações de capacitação dos cuidadores, para melhorar a assistência aos pacientes com AR.

Palavras-chave: Doença Crônica; Assistência ao Paciente; Assistência Individualizada de Saúde; Avaliação em Saúde

Abstract

Objective:  to describe the profile of patients with Rheumatoid Arthritis (RA) and their caregivers receiving care at the Rheumatology Outpatient Clinic of a teaching hospital, and evaluate the burden of the caregivers.

Method:  a cross-sectional study was performed with 41 patients with RA and their caregivers using a questionnaire to identify sociodemographic variables; the Burden Interview Scale and the Stanford Health Assessment Questionnaire. Descriptive analyzes and comparison between clinical-demographic variables and the functional status of patients were performed and the correlation between sociodemographic variables and levels of burden of caregivers was tested.

Results:  there was a prevalence of female patients (87.8%); a mean age of 64.4 years (±12.9); a mean time for the diagnosis of RA of 13.5 years (±8.5), a prevalence of moderate disability (39.0%); lower disability in the Hygiene domain (1.6; ±0.5) and greater disability in the Other Activities of Daily Life (2.1; ±0.6), Reach (2.0; ±0.7) and Grip (2.0; ±0.7) domains. The caregivers were women (73.2%); aged between 17 and 81 years (mean: 46.8; ±15.1); with a high school education (41.4%). The degree of kinship was 56.2% offspring and 36.6% spouses. Eighteen (44.0%) caregivers suffered burden, nine (22.0%) of whom had mild burden and nine (22.0%) of whom suffered intense burden. There was a higher incidence of intense burden among spouses (12.2%) and mild burden among children (12.2%).

Conclusion:  the low occurrence of burden among caregivers may be related to the profile of the patients, who presented good levels of independence for self-care. The profile of caregivers and the prevalence of overburdened spouses and offspring shows the need and importance of the implementation of caregiver training by health service professionals to improve care for RA patients.

Keywords: Chronic Disease; Patient Care; Personal Health Services; Health Evaluation

INTRODUÇÃO

Com o envelhecimento populacional, é frequente o aumento da prevalência de doenças osteoarticulares, como a osteoartrose, a artrite reumatoide e a osteoporose. Essas doenças causam dor e restrição de movimento, manifestações que podem causar limitação na realização de atividades diárias, pela atrofia muscular, diminuição da capacidade aeróbia, da força muscular e do equilíbrio, impactando negativamente na vida dos idosos1,2.

Artrite Reumatoide (AR) é uma doença inflamatória sistêmica, crônica e degenerativa, caracterizada principalmente pelo comprometimento da membrana sinovial das articulações periféricas. Atinge aproximadamente 0,5 a 1% da população mundial, com taxa de incidência de 2 a 3 vezes maior em mulheres acima de 40 anos3. A doença caracteriza-se pelo acometimento simétrico de pequenas e grandes articulações, envolve com maior frequência mãos e pés e tem significativo impacto sobre a capacidade funcional e independência do paciente. As deformidades físicas e a dor prejudicam a realização de atividades profissionais, sociais e de vida diária, afetando a qualidade de vida, a saúde mental e aumentando os riscos de mudanças negativas nos parâmetros psicológicos4. Além disso, a fadiga, um sintoma subjetivo de baixa vitalidade (cansaço, exaustão, fraqueza, indisposição), acompanhado de redução da capacidade física e mental, está presente em 88 a 98% dos pacientes5.

O tratamento da AR tem como principais objetivos reduzir a dor, o edema articular e sintomas constitucionais, como a fadiga. Visa, também, melhorar a função articular, interromper a progressão do dano ósseo-cartilaginoso, prevenir incapacidades e reduzir a morbimortalidade associados à AR4.

A educação do paciente com doença crônica e de seus familiares é parte importante do tratamento. Está associada à melhora na compreensão da doença e aumento na adesão ao tratamento. Assim, é papel dos profissionais da saúde apoiar o paciente e seus familiares, promovendo educação em saúde. Habitualmente, o cuidador de pacientes com doenças crônicas é um familiar inexperiente, que assume a tarefa de cuidar do paciente, responsável por prover ou coordenar os recursos requeridos pelo indivíduo doente, que apresenta dependência, associada a incapacidades funcionais temporárias ou definitivas. Esses cuidadores são considerados “pacientes ocultos” e merecem cuidados dos profissionais da saúde, uma vez que seu comportamento tem impacto sobre o tratamento do paciente6.

Segundo a Política Nacional de Saúde do Idoso, os cuidados podem ser fornecidos num sistema formal ou informal. Cuidadores formais são pessoas pagas para prestar cuidados, com formação para exercer tal tarefa. Já os cuidadores informais são familiares, amigos ou vizinhos que proporcionam apoio e cuidados voluntários aos que necessitam7.

As atividades do cuidador dependem do estado funcional do paciente, do número e duração das tarefas que necessitam de supervisão e do seu envolvimento emocional com o paciente. O tempo gasto, o tipo de tarefas realizadas e a dedicação ao paciente podem interromper ou reduzir atividades de lazer, aumentar o nível de estresse e impor elevada sobrecarga física. A tarefa de cuidar tem, portanto, importante impacto fisiológico, social, econômico e psicológico sobre a pessoa do cuidador, especialmente quando se trata de cuidadores informais6.

O familiar que se torna um cuidador, frequentemente despreparado para exercer esse papel, sem conhecimento ou suporte adequados, sofre prejuízos em sua qualidade de vida, comprometendo o cuidado prestado ao doente. Ao praticar as atividades associadas ao cuidar, o cuidador limita sua própria vida, favorecendo o aparecimento da sobrecarga8.

Ante o exposto, este estudo objetivou descrever o perfil de pacientes com AR, atendidos no Ambulatório de Reumatologia de um hospital de ensino, descrever o perfil, avaliar a sobrecarga dos cuidadores destes pacientes e verificar se há associação entre sobrecarga do cuidador com o seu perfil e do paciente.

MÉTODO

Estudo transversal e observacional, com amostra de conveniência, não probabilística, entre pacientes com Artrite Reumatoide e seus cuidadores, atendidos no Ambulatório de Reumatologia do Hospital de Base de São José do Rio Preto, às sextas-feiras, entre os meses de agosto/2013 e abril/2014.

Foram incluídos no estudo os pacientes com AR, segundo os critérios da American College of Rheumatology (ACR), que estavam acompanhados de seus cuidadores ou familiares e faziam tratamento há pelo menos seis meses devido a doença. Foram excluídos do estudo os que compareceram sozinhos para a consulta.

Os dados foram coletados durante o atendimento ambulatorial, após a consulta médica, realizada durante o período do estudo. Os instrumentos foram aplicados por um dos pesquisadores, que entrevistou os pacientes e cuidadores em uma sala reservada para essa finalidade.

Para a caracterização dos pacientes com AR e seus cuidadores, foi utilizado um instrumento elaborado pelos autores, contando as variáveis: idade, sexo, escolaridade e tempo da doença.

O estado funcional dos pacientes com AR foi avaliado utilizando-se a versão em português do Health Assessment Questionnaire (HAQ), validada por Ferraz et al9. É composto por 20 perguntas que avaliam oito domínios: vestir-se, acordar, alimentar-se, andar, higiene, alcance, pegada e outras atividades do dia a dia. Para cada pergunta, tendo como referência a última semana, o paciente indica o grau de dificuldade encontrado para realizar a tarefa, em uma escala Likert de 0 a 3, onde 0 é nenhuma dificuldade, 1 é com alguma dificuldade, 2 com muita dificuldade e 3 é incapaz de realizar. O resultado final é a média aritmética do maior escore de cada um dos oito domínios avaliados. O grau de deficiência classifica-se em: deficiência leve (HAQ de 0 a 1), deficiência moderada (HAQ > 1 a 2) e deficiência grave (HAQ >2 a 3)9-11.

A sobrecarga dos cuidadores foi avaliada com a Escala de Sobrecarga de Cuidadores de Zarit, validada para a língua portuguesa12. Esse questionário é composto por 22 perguntas englobando as áreas de saúde, vida social e pessoal, situação financeira, bem-estar emocional e relacionamento interpessoal, e pode ser utilizada para avaliar a sobrecarga dos cuidadores de indivíduos com incapacidades física e mental. Para classificação dos níveis de sobrecarga, foram considerados os seguintes pontos de corte: sem sobrecarga (<46), sobrecarga ligeira (47 - 55), sobrecarga intensa (>56)12-15.

Na análise dos dados foi utilizada estatística descritiva para caracterização da amostra de pacientes e cuidadores. Os dados do Health Assessment Questionnaire e da Escala de Sobrecarga de Cuidadores de Zarit foram pontuados de acordo com as normas de adaptação dos instrumentos para o português10-13 e analisados em termos de parâmetros descritivos.

A distribuição dos dados foi analisada pelo teste de Shapiro-Wilk (p<0,05) e a comparação entre variáveis clínico-demográficas e o estado funcional dos pacientes foi realizada pelo teste qui-quadrado. Para a análise da correlação entre variáveis sociodemográficas e níveis de sobrecarga dos cuidadores utilizou-se o Teste de Correlação de Pearson. Considerou-se significante valor-p menor ou igual a 0,05.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição, com Parecer número 300.634, de 11 de junho de 2013, atendendo as exigências formais para pesquisas envolvendo seres humanos, conti das na Resolução n. 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde e na Declaração de Helsinque. A coleta ocorreu após a leitura e a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelos participantes do estudo.

RESULTADOS

Participaram do estudo 41 pacientes com Artrite Reumatoide, com idade entre 27 e 81 anos, sendo a média de idade de 64,4 anos (±12,9). Houve prevalência de pacientes do sexo feminino (87,8%). O tempo de diagnóstico da doença variou de dois a 33 anos, com média de 13,5 anos (±8,5) e predomínio de deficiência moderada (39,0%). Em relação ao estado funcional, os pacientes com AR apresentaram menor deficiência no domínio Higiene (1,6;±0,5) e maior deficiência nos domínios Outras atividades do dia a dia (2,1;±0,6), Alcance (2,0;±0,7) e Pegada (2,0;±0,7), conforme mostra a Tabela 1.

Tabela 1
Caracterização dos pacientes com Artrite Reumatoide. São José do Rio Preto, São Paulo, 2013-2014.

Em relação ao estado funcional, os resultados mostraram que os pacientes com AR exigiam maior auxílio dos cuidadores para realizar serviços domésticos (25,6%), andar (15,4%), ir a uma consulta médica (10,3%), tomar banho (10,3%) e realizar todas as atividades (10,3%). Além disso, observaram-se comprometimentos de atividades diárias, como ir ao banheiro (5,1%), vestir-se (5,1%) e alimentar-se (5,1%), limitando a autonomia e a privacidade dos pacientes, conforme mostra a Tabela 2.

Tabela 2
Distribuição das atividades que os pacientes com Artrite Reumatoide requerem mais auxílio do cuidador, segundo o Health Assessment Questionnaire. São José do Rio Preto, São Paulo, 2013-2014.

Houve correlação estatisticamente significativa entre o sexo dos pacientes e o grau de deficiência (r=0,4621; p=0,0356). Contudo, não houve correlação significante entre faixa etária do paciente e o grau de deficiência (r=0,02869; p=0,8587); tempo da doença e o grau de deficiência (r=-0,05175; p=0,7479).

A Tabela 3 apresenta a caracterização dos cuidadores. Observou-se que a maioria dos cuidadores era do sexo feminino (73,2%), na faixa etária de 41 a 60 anos (43,9%), com 9 a 11 anos de estudo (46,3%) e tinham algum parentesco com o paciente, sendo 56,2% filhos e 36,6% cônjuges. A idade dos cuidadores variou de 17 a 81 anos, com média de 46,8 anos (±15,1).

Tabela 3
Caracterização dos cuidadores dos pacientes com Artrite Reumatoide. São José do Rio Preto, 2013-2014.

A Escala de Sobrecarga do Cuidador mostrou que 18 (44,0%) cuidadores apresentaram algum grau de sobrecarga, sendo que 9 (22,0%) tinham sobrecarga ligeira e 9 (22,0%) estavam com sobrecarga intensa. Observou-se maior incidência de sobrecarga intensa entre os esposos(as) e sobrecarga ligerira entre os filhos(as), conforme mostra a Tabela 4.

Tabela 4
Distribuição dos níveis de sobrecarga dos cuidadores dos pacientes com Artrite Reumatoide, segundo o grau de parentesco. São José do Rio Preto, 2013-2014.

Não houve diferença estatisticamente significante entre níveis de sobrecarga e o grau de parentesco (filhos e cônjuges) dos cuidadores (x2=0,8761; p=0,6453); tempo da doença e o grau de sobrecarga (r=-0,02400; p=0,8816); grau de dependência do paciente e o nível de sobrecarga do cuidador (r=0,1506; p=0,3472).

Por outro lado, encontrou-se significância na correlação entre idade do paciente e sobrecarga do cuidador (r=0,3487, p=0,0254).

DISCUSSÃO

O perfil dos pacientes com AR avaliados neste estudo - prevalência do sexo feminino e faixa etária de 40 a 60 anos - é condizente com a literatura, que aponta que a doença acomete, principalmente, mulheres acima dos 40 anos3,16. Esse perfil gera significativo impacto social, pois, ao acometer pessoas em idade produtiva, a AR causa limitações que levam ao afastamento das atividades laborais que, podem atingir mais de 60% dos pacientes, após 15 anos da doença17.

Corroborando a literatura, as atividades que os pacientes com AR deste estudo requeriam mais auxílio do cuidador foram as atividades domésticas (25,6%). Essa é uma característica associada ao sexo dos pacientes, a maioria do sexo feminino, que desempenham serviços domésticos, papel culturalmente atribuído às mulheres18.

Destaca-se, ainda, que a perda da capacidade funcional do paciente com AR, ao longo da vida, é influenciada não apenas pela idade ou pelo tempo da doença, mas também pelos níveis de dor e pelas medicações em uso19.

Assim, é importante que a equipe multiprofissional implemente ações de orientação e atenção à saúde destes pacientes, que melhorem a função articular, interrompendo a progressão do dano ósseo-cartilaginoso, prevenindo incapacidades e reduzindo o impacto causado pela AR4. Neste contexto, recomenda-se que os profissionais orientem os pacientes com AR sobre o uso de proteção articular, uma vez que as atividades domésticas exigem movimentos de flexão das articulações metacarpofalangeanas, aumentando as forças desviantes e favorecendo o desvio ulnar20.

As ações de educação em saúde devem focar a melhoria da compreensão da doença pelo paciente e seus familiares, e o aumento na adesão ao tratamento, buscando amenizar os sintomas da doença, como a dor, o edema articular e sintomas constitucionais, como a fadiga do paciente.

Portanto, os cuidadores dos pacientes com AR têm uma grande importância para o tratamento da doença e requerem atenção da equipe de saúde, pois sua participação na atenção à saúde do doente terá impacto na recuperação da doença6.

Os cuidadores dos pacientes com AR avaliados neste estudo apresentam perfil compatível com o relatado na literatura, ou seja, mulheres, com vínculo familiar, adultas jovens e sem nível superior. Estudos mostram que as mulheres são as principais cuidadoras de pessoas mais dependentes e vulneráveis, como os doentes crônicos. No contexto ocidental, cuidar é obrigação da mulher e ser cuidadora é naturalmente intrínseco ao sexo feminino. Assim, as mulheres tornam-se responsáveis pelos cuidados prestados ao marido, aos filhos, pais e demais familiares6,21.

A prevalência de cuidadores familiares é descrita por outros estudos6,22,23. O cuidar está relacionado à intimidade familiar, ligado por laços de reciprocidade e solidariedade, como uma forma de proteção natural pelos membros da família21. Assim, é comum que o cuidado seja prestado por um sistema informal, incluindo familiares, amigos, vizinhos e membros da comunidade, sem remuneração23. Entre os motivos que levam um indivíduo a exercer o papel de cuidador destacam-se: a obrigação moral, os aspectos culturais e religiosos, situação conjugal e ausência de outra pessoa que possa assumir os cuidados22.

Os membros da família são considerados os principais provedores e coordenadores de recursos requeridos pelos pacientes com doenças crônicas, que exigem intensa dedicação dos cuidadores, devido à evolução e longa duração da doença6,22. O cuidado prestado pelos filhos é atribuído a questões socioculturais e considerado um processo natural, como retribuição ao cuidado recebido dos pais na infância23. Há, assim, uma inversão de papéis entre uma geração e outra, e os cuidadores veem essa situação como um ato de obrigação24.

Entre os cônjuges, é comum encontrarmos um idoso cuidando de um outro idoso mais dependente. Esta situação requer atenção redobrada dos profissionais de saúde, pois os cuidadores idosos apresentam, naturalmente, perdas funcionais que afetam sua potencialidade global, nos aspectos físicos, psicológicos, financeiros e na sua qualidade de vida, comprometendo sua capacidade para assistir o doente25.

Além disso, pessoas mais velhas consideram a família seu habitat natural, importante em todas as fases da vida de uma pessoa. A família, portanto, é quem melhor cuida do idoso26.

Diversos fatores inerentes ao cuidado aos pacientes com AR podem causar sobrecarga nos cuidadores, sejam estes formais ou informais. Essa sobrecarga pode ser objetiva, quando abrange as tarefas cotidianas de prestação de cuidados ao paciente, perdas financeiras, desestruturação da rotina, vida social e profissional; ou subjetiva, quando relacionada aos sentimentos, emoções e preocupações com o paciente27.

Embora a maiorida dos cuidadores avalidos neste estudo não tenha apresentado sobrecarga, sentimentos negativos podem ocorrer na relação de atenção às necessidades do doente com AR. Assumir a posição de cuidador implica mudanças na rotina e uma reestruturação na organização de tarefas, aumentando a carga de trabalho e, consequentemente, sobrecarregando o cuidador28.

O cuidado pode gerar estresse na dinâmica familiar, provocando complicações físicas, mentais e emocionais no cuidador, limitando sua saúde e qualidade de vida24.

Estudo com cuidadores de pacientes crônicos mostrou que, quanto mais o doente necessita de cuidados ou se sente sozinho, mais distante o cuidador fica de seus familiares e amigos, perdendo oportunidades de lazer e convívio social. Portanto, conviver e cuidar de um familiar com alguma enfermidade é uma tarefa árdua e, dependendo do diagnóstico, é vivido como uma crise na família, gerando ansiedade, estresse, medo e sofrimento22.

Aspectos como os sintomas e o grau de autonomia do paciente, o tratamento realizado, o relacionamento entre o paciente e o cuidador familiar, podem agravar a situação de sobrecarga, dificultando a assistência ao doente29. Por outro lado, maior escolaridade contribui para redução da sobrecarga, pois cuidadores com maior grau de instrução possuem melhor entendimento das orientações fornecidas pela equipe de saúde e realizam os cuidados com maior facilidade23.

Os resultados deste estudo mostraram associação significante entre a idade do paciente e o nível de sobrecarga do cuidador. Isso pode estar associado à duração da AR que, por ser uma doença crônica, exige longo período de dedicação do cuidador, favorecendo a sobrecarga, especialmente no caso de cuidadores familiares, que podem apresentar maior dificuldade em cuidador do outro.

Embora outras associações não tenham sido observadas neste estudo, a literatura aponta a idade como um fator de agravo à saúde mental do cuidador. Há evidencias de menores índices de estresse entre indivíduos com idade mais avançada, sugerindo que, com o passar do tempo, as pessoas criam estratégias de enfrentamento mais adequadas. No entanto, alguns estudos apontam que cuidadores jovens apresentam perda do convívio com amigos, aumentando os níveis de estresse e potencializando o risco de impacto social nessa população6,29,30.

Fatores moderadores, como apoio social, situação financeira e estratégias de enfrentamento utilizadas têm importante impacto na saúde mental dos cuidadores, podendo compromete-la ou poupá-la. Estudo com cuidadores de idosos aponta que a participação em grupos semanais de cuidadores contribuiu para a redução da depressão e, como consequência, houve melhoria na qualidade do cuidado prestado, gerando mudanças positivas no comportamento dos idosos e na qualidade de vida31.

Para Pedreira e Oliveira32, famílias com melhor estrutura econômica e emocional, tendem a reagir de maneira mais adequada na relação com o indivíduo dependente. Os autores destacam que a sobrecarga pode variar de acordo com a cognição e o comportamento do idoso, a relação familiar entre o cuidador e idoso, e o apoio de que dispõem.

Este estudo apresenta como limitações a escassez de pesquisas com cuidadores de pacientes com AR em seus aspectos emocionais, sociais ou ocupacionais; e o fato de os pacientes e cuidadores avaliados pertencerem a uma única instituição de saúde. Embora se trate de um serviço de referência regional, a realização de novos estudos, abrangendo outros serviços de saúde permitirá conhecer melhor o perfil de pacientes com AR e seus cuidadores, e aprofundar o entendimento e a discussão sobre os fatores que causam sobrecarga nesses cuidadores.

CONCLUSÕES

O perfil dos pacientes com AR observado neste estudo (mulheres, idade média de 64,4 anos, tempo médio de diagnóstico de 13,5 anos, predomínio de deficiência moderada, menor deficiência no domínio Higiene e maior deficiência nos domínios Outras atividades do dia a dia, Alcance e Pegada) e de seus cuidadores (mulheres, idade média de 46,8 anos, ensino médio completo, filhos ou cônjuges e sem sobrecarga) é semelhante ao relatado na literatura.

O fato de a maioria dos cuidadores deste estudo não apresentarem sobrecarga pode estar relacionado ao perfil dos doentes que apresentaram bons níveis de independência para o autocuidado.

A prevalência de cônjuges e filhos entre os cuidadores com sobrecarga fortalece a tese de que o cuidado está relacionado à intimidade familiar, construído por traços de reciprocidade e solidariedade.

A identificação do perfil e dos níveis de perda funcional dos pacientes com AR, em acompanhamento ambulatorial, e os níveis de sobrecarga de seus cuidadores contribui para os profissionais de saúde adequarem as ações assistenciais, buscando atenuar os sintomas e o comprometimento causado pela AR, melhorando as condições clínicas e a qualidade de vida dos doentes.

Além disso, permite a implementação de ações de suporte emocional e ocupacional, capazes de atender as demandas apresentadas pelos cuidadores, minimizar os efeitos da sobrecarga e melhorar a saúde e a qualidade de vida dos cuidadores.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2018

Histórico

  • Recebido
    08 Jul 2017
  • Revisado
    26 Dez 2017
  • Aceito
    12 Jan 2018
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