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Efeitos do tamoxifeno e dos estrogênios conjugados no epitélio mamário de ratas em estro permanente

Effects of tamoxifen and conjugated estrogens on the mammary epithelium of rats in persistent estrus

Resumos

Objetivo: avaliar as alterações morfológicas e morfométricas produzidas pelo tamoxifeno e pelos estrogênios conjugados no epitélio mamário de ratas em estro permanente. Métodos: foram utilizadas 33 ratas adultas, induzidas a estro permanente com 1,25 mg de propionato de testosterona e divididas ao acaso em três grupos: GI -- que receberam apenas água, servindo como controle (n = 12); GII -- tratadas com 500 mig de tamoxifeno diariamente (n = 10); GIII -- tratadas com 30 mig de estrogênios conjugados ao dia (n = 11). O primeiro par mamário abdômino-inguinal dos animais foi extirpado e processado para estudo morfológico e morfométrico. Os dados foram analisados estatisticamente pela análise de variância por postos de Kruskal-Wallis (p < 0,05). Resultados: o estudo morfológico revelou sinais de atrofia epitelial e o estudo morfométrico exibiu redução estatisticamente significante do número médio de ductos e alvéolos nos grupos II (10,1 e 1,9, respectivamente) e III (11,1 e 3,5, respectivamente) em relação ao grupo I (25,0 e 6,6, respectivamente). Não houve diferença estatística entre os grupos II e III. Conclusões: os resultados deste estudo indicam que tanto o tamoxifeno como os estrogênios conjugados, nas doses e no tempo utilizado, produziram atrofia no epitélio mamário de ratas em estro permanente.

Mama normal; Terapia de reposição hormonal; Antiestrogênios


Purpose: to evaluate the morphologic and morphometric alterations produced by tamoxifen and conjugated estrogens in the mammary epithelium of rats in persistent estrus. Methods: thirty-three adult female rats in persistent estrus induced with 1.25 mg testosterone propionate were divided at random into three groups: GI -- which received only water, control group (n = 12); GII -- treated with 500 mug tamoxifen daily (n = 10); GIII -- treated with 30 mug conjugated estrogens per day (n = 11). The first inguinal-abdominal pair of mammary glands of the animals was extirpated and processed for morphologic and morphometric study. Data were analyzed statistically by the Kruskal-Wallis rank analysis of variance (p < 0.05). Results: the morphologic study revealed signs of epithelial atrophy and the morphometric study showed a statistically significant reduction in the mean number of ducts and alveoli in groups II (10.1 and 1.9, respectively) and III (11.1 and 3.5, respectively) compared to group I (25.0 and 6.6, respectively). There was no significant difference between groups II and III. Conclusions: the results of this study indicate that tamoxifen as well as conjugated estrogens at the tested doses produced mammary epithelial atrophy in rats in persistent estrus.

Normal breast; Hormonal replacement therapy; Antiestrogens


Trabalhos Originais

Efeitos do Tamoxifeno e dos Estrogênios Conjugados no Epitélio Mamário de Ratas em Estro Permanente

Effects of Tamoxifen and Conjugated Estrogens on the Mammary Epithelium of Rats in Persistent Estrus

Benedito Borges da Silva, Luiz Henrique Gebrim, Manuel de Jesus Simões, Edmund Chada Baracat, Geraldo Rodrigues de Lima

RESUMO

Objetivo: avaliar as alterações morfológicas e morfométricas produzidas pelo tamoxifeno e pelos estrogênios conjugados no epitélio mamário de ratas em estro permanente.

Métodos: foram utilizadas 33 ratas adultas, induzidas a estro permanente com 1,25 mg de propionato de testosterona e divididas ao acaso em três grupos: GI ¾ que receberam apenas água, servindo como controle (n = 12); GII ¾ tratadas com 500 mg de tamoxifeno diariamente (n = 10); GIII ¾ tratadas com 30 mg de estrogênios conjugados ao dia (n = 11). O primeiro par mamário abdômino-inguinal dos animais foi extirpado e processado para estudo morfológico e morfométrico. Os dados foram analisados estatisticamente pela análise de variância por postos de Kruskal-Wallis (p < 0,05).

Resultados: o estudo morfológico revelou sinais de atrofia epitelial e o estudo morfométrico exibiu redução estatisticamente significante do número médio de ductos e alvéolos nos grupos II (10,1 e 1,9, respectivamente) e III (11,1 e 3,5, respectivamente) em relação ao grupo I (25,0 e 6,6, respectivamente). Não houve diferença estatística entre os grupos II e III.

Conclusões: os resultados deste estudo indicam que tanto o tamoxifeno como os estrogênios conjugados, nas doses e no tempo utilizado, produziram atrofia no epitélio mamário de ratas em estro permanente.

PALAVRAS-CHAVE: Mama normal. Terapia de reposição hormonal. Antiestrogênios.

Introdução

Há muitas controvérsias a respeito dos efeitos dos estrogênios conjugados e do tamoxifeno na mama normal. A comprovação de uma ação antiestrogênica poderia ser útil para a redução da atividade proliferativa da mama de pacientes em uso de terapêutica de reposição hormonal.

Os estrogênios conjugados representam uma combinação complexa de sulfato esteróides, extraídos da urina de éguas prenhes1. Apesar de seu largo uso clínico, por mais de 50 anos, a literatura carece de estudos sobre seus efeitos tanto na mama humana normal quanto na mama de animais de laboratório. Alguns estudos epidemiológicos não evidenciaram aumento no risco de câncer de mama quando foram usados estrogênios conjugados na dose de 0,625 mg ao dia e por longos períodos2, ao passo que outros têm mostrado, até mesmo, uma redução. Isto nos levaria a questionar se os estrogênios conjugados agiriam de maneira diferente daquela do estradiol ou se teriam alguma ação similar à do tamoxifeno.

O tamoxifeno pode ter um efeito estrogênico parcial ou total ou antiestrogênico a depender do tecido alvo e da espécie em estudo3,4. A droga mostrou-se eficiente em inibir o desenvolvimento de tumores mamários de ratas, normalmente induzidos por carcinogênios como o dimetilbenzantraceno5. Também inibiu completamente os efeitos do benzoato de estradiol no crescimento dos ductos mamários de ratas adultas castradas6. Assim, poderíamos supor que um epitélio mamário sob estimulação estrogênica contínua, como o de ratas em estro permanente, seria útil para o estudo dos efeitos antiestrogênicos do tamoxifeno e de algum efeito similar dos estrogênios conjugados.

Contudo, pouco se conhece sobre os efeitos do tamoxifeno e dos estrogênios, conjugados em um epitélio mamário normal sob constante estimulação estrogênica. O presente trabalho tem por objetivo comparar os aspectos morfológicos e morfométricos do epitélio mamário de ratas em estro permanente, tratadas com tamoxifeno e com estrogênios conjugados.

Material e Métodos

Foram utilizadas 33 ratas adultas virgens (Rattus novergicus albinus) em estro permanente obtido pela injeção subcutânea de 1,25 mg de propionato de testosterona no segundo dia de vida7. O estro permanente foi confirmado por colpocitologia hormonal, realizada por duas semanas, a partir dos 70 dias de vida. Os animais foram então divididos ao acaso em três grupos: grupo I, controle (n = 12), que receberam apenas 1 ml de água destilada diariamente por 30 dias; grupo II (n = 10), que receberam 500 mg de tamoxifeno diários diluídos em água destilada e administrados por gavagem durante 30 dias, e grupo III (n = 11) que receberam 30 mg de estrogênios conjugados, administrados da mesma maneira e por igual período de tempo.

No 31odia, os animais foram sacrificados para remoção do primeiro par mamário abdômino-inguinal, que foi fixado em Bouin por 72 h, sendo então processado e corado pelo método de H-E para estudo em microscopia óptico. Para análise morfométrica referente à contagem de ductos e alvéolos foram utilizados princípios de estereologia de acordo com Weibel e Gomez8, que preconizam a contagem somente dos pontos do retículo que interceptam a estrutura estudada. Para tal, utilizou-se ocular KPL 10X, da Zeiss, com retículo de integração (Integrationplate I) contendo 25 pontos, acoplados a microscópio óptico com aumento de 100 vezes. Para cada lâmina, foram estudados 10 campos aleatórios pelo sistema de varredura horizontal, num total de 250 pontos. Os dados foram analisados estatisticamente pelo teste da análise da variância por postos de Kruskal-Wallis (p < 0,05).

Resultados

O estudo morfológico do grupo controle revelou lóbulos exibindo grande concentração de alvéolos revestidos por células cúbicas, dilatados e contendo secreção eosinofílica. Os ductos, por sua vez, encontravam-se em maior concentração que os alvéolos e, à semelhança destes, dilatados e contendo material eosinofílico (Figura 1). Os grupos II (tamoxifeno) e III (estrogênios conjugados) exibiram menor concentração de ductos e alvéolos, pouco desenvolvidos e com secreção escassa ou ausente (Figuras 2 e 3).




A análise dos dados morfométricos mostra uma redução significante do número médio de ductos dos grupos II e III, 10,1 e 11,2, respectivamente, em relação ao grupo controle, 25,0 (Tabela 1). Da mesma maneira, constatou-se uma redução significante do número médio de alvéolos dos grupos II e III, 1,9 e 3,5, respectivamente, em relação ao grupo controle, 6,6 (Tabela 2).

Discussão

A terapêutica de reposição hormonal encontra-se cercada de muitas controvérsias pela possibilidade de aumentar o risco para câncer de mama, principalmente em pacientes de alto risco. Há também a possibilidade de se fazer quimioprevenção do câncer de mama com tamoxifeno em pacientes de alto risco, porém não se chegou a um consenso sobre a relação entre o uso de tamoxifeno e estrogênios conjugados e o risco de câncer de mama9. Além do mais, por razões de natureza ética, torna-se difícil estudar os efeitos destas drogas no epitélio mamário humano normal.

Na presente investigação utilizamos ratas em estro permanente com o intuito de estudar os efeitos do tamoxifeno e dos estrogênios conjugados na mama destes animais. As drogas foram diluídas com água destilada e administradas por via oral à semelhança da via comumente utilizada pelas mulheres. As doses empregadas podem parecer altas para alguns autores ou mesmo baixas para outros, pois há dificuldades de se estabelecer equivalência de doses entre as diversas espécies em face das diferenças principalmente na absorção e no metabolismo das drogas.

De Gregorio et al.10, após estudos em ratos sobre vias de administração e equivalência de doses, postularam que 1.000 mg ao dia de tamoxifeno, por via subcutânea, resultariam em níveis similares aos das mulheres usando 20 mg da droga ao dia. Portanto, o dobro da dose empregada nesse estudo (500 mg) e por via oral. No que se refere aos estrogênios conjugados, Orimo et al.11 empregaram 25 mg e 100 mg ao dia, por via oral, com objetivo de prevenir osteoporose induzida em ratos, obtendo o efeito desejado com a dose de 100 mg. Com dose inferior a esta, 30 mg diários, embora cerca de cinco a 10 vezes a dose equivalente comumente usada na reposição hormonal, observamos efeitos na mama de ratas em estro permanente.

A glândula mamária das ratas em estro permanente (controle) exibiu grande concentração de ductos e alvéolos, que se encontravam dilatados e contendo secreção. Estes achados poderiam sobrevir do contínuo influxo de estrogênios e da maior liberação de prolactina e estão de acordo com aqueles relatados por Jacobsohn e Norgren12.

A atrofia mamária produzida pelo tamoxifeno poderia advir de sua ação antiestrogênica por meio da inibição na molécula do receptor de estrogênio da função de ativação da transcrição gênica 2, predominante na mama13. Uma outra hipótese seria a supressão pelo tamoxifeno de algum gene tal como o gene CD36, envolvido na angiogênese, demonstrada tanto em tecido mamário humano normal quanto em neoplásico14. Já a ação regressiva produzida pelos estrogênios conjugados é intrigante, pois trata-se de um epitélio proliferado que recebeu mais estímulo estrogênico. Uma das hipóteses que poderia ser aventada para explicação do fenômeno seria a sua complexa constituição, pois é formado por mais de 10 sulfato esteróides e pelo menos um deles (equilenina ou 17-hidroxiequilenina) pode bloquear os efeitos do estradiol no epitélio mamário de maneira similar ao tamoxifeno15.

Assim, o presente estudo mostra que tanto o tamoxifeno como os estrogênios conjugados nas doses testadas produziram atrofia no epitélio mamário de ratas em estro permanente. Contudo, não sabemos se tais resultados podem ser extrapolados para a espécie humana, o que requer mais estudos.

SUMMARY

Purpose: to evaluate the morphologic and morphometric alterations produced by tamoxifen and conjugated estrogens in the mammary epithelium of rats in persistent estrus.

Methods: thirty-three adult female rats in persistent estrus induced with 1.25 mg testosterone propionate were divided at random into three groups: GI ¾ which received only water, control group (n = 12); GII ¾ treated with 500 mg tamoxifen daily (n = 10); GIII ¾ treated with 30 mg conjugated estrogens per day (n = 11). The first inguinal-abdominal pair of mammary glands of the animals was extirpated and processed for morphologic and morphometric study. Data were analyzed statistically by the Kruskal-Wallis rank analysis of variance (p < 0.05).

Results: the morphologic study revealed signs of epithelial atrophy and the morphometric study showed a statistically significant reduction in the mean number of ducts and alveoli in groups II (10.1 and 1.9, respectively) and III (11.1 and 3.5, respectively) compared to group I (25.0 and 6.6, respectively). There was no significant difference between groups II and III.

Conclusions: the results of this study indicate that tamoxifen as well as conjugated estrogens at the tested doses produced mammary epithelial atrophy in rats in persistent estrus.

KEY WORDS: Normal breast. Hormonal replacement therapy. Antiestrogens.

Referências

Disciplina de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina

Correspondência: Benedito Borges da Silva

Rua Wilson Soares, 95 - Bairro São Cristóvão

64052-310 ¾ Teresina ¾ PI

Telefone: (86) 232 5063

Fax: (86) 223 2170

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Out 2005
  • Data do Fascículo
    Fev 2000
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