Open-access Intelectuais, democratização e combate à pobreza no Brasil contemporâneo

Resumos

O texto aborda o tema da participação de intelectuais em projetos e programas de inclusão social no Brasil contemporâneo e toma como objeto de análise a trajetória político-intelectual de Herbert de Souza, o Betinho, e Carlos Alberto Libânio Christo, Frei Betto. Depois de examinar as formulações dos autores em torno dos problemas relativos ao elitismo das esquerdas brasileiras, volta-se para a análise da atuação de Betinho à frente da "Ação da Cidadania contra a fome, a miséria e pela vida", e de Frei Betto como um dos dirigentes do "Fome Zero".

intelectuais; esquerdas; democratização


This paper addresses the issue of the participation of intellectuals in social inclusion projects and programs in contemporary Brazil and analyzes the political and intellectual trajectory of Herbert de Souza (Betinho), and Carlos Alberto Libânio Christo (Frei Betto). After examining these authors' writings about problems related to the elitism of the Brazilian left, the paper turns to the analysis of Betinho's performance directing the project 'Action of Citizenship Against Hunger, Misery and for Life,' and Frei Betto's as one of the leaders of 'Zero Hunger.'

intellectuals; left; democratization


DOSSIÊ: HISTÓRIA E DEMANDAS SOCIAIS

Intelectuais, democratização e combate à pobreza no Brasil contemporâneo

Intellectuals, democratization and the fight against poverty in contemporary Brazil

Américo Oscar Guichard Freire

Programa de Pós-Graduação em História, Política e Bens Culturais do CPDOC/FGV e da Escola de Ciências Sociais e História da FGV. Pesquisador do CNPq. Praia de Botafogo, 190, sala 1409. 22250-900 Rio de Janeiro – RJ – Brasil. americo.freire@fgv.br

RESUMO

O texto aborda o tema da participação de intelectuais em projetos e programas de inclusão social no Brasil contemporâneo e toma como objeto de análise a trajetória político-intelectual de Herbert de Souza, o Betinho, e Carlos Alberto Libânio Christo, Frei Betto. Depois de examinar as formulações dos autores em torno dos problemas relativos ao elitismo das esquerdas brasileiras, volta-se para a análise da atuação de Betinho à frente da "Ação da Cidadania contra a fome, a miséria e pela vida", e de Frei Betto como um dos dirigentes do "Fome Zero".

Palavras-chave: intelectuais; esquerdas; democratização.

ABSTRACT

This paper addresses the issue of the participation of intellectuals in social inclusion projects and programs in contemporary Brazil and analyzes the political and intellectual trajectory of Herbert de Souza (Betinho), and Carlos Alberto Libânio Christo (Frei Betto). After examining these authors' writings about problems related to the elitism of the Brazilian left, the paper turns to the analysis of Betinho's performance directing the project 'Action of Citizenship Against Hunger, Misery and for Life,' and Frei Betto's as one of the leaders of 'Zero Hunger.'

Keywords: intellectuals; left; democratization.

Este texto gira em torno de dois intelectuais e de duas proposições. Os intelectuais são Herbert de Souza, o Betinho, e Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto. Ambos mineiros, de ascendência católica, marcharam juntos no início da militância política nos primeiros anos da década de 1960, para depois se separarem física e politicamente nas décadas seguintes, em particular nos anos que se seguiram à crise e ao fim do regime militar. Nas últimas décadas do século passado, tornaram-se figuras-chave da intelectualidade brasileira, ocupando amplos espaços nos meios de comunicação, vindo a atuar não só como ideólogos submetidos à ética das convicções, mas também no contato direto junto às populações na formulação de políticas de cunho prático, sob a ética da responsabilidade. 1

O exame do itinerário 2 cruzado desses dois 'intelectuais públicos', 3 além de nos ajudar a situar e a melhor compreender alguns aspectos relativos aos desafios enfrentados pelas esquerdas brasileiras nos anos 1980 e 1990, nos sugere, também, novas perspectivas analíticas em torno das condições políticas que permitiram a construção de políticas públicas de amplo espectro voltadas para o combate à fome e à miséria no país, e que contaram com a presença e a liderança de Betinho e Frei Betto em épocas e posições diferentes. Na década de 1990, enquanto Betinho se posiciona equidistante dos partidos políticos, voltando-se fundamentalmente para coordenar movimentos junto à sociedade civil, como na campanha "Ação da Cidadania contra a fome, a miséria e pela vida", e atuando somente de forma subsidiária em conselhos governamentais, Frei Betto, ao lado de seu trabalho pastoral junto a movimentos sociais, manteve-se como simpatizante explícito e confesso do Partido dos Trabalhadores (PT) e das sucessivas candidaturas de Luís Inácio Lula da Silva à Presidência da República. Em 2003, optou por aceitar o convite do então presidente Lula para compor o núcleo dirigente responsável por levar adiante o "Fome Zero", aquele que deveria ser o mais importante programa social do governo. Em fins do ano seguinte, decepcionado com o que considerou ser o desvirtuamento do programa, pediu demissão para não mais voltar a assumir cargos públicos.

O texto está dividido em três seções. Na primeira, acompanhamos alguns momentos importantes da trajetória dos dois personagens: o ingresso na vida política, a luta contra a ditadura, a guerrilha, a prisão de Frei Betto e o exílio de Betinho. Na seguinte, o foco recai nas formulações de ambos acerca de como viram a derrota e o fracasso da luta armada no país. Betinho lida com essas questões ainda no exílio, quando troca intensa correspondência com vários dos seus antigos companheiros, entre os quais seu 'xará' Betto. Já Frei Betto mergulha de alma e coração na práxis da Teologia da Libertação, tornando-se um dos seus principais divulgadores. Em seus escritos, enfrenta o desafio de refletir sobre as complexas relações entre cristianismo e marxismo.

Na última seção examino a maneira pela qual ambos vivenciaram a experiência de estar à frente de movimentos e programas voltados para o combate à fome e à miséria. Para não me perder no vasto manancial de fontes existente sobre essa problemática – composto por inúmeros estudos acadêmicos, material de propaganda governamental, depoimentos diversos etc. –, optei por concentrar minha pesquisa em escritos e entrevistas dos próprios autores, em que eles explicitam as razões pelas quais viam como mister construir uma agenda de combate à fome e à miséria no país. Para ambos, essa agenda deveria ser necessariamente articulada a procedimentos e práticas políticas que assegurassem o protagonismo e a autonomia dos movimentos sociais frente ao Estado.

Caminho sem volta

Durante décadas, a história das esquerdas brasileiras confundiu-se com a do Partido Comunista do Brasil, depois designado Partido Comunista Brasileiro (PCB). Principal polo de convergência da 'família política' comunista, 4 o chamado 'partidão' superou bem tanto as dissensões e os embates no campo das esquerdas com trotskistas e/ou socialistas de diferentes matizes, como a repressão em maior ou menor escala dos governos civis durante a "Era Democrática" (1945-1964). Agremiação de cariz marxista revolucionária e laica, criada na década de 1920, teve na experiência soviética sua principal referência política. Na passagem dos anos 1950 para os 1960, mesmo atuando na semiclandestinidade, o PCB reuniu condições para exercer um papel importante na organização dos movimentos sindical e popular em prol de mudanças estruturais no país, ora disputando, ora estabelecendo alianças com outras forças de esquerda, fossem os trabalhistas/nacionalistas, fossem os cristãos de esquerda. Ao longo das duas décadas de ditadura militar (1964-1985), o PCB propugnou pela formação de uma frente política democrática composta por liberais e pelas esquerdas com vistas a combater o regime ditatorial, mantendo uma posição crítica às teses de organizações de extrema-esquerda que então defendiam a luta armada. Nas décadas de 1980 e 1990, já em tempos democráticos, o PCB terminaria por sucumbir às disputas internas e ao quadro externo amplamente desfavorável.

O trabalhismo é outra 'família' de forte tradição na vida política brasileira. Fruto de uma operação política liderada pelo presidente Vargas (1930-1945 e 1951-1954) junto a lideranças sindicais e a políticos profissionais no sentido de criar uma agremiação que respondesse pela herança social do seu governo, o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), o qual, com o tempo, veio a se constituir no principal eixo de luta de amplas parcelas da sociedade em prol de um projeto nacional-estatista, no qual os fundamentos eram a defesa da soberania nacional contra a ação imperialista; do distributivismo; e da garantia dos direitos sociais dos trabalhadores. 5 No início dos anos 1960, o PTB, ao conquistar vitórias eleitorais significativas, transformou-se no segundo maior partido brasileiro, colocando-se como real alternativa de poder frente às forças conservadoras. Em 1964, a derrubada do presidente trabalhista João Goulart por uma frente política liderada pelos militares teve efeitos devastadores sobre a legenda, que terminaria por ser extinta, assim como os demais partidos políticos, em 1965. Quinze anos depois, o trabalhismo foi reorganizado em torno da liderança de Leonel Brizola (antiga liderança do PTB) e da legenda do Partido Democrático Trabalhista (PDT).

Outro importante eixo de articulação política das esquerdas brasileiras nas décadas de 1950 e 1960 foram os movimentos que reuniram membros de variadas entidades católicas – a Juventude Universitária Católica (JUC), a Juventude Estudantil Católica (JEC), a Juventude Operária Católica (JOC), a Ação Operária Católica (ACO), entre outras. Fruto de importante processo de renovação ocorrido no interior da Igreja – do qual há vetores variados, entre os quais os originários de novas diretrizes emanadas pelos papas João XXIII e Paulo VI –, esses movimentos, na década de 1960, acompanhando a 'gramática política' da época, avançaram no sentido de colocar em xeque as proposições da alta hierarquia da Igreja católica que se opunha a uma ação mais combativa em prol da então chamada Revolução Brasileira. Daí, mais especificamente da ala esquerda da JUC, originou-se um novo movimento de cunho revolucionário – a Ação Popular – cuja orientação política se fundamentava numa original mescla do marxismo e de concepções defendidas por correntes do humanismo cristão, que se mostravam críticas tanto ao liberalismo e ao capitalismo, como ao modelo soviético de socialismo. Durante os anos da ditadura militar-civil, a AP cai na clandestinidade e acompanha outras organizações de extrema-esquerda em defesa da luta armada. Nos anos 1970, a AP, à época denominada APML, caminha na direção do maoísmo, vindo a se dissolver no Partido Comunista do Brasil (PCdoB). 6

Herbert de Souza, o Betinho, era figura de amplo trânsito na Belo Horizonte radical do fim dos anos 1950, sendo visto em vários dos seus principais espaços de sociabilidade, a saber: o Colégio Estadual Central, antigo Ginásio Mineiro, a principal escola pública de Ensino Médio da cidade; a Faculdade de Ciências Econômicas (Face) – mais tarde incorporada à da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) –, celeiro de quadros e militantes do PCB e de diversas organizações de extrema-esquerda; os grupos de discussão católicos; as reuniões de militantes em frente à igreja São José, o Cinema São Luís e os inúmeros bares da capital mineira. Tendo participado da criação da AP, em 1962, Betinho logo se transforma em um dos seus principais dirigentes políticos, e é nessa condição que chega a participar diretamente do governo João Goulart.

Em 1964, caçado pelo regime militar, caiu na clandestinidade e foi em direção ao exílio no Uruguai, onde se integra a um conjunto de militantes em torno de um projeto de derrubada do governo militar sob a liderança de Leonel Brizola. Depois do fracasso das investidas guerrilheiras de inspiração brizolista-guevarista, retorna ao Brasil e retoma sua militância na AP. Depois de trabalhar como operário em uma fábrica de porcelana, seguindo a orientação da organização de que seus militantes deveriam se proletarizar para purgar seu passado pequeno-burguês, no começo de 1971 Betinho parte para novo exílio, agora no Chile socialista de Salvador Allende. Em Santiago inicia um movimento de questionamento de sua experiência na AP, vindo a sair da organização ao mesmo tempo em que se integra a projetos vinculados ao governo Allende na área acadêmica. Em 1973, em seguida ao golpe de Pinochet contra o governo Allende, parte para novo exílio no Panamá, Canadá e México, sucessivamente, até o retorno definitivo ao Brasil em meados de 1979, como decorrência da aprovação da Lei de Anistia. 7

Carlos Alberto, depois Frei Betto, nasceu em 1944 e era 9 anos mais novo que Betinho. Ao fim dos anos 1950, fez amizade com Henrique, um dos irmãos mais novos de Betinho, o qual se tornaria conhecido depois como Henfil – um dos mais importantes caricaturistas brasileiros. Aos 15 anos, Carlos Alberto entrou na Juventude Estudantil Católica (JEC), tornando-se, anos depois, um dos dirigentes nacionais da entidade, função essa que o obrigou a se mudar para o Rio de Janeiro. É nessa ocasião, ou seja, por volta de 1962, que passa a conviver mais de perto com Betinho, já que este, quando ver ao Rio de Janeiro, hospeda-se no apartamento no qual Carlos Alberto e outros dirigentes da JEC e da JUC moravam.

Em depoimento recente, Frei Betto registra que acompanhou de perto o afastamento de Betinho da JUC, assim como a criação da AP, pela qual nutriu simpatia. Diz ele:

Nunca entrei na AP, embora tivesse toda simpatia, porque havia uma exigência da CNBB de que os dirigentes da Ação Católica não deviam ter vínculo com nenhuma instituição política, com o que eu concordava. Lia todos os documentos, conhecia os outros fundadores da AP, o Vinícius Caldeira Brant, o Lucio Nunes e o José Alberto da Fonseca, que, dos quatro, é o único que está vivo e que é meu amigo até hoje. 8

Sobre esses tempos, registra um caso curioso na relação dos dois: sua prisão por engano, em junho de 1964, quando foi confudido com Betinho. Relata:

Em 64 tem o golpe e o Betinho era uma das figuras mais procuradas. Em junho de 64 este apartamento é invadido pela Marinha – isso tudo eu conto em detalhes no Batismo de Sangue – e eu sou preso como se fosse o Betinho, porque, naquela noite, houve o arrastão da Ação Popular e o apartamento foi invadido, não por ser da Ação Católica, mas por ser da Ação Popular. Não era, mas na cabeça do Cenimar, que fez o arrastão, era tudo uma coisa só. Eu fui levado para a Ilha das Cobras como se fosse o Betinho. E das duas prisões que eu tive, essa primeira não durou muito, porque depois o dom Jaime Câmara, que era o cardeal, entrou no circuito e conseguiu que o nosso caso se transformasse em prisão domiciliar, mas foi a única em que eu fui torturado, porque havia essa coincidência Betto/Betinho/Belo Horizonte, entendiam que a discussão de Ação Católica era Ação Popular... e o Betinho morreu dizendo que ele tinha uma dívida comigo e eu dizia que eu esperava que ele nunca pagasse, porque eu apanhei no lugar dele. 9

Em 1965, Carlos Alberto optou por ingressar na Igreja católica como frei dominicano, tornando-se irmão cooperado e leigo, ou seja, sem o devido sacramento para exercer as funções de sacerdote. Pouco tempo depois, acumulava atividades em São Paulo, mesclando seu trabalho religioso com o de estudante de filosofia na Universidade de São Paulo (USP) e de jornalista na Folha da Tarde. Foi nessa ocasião que Frei Betto e outros dominicanos começaram a manter contatos regulares com Carlos Marighella, principal líder da Ação de Libertação Nacional (ALN) – uma organização originária de dissidência do PCB que defendia a ação guerrilheira contra o governo militar. Simpatizante da ALN, Frei Betto dirigiu-se ao Rio Grande do Sul para montar um esquema para fuga de militantes procurados da organização. No fim do ano de 1969, em seguida ao assassinato de Mariguella pelas forças de repressão do governo, Frei Betto e seus confrades dominicanos foram presos. Na prisão, escreveu cartas que denunciaram as atrocidades dos cárceres brasileiros. A reunião delas terminou por se transfomar em livro de denúncia, publicado na Itália, Suécia e só depois no Brasil. Durante os 4 anos que ficou preso (1969-1973), viveu e viu de tudo. Diz ele:

Quatro anos nos subterrâneos da história. Algemas, galerias, celas fortes, camburões, sangue, revoltas, interrogatórios, torturas, gritos, sangue, fugas, revistas, sequestros, assassinatos, desaparecimentos, sangue. Nas mãos, a sacola, poucos objetos pessoais, meia dúizia de livros, a Bíblia, a caneca de alumínio trazida de recordação. 10

Frei Betto saiu da prisão no dia 4 de outubro de 1973. Depois dos anos amargos daquela experiência por ele chamada de "Batismo de Sangue", optou por permanecer no Brasil, deixando de ouvir o apelo de familiares e amigos de que deveria deixar o país. Parte então para a cidade de Vitória, a capital do estado do Espírito Santo, no intuito de participar da criação das comunidades eclesiais de base (CEBs) e refazer sua vida.

A construção do novo

Betinho, em seu exílio no Canadá e no México, mesmo afastado da organização que ajudara a criar – a AP –, ao lado de levar adiante seus afazeres acadêmicos em entidades de ensino superior, manteve intensa atividade política, fazendo contatos frequentes com diferentes personalidades das esquerdas brasileiras. Um bom material para se acompanhar essa quadra de sua trajetória é a correspondência trocada com amigos, ex-correligionários, conhecidos e familiares. Para os objetivos limitados deste texto, fiquemos por ora com alguns extratos de cartas trocadas entre ele e o 'xará' Frei Betto.

Em 30 de janeiro de 1978 Betinho assina uma longa carta para o conterrâneo. O tom é de proximidade dos que se conhecem há um bom tempo. Nela, registra sua satisfação por concordar com as palavras de Frei Betto acerca do papel dos movimentos sociais no Brasil naquele fim dos anos 1970 e do elitismo da nossa classe política. Ao discorrer sobre esses temas, Betinho se propõe a fazer um balanço não apenas de sua trajetória, mas de sua geração – anterior à de Frei Betto. Diz ele:

Pertencemos a uma geração que desejou por todas as formas fazer política e, uns mortos, outros vivos, fizemos. Não foi fácil perceber que havíamos aprendido com velhos professores das classes dominantes, mesmo quando ilustrávamos a nossa prática com as lições dos velhos professores das classes dominadas ... O elitismo de que você fala é a parte mais visível de uma longa, pesada e forte tradição antidemocrática brasileira da vida política e cultural brasileira.

E continua mantendo o tom autocrítico:

A fascinação com o poder, como algo mágico, quase religioso, que nos levaria a transformar a sociedade ao invés de nos aproximar dos caminhos seguros, lentos e penosos do povo, muitas vezes nos levou a nos aproximar de seus intérpretes iluminados e do Estado, onde o povo brasileiro nunca esteve... (cit. em Pandolfi; Heymann, 2005, p.89)

Na mesma carta, Betinho, em seu diálogo com Frei Betto, introduz algumas imagens em sua narrativa que relembram o militante que, no início dos anos 1960, fora um dos protagonistas da JUC e da AP na defesa do que, à época, se chamava de 'ideal histórico'. Em determinada passagem, por exemplo, ao analisar o momento político brasileiro, menciona duas temporalidades históricas: a da ação imediata e a da 'dimensão de futuro' que está 'presente hoje'. A primeira, associa à criação dos partidos liderados pela pequena burguesia a tentar 'abarcar o povão', à atuação da Igreja, ao movimento estudantil, enfim, aos atores sociais e políticos. A segunda, mais ampla e que abre perspectivas novas, associa à construção da democracia: "a única capaz de praticar a 'prática popular'". Daí, prossegue: "a grande questão que me preocupa e me inquieta é: como pensar grande, real, e de tal forma fundamental e concreto que MOBILIZE, que desperte energias, que some, que faça de cada homem, de cada trabalhador, um ser totalmente mobilizado para a transformação de todos e por todos".

Ao concluir, mantém a confiança na força transfomadora do homem. Diz:

Existem momentos na vida dos povos onde esta mobilização, esta força, esta energia, se encarna numa liderança, num movimento, numa conjuntura ... Não visualizo isto como uma força puramente espiritual, ela o é, mas creio que é o cimento material da própria história humana, a energia que se põe em movimento quando se abre em perspectiva real, no grande projeto, no grande sonho de todos nós... (ibidem, p.90)

Na carta ao 'xará', Betinho pouco faz menção às formas pelas quais pretendia trabalhar na construção do novo. Talvez porque ele mesmo ainda alimentasse dúvidas, assim como muitos de sua geração durante os estertores do exílio. A se levar em conta parte da correspondência que ele recebia de seus amigos e ex-correligionários, é possível verificar que muitos deles contavam que Betinho viesse a desembarcar em algum partido ou organização, após o retorno ao Brasil. Esse foi o caso, por exemplo, de cartas dirigidas a ele por militantes que, na ocasião, formavam com Leonel Brizola e faziam questão de mantê-lo a par das articulações que vinham se dando em torno da recriação do Partido Trabalhista Brasileiro no exterior. Ainda em 1978, ao deslocar-se do Canadá para a Cidade do México, Betinho manteria contato frequente com intelectuais e militantes que estiveram na origem do chamado 'novo trabalhismo', tais como Theotônio dos Santos, Vania Bambirra, Neiva Moreira, Francisco Julião e Flávio Tavares, entre outros. Não por acaso, Betinho, em junho de 1979, desloca-se da Cidade do México para a capital portuguesa no intuito de acompanhar e participar do ato de refundação do PTB no chamado Congresso de Lisboa. Por meio dessa atitude, Betinho reatava antigos laços políticos com Brizola, oriundos dos anos que antecederam ao golpe de 1964, quando formou com o líder gaúcho na Frente de Mobilização Popular (FMP), ou mesmo do período imediatamente posterior à derrubada do governo de João Goulart, quando se envolveu nas articulações guerrileiras brizolistas no Uruguai. Mais tarde, nos anos 1990, ou seja, no momento em que Betinho já afirmara uma imagem suprapartidária, esses vínculos com Brizola terminaram estrategicamente por serem desqualificados ou mesmo esquecidos por ele e seus biográfos.

Outra fonte valiosa para se buscar compreender o que pensava Betinho a respeito do que ele e as esquerdas brasileiras deveriam fazer ao voltar ao Brasil, é seu texto publicado na coleção "Memórias do exílio" – obra que reúne um conjunto significativo de depoimentos de exilados brasileiros que se encontravam espalhados em várias partes do mundo, vindo a público primeiro em Portugal, em 1976, e 2 anos depois no Brasil. Em seu depoimento, Betinho não mede palavras e apresenta aos leitores um painel amplo e crítico de sua trajetória política como dirigente da JUC e da AP e de sua vida no exílio. Expõe-se como um militante de carne e osso, relatando dúvidas e sofrimentos pessoais, sem esconder as dificuldades de sua condição de hemofílico. Discorre sobre o que considera os equívocos da proletarização da AP – da qual também participou como operário em uma fábrica de porcelana, como vimos –, assim como denuncia a incongruência da direção da organização na defesa da 'guerra popular' contra a ditadura. Diz ele: "A aventura mais incrível, a de propor guerra popular, nos anos de 1968/9, sem base popular, e sem guerra, isso não era militarismo, isso era o marxismo-leninismo-maoísmo". 11

Em seguida a esse conjunto de críticas, Betinho apresenta a questão central que marca todo o seu depoimento e que se dirige diretamente para o conjunto das esquerdas: por que se chegou a isso? E responde: "Creio que foi o resultado de uma perda de pé na realidade. Quer dizer, você manteve a mística, manteve o sentido de compromisso, manteve a família ... Tudo isto eu vi e percebi em camaradas fantásticos. Mas no meio desse contexto todo faltava uma só coisa: faltava a realidade, faltava a política" (em Cavalcanti, 1978, p.87).

Para Betinho, o exílio no Chile de Salvador Allende foi fundamental para que ele melhor percebesse os equívocos das concepções voluntaristas, vanguardistas e elitistas de sua organização. Quem faz a Revolução, diz ele, não é a vanguarda, os revolucionários, o partido revolucionário:

Quem faz a Revolução é a luta de massas, é a história, e às vezes a própria burguesia que cria as condições para a Revolução ... um revolucionário é muito mais um participante no processo socialmente existente do que alguém que cria as condições para isso. Quando eu procurava dizer coisas como esta era taxado de suprassumo do espontaneísmo, porque isso era negar o partido. (ibidem, p.91)

Em seu depoimento, Betinho não quer deixar nada de pé. Quer desvencilhar-se do seu passado, ou melhor, de uma vida toda marcada por uma 'atitude religiosa da realidade'. Para ele, as esquerdas brasileiras, assim como as latino-americanas, ao contrário do que se pensava, eram essencialmente religiosas em seu padrão de ação dogmático e irreal. Diz ele: "A primeira coisa que aprendi foi a perda do sentido missionário. Olha, eu não sou nenhum dos 12 apóstolos, nem o décimo terceiro. Descobri que sou um cidadão comum e corrente". Nesse trecho do seu depoimento, como em outros, Betinho deixa explícito seu desconforto e aposta na necessidade de mudar e abandonar os projetos revolucionários vistos por ele como vanguardistas e/ou religiosos.

Creio que é importante frisar, ao lermos esses trechos do depoimento de Betinho, que eles não podem ser vistos isoladamente, como fruto exclusivo do rompimento individual do autor com boa parte daquela história de lutas, ainda que isso não deva de forma alguma ser desmerecido. A meu ver, suas palavras duras para com ele mesmo e para com os seus devem ser situadas no âmbito de um processo de autocrítica que boa parte da militância das esquerdas estava atravessando, no exílio e no Brasil. Como bem demonstrou Denise Rollemberg em seu importante estudo de conjunto sobre o exílio brasileiro das décadas de 1960 e 1970, passada a euforia da experiência socialista no Chile de Allende, os anos que se seguiram ao 11 de setembro de 1973 e ao bombardeio do Palácio de La Moneda foram de diáspora e de readaptação, uma vez que caíra por terra, com a derrota do projeto revolucionário, a ilusão de rápido retorno ao Brasil. O tempo passou, diz Rollemberg: "A militância ganhou outro significado. A maneira de lidar com o cotidiano foi reavaliada. Os valores mudaram ... De uma cultura política basicamente autoritária, transitou-se para a valorização, ainda que desigual, da democracia". E prossegue sobre os efeitos do exílio para muitos:

Os exilados reavaliaram o projeto que havia sido vencido, abandonaram alguns de seus aspectos centrais, agregaram outros, reconstruíram caminhos e concepções de mundo, redefinindo-se a si mesmos. Entre o que deixavam para trás e o que viam diante de si, as contradições, as tradições do passado, as novidades do presente. O futuro. No embate, se não houvesse naufrágios, os exilados viveram a dolorosa e a maravilhosa experiência da metamorfose, tornando-se outros, sem perder de todo traços da condição anterior. 12

Em setembro de 1979, Betinho desembarca no Rio de Janeiro como outro homem. Em seus planos de vida não havia espaço para a criação de partidos ou mesmo para a militância político-partidária, a despeito de sua proximidade afetiva com quadros importantes do 'novo trabalhismo'. Veio com planos de formar um centro de análise de políticas governamentais – CAPG, mais tarde viabilizado sob o nome de Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase). Finalmente, veio também nacionalmente conhecido como o "irmão do Henfil" – já que essa expressão fazia parte da letra de uma música intitulada O bêbado e o equilibrista, dos compositores Aldir Blanc e João Bosco, que se tornara o verdadeiro hino da campanha da anistia no Brasil, na voz de Elis Regina.

Frei Betto, como vimos, saiu do inferno da prisão paulista para refugiar-se em um convento dominicano em Vitória. Em seu livro-depoimento intitulado Mosca Azul, no qual relata sua experiência de 30 anos de vida pública, entre 1974 e 2004, o autor nos coloca a par do seu reencontro com o trabalho pastoral junto às comunidades eclesiais de base. Diz ele que, na ocasião, se surpreendeu com a força do movimento popular que "não havia sido organizado por nós da esquerda carimbada, ornados de teorias professadas num lapidar rigor acadêmico que as transubstanciava em dogmas religiosos". E prossegue com a crítica direta:

Como o povo se organizara se nós, a 'vanguarda', os dirigentes, estávamos na cadeia? Como criara movimentos de moradia, de luta contra a carestia, de mulheres, negros, de indígenas, de direitos humanos... se nós, intelectuais, nós que conhecíamos bem o marxismo ... nós, os timoneiros, não figurávamos à frente de seus movimentos? (Quanta pretensão!) (Betto, 2006, p.50)

Frei Betto não foi para Vitória por acaso. Na capital capixaba, pôde contar com o apoio e a orientação do arcebismo d. João Batista da Mota e Albuquerque e do bispo auxiliar d. Luís Gonzaga Fernandes, dois membros da hierarquia da Igreja católica que, ao lado de d. Helder Câmara e outras importantes lideranças da chamada ala progressista da Igreja, defendiam um trabalho pastoral mais intenso junto aos setores populares. Consoantes com as resoluções da II Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, realizado em Medellín em 1968, propugnavam por uma maior presença da Igreja na transformação social da América Latina. Na ocasião, começava a tomar forma a Teologia da Libertação – um conjunto orgânico de proposições que, segundo as palavras de um dos principais nomes, Gustavo Gutiérrez, representa "uma tentativa de compreender a fé a partir da práxis histórica, libertadora e subversiva dos pobres desse mundo, das classes exploradas, das raças desprezadas, das culturas marginalizadas. Ela nasce da inquietante esperança de libertação". 13

Em Vitória, portanto, Frei Betto encontrou boas condições para viver intensamente esse novo momento na história da Igreja católica brasileira, ou melhor, se quisermos ser mais precisos, de uma parte da Igreja. É nessa ocasião que mantém correspondência com Betinho e percebe que ambos estavam falando mais ou menos sobre a mesma coisa. Para Betinho, no exílio canadense e depois no México, a hora era de rompimento com um passado recente e de recolhimento pessoal e profissional. O novo – a democracia – ainda estava por vir. Ainda estava por ser construída. Já para Frei Betto, livre, disposto e com bom apoio junto a seus pares, a hora era de avançar na educação popular e na criação de uma nova Igreja baseada nas comunidades eclesiais de base. Em mais uma estocada contra os métodos e o vanguardismo das esquerdas tradicionais, afirma: "Nós, agentes da pastoral, tínhamos a nosso favor a linguagem religiosa. Não o hermético vocabulário da esquerda, o dialeto estranho aos ouvidos dos pobres, a 'correlação de forças', o 'antogonismo de classe', a 'contradição histórica'. Era a linguagem popular, essa matéria-prima que tece, em categorias religiosas, a ideologia mais elementar, e nem por isso menos crítica e revolucionária". E conclui: "A comunidade despertava ao descobrir que, se Deus é Pai e somos irmãos e irmãs, não se justifica tanta desigualdade". 14

Ao fim dos anos 1970, Frei Betto retornou a São Paulo para trabalhar como coordenador da Pastoral Operária em São Bernardo do Campo, uma das cidades industriais do estado que surgira e crescera em torno da indústria automobilística. Em São Bernardo, como de resto nas outras duas cidades do ABC paulista (Santo André e São Caetano do Sul), despontava um poderoso movimento sindical que colocou em xeque a legislação trabalhista autoritária do regime militar por meio de sucessivas greves. À frente do movimento estava Luís Inácio da Silva, o Lula, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo. Em 1980 Frei Betto e Lula travaram contato, e juntos participariam da criação da Articulação Nacional dos Movimentos Populares e Nacionais (Anampos), do Partido dos Trabalhadores (PT) e da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Para Frei Betto, o novo, o popular ganhara um rosto.

A "Campanha do Betinho" e o "Fome Zero"

Francisco de Oliveira e Wanderley Guilherme dos Santos, dois importantes intelectuais brasileiros, em obras recentes 15 têm chamado atenção para as mudanças que se processaram nas estruturas e na dinâmica do 'político' 16 no Brasil entre as décadas de 1980 e 1990. Para o primeiro, aqueles anos foram marcados por 'uma reinvenção da política' protagonizada por frações das classes dominadas que passaram a operar a construção de uma agenda que se desdobrou em três das mais importantes invenções políticas da história recente no Brasil: o sindicalismo cutista, o PT e o MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra). Já para Wanderley Guilherme dos Santos os anos que se seguiram ao regime militar foram de "exuberância participativa, com a inclusão dos analfabetos nos contingentes de eleitores, com a Assembleia Constituinte e a continuada mobilização da população adulta, com a circulação provocada pela divisão social do trabalho e a multiplicação dos grupos de interesse, todos esses processos se somaram, gerando expectativas positivas quanto ao futuro imediato de cada um" (Santos, 2006, p.179).

Betinho e Frei Betto viveram intensamente essas duas décadas de mudanças e de 'invenção democrática'. 17 O primeiro, já devidamente instalado no Ibase, envolveu-se diretamente em seguidas campanhas de projeção nacional. Uma delas disse respeito a um tema que historicamente marcou sua trajetória e a da sua geração: o da Reforma Agrária. Longe de ser um ajuste de contas com o passado, como bem dizem Dulce Pandolfi e Luciana Heymann em seu livro sobre Betinho, a Campanha Nacional pela Reforma Agrária (CNRA) "encontrava fundamento na percepção de uma reforma agrária, diante da mobilização que, apesar do regime militar, voltava a se intensificar no campo, fazia ainda todo o sentido para o país. Mais, era uma bandeira de luta para a qual confluíam movimentos sociais e diversos atores que atuavam no campo" (Pandolfi; Heymann, 2005, p.128).

O fim do regime militar, em 1985, seguido da convocação de uma Assembleia Constituinte, em 1987, representaram um momento-chave para que a CNRA tomasse corpo no sentido de pressionar os poderes públicos em prol do avanço da Reforma Agrária no país. Vários eventos foram realizados nesse sentido, até mesmo a apresentação de uma emenda de iniciativa popular à Constituinte, assinada por um milhão e meio de pessoas, na qual se reúne um conjunto orgânico de proposições para mudar as estruturas do campo brasileiro. A equipe do Ibase, coordenada por Betinho, teve papel central seja na formulação, seja na condução de toda a campanha.

Uma das frentes de luta de Betinho era a imprensa, tratando de, continuamente, manter aberto o diálogo com a opinião pública. Dessa maneira, reuniu condições para se tornar conhecido por amplos setores da população carioca e brasileira como um militante devotado às causas sociais e defensor inconteste da participação cidadã. Daí é possível compreender sua nomeação pelo prefeito Saturnino Braga, em 1988, para o cargo de Defensor do Povo da Cidade do Rio de Janeiro – no qual ele deveria ficar responsável por ouvir e encaminhar demandas da população aos órgãos municipais. Nos anos seguintes, com o agravamento da crise de violência no Rio de Janeiro, a qual foi acompanhada pela sensível elevação dos índices de criminalidade, Betinho se envolveria ainda em várias outras campanhas em prol da cidade que escolhera para viver e criar sua família.

No início dos anos 1990, setores expressivos da sociedade brasileira, ainda na esteira das mobilizações da década anterior, promoveram seguidas manifestações políticas em defesa do impeachment do presidente Fernando Collor de Mello, o qual sofria acusações graves de corrupção. No bojo dessa mobilização, originou-se o Movimento pela Ética na Política (MEP), que contou com o apoio de inúmeras entidades da sociedade civil, entre as quais o Ibase. No ano seguinte, já devidamente afastado o presidente Collor, as entidades que se reuniam no MEP passaram a levar adiante discussões que, segundo Pandolfi e Heymann, desembocaram na ideia de promover uma campanha para combater à fome e à miséria no país (Pandolfi; Heymann, 2005, p.180).

Outra versão da origem da campanha contra a fome nos foi relatada por Frei Betto em recente entrevista. Segundo ele, coube a Lula a iniciativa de levar adiante a referida campanha, e não ao MEP. Diz Frei Betto:

É um fato histórico. Eu estava lá e não posso negar, com todo o respeito e reconhecimento do papel que o Betinho teve na questão da fome no Brasil... Realmente ele transformou essa questão, que era um tabu, levantado pelo Josué de Castro, num fato político. Só que isso [foi] proposto pelo Lula numa reunião em São Paulo em que estávamos eu e o Betinho, e o Lula propôs a campanha e o nome do Betinho: "Betinho, você e dom Mauro [Morelli] podiam tocar isso aí". E aí o Betinho assume a campanha e deslancha, e era exatamente o que se queria, que não tivesse caráter partidário ... De uma maneira geral, ele nunca reconhecia que a ideia da campanha tivesse partido do Lula.

Divergências à parte, creio que o mais importante agora, no atual estágio da pesquisa, é atentarmos para o trecho em que Frei Betto assinala que Betinho, ao chamar a campanha para si, a transformou em fato político, o que, em outras palavras, poderia ser expresso da seguinte maneira: Betinho colocou o tema – pela primeira vez – na agenda pública brasileira. Como ele conseguiu isso? Por meio de que instrumentos e métodos ele conseguiu sensibilizar amplos segmentos da população? Como reuniu condições para transformar a campanha, intitulada de "Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e pela Vida", no mais importante movimento de solidariedade da sociedade brasileira até então?

Como vimos, Betinho, ao longo da década de 1980, construiu uma imagem pública de alta credibilidade junto a diversos setores da opinião pública. Como na Belo Horizonte do começo dos anos 1960, transitava com facilidade e desenvoltura por vários lugares e grupos políticos, preservando sua independência e mantendo-se longe dos partidos e das facções políticas. Seu discurso político, nessa campanha, mira no todo, no global, no povo, na nação, não mais nos camponeses, trabalhadores, oprimidos. Elabora uma narrativa de estadista – com máximas como "Quem tem fome tem pressa" –, em um momento no qual o país se encontrava recém-saído de grave crise política e sob a direção do governo provisório de Itamar Franco.

Para além disso, Betinho não pestanejou em enfrentar o discurso de setores das esquerdas que viam na campanha nada mais, nada menos, que a reprodução das velhas práticas do assistencialismo. Sobre esse ponto em particular, Betinho afirmava que era crucial articular as dimensões emergencial e estrutural, levando-se necessariamente em conta que "atuar no emergencial sem considerar o estrutural é contribuir para perpetuar a míséria. Propor o estrutural sem atuar no emergencial é praticar o cinismo de curto prazo em nome da filantropia de longo prazo" (em Pandolfi; Heymann, 2005, p.180).

A respeito dos métodos e instrumentos para levar adiante a campanha, Betinho preocupou-se em não adotar medidas que fizessem com que a Ação da Cidadania fosse confundida com uma iniciativa do governo ou do Estado. O motor seria a sociedade civil e não haveria um modelo único, um roteiro a ser seguido por todos. Crítico acerbo dos modelos de centralização política e defensor de propostas que surgissem por iniciativa própria dos variados comitês organizados por todo o país, Betinho assim definiu os três princípios gerais que deveriam fundamentar a campanha: "Parceria porque propõe juntar quem quer dar com quem precisa receber. Iniciativa porque não apresenta respostas, mas coloca questões e cobra soluções. Descentralização porque não estabelece um modelo hierárquico, mas sim estimula ações sem impor uma coordenação" (em Pandolfi; Heymann, 2005, p.181).

Por tudo isso, não é difícil entender por que a Ação da Cidadania ficou conhecida e confundida pelo grande público como a "Campanha do Betinho". Para isso, contribuíram também razões de toda ordem: um discurso simples, direto e abrangente; uma postura física frágil e ao mesmo tempo determinada; carisma; desapego por cargos e nítido compromisso com o social; etc. Isso não significa, no entanto, que ele não sofreria duras críticas ou pressões. Frei Betto, por exemplo, nos relata que se manteve afastado da campanha, já que possuía críticas severas à maneira pela qual ela foi conduzida por Betinho. Diz ele:

Eu tinha uma crítica muito forte: estava centrada muito na pessoa do Betinho. Cheguei a falar, em reunião com ele aqui no Rio, que ele não socializava o poder, e ele ficou muito chateado. Eu sentia isso, que no momento em que ele desaparecesse... Ele tomou uma posição exatamente contrária à minha; era contra organizar demais. Eu falei: o problema é que tem que organizar, porque o movimento tem que ter continuidade, independente de suas lideranças. Era ele o movimento e ele tinha dificuldade, por exemplo, de ter um cara que articulasse o movimento no Nordeste, outro no Sul, e dividir o poder e debater com esses caras os rumos do movimento. Eu sempre fui da posição inversa. Eu realmente defendia que o movimento tinha que ser mais orgânico. Eu sentia que as coisas vinham num embalo e depois acabavam. Foi extinguindo, extinguindo, até que acabou. Tem a ver com essa falta de organicidade. 18

Por conta dessas pressões, houve episódios de desencontros entre Betinho e membros próximos ao PT que, em 1994, defendiam a candidatura de Lula à Presidência da República. Um desses episódios está documentado na correspondência trocada entre Oded Grajew, empresário progressista engajado na campanha de Lula, e Betinho. Oded, em carta datada em 15 de agosto de 1994, é porta-voz de uma cobrança por parte do Partido dos Trabalhadores para que Betinho declare apoio explítito ao candidato do PT, já que, segundo Oded, coube a Lula a iniciativa da criação da Campanha contra a fome e a indicação do nome de Betinho para liderar a campanha. Oded conclui apresentando as opções políticas que se colocam para Betinho:

se posicionar e perder a quase unanimidade da opinião pública ou frustrar a expecttiva de fiéis amigos e companheiros de lutas comuns; ou ainda, ajudar a termos um governo capaz de empreender ações efetivas contra a miséria ou se eximir de tomar partido e continuar uma campanha que apenas cria expectativas e tenta maquiar uma perversa gestão pública. (em Pandolfi; Heymann, 2005, p.215)

Betinho responde em seguida, 2 dias depois. Em sua carta, além de atribuir a origem da campanha à ação do MEP, apresenta claramente sua desconfiança em relação ao poder. Segundo ele, sua atenção se volta para a sociedade e não para o governo. Diz: "entre o presidente e o cidadão, fico com o cidadão". Afirma-se antiestatista e defende a democratização do Estado. Registra ainda que possui críticas ao PT e ao próprio Lula. Como a lembrar antigos fantasmas das esquerdas revolucionárias da qual fez parte, afirma:

O PT no fundo ainda se crê um partido único, aquele que detém a verdade, o caminho, a luz, a coerência, a ética. Esssa visão que tem de si mesmo me assusta. Essa visão é totalitária porque pretende impor a todos o que é apenas a verdade de uma parte. Por isso, o PT não sabe se aliar, negociar, ceder, compor, somar. Só compõe com quem está de acordo do lado esquerdo do seu coração. Mas será o Brasil um país de esquerda? (em Pandolfi; Heymann, 2005, p.217)

Em 1995 a Campanha do Betinho já havia perdido fôlego. O país vivia um novo momento político marcado pela chegada à Presidência da República de Fernando Henrique Cardoso, eleito no ano anterior em primeiro turno por amplos setores da sociedade brasileira. Ao lado de levar adiante uma agenda voltada para consolidar a estabilização econômica pelo Plano Real, FHC busca redesenhar a política social mediante um conjunto de iniciativas englobado no programa "Comunidade Solidária". A hora agora era de regularização, ordenação, institucionalização e menos de campanhas de mobilização. Por conta disso, Betinho, que em um primeiro momento chegou a se envolver em ações oficiais, terminou por se afastar do Comunidade Solidária e do governo. Em agosto de 1997, Betinho morreu de aids no Rio de Janeiro.

Frei Betto, nos anos 1980 e 1990, consolidou sua presença como figura-chave da corrente progressista da Igreja católica junto a movimentos sociais, mantendo sua atuação militante na Articulação Nacional dos Movimentos Populares e Sindicais, assim como sua proximidade política e pessoal com Luís Inácio Lula da Silva e com segmentos do Partido dos Trabalhadores (PT). Pari passu, afirmou-se como intelectual e escritor, tendo sido, em 1986, agraciado pela União Brasileira de Escritores com o prestigiado troféu Juca Pato. Entre 1980 e 2000, publicou sozinho ou em coautoria 35 livros, dos mais variados temas. Entre outros, um de grande impacto foi Fidel e a Religião (Brasiliense, 1986), no qual publica uma longa entrevista concedida pelo líder cubano sobre marxismo e religião e sobre as relações do governo daquele país com a Igreja católica.

Enquanto Betinho, nesses anos, levava adiante seu trabalho no Ibase e junto à sociedade civil, Frei Betto vivia intensamente os processos revolucionários na América Central, na Nicarágua e em El Salvador, os quais contaram com a presença de líderes religiosos entre os líderes rebeldes. No Brasil, a chamada Teologia da Libertação ganhava espaços, ao mesmo tempo em que começava a ser 'domesticada' pela alta hierarquia da Igreja católica sob as ordens de João Paulo II.

Na década de 1990 o PT já se transformara no principal eixo de oposição ao governo federal, tendo ao seu lado as mais importantes entidades sindicais e populares. Reunindo líderes sindicais e remanescentes das esquerdas revolucionárias, a agremiação contaria ainda com amplo respaldo de líderes populares, boa parte deles egressos das comunidades eclesiais de base. Aos poucos, o PT afirmou sua hegemonia no campo das esquerdas. Em 2002, Lula, depois de ter sido derrotado por três vezes, foi eleito presidente da República sob a legenda do PT. Frei Betto, em seu livro A mosca azul, relata sua emoção com a vitória eleitoral do amigo. Diz ele a respeito da cerimônia da posse de Lula em 2003:

A Esplanada [dos Ministérios] tranfigura-se em praça vermelha ... O gosto do travo na garganta, a emoção desbordando em lágrimas, um povaréu embriagado de tanta lucidez. O sertão virava mar, derramava-se por todos os beirais, sopitava temores. Subia a maré, subia no ondear de cinco séculos de gravidez, borbulhando alvíssaras; enfim o parto; e o sangue, que não foi pouco, transmutado em adubo, oferecia agora o buquê de primícias. Renascença. (Betto, 2006a, p.22)

Frei Betto aceitou o convite de Lula para, pela primeira vez na vida, assumir um cargo oficial: o de assessor da Presidência da República na mobilização do programa Fome Zero. Esse programa, que veio a ser por determinado tempo o carro-chefe da política social do governo, voltava-se para uma ação concentrada dos poderes públicos no combate à fome no Brasil, para o qual deveria ser baseado em uma ação cidadã da sociedade e sob a supervisão de comitês gestores formados em cada localidade do país. Frei Betto, pela enorme experiência que tinha na educação popular e na formação das comunidades eclesiais de base (CEBs), deveria ser um dos principais elos do governo com os movimentos populares. Já Oded Grajew, já citado, atuaria na mobilização junto ao empresariado.

A equipe do Fome Zero, da qual Frei Betto foi um dos principais nomes, desenhou um projeto que para ele não cumprisse apenas o papel de mobilização social e de alerta para o problema, como a "Campanha do Betinho". Ao lado da ação junto à opinião pública, foi sendo formulada uma política pública que pressupunha um montante considerável de recursos do governo, além de iniciativas constantes de ação informativa e de mobilização social levadas adiante por uma ampla rede de educadores populares – a qual foi chamada de Talher. A respeito do papel da "Campanha do Betinho" para o "Fome Zero", Frei Betto afirmou categoricamente: a Campanha contra a Fome do Betinho foi fundamental para alavancar o Fome Zero. Aquilo que ele deu de empurrão favoreceu enormemente o Fome Zero. Talvez o Fome Zero não tivesse o impacto que teve se não tivesse antes a questão do Betinho". 19

Em tese, o "Fome Zero" tinha tudo para representar a espinha dorsal de uma nova política social no país. Na prática, porém, a história foi outra. A se levar em conta a versão apresentada por Frei Betto em seu livro Calendário do Poder – versão essa que, por óbvio, precisa ser confrontada com depoimentos de outras pessoas –, percebe-se que o próprio governo fez questão de enterrá-lo. Para isso, valeu-se de um novo programa – o "Bolsa Família" –, o qual tem sido um dos responsáveis nos últimos anos pela queda dos níveis de desigualdade social no país.

Frei Betto, em seu livro/diário, deixa explícito o seu descontentamento com a maneira pela qual o núcleo duro do governo Lula se encarregou de boicotar o "Fome Zero". Entre as razões para isso estariam, entre outras, a ameaça que o programa poderia representar – seja pelos comitês gestores, seja pela ação dos educadores populares – ao tradicional controle político que as forças conservadoras exerciam em suas localidades. E isso era tudo que o governo e o PT, de olho nas eleições municipais, não queriam. Ao fim do ano de 2004, Frei Betto resolve abandonar o governo Lula, deixando claro seu descontentamento com sua agenda conservadora e eleitoreira.

Considerações finais

Neste texto foi meu objetivo estabelecer algumas conexões entre a atuação de dois intelectuais militantes e a construção de uma nova agenda social no país. Por meio do exame da trajetória cruzada desses dois personagens, podemos adiantar algumas conclusões preliminares.

Na pesquisa sobre esse tema ora em curso, percebe-se que um dos eixos constituidores da nova agenda social brasileira do século XXI foi um conjunto de movimentos de inspiração cristã bem denominado por Michel Löwy como 'cristianismo de libertação'. 20 Por certo, foram muitos os que se envolveram diuturnamente na construção desse eixo, mas não há como deixarmos de considerar o papel protagônico de Betinho e Frei Betto nesse processo.

Betinho e Frei Betto fazem parte de uma mesma 'família política'. Suas origens são semelhantes e eles compartilham determinados valores, assim como defendem a adoção de métodos participativos e voltados para a ação cidadã. Seus itinerários, porém, seguiram rumos diferentes, e eles nem sempre estiveram no mesmo lado político. Betinho, como vimos, depois do drama do exílio, deixa de lado qualquer projeto político-partidário voltado para alcançar o poder. Ao mesmo tempo, alimenta a crença na solidariedade e na capacidade inventiva do povo. Frei Betto, por seu turno, amargou 4 anos de prisão. Saiu dela íntegro e disposto a mergulhar no trabalho pastoral e na educação popular. Durante décadas, tem mantido esse trabalho, o que leva sua experiência no governo – também amarga – a representar apenas um curto período em sua longa carreira de militante social.

NOTAS

Artigo recebido em 22 de janeiro de 2013.

Aprovado em 15 de maio de 2013.

Referências bibliográficas

  • 1 A distinção entre esses dois tipos de intelectuais, por certo inspirada em Max Weber, é apresentada em BOBBIO, Norberto. Os intelectuais e o poder. São Paulo: Ed. Unesp, 1997.
  • 2 Sobre o emprego da noção de itinerário para o estudo da história dos intelectuais, ver SIRINELLI, J. F. Le hasard ou la nécessité? Une histoire en chantier: l'histoire des intellectuels. Vingtième Siècle, Revue d'histoire, n.9, p.97-108, janv.-mars 1986.
  • Ver ainda, do mesmo autor: Intelectuais. In: REMOND, René. Por uma história política. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 1996. p.231-269.
  • 3 O uso da categoria 'intelectual público' baseia-se na seguinte definição de Edward Said: é o "indivíduo dotado de uma vocação para representar, dar corpo e articular uma mensagem, um ponto de vista, uma atitude, uma filosofia ou opinião para (e também por) um público". Ver: SAID, Edward. Representações do intelectual: as conferências Reith 1993. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.
  • 4 A respeito da noção 'família política', ver: DUTRA, Eliane. História e culturas políticas: definições, usos, genealogias. Varia História, Belo Horizonte: Departamento de História da UFMG, n.28, p.13-28, 2002.
  • 5 A respeito das bases do nacional-estatismo, ver: REIS, Daniel Aarão. Ditadura militar, esquerdas e sociedade Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.
  • Sobre o projeto trabalhista, ver, entre outros, NEVES, Lucília de Almeida. PTB: do getulismo ao reformismo (1945-1964). São Paulo: Marco Zero, 1988;
  • GOMES, Angela de Castro. Partido Trabalhista Brasileiro (1945-1964): getulismo, trabalhismo, nacionalismo e reformas de base. In: FERREIRA, Jorge; REIS, Daniel Aarão (Org.). Nacionalismo e reformismo radical (1945-1964) Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. (As esquerdas no Brasil, v.2). p.55-81.
  • 6 Sobre a trajetória da AP, ver importante estudo de RIDENTI, Marcelo. Ação Popular: cristianismo e marxismo. In: RIDENTI, Marcelo; REIS, Daniel Aarão (Org.). Partidos e organizações dos anos 20 ao 60 Campinas (SP): Ed. Unicamp, 2007. (História do marxismo no Brasil, v.5). p.227-302.
  • Ver ainda: CIAMBARELLA, Alessandra. Do cristianismo ao maoísmo. In: FERREIRA, Jorge; REIS, Daniel Aarão (Org.). Revolução e democracia (1964-...) Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. (As esquerdas no Brasil, v.3). p.99-132.
  • 7 Para uma visão de conjunto do itinerário de Betinho, ver: PANDOLFI, Dulce; HEYMANN, Luciana (Org.). Um abraço, Betinho Rio de Janeiro, Ed. FGV/CPDOC/Ibase; Garamond, 2005.
  • 8 Depoimento de Frei Betto ao autor. Rio de Janeiro, 29 fev. 2012.
  • 9 Depoimento de Frei Betto ao autor. Rio de Janeiro, 29 fev. 2012.
  • 10 BETTO, Frei. A mosca azul: reflexão sobre o poder. Rio de Janeiro: Rocco, 2006. p.41.
  • 11 Entrevista com Herbert de Souza (Betinho). In: CAVALCANTI, Pedro Celso Uchôa et al. Memórias do Exílio São Paulo: Ed. Livramento, 1978. p.87.
  • 12 ROLLEMBERG, Denise. Vidas no exílio. In: SEMINÁRIO 40 ANOS DO GOLPE DE 1964. Rio de Janeiro: Faperj; Sete Letras, 2004. p.203-204.
  • Ver da mesma autora: Exílio: entre raízes e radares. Rio de Janeiro: Record, 1999.
  • 13 GUTIÉRREZ, Gustavo. A força histórica dos pobres. Petrópolis (RJ): Vozes, 1981. p.58.
  • 14 BETTO, Frei. Calendário do poder Rio de Janeiro: Rocco, 2006a. p.52.
  • 15 OLIVEIRA, Francisco de; RIZEK, Cibele S. (Org.). A era da indeterminação São Paulo: Boitempo, 2007;
  • e SANTOS, Wanderley Guilherme dos. Horizonte do desejo: instabilidade, fracasso e inércia social. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2006.
  • 16 A respeito da noção de político aqui empregada, ver: ROSANVALLON, Pierre. Por uma história do político São Paulo: Alameda, 2010.
  • 17 Sobre a noção, ver: LEFORT, Claude. A invenção democrática: os limites da dominação autoritária. Belo Horizonte: Autêntica, 2011.
  • 18 Entrevista de Frei Betto ao autor, Rio de Janeiro, 29 fev. 2012.
  • 19 Entrevista ao autor, Rio de Janeiro, 29 fev. 2012.
  • 20 LÖWY, Michel. Cristianismo da Libertação e marxismo: de 1960 a nossos dias. In: RIDENTI, Marcelo; REIS, Daniel Aarão (Org.). Partidos e movimentos após os anos 1960 Campinas (SP): Ed. Unicamp, 2007. (História do Marxismo no Brasil, v.6). p.411-437.
  • 1
    A distinção entre esses dois tipos de intelectuais, por certo inspirada em Max Weber, é apresentada em BOBBIO, Norberto.
    Os intelectuais e o poder. São Paulo: Ed. Unesp, 1997.
  • 2
    Sobre o emprego da noção de itinerário para o estudo da história dos intelectuais, ver SIRINELLI, J. F. Le hasard ou la nécessité? Une histoire en chantier: l'histoire des intellectuels.
    Vingtième Siècle, Revue d'histoire, n.9, p.97-108, janv.-mars 1986. Ver ainda, do mesmo autor: Intelectuais. In: REMOND, René.
    Por uma história política. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 1996. p.231-269.
  • 3
    O uso da categoria 'intelectual público' baseia-se na seguinte definição de Edward Said: é o "indivíduo dotado de uma vocação para representar, dar corpo e articular uma mensagem, um ponto de vista, uma atitude, uma filosofia ou opinião para (e também por) um público". Ver: SAID, Edward.
    Representações do intelectual: as conferências Reith 1993. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.
  • 4
    A respeito da noção 'família política', ver: DUTRA, Eliane. História e culturas políticas: definições, usos, genealogias.
    Varia História, Belo Horizonte: Departamento de História da UFMG, n.28, p.13-28, 2002.
  • 5
    A respeito das bases do nacional-estatismo, ver: REIS, Daniel Aarão.
    Ditadura militar, esquerdas e sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. Sobre o projeto trabalhista, ver, entre outros, NEVES, Lucília de Almeida.
    PTB: do getulismo ao reformismo (1945-1964). São Paulo: Marco Zero, 1988; GOMES, Angela de Castro. Partido Trabalhista Brasileiro (1945-1964): getulismo, trabalhismo, nacionalismo e reformas de base. In: FERREIRA, Jorge; REIS, Daniel Aarão (Org.).
    Nacionalismo e reformismo radical (1945-1964). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. (As esquerdas no Brasil, v.2). p.55-81.
  • 6
    Sobre a trajetória da AP, ver importante estudo de RIDENTI, Marcelo. Ação Popular: cristianismo e marxismo. In: RIDENTI, Marcelo; REIS, Daniel Aarão (Org.).
    Partidos e organizações dos anos 20 ao 60. Campinas (SP): Ed. Unicamp, 2007. (História do marxismo no Brasil, v.5). p.227-302. Ver ainda: CIAMBARELLA, Alessandra. Do cristianismo ao maoísmo. In: FERREIRA, Jorge; REIS, Daniel Aarão (Org.).
    Revolução e democracia (1964-...). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. (As esquerdas no Brasil, v.3). p.99-132.
  • 7
    Para uma visão de conjunto do itinerário de Betinho, ver: PANDOLFI, Dulce; HEYMANN, Luciana (Org.).
    Um abraço, Betinho. Rio de Janeiro, Ed. FGV/CPDOC/Ibase; Garamond, 2005.
  • 8
    Depoimento de Frei Betto ao autor. Rio de Janeiro, 29 fev. 2012.
  • 9
    Depoimento de Frei Betto ao autor. Rio de Janeiro, 29 fev. 2012.
  • 10
    BETTO, Frei.
    A mosca azul: reflexão sobre o poder. Rio de Janeiro: Rocco, 2006. p.41.
  • 11
    Entrevista com Herbert de Souza (Betinho). In: CAVALCANTI, Pedro Celso Uchôa et al.
    Memórias do Exílio. São Paulo: Ed. Livramento, 1978. p.87.
  • 12
    ROLLEMBERG, Denise. Vidas no exílio. In: SEMINÁRIO 40 ANOS DO GOLPE DE 1964. Rio de Janeiro: Faperj; Sete Letras, 2004. p.203-204. Ver da mesma autora:
    Exílio: entre raízes e radares. Rio de Janeiro: Record, 1999.
  • 13
    GUTIÉRREZ, Gustavo.
    A força histórica dos pobres. Petrópolis (RJ): Vozes, 1981. p.58.
  • 14
    BETTO, Frei.
    Calendário do poder. Rio de Janeiro: Rocco, 2006a. p.52.
  • 15
    OLIVEIRA, Francisco de; RIZEK, Cibele S. (Org.).
    A era da indeterminação. São Paulo: Boitempo, 2007; e SANTOS, Wanderley Guilherme dos.
    Horizonte do desejo: instabilidade, fracasso e inércia social. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2006.
  • 16
    A respeito da noção de político aqui empregada, ver: ROSANVALLON, Pierre.
    Por uma história do político. São Paulo: Alameda, 2010.
  • 17
    Sobre a noção, ver: LEFORT, Claude.
    A invenção democrática: os limites da dominação autoritária. Belo Horizonte: Autêntica, 2011.
  • 18
    Entrevista de Frei Betto ao autor, Rio de Janeiro, 29 fev. 2012.
  • 19
    Entrevista ao autor, Rio de Janeiro, 29 fev. 2012.
  • 20
    LÖWY, Michel. Cristianismo da Libertação e marxismo: de 1960 a nossos dias. In: RIDENTI, Marcelo; REIS, Daniel Aarão (Org.).
    Partidos e movimentos após os anos 1960. Campinas (SP): Ed. Unicamp, 2007. (História do Marxismo no Brasil, v.6). p.411-437.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      2013

    Histórico

    • Recebido
      22 Jan 2013
    • Aceito
      15 Maio 2013
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