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A configuração dos espaços ficcionais em O outro pé da sereia, de Mia Couto

Configuration of Fictional Spaces in The other Foot of the Mermaid, by Mia Couto

RESUMO

O objetivo deste artigo consiste em analisar a construção dos espaços nos dois eixos temporais que estruturam a obra O outro pé da sereia (2006). O percurso investigativo adotado desenvolve-se a partir da análise dos recursos empregados na composição dos espaços que estruturam o romance e revelam os diferentes tempos históricos encenados. As contribuições teóricas de Luiz Alberto Brandão (2013), Osman Lins (1976) e Ozíris Borges Filho (2007) fornecem elementos para a compreensão da dinamicidade de que se reveste a categorial espacial na narrativa. Em O outro pé da sereia (2006), a construção dos espaços ficcionais desvela poder e opressão no passado, desolação e reconstrução no presente.

PALAVRAS-CHAVE
Composição; Espaços ficcionais; Estrutura; O outro pé da sereia

ABSTRACT

The objective of this article is to analyze the construction of spaces in the two temporal axes that structure the work The other foot of the mermaid (2006). The investigative path adopted is developed from the analysis of the resources used in the composition of the spaces that structure the novel and reveal the different historical times staged. The theoretical contributions of Luiz Alberto Brandão (2013), Osman Lins (1976) and Ozíris Borges Filho (2007) provide elements for understanding the dynamics of the spatial category in the narrative. In The other foot of the mermaid (2006), the construction of fictional spaces reveals power and oppression in the past, desolation and reconstruction in the present.

KEYWORDS
Composition; Fictional Spaces; Structure; The other foot of the mermaid

A ficcionalização de distintos momentos que marcaram o contexto histórico da colonização de Moçambique é uma constante na produção literária de Mia Couto. Marcado por essa tendência de retomada do passado histórico, o romance O outro pé da sereia (2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.) tem sua tessitura narrativa perpassada por uma proposta de releitura da história pré-colonial e pós-colonial. Como um traço da criação estética do ficcionista, as narrativas nessa obra promovem reinterpretações e dão novos significados a eventos que constituem a trajetória histórica do seu país. No retorno à instância temporal de um passado próximo ou distante, característica da composição estrutural desse romance, tempos, espaços e personagens tencionam em suas representações suscitar diferentes versões, sob diferentes perspectivas, para os mesmos acontecimentos.

Sob essa perspectiva, a apreensão dos espaços, foco da abordagem deste artigo, desenvolve-se a partir da investigação dos elementos que os compõem nos dois planos temporais representados no romance. Inicialmente, o percurso investigativo segue pela análise da estrutura espacial da narrativa encenada em 1560, o foco é projetado para os espaços representativos do passado pré-colonial. Na análise dos espaços pertencentes ao plano temporal de 2002, a ênfase volta-se para os aspectos que constituem a estrutura desses espaços e como eles estabelecem suas relações com o passado histórico.

Dessa forma, as referências espaciais do plano temporal de 1560 são norteadas pela expedição religiosa conduzida pelo missionário português D. Gonçalo da Silveira, de Goa para Moçambique. Nesse contexto histórico, a nau portuguesa Nossa Senhora da Ajuda assume a configuração do elemento espacial que abriga a convivência de universos opostos entre portugueses e africanos. Em sua configuração desvela as articulações de poder que se contextualizam no momento histórico encenado. A apreensão dos espaços ficcionais de 2002 dá visibilidade aos recursos empregados na espacialização das vilas de Vila Longe e Antigamente. Os elementos espaciais articuladores da narrativa, revelam em suas representações as marcas da desolação deixadas pelas sucessivas guerras que assolaram o país.

Diante da dinamicidade revelada pela categoria espacial na obra, as teorias do espaço literário apresentadas, entre outros autores, pelos trabalhos de Osman Lins (1976LINS, Osman. Lima Barreto e o espaço romanesco. São Paulo: Ática, 1976.) sobre o espaço romanesco, a abordagem de Osíris Borges Filho (2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007.) acerca da relação entre espaço e literatura e a obra de Luis Alberto Brandão que abrange as Teorias do Espaço Literário (2013BRANDÃO, Luis Alberto. Teorias do espaço literário. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: FAPEMIG, 2013.) são empregadas como aporte teórico para a proposição de análise desta abordagem.

Um breve percurso teórico do espaço literário

A apreensão das potencialidades da categoria espacial em O outro pé da sereia (2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.) implica no reconhecimento de que as significações que envolvem o elemento espacial na obra vão além dos limites de situar as personagens na extensão geográfica dos seus espaços de atuação. Para além dessa noção, as articulações teóricas do espaço na narrativa revelam que as significações que o envolvem não são refutáveis, mas conciliadoras, conforme afirma Brandão (2013BRANDÃO, Luis Alberto. Teorias do espaço literário. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: FAPEMIG, 2013.). Essa proposta de conciliação parte de um trabalho contextualizador dos diferentes significados que remetem ao espaço literário, possibilitando, assim, depreendê-lo, confirmá-lo e realçá-lo. Segundo a justificativa do autor, “Isso nitidamente se verifica na índole espacial de vertentes importantes das literaturas moderna e contemporânea” (Brandão, 2013BRANDÃO, Luis Alberto. Teorias do espaço literário. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: FAPEMIG, 2013., p. 3). Nessa perspectiva, apreender, em sentido amplo, a noção de espaço, pressupõe lançar mão de um conjunto de referências, daí a impossibilidade de isolamento dos significados.

A definição de espaço, segundo o Dicionário de Teoria da Narrativa, apresenta mais de uma concepção para a categoria:

Entendido como domínio específico da história o espaço integra, em primeira instância, os componentes físicos que servem de cenário ao desenrolar da ação e à movimentação das personagens [...]; em segunda instância, o conceito de espaço pode ser entendido em sentido translato, abarcando então tanto as atmosferas sociais (espaço social) como até as psicológicas (espaço psicológico). (Reis e Lopes, 1988REIS, Carlos; LOPES, Ana Cristina M. Dicionário de teoria da narrativa. São Paulo: Ática , 1988., p. 204).

A definição aponta para duas instâncias de abrangência do conceito de espaço. Uma primeira instância é situada em aspectos mais objetivos e concretos relacionados a aspectos físicos do lugar onde ocorrem as ações das personagens. Nesse sentido, tais aspectos fazem referência a elementos que constituem os cenários de forma a revelar as relações entre as personagens e o espaço que as envolve. Numa outra perspectiva de apreensão, o espaço integra as entrelinhas da subjetividade que perpassa a narrativa, de forma a configurar as atmosferas ligadas tanto ao social, quanto ao psicológico da obra. Os desdobramentos dessa definição são identificados nos estudos desenvolvidos por autores que se debruçam sobre a natureza do elemento espacial no domínio da literatura. Assim, ao ressaltar a importância da categoria espacial na estrutura da obra literária, Lins (1976LINS, Osman. Lima Barreto e o espaço romanesco. São Paulo: Ática, 1976.) posiciona-se contrário ao estabelecimento de uma tipologia do espaço, mas destaca que as possibilidades de apreensão do espaço romanesco revelam a importância que esse elemento estrutural pode assumir na ficção, chegando, inclusive a ser o fulcro e a fonte da ação. Partindo dessa premissa, o autor formula uma definição para o elemento espacial sustentada no princípio de que

o espaço, no romance, tem sido - ou assim pode entender-se - tudo que, intencionalmente disposto, enquadra a personagem e que, inventariado, tanto pode ser absorvido como acrescentado pela personagem, sucedendo, inclusive, ser constituído por figuras humanas, então coisificadas ou com a sua individualidade tendendo para zero. (Lins, 1976LINS, Osman. Lima Barreto e o espaço romanesco. São Paulo: Ática, 1976., p. 72).

Sob esse entendimento, o espaço opõe-se às perspectivas teóricas que o concebem como uma forma estática, linear, tendendo a sua funcionalidade para atuar como pano de fundo do romance. Há o entendimento, portanto, de que sua dinamicidade o impede de ficar reduzido a um horizonte denotativo, posto que os recursos verbais manipulados pelo autor o revestem de um caráter simbólico, em consonância com a dimensão estética do texto literário.

Em sua proposta de topoanálise, Borges Filho (2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007.) dá continuidade a esse aspecto dinâmico do espaço na obra literária apontando possíveis caminhos para a abordagem dessa categoria. Além de abordar os conceitos de espaço, lugar, paisagem e território, o autor destaca, entre outros fatores, as funções do espaço e as perspectivas espaciais como itens a serem considerados na análise do texto literário. Mediante a impossibilidade de classificar os propósitos a que serve a criação do espaço no texto literário, Borges Filho destaca sete funções do espaço: 1. Caracterizar as personagens, situando-as no contexto socioeconômico e psicológico em que vivem; 2. Influenciar as personagens e também sofrer suas ações; 3. Propiciar a ação; 4. Situar a personagem geograficamente; 5. Representar os sentimentos vividos pelas personagens; 6. Estabelecer contraste com as personagens; 7. Antecipar a narrativa (Borges Filho, 2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007.). É possível identificar no desdobramento dessas funções uma performance do elemento espacial que abrange tanto uma instância mais concreta de constituição de cenário, quanto um delineamento mais subjetivo capaz de relacionar o espaço, os sentimentos e a posição social das personagens.

Na perspectiva de uma apreensão mais abrangente do espaço, Borges Filho (2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007.) faz referência à atuação do narrador na criação do espaço dentro da narrativa, caracterizando, assim, o que o autor define como espacialização. Para essa identificação, o autor ressalta: “[...] deve-se refletir sobre a maneira pela qual o narrador ou o eu-lírico cria o espaço na obra literária. Temos de desvendar quais recursos são utilizados, trata-se, portanto, de uma questão que remete à ideia de focalização (2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007., p. 61). Vincula-se a esse processo de criação a atuação do narrador, o modo como a instância narrativa, utilizando-se de recursos descritivos, revela e recria os espaços no romance.

As diferentes noções de espaço formuladas pelas correntes teóricas, segundo Brandão (2013BRANDÃO, Luis Alberto. Teorias do espaço literário. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: FAPEMIG, 2013.), dividem-se no segmento de duas tendências: a primeira, de linhagem estruturalista, elege como primazia a espacialidade da linguagem em detrimento do valor mimético do espaço como categoria literária. A segunda, de cunho sociológico e cultural, segue um sentido oposto e concebe o espaço como representação do social, passível de ser conhecido no âmbito extratextual.

Partindo desses dois direcionamentos, são definidos quatro modos de abordagem do espaço no texto literário, no âmbito da produção teórica e crítica, assim elencados por Brandão (2013BRANDÃO, Luis Alberto. Teorias do espaço literário. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: FAPEMIG, 2013.): representação do espaço, espaço como forma de estruturação textual, espaço como focalização e espaço da linguagem.

A representação do espaço é o modo mais recorrente de análise, pois está relacionado à representação dessa categoria no texto literário. Na definição de Brandão: “Aqui se entende espaço como ‘cenário’ ou seja, lugares de pertencimento ou trânsito dos sujeitos ficcionais, recurso de contextualização da ação” (2013BRANDÃO, Luis Alberto. Teorias do espaço literário. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: FAPEMIG, 2013., p. 59). Fazem parte dessa representação o que o autor denomina de significados translatos, ou seja, os espaços metafóricos do social e do psicológico. O primeiro é analisado numa perspectiva histórica, cultural e ideológica. O segundo apresenta um enfoque subjetivista, compreendendo uma atmosfera mais intimista criada pelos diferentes sentimentos que movem narrador e personagem. Sob esse enfoque, são analisados os efeitos produzidos por procedimentos descritivos e narrativos empregados na construção do texto.

Como o próprio nome indica, o espaço como forma de estruturação textual é uma ocorrência intrinsecamente relacionada aos procedimentos de estruturação do texto. Nesse modo, privilegiam-se como feição espacial os recursos empregados na produção do efeito de simultaneidade, como forma de estabelecer articulações entre as categorias estruturais da obra.

O espaço como focalização constitui-se por meio da direta participação do narrador, pois dá visibilidade ao ponto de vista, à visão perceptiva do narrador em relação ao espaço observado e ao espaço de onde se observa. Sobre esse modo de ocorrência espacial, o autor destaca: “Em sentido estrito, [...] trata-se da definição da instância narrativa: da ‘voz’ ou do ‘olhar’ do narrador. Em sentido amplo, trata-se do efeito gerado pelo desdobramento, de todo discurso verbal, em enunciado” (2013BRANDÃO, Luis Alberto. Teorias do espaço literário. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: FAPEMIG, 2013., p. 62). Sobressai, nesse processo, a visão que perpassa a narrativa, é o espaço revelando-se pelo ponto de vista do narrador, de forma a assumir sua própria representação.

O quarto modo de apreensão do espaço na literatura é embasado no princípio de que “[...] há uma espacialidade própria da linguagem verbal. Afirma-se que a palavra é também espaço” (Brandão, 2013BRANDÃO, Luis Alberto. Teorias do espaço literário. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: FAPEMIG, 2013., p. 63). Tal assertiva funda-se em dois argumentos: primeiro, no argumento de que tudo que é da ordem das relações da estrutura da linguagem é espacial. Isso porque os elementos internos que compõem a estrutura do espaço do texto constituem-se na linguagem que dá forma ao espaço. O segundo argumento apoia-se na ideia de que a linguagem é espacial devido à materialidade dos signos que a constituem. Quanto aos recursos que constituem a espacialidade e o espaço do texto, Barbieri apresenta a seguinte distinção:

A espacialidade do texto é caracterizada pelo uso de recursos artísticos e plásticos empregados na sua composição, tais como ritmo, sonoridade, pausas, repetições e outros, enquanto o espaço do texto é constituído pela organização estrutural deste em capítulos, parágrafos, frases. (Barbieri, 2009BARBIERI, Claudia. Arquitetura literária: sobre a composição do espaço narrativo. In: BORGES FILHO, Oziris; BARBOSA, Sidney, orgs. Poéticas do espaço literário. São Carlos, SP: Editora Claraluz, 2009., p. 122).

A espacialidade do texto, portanto, é um caminho encontrado para uma estreita ligação entre o que está sendo narrado e o modo como se processa essa escrita do texto. Dessa forma, o autor busca reproduzir na elaboração das frases e parágrafos o efeito sonoro desejado. Para esse fim, explora, entre outros, os efeitos gerados pelas pausas e pela repetição dos sons das palavras, recursos que dão ao texto o ritmo correspondente à ação narrada.

Sobre os quatro modos de apreensão do espaço, Brandão (2013BRANDÃO, Luis Alberto. Teorias do espaço literário. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: FAPEMIG, 2013.) sugere que antes de serem refutáveis, podem ser conciliadores no sentido de possibilitar, de forma mais abrangente, a apreensão dos diferentes modos de constituição do espaço no texto literário. Em consonância com essa proposta, em O outro pé da sereia, as diferentes representações de que se reveste essa categoria possibilitam a articulação das diferentes apreensões do espaço na construção da análise.

A configuração dos espaços subjugados de 1560

A construção dos espaços ficcionais no plano temporal de 1560 em O outro pé da sereia tem como eixo norteador a viagem messiânica de D. Gonçalo da Silveira, de Goa para Moçambique. A viagem encena o processo de colonização de Moçambique iniciado no século XVI com a primeira incursão católica dos portugueses no império do Monomotapa. Os eventos que marcaram essa fase pré-colonial mantêm um diálogo anacrônico com acontecimentos do tempo presente, quando as reminiscências da chegada dos portugueses reaparecem e desvelam o passado histórico.

A incursão do Jesuíta português na África é alicerçada na constituição da categoria espacial, ganhando especial relevo no espaço do navio Nossa Senhora da Ajuda, local privilegiado para serem desveladas as ações que repercutirão em outros tempos e em outros espaços da obra. O indicativo dessa configuração espacial pode ser identificado nos primeiros momentos da partida, na descrição da passagem:

A nau Nossa Senhora da Ajuda acaba de sair do porto de Goa, rumo a Moçambique. Cinco semanas depois, em Fevereiro de 1560, chegará à costa africana. Com Nossa Senhora da Ajuda seguem mais duas naus: São Jerónimo e São Marcos. Nos barcos viajam marinheiros, funcionários do reino, deportados, escravos. Mais do que todos, porém, a nau conduz D. Gonçalo da Silveira, o provincial dos jesuítas na Índia portuguesa. [...] O propósito da viagem é realizar a primeira incursão católica na corte do Império do Monomotapa. Gonçalo da Silveira prometeu a Lisboa que baptizaria esse imperador negro [...]. Por fim, África inteira emergiria das trevas e os africanos caminhariam iluminados pela luz cristã. (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 51).

O distanciamento da terra firme, as referências ao navio como lugar extremo, universo isolado e mundo condensado são expressões que projetam sobre a embarcação a simbologia que envolve o evento histórico da viagem. Contribuem para potencializar o foco sobre essa missão as estratégias utilizadas pelo autor na caracterização do elemento espacial representado pelo navio, de forma a configurá-lo como uma espécie de micromundo, criado para abrigar universos opostos representados pelos portugueses e africanos. Essa convivência de mundos dá visibilidade à materialização dos diferentes discursos, o eurocêntrico e o contradiscurso manifestado por aqueles que fazem parte do outro mundo, irreconhecível, oculto, invisível, assim referenciados:

O padre Manuel Antunes terminou o dia arrumando o seu pequeno agasalho, o minguado espaço que lhe cabia por quarto. [...] Foi lendo as oficiais escrituras e dando conta dos nomes da viagem e do seu destino. Chamavam de Torna-Viagem a este percurso da Índia para Portugal. E chamavam de Contra-Costa ao Oriente de África. Tudo fora nomeado como se o mundo fosse uma lua: de um só lado visível, de uma só face reconhecível. E os habitantes do mundo oculto nem o original nome de “gentios” mantinham. Designavam-se, agora, de “cafres”. A palavra fora roubada aos árabes. Era assim que estes chamavam aos africanos. Os cafres eram os infiéis. Não porque tivessem outra fé. Mas porque se acreditava não terem nenhuma. (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 62).

A leitura do documento, conforme descreve a passagem, remete a outros espaços, embora de configuração mais subjetiva e abstrata. Em relação ao espaço do aposento onde ocorre a cena, há a referência a espaços imaginários construídos a partir de uma percepção de valores eurocêntricos. Em consonância com o que observa Lins, “[...] tudo na ficção sugere a existência do espaço - e mesmo a reflexão, oriunda de uma presença sem nome, evoca o espaço onde proferem e exige um mundo no qual cobra sentido” (Lins, 1976LINS, Osman. Lima Barreto e o espaço romanesco. São Paulo: Ática, 1976., p. 69). Interferem na construção desse sentido, pontuado por Lins, as inferências do narrador, que, assumindo a postura reflexiva da personagem, não se furta em analisar criticamente a cartografia da costa africana construída pelos portugueses. A denominação de Contra-Costa é empregada para corroborar com a visão do continente como o lado irreconhecível do mundo, visão que se estende aos habitantes desse espaço. A emissão desse juízo de valor pelo prisma espacial nas primeiras cenas da viagem antecipa o que será consolidado à medida que vão se intensificando os contatos e, consequentemente, estabelecendo-se a delimitação de territórios no navio.

Essa atuação do espaço no romance encontra possível correspondência na proposição apresentada por Barbieri (2009BARBIERI, Claudia. Arquitetura literária: sobre a composição do espaço narrativo. In: BORGES FILHO, Oziris; BARBOSA, Sidney, orgs. Poéticas do espaço literário. São Carlos, SP: Editora Claraluz, 2009.) em sua abordagem sobre a composição do espaço narrativo. Partindo de pressupostos que ampliam o campo de atuação do elemento espacial na obra literária, a autora pontua:

O espaço na narrativa, muito além de caracterizar os aspectos físico- geográficos, registrar os dados culturais específicos, descrever os costumes e individualizar os tipos humanos necessários à produção do efeito de verossimilhança literária, cria também uma cartografia simbólica em que se cruzam o imaginário, a história, a subjetividade e a interpretação. A construção espacial da narrativa deixa de ser passiva - enquanto um elemento necessário apenas à contextualização e pano de fundo para os acontecimentos - e passa a ser um agente ativo: o espaço, o lugar como um articulador da história. (Barbieri, 2009BARBIERI, Claudia. Arquitetura literária: sobre a composição do espaço narrativo. In: BORGES FILHO, Oziris; BARBOSA, Sidney, orgs. Poéticas do espaço literário. São Carlos, SP: Editora Claraluz, 2009., p. 105).

Sob a perspectiva da cartografia simbólica do espaço, há a possibilidade de apreensão dessa categoria dentro de um campo mais abrangente, para além de uma caracterização dentro dos limites físico e geográfico. Ao encontro dessa perspectiva, as variadas formas de manifestação do espaço em O outro pé da sereia suscitam esse viés de investigação, devido às diferentes representações que assumem na produção de sentidos do romance.

Em sua análise sobre os espaços cartográficos do romance, Luana Antunes Costa compara a espacialidade da nau portuguesa com uma sociedade colonial. Nesse sentido, a pesquisadora afirma: “[...] o navio, sintetizador de toda a carga simbólica da viagem, é o espaço das transformações mestiças mais emblemáticas do romance” (Costa, 2008COSTA, Luana Antunes. Pelas águas mestiças da história: uma leitura de O outro pé da sereia de Mia Couto. Niterói: Instituto de Letras, 2008. 140f. Dissertação. Universidade Federal Fluminense, 2008., p. 77). Diante disso, a demarcação dos espaços ocupados por portugueses e africanos, em suas posições de poder e opressão, faz da nau portuguesa o cenário privilegiado para que os personagens sejam revelados em seus diferentes papéis, de forma que o navio pode ser concebido como o espaço embrionário das relações que nortearão a sucessão dos acontecimentos no desenrolar da narrativa. Uma das ações significativas que enlaça os dois planos temporais do romance ocorre dentro dos espaços do navio, quando descobrem que o escravo Nimi Nsund cerra o pé da imagem de Nossa Senhora:

- Onde está o pé? Onde o escondeste, maldito? Levaram-no para o porão e ali o colocaram sob vigilância. Nem que fosse à pancada o homem haveria de confessar a razão do crime e o paradeiro da amputada parte. Caso não confessasse durante a noite, na manhã seguinte ele seria pingado: verteriam óleo fervente sobre a pele nua para que revelasse os motivos do seu infante acto. Depois, seria enforcado no mastro para servir de exemplo. (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 198).

A cena condensa a carga simbólica que envolve as ações no espaço do navio. O porão serve de cenário para as ameaças de tortura que sofrerá o negro caso não confesse o que o levou a amputar a imagem, atitude considerada pelos portugueses como um crime, uma afronta à religiosidade cristã. A atmosfera é criada pelos elementos cênicos empregados na composição do ambiente, que projetam imagens de opressão e tortura. Portanto, engendrada no espaço da nau portuguesa, a narrativa conduz parte significativa do enredo nesse plano temporal do passado, o que dá visibilidade ao papel desempenhado por tal categoria na constituição da estrutura do romance.

Ao encontro da ideia de sociedade colonial apontada por Costa (2008COSTA, Luana Antunes. Pelas águas mestiças da história: uma leitura de O outro pé da sereia de Mia Couto. Niterói: Instituto de Letras, 2008. 140f. Dissertação. Universidade Federal Fluminense, 2008.), o navio é inserido num quadro de referências históricas, representativas de uma época quando se estabelecem os primeiros contatos civilizatórios entre portugueses e africanos. Nos espaços da nau, esses contatos são impregnados de valores atribuídos à raça, à cultura e à religiosidade dos escravos, observados no excerto:

Os padres passavam agora à segunda cobertura. Era ali que se encontravam os seus camarotes. Aquela era a fronteira do seu território seguro, a última das realidades visíveis. Seguiram descendo para a terceira e última cobertura onde se localizava o paiol das drogas e o paiol da pimenta. Nossa Senhora da Ajuda não era um navio negreiro. Os poucos escravos viajavam no porão onde se acumulavam as bagagens dos tripulantes. Os barcos especializados em carregar mercadoria humana chegariam depois e infestariam de maldição os mares do Índico. (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 200).

Na passagem, a representação do espaço do navio construída pela narrativa desvela as articulações de poder que se contextualizam no momento histórico encenado pelo romance. A organização do espaço geográfico dividido em níveis de cobertura, mais que a possibilidade de gerar uma imagem arquitetônica, adquire um significado de limites de ocupação destinado às configurações sociais e de poder representadas pela distribuição espacial. Esse efeito de sentido é reforçado com o emprego das palavras “fronteira” e “território”, demarcando, assim, as diferentes articulações que os espaços estabelecem entre si.

Segundo Borges Filho (2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007.) a palavra “território” está relacionada às relações de poder na obra literária. As possibilidades de análise sob essa perspectiva visam a “[...] estudar as relações de poder que enfeixam a obra literária” (Borges Filho, 2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007., p. 29). Portanto, a apreensão do espaço enquanto território dá-se pelas relações de poder e de dominação entre os portugueses e os escravos africanos, haja vista o contexto histórico pré-colonial encenado.

Os procedimentos descritivos empregados revelam que a construção do espaço pela narrativa é indissociável de valores. O espaço ocupado pelos escravos assume a representação de um imaginário histórico pelas referências ao navio negreiro e à dimensão simbólica que envolve o tratamento dado à “mercadoria humana” que era carregada no espaço do porão. As condições de sobrevivência dos escravos nesse espaço marcam pontos dramáticos da narrativa. Na sua configuração, o elemento espacial traduz essa dramaticidade, porquanto torna possível o encadeamento das ações, como ocorre na sequência mostrada no excerto:

A algazarra do porão tornara-se mais intensa como se brotasse não do ventre do navio, mas das profundezas do oceano. Era algo que, desde sempre, alvoroçara Gonçalo da Silveira: o modo como os negros gargalhavam, a felicidade da felicidade, a disponibilidade para a lascívia. Faltava aos selvagens não apenas um credo. Faltava-lhes moderação na alegria, tanto no riso, parcimónia na paixão. A gargalhada é mulher, o riso é masculino. A primeira é própria dos bichos, a segunda é humana. Havia que humanizar os escravos. Afinal, para corrigir a gargalhada bem podia servir a gargalheira, essa coleira de ferro que prendia os escravos pelo pescoço. Era isso: a gargalhada pedia a gargalheira. (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 201).

É possível depreender do excerto que a representação espacial do navio serve a diferentes propósitos no romance. Em consonância com a nomenclatura utilizada por Brandão (2013BRANDÃO, Luis Alberto. Teorias do espaço literário. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: FAPEMIG, 2013.), o espaço funciona como “dínamo textual”, de forma que a correlação de sentidos que se estabelece entre o espaço do porão e seus ocupantes condiciona a reação de repúdio do padre às manifestações de felicidade dos escravos. Complementam a formação da imagem que serve de cenário para essas manifestações as percepções sensoriais engendradas nas descrições do narrador. São descrições de caráter mais subjetivo, vinculadas à esfera do sensível, aos espaços imaginários. Os atributos empregados pelo missionário para caracterizar os negros como selvagens, bichos sem credo e sem moderação libidinosa são gerados pela percepção auditiva dos sons que ecoavam do porão do navio.

A tensão dos espaços na narrativa dá-se ainda por meio das manifestações culturais reivindicadas como representação identitária dos escravos. A narrativa cria uma atmosfera de suspense acentuada com a negativa de D. Gonçalo para que fosse realizada a cerimônia, por ele considerada pagã, nos espaços da nau:

Antunes já tinha completado as orações, mas, para os habitantes do porão, o falecimento de Nsundi pedia uma outra cerimónia. Os escravos queriam tocar tambores, cantar e dançar. Purificar o navio. Enviaram um representante ao convés para que levantasse a interdição. Faziam-no sem qualquer esperança. Silveira já se manifestara sobre o assunto. [...] Como seria de esperar, a missa pagã foi negada pelo capitão e por Silveira. Passado um tempo, um soldado avisou: o ambiente no convés se tornara tenso, os escravos conspiravam entre si. O capitão receou um motim. (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 205).

A atmosfera que se descreve tem como motivação o impasse gerado pelo desejo dos escravos em manifestar suas crenças e a recusa do missionário em ceder à realização de uma cerimônia contrária aos princípios cristãos nos espaços da nau. O efeito criado pelo emprego de expressões que dão uma ideia de ambiente tenso, conspiração e motim auxilia na criação desse cenário que envolve as ações no ambiente do navio. Em consonância com o conceito de Lins: “A atmosfera, designação ligada à ideia de espaço, sendo invariavelmente de caráter abstrato - de angústia, de alegria, de exaltação, de violência etc. -, consiste em algo que envolve ou penetra de maneira sutil as personagens” (Lins, 1976LINS, Osman. Lima Barreto e o espaço romanesco. São Paulo: Ática, 1976., p. 76). Ainda sobre o potencial de envolvimento da atmosfera, o autor ressalta que há casos em que “o espaço justifica-se exatamente pela atmosfera que provoca” (Lins, 1976LINS, Osman. Lima Barreto e o espaço romanesco. São Paulo: Ática, 1976., p. 76).

A atmosfera de exaltação se intensifica à medida que avança do porão para o convés, uma forma de ocupação que sugere o confronto de forças, uma manifestação de resistência dos escravos ao silenciamento imposto pelos portugueses. É possível perceber, portanto, a importante atuação do elemento espacial no sentido de contribuir, por meio dos sentidos gerados pelas coberturas inferiores e superiores, na criação da atmosfera correspondente às ações encenadas.

A disposição dos espaços do navio em coberturas remete à ideia de coordenadas espaciais que se organizam, segundo Borges Filho (2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007.), a partir dos eixos horizontal e vertical, importando para a análise os valores que assumem no texto literário. Uma correspondência entre as coordenadas do eixo vertical e a divisão de territórios no navio pode ser observada mediante as concessões de espaços para a celebração da religiosidade de portugueses e africanos. Ao encontro do que observa Borges Filho: “Se na obra esse eixo for tematizado, então se deve verificar quais são os valores que o impregnam” (Borges Filho, 2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007., p. 57). Numa correlação de valores, a missa cristã pode ser realizada no andar superior, no convés. Em contrapartida, a cerimônia pagã dos escravos fica restrita ao piso inferior da nau, ao espaço do porão.

A explicação para a devida ocupação desses espaços é dada por D. Gonçalo: “os escravos que rezassem do único modo que Deus poderia entender” (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 205). Assim, por ser uma cerimônia reconhecida pelas leis celestiais, justifica uma ocupação privilegiada, assistida por todos. O contrário ocorreria com os cânticos, as danças e o toque dos tambores: “E nenhum dos brancos na nau Nossa Senhora da Ajuda teria paciência para conviver com uma ruidosa cerimónia pagã” (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 205). Sob essa configuração, por meio do elemento espacial veiculam os valores da época atribuídos, sob o prisma de uma visão eurocêntrica, aos que estão confinados aos espaços inferiores do universo do navio.

A representação do espaço do navio na narrativa ocorre, ainda, como efeito da experiência sensorial. Na dimensão estética do romance, essa representação segue a via do simbólico, resultante do trabalho artístico do texto, pois as imagens geradas na descrição das sensações dão forma ao espaço que se torna visível aos olhos do leitor:

Finalmente, Gonçalo da Silveira venceu os últimos degraus que o conduziram ao ventre do navio. [...] Foi então que Gonçalo sentiu os cheiros. Esperava que no ventre do navio se encontrassem os perfumes da canela e das especiarias, mas os aromas eram outros. Bem mais azedos. [...] Olhou em volta, perscrutando na penumbra: ali se agrupavam os escravos. (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 201).

A expressa oposição entre o pressentimento e a imagem com a qual D. Gonçalo se depara auxilia na representação sensorial do espaço. Tal oposição torna-se mais intensa a partir do contraste gerado com o emprego das expressões “perfumes da canela e das especiarias”, opondo-se a cheiros azedos para fazer referência à presença dos escravos no espaço das cargas. Nessa linha de pensamento, o elemento espacial se expressa por meio de motivações sensoriais do olfato, tensionadas na própria dinâmica do enredo.

O modo de percepção do espaço pelo ponto de vista sensorial da personagem é tratado por Borges Filho (2009BORGES FILHO, Ozíris. Espaço, percepção e literatura. In: BORGES FILHO, Oziris; BARBOSA, Sidney, orgs. Poéticas do espaço literário. São Carlos, SP: Editora Claraluz , 2009.), como mais uma das possibilidades interpretativas que emergem da relação entre o elemento espacial e a personagem na obra. Nessa perspectiva, o autor trabalha com a noção de “gradientes sensoriais” para fazer referência aos sentidos utilizados pelo homem nesse processo perceptivo. Segundo o autor, pela sensibilidade do sentido do olfato há a possibilidade de se captar sugestões de imagens e ideias sobre a espacialidade no romance. Conforme enfatiza o autor, “Outro dado muito interessante ligado ao olfato é que o odor pode mais facilmente que os outros sentidos evocar lembranças carregadas emocionalmente” (Borges Filho, 2009BORGES FILHO, Ozíris. Espaço, percepção e literatura. In: BORGES FILHO, Oziris; BARBOSA, Sidney, orgs. Poéticas do espaço literário. São Carlos, SP: Editora Claraluz , 2009., p. 179). Portanto, na descrição dos cheiros que circulavam pelo porão, o narrador põe em evidência os efeitos de sentido gerados por meio da percepção de Dom Gonçalo sobre o espaço ocupado pelos escravos. Depreende-se uma percepção negativa intermediada pelo espaço, mas projetada para seus ocupantes. É como elemento desse cenário que atua a nau portuguesa, como espaço subjugado de um contexto que preanuncia o sistema opressor da colonização que deixa suas marcas nos espaços encenados no tempo presente.

Vila Longe e Antigamente: os espaços desolados do presente

Em O outro pé da sereia (2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.), a temporalidade do presente situa suas ações em dois espaços da narrativa: Vila Longe e Antigamente. São espaços interligados à representação de um tempo pós-colonial, reveladores da desolação deixada pelas guerras e da frustação a que sucumbiu a esperança nas mudanças que viriam com o pós-independência.

O espaço de Antigamente pode ser compreendido como um elemento articulador da narrativa. É nele que Madzero encontra o baú contendo os restos mortais de D. Gonçalo, os manuscritos e a imagem da santa com o pé decepado. Como esse plano temporal é um reflexo do que ocorreu em 1560, elementos que fizeram parte desse passado histórico são evocados e marcam presença nos espaços do presente.

A ideia de espacialização é inicialmente criada por meio das referências ao espaço de Antigamente que aparecem no primeiro capítulo, introduzindo a narrativa no tempo presente. De acordo com Borges Filho: “Por espacialização entendemos a maneira pela qual o espaço é instalado dentro da narrativa” (Borges Filho, 2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007., p. 61). Vincula-se a esse processo de criação a atuação do narrador, o modo como a instância narrativa, utilizando-se de recursos descritivos, revela e recria os espaços.

Nessa perspectiva, o lugarejo de Antigamente é apresentado com a seguinte caracterização:

Naquelas esqueléticas paragens só chove quando os joelhos dos bois tocam o chão, as mulheres cantam e os homens rezam. Mas fazia tempo que não havia bois, há muito que as mulheres tinham emudecido e os homens perdido a crença. Todavia, aquele lugar nem sempre fora um território isolado, longe do mundo, do outro lado do tempo. [...] Podia-se dizer de Madzero que era tonto mas, ao menos, ele escolhera viver nesse lugar de que esqueceram os caminhos. Há anos que ele quase não cruzava com alma vivente. A única pessoa de seu convívio era Mwadia (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 15-16).

A descrição do espaço revela um lugar inóspito, uma paisagem devoluta em estado de degradação. A sequência gradativa de ausências reforça a imagem de decadência que a narrativa projeta sobre o lugar escolhido como refúgio para os personagens Madzero e Mwadia. Outra coordenada espacial, que também dá contorno a essa imagem, é o indicativo de território longínquo, isolado do mundo, que segue outro percurso de tempo.

Essa caracterização do espaço evoca a ideia de paisagem apresentada por Borges Filho (2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007.), como um conceito relacionado ao espaço, porém com o diferencial de estar associado a implicações subjetivas que perpassam tanto o olhar do narrador quanto da personagem. Segundo o autor, “A ideia de paisagem estará ligada ao olhar da personagem e/ou narrador. [...] Como se sabe, nenhum olhar é neutro, daí que a vivência da personagem e ou narrador determinará o conceito que esta terá do espaço que vê” (Borges Filho, 2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007., p. 52). Uma possível ocorrência desse conceito dá-se com a descrição feita pelo narrador ao utilizar a expressão “esqueléticas paragens” para fazer referência ao lugar de morada dos personagens.

As conexões entre a atuação do personagem e a constituição da paisagem são um princípio que norteia a definição do termo feita por Michel Collot (1990COLLOT, Michel. Pontos de vista sobre as percepções da paisagem. Boletim da Geografia Teorética, Rio Claro, v.20, 1990, p. 21-32. ). Nesse sentido, o autor afirma: “Essa coerência, essa convergência de seus elementos constitutivos torna também a paisagem apta a significar: ela se apresenta com uma unidade de sentidos, ela fala a quem olha” (Collot, 1990COLLOT, Michel. Pontos de vista sobre as percepções da paisagem. Boletim da Geografia Teorética, Rio Claro, v.20, 1990, p. 21-32. , p.24). Dessa forma, a percepção da paisagem é constituída pelo olhar observador e atento do narrador que organiza, interpreta e constrói significados a partir do que vê.

O indicativo de distância é retomado em outro momento da narrativa, quando Mwadia informa a localização de Antigamente com as referências: “- Fica do lado de lá do rio, do lado de lá da montanha” (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 123). No entanto, não se trata apenas de uma distância física, mas de uma distância que ultrapassa as fronteiras do mundo real, devido à simbologia que envolve o rio na narrativa. Sua travessia configura-se numa espécie de portal que dá acesso a outros planos. Nesse sentido, vale ressaltar o que pontua Valentim sobre a relação de Mwadia com o espaço: “[...] Antigamente pode ser entendido como uma reiteração do caráter mítico da personagem” (Valentim, 2011VALENTIM, J. V. Entre mapas movediços e águas míticas, alguns jogos de espelho em O outro pé da sereia, de Mia Couto. In: MWEW, Christin Muleka; SÁ, Ana Lúcia; VAZ, Alexandre Fernandez, orgs. O verso do anverso: teoria, crítica e literaturas africanas. Nova Petrópolis: Nova Harmonia, 2011., p. 37). Reforçam essa ideia os recursos descritivos que auxiliam na produção dos sentidos propostos pela narrativa, ao criar um lugar que possibilite o trânsito entre memória e esquecimento, realidade e imaginação, vida e morte.

É através da visão topográfica do narrador que o vilarejo é apresentado aos olhos do leitor. Contudo, trata-se de uma topografia revestida de subjetividade, mantendo assim, uma estreita ligação com a história dos dois personagens: “Mwadia perdera a conta ao tempo naquele exílio de tudo, naquela desistência de todos. No início, Mwadia acreditou que eles buscassem refúgio para escapar da guerra” (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 32). Mais que a fuga de um lugar para outro, há a fuga da própria existência. Não obstante às adversidades reais da guerra, há motivos maiores que conduzem Mwadia e Madzero ao exílio. O efeito provocado pela expressão “desistência de todos” é de ausência de vida, lugar para se conviver com a morte.

As relações de Mwadia com Antigamente traçam uma analogia entre o espaço que a personagem ocupa e os sentimentos que a constituem. Relação que também se manifesta com o espaço de Vila Longe, cuja topografia está intrínseca à ideia de retorno que move a personagem a um espaço resgatado da zona do esquecimento nesse momento da narrativa:

Quando entrou em Vila Longe era noite madura [...]. A vila era de bom tamanho, suficiente para merecer igreja e praça. Mwadia podia caminhar de olhos fechados, guiada pelo sentimento de estar vagueando por dentro do seu próprio corpo. Constrangida, foi atravessando as ruelas. O ruído dos cascos do burro era a sua única defesa contra o medo. Perfilou-se perante a velha casa e um arrepio a fez estancar. A casa da infância é como um rosto de mãe: contemplamo-lo como se já existisse antes de haver o Tempo. (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 68).

Para além dos estímulos visuais apresentados, as referências espaciais expressam uma luta interna da personagem com o seu destino, os conflitos que envolvem o seu retorno à terra natal, a angústia do confronto com o passado e com a sua história. Tem-se, assim, uma visível interferência do elemento espacial no destino da personagem, servindo inclusive de fulcro da ação, no momento da chegada de Mwadia a Vila Longe. Esse sentimento de confronto, de luta interna provocada pelo retorno pode ser percebido no excerto: “E sentiu saudade do seu oculto lugar, além do rio. Ao menos lá, em Antigamente, ela se esquecia de ter nome, ter rosto, ter idade” (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 71). É possível perceber que os sentimentos e a própria identidade da personagem são influenciados pelos espaços por onde ela transita.

A imagem dos espaços da Vila projetada pelo pensamento da personagem apontam para a simbólica permanência das marcas do passado que subsistem nos espaços do presente:

Qualquer coisa desmoronou na alma de Mwadia quando entrou no recinto da igreja. O edifício estava em ruínas. Não havia telhado, janelas, portas. Restavam paredes sujas. [...] Mwadia afastou-se das ruínas e dirigiu-se para o cemitério, bem ao lado da igrejinha. Mal entrou no recinto, a moça se arrependeu. A destruição do cemitério começara ainda no tempo em ela vivia na Vila. (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 96).

[...]

Ao chegar à praça, Mwadia se espantou: o que restava da barbearia não era mais que uma parede arruinada [...]. Tudo se tinha desmoronado durante a guerra. (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 121).

A expressão inicial “desmoronou na alma” transmite a ligação da personagem com a espacialidade de Vila Longe, pois instaura uma correlação de sentidos gerados pela ideia de desmoronamentos da alma e dos espaços. Nesse processo, o narrador imprime na descrição dos espaços o desapontamento de Mwadia ao se deparar com o estado de ruínas em que se encontra sua vila natal. A caracterização precisa dos escombros da igreja e das partes destruídas da barbearia corresponde, segundo Borges filho (2007BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007.), a um tipo de espacialização minuciosa. Os efeitos desse tipo de espacialização para a narrativa são de realce do saldo deixado pelos anos de guerrilha no país, remetem às lutas armadas que ocorreram após a independência e perduraram durante dezesseis anos, deixando um grande rastro de devastação em todo o território moçambicano. Portanto, as imagens de ruína estão impregnadas de sentidos relacionados ao tempo e às ações das personagens nesse momento histórico encenado pelo romance, imagens que se estendem para os espaços mais amplos de Vila Longe.

Embora sejam possíveis as relações com espaços extratextuais, o estado de desolação identificado na caracterização de Vila Longe atende à proposta de estruturação do universo ficcional. Dessa forma, o elemento espacial não atua isoladamente, mas, aliado a outras categorias, constitui a composição enunciativa do romance no sentido de propor, pelo viés estético, diferentes olhares e questionamentos acerca de temáticas que atravessam o enredo. Nesse sentido, Lins alerta para o fato de que

O estudo do tempo ou do espaço num romance, antes de mais nada, atém-se a esse universo romanesco e não ao mundo. Vemo-nos ante um espaço ou um tempo inventados, ficcionais, reflexos criados do mundo e que não raro subvertem - ou enriquecem, ou fazem explodir - nossa visão das coisas. (Lins, 1976LINS, Osman. Lima Barreto e o espaço romanesco. São Paulo: Ática, 1976., p. 64).

Portanto, as referências à guerra revestem-se, sobretudo, de sentidos históricos ligados à guerra civil moçambicana. Lançando mão de tal temática, a dimensão espacial do romance gera imagens de ruína que dão contorno ao espaço social representado no plano temporal do presente. Além de imagens sugestivas, complementa a composição desse cenário a presença das minas terrestres como mais um indício dos rastros deixados pela guerra no país: “A versão era a seguinte: o burriqueiro morrera há uns dois anos quando pisou uma mina. [...] O eco da explosão chegou a Vila Longe. Quando acorreram não restava nada que desse conta da identidade da vítima (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 92)”. A imagem do potencial destrutivo da mina é gerada pelo som da explosão e pela ideia de esfacelamento da vítima. Os recursos empregados nessa descrição são responsáveis, de acordo com Barbieri, “[...] pela composição dos ambientes e que contribuem na criação da atmosfera do texto” (Barbieri, 2009BARBIERI, Claudia. Arquitetura literária: sobre a composição do espaço narrativo. In: BORGES FILHO, Oziris; BARBOSA, Sidney, orgs. Poéticas do espaço literário. São Carlos, SP: Editora Claraluz, 2009., p. 117), correspondendo, assim, à concepção de espaço-cena. Além da ação narrada, para a compreensão desse espaço, importam as técnicas de composição da cena, como o som da explosão. Destaca-se, portanto, a informação sensorial como elemento constitutivo da espacialidade. Sua força perceptiva está interligada à proposta enunciativa do romance, no sentido de criar imagens impactantes que remetem ao amplo poder de destruição da guerra nos espaços.

Também ganha destaque na composição da categoria espacial do romance o tratamento dispensado ao espaço da casa. Sobre a recorrente presença desse elemento nos romances do autor, Fonseca e Cury pontuam que “A casa nos romances de Mia Couto tanto pode ser entendida como metonímia da nação moçambicana quanto problematizar essa mesma relação” (Fonseca e Cury, 2008FONSECA, Maria Nazareth Soares; CURY, Maria Zilda Ferreira. Mia Couto: espaços ficcionais. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2008.133p., p. 98). Revestida de símbolos, a casa abriga um universo de costumes, crenças e tradições representativos dos personagens que nela habitam: “Para Mwadia, restara a lição: as pessoas é que abrigam a casa, a ternura é que sustenta o tecto” (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 69). O trecho põe em evidência a conexão existente entre o espaço da casa e as tradições da cultura africana e o quanto ela está inscrita no interior de Mwadia, como parte constitutiva de sua identidade. Os possíveis indícios dessa relação de proximidade são gerados pela oposição de ideias; ao invés da casa ser concebida como abrigo para as pessoas, eram as pessoas que a abrigavam.

Como representação das tradições, a casa também se subdivide em territórios, delimitados por Constança da seguinte forma: “- Lá dentro de casa fica a cozinha de Jesustino. A minha é aqui fora, como sempre foi na nossa terra” (Couto, 2006COUTO, Mia. O outro pé da sereia. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., p. 167). Como uma possível referência à cultura rural africana, a cozinha é o espaço situado fora da casa, reservado às mulheres, onde Constança exerce seus domínios de matriarca. Trata-se de um espaço revestido de simbologia inerente ao universo feminino, conforme revela o narrador ao descrever a arquitetura do ambiente: “Cercada por um muro redondo, fechada em cima por uma cobertura de colmo, a pequena casota apenas recebia mulheres. Constança explicou: a cozinha é um ventre, é ali que se aquecem os materiais da Vida” (Couto, 2006COLLOT, Michel. Pontos de vista sobre as percepções da paisagem. Boletim da Geografia Teorética, Rio Claro, v.20, 1990, p. 21-32. , p. 167). A percepção descritiva do narrador condensa toda a representação simbólica da cozinha. A analogia com o ventre assinala a relação de similitude do espaço com Dona Constança, como se esse espaço fosse uma extensão da personagem. Nesse sentido, Fonseca e Cury analisam que “O espaço das mulheres na casa, ou antes, o espaço fora dela reservado à tarefa de pilar os grãos, propicia a percepção da voz da sabedoria dos antigos” (Fonseca e Cury, 2008FONSECA, Maria Nazareth Soares; CURY, Maria Zilda Ferreira. Mia Couto: espaços ficcionais. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2008.133p., p. 97). Portanto, os elementos utilizados na composição espacial da cozinha criam o ambiente propício para a manifestação da tradição cultural no romance, ambiente uterino, gerador da vida cotidiana da personagem, que, no movimento sincronizado do pilão, reconstitui-se.

Nos exemplos apresentados, há a atuação do espaço na sua função interativa. Segundo Borges Filho, para além de um pano de fundo na ação narrativa, “O espaço não somente localiza, mas também interage com a personagem, salientando, por semelhança ou contraste características sociais e/ou psicológicas, sentimentais, etc.” (Borges Filho, 2015BORGES FILHO, Ozíris. (Org.) Espaço e literatura: perspectivas. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora , 2015., p. 31). Assim, os espaços da casa e da cozinha, em suas configurações significativas, interagem intimamente com as personagens e, nesse processo, revelam muito dos seus sentimentos e de suas identidades.

Considerações finais

A dinamicidade que envolve o espaço no romance O outro pé da sereia faz dessa categoria um elemento articulador da história nos diferentes tempos da narrativa. Contrariando a ideia de elemento estático e passivo, o espaço é um agente produtor de sentidos, de forma que, para sua apreensão, o percurso teórico seguido ultrapassa os limites da noção de situar geograficamente a personagem na narrativa.

Na construção dos espaços no romance, a dimensão estética de que se reveste o navio possibilita estabelecer ligações com o tempo pré-colonial da narrativa, posto que o navio é o espaço privilegiado para a projeção do olhar dos portugueses sobre os escravos africanos. Nesse momento da narrativa, as referências espaciais apontam para os estereótipos criados sobre a história e a cultura africanas, de forma que as fronteiras que delimitam o espaço da cobertura superior e o espaço do porão dão visibilidade às formulações ideológicas predominantes nessa fase pré-colonial. A ideia de povo primitivo, destituído de qualquer princípio de civilidade e, portanto, suscetível a toda espécie de dominação é o que permeia a visão dos portugueses, bem como justifica a missão evangelizadora no espaço africano. Ao concentrar parte significativa da narrativa de matriz histórica, a nau portuguesa é o espaço onde são desveladas as relações de superioridade, opressão e resistência, que permeiam o contato e as trocas no passado quinhentista. Dessa forma, a nau Nossa Senhora da Ajuda, na delimitação de espaços fronteiriços, condensa a produção de sentidos que se propagam na composição espacial do romance.

Os espaços criados para compor o cenário do plano temporal do presente reproduzem o que foi antecipado pelo passado histórico. Os acontecimentos advindos com a chegada dos portugueses em 1560 revelam suas consequências no século XXI. As ruínas deixadas pelas sucessivas guerras e a desolação que caracteriza o perfil dos personagens nesse presente pós-colonial são elementos que dialogam com as ações do passado e repercutem na construção espacial do presente. Em oposição aos desmoronamentos que marcam o tempo de incertezas do presente, a espacialidade da casa abriga o universo de costumes, crenças e tradições, configurando-se numa extensão constitutiva da identidade das personagens.

A apreensão dos espaços em O outro pé da sereia revela a dinamicidade dessa categoria narrativa em seus elementos constitutivos. Os recursos empregados na construção das espacialidades, das atmosferas, das paisagens e dos ambientes estabelecem as conexões de sentido propostas pelos planos temporais encenados.

REFERÊNCIAS

  • BARBIERI, Claudia. Arquitetura literária: sobre a composição do espaço narrativo. In: BORGES FILHO, Oziris; BARBOSA, Sidney, orgs. Poéticas do espaço literário São Carlos, SP: Editora Claraluz, 2009.
  • BORGES FILHO, Ozíris. Espaço e literatura: introdução à topoanálise. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora, 2007.
  • BORGES FILHO, Ozíris. Espaço, percepção e literatura. In: BORGES FILHO, Oziris; BARBOSA, Sidney, orgs. Poéticas do espaço literário São Carlos, SP: Editora Claraluz , 2009.
  • BORGES FILHO, Ozíris. (Org.) Espaço e literatura: perspectivas. Franca, São Paulo: Ribeirão gráfica e Editora , 2015.
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  • COLLOT, Michel. Pontos de vista sobre as percepções da paisagem. Boletim da Geografia Teorética, Rio Claro, v.20, 1990, p. 21-32.
  • COSTA, Luana Antunes. Pelas águas mestiças da história: uma leitura de O outro pé da sereia de Mia Couto. Niterói: Instituto de Letras, 2008. 140f. Dissertação. Universidade Federal Fluminense, 2008.
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  • FONSECA, Maria Nazareth Soares; CURY, Maria Zilda Ferreira. Mia Couto: espaços ficcionais. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2008.133p.
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  • REIS, Carlos; LOPES, Ana Cristina M. Dicionário de teoria da narrativa São Paulo: Ática , 1988.
  • VALENTIM, J. V. Entre mapas movediços e águas míticas, alguns jogos de espelho em O outro pé da sereia, de Mia Couto. In: MWEW, Christin Muleka; SÁ, Ana Lúcia; VAZ, Alexandre Fernandez, orgs. O verso do anverso: teoria, crítica e literaturas africanas. Nova Petrópolis: Nova Harmonia, 2011.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Maio 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    03 Nov 2019
  • Aceito
    13 Dez 2019
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