RESUMO
A fratura por estresse foi descrita inicialmente em soldados prussianos por Breithaupt em 1855 e ocorre como o resultado de um número repetitivo de movimentos em determinada região que pode levar a fadiga e desbalanço da atuação dos osteoblastos e osteoclastos e favorecer a ruptura óssea. Além disso, quando usamos uma determinada região do corpo de maneira errônea, a fratura por estresse pode ocorrer mesmo sem que ocorra um número excessivo de ciclos funcionais. O objetivo deste estudo é revisar a literatura mais relevante dos últimos anos para agregar as principais informações a respeito dessa patologia em um artigo de atualização do tema.
Palavras chave:
Fraturas por estresse/epidemiologia; Fraturas por estresse/fisiopatologia; Fraturas por estresse/diagnóstico; Fraturas por estresse/classificação; Fraturas por estresse/tratamento
ABSTRACT
Stress fractures were first described in Prussian soldiers by Breithaupt in 1855. They occur as the result of repeatedly making the same movement in a specific region, which can lead to fatigue and imbalance between osteoblast and osteoclast activity, thus favoring bone breakage. In addition, when a particular region of the body is used in the wrong way, a stress fracture can occur even without the occurrence of an excessive number of functional cycles. The objective of this study was to review the most relevant literature of recent years in order to add key information regarding this pathological condition, as an updating article on this topic.
Keywords:
Stress fracture/epidemiology; Stress fracture/physiopathology; Stress fracture/diagnosis; Stress fracture/classification; Stress fracture/treatment
Introdução
A fratura por estresse foi descrita inicialmente em soldados prussianos por Breithraupt em 1855.1,2and3 Denominada de "fratura da marcha", suas características foram confirmadas 40 anos depois com o advento da radiografia.1and2 Em 1958, Devas fez o primeiro relato de fratura por estresse em atletas.1,2and3
Essa lesão ocorre como resultado de um número elevado de sobrecargas cíclicas de intensidade inferior ao strength ósseo máximo sobre o tecido ósseo não patológico. 4,5and6
Essa fratura pode ser o estágio final da fadiga ou insuficiência do osso acometido.6 Elas ocorrem após a formação e o acumulo de microfraturas nas trabéculas ósseas normais. Em contrapartida, a fratura resultante da insuficiência óssea ocorre em um osso mecanicamente comprometido, geralmente apresentando uma baixa densidade mineral óssea.6 Nas duas situações, o desequilíbrio entre o osso formado e remodelado e o osso reabsorvido resultará na descontinuidade óssea no local acometido.7and8 O objetivo do presente estudo é apresentar um artigo de atualização sobre o tema e condensar as principais informações obtidas nos principais estudos publicados nos últimos anos.
Epidemiologia
População
Atletas corredores, militares e dançarinos são as principais vítimas da fratura por estresse.6,9and10
Região anatômica
Todos os ossos do corpo humano estão sujeitos a fratura por estresse. Ela está intimamente relacionada com a prática diária do atleta. A predominância de fraturas por estresse nos membros inferiores sobre os membros superiores reflete as sobrecargas cíclicas tipicamente exercidas sobre ossos de sustentação do peso corporal comparadas com as dos ossos que não têm essa função.3 São mais comumente diagnosticadas fraturas por estresse na tíbia, seguida pelos metatarsos (segundo e terceiro principalmente) e pela fíbula.3and11 Fraturas por estresse no esqueleto axial são infrequentes, localizam-se principalmente nas costelas,pars interarticularis, vértebras lombares e na pelve.11,12and13
Modalidade esportiva
Atletas de corrida têm maior incidência de fratura por estresse nos ossos longos como a tíbia, o fêmur e a fíbula, além dos ossos do pé e do sacro.11and12 Modalidades esportivas que usam os membros superiores como ginástica olímpica,14 tênis, beisebol e basquetebol podem resultar em fraturas por estresse. O osso mais acometido é a ulna, principalmente em sua porção proximal, e também o úmero em sua extremidade distal.6,11and13 Essa lesão ocorre principalmente nas costelas em jogadores de golfe e remadores11and13 Saltadores, jogadores de boliche e bailarinos apresentam maior risco de lesão na coluna lombar e pelve.11
Sexo
Em atletas a diferença na incidência de fraturas por estresse entre homens e mulheres é mínima. Acredita-se que a intensidade e o tipo de treinamento controlado para cada atleta e o preparo físico já existente diminuam o impacto do programa de treinos.9and15 Na população militar, a incidência de fraturas por estresse no sexo feminino é maior do que no masculino.16and17
Fisiopatologia
Após seis a oito semanas do aumento súbito e não gradual da intensidade da atividade física do atleta ou do novo praticante, essa sobrecarga fisiológica cíclica e repetitiva pode levar ao surgimento de microfraturas e não permitir que o tecido ósseo tenha tempo suficiente para que sofra remodelação e se adapte à nova condição e repare a microlesão.4,5,6,10,18and19 A carga aplicada é considerada insuficiente para causar uma fratura aguda, mas a combinação de sobrecarga, movimentos repetitivos e um tempo de recuperação inadequado faz dessa uma lesão crônica.11 Inicialmente ocorre uma deformação elástica que progride para deformidade plástica até que finalmente resulte em microfraturas, que, quando não tratadas, evoluem para a fratura completa do osso acometido.10O processo de reparo ósseo na fratura por estresse é diferente do processo das fraturas agudas comuns e ocorre unicamente por meio da remodelação óssea, ou seja, ocorre a reabsorção das células lesadas e a substituição com novo tecido ósseo.19
Markey ainda propôs que a massa muscular atua na dispersão e no compartilhamento das cargas de impacto no tecido ósseo.20 Portanto, quando há fadiga, fraqueza ou despreparo muscular essa ação protetora é perdida e aumenta o risco de lesões do tecido ósseo.16and20
Fatores de risco
Os fatores associados ao aumento do risco para o desenvolvimento de fraturas por estresse podem ser divididos em extrínsecos e intrínsecos e tornar essa afecção multifatorial e de difícil controle.8,9,20,21,22and23
Os fatores extrínsecos estão relacionados ao gesto esportivo, aos hábitos nutricionais, aos equipamentos usados e ao tipo de solo.8,9,14,20,21,22and23
Muitas vezes o aumento abrupto na intensidade e no volume do treinamento pode ser suficiente para o desenvolvimento da lesão.6,9,10and11 Equipamentos como calçados de baixa absorção de impacto, desgastados (mais de seis meses de uso) ou aqueles que não se adaptam adequadamente ao pé do atleta podem causar lesões.8and23 A qualidade da pista de treinamento também pode ser um fator de risco quando desniveladas, irregulares e muito rígidas.17and24 Por fim, o despreparo do atleta na feitura do gesto esportivo e da técnica funcional pode levar a lesão sem que às vezes o número de repetições seja tão elevado.8and25
Os fatores intrínsecos estão relacionados a possíveis variações anatômicas, condições musculares, estado hormonal, gênero, etnia e idade.8,9,20,21and22
Muitos estudos equivocadamente consideram apenas o sexo feminino como um fator de risco primário para o surgimento da fratura por estresse.11,16and26 Na verdade, alteração hormonal, nutricional, biomecânica e anatômica são os verdadeiros fatores que favorecem o surgimento da fratura por estresse no sexo feminino.11and24
A idade também não pode ser considerada um fator de risco isolado para fratura por estresse.11,23and27 Estudos americanos tentaram avaliar a incidência dessa lesão em atletas brancos e negros e não foram observadas diferenças significativas.11and13 Na população militar, houve uma incidência duas vezes maior em brancos do que em negros sem distinção de gênero. Atribui-se esse fato à densidade óssea e sua biomecânica.24
Existe uma relação inversa entre a densidade mineral óssea e o risco de fraturas por estresse.8,10and28 A ingestão nutricional não adequada pode alterar o metabolismo ósseo e predispor o aparecimento de fraturas por estresse.8,10and29
O baixo nível de condicionamento físico e muscular também é um importante fator de risco na gênese do problema.6,8,10,30and31 Além disso, pé cavo rígido, discrepância dos membros inferiores, tíbia breve, genu valgo, ângulo Q aumentado, índice de massa corporal menor do que 21 kg/m2 e baixa estatura também deve ser levados em consideração na análise dos fatores de risco para fraturas por estresse.6,8,9,21and32
Alguns estudos sugerem ainda como fatores de risco rigidez dos pés, alterações do arco plantar e limitações na dorsiflexão do tornozelo devido a um encurtamento do tríceps sural.8,10and33 Corredores que têm o retropé em eversão, particularmente em pronação exagerada, e atletas com o arco do pé pronunciado têm um risco de desenvolver uma fratura por estresse até 40% maior.10,21,33and34 Enquanto hiperpronação do antepé predispõe o aumento do risco de fraturas por estresse na fíbula.35 Fraturas por estresse do segundo metatarso estão associadas à presença de neuroma de Morton, hipermobilidade do primeiro metatarso e aumento relativo no comprimento do segundo metatarso.20and33 Apesar de o uso de órteses e calçados mais adequados diminuir, teoricamente, a incidência de fraturas por estresse, ainda não há estudos suficientes na literatura que sustentem essa teoria.10and34
Outros autores também consideram como fatores de risco: tabagismo, atividade física com frequência inferior a três vezes por semana e o consumo de mais de 10 doses de bebida alcoólica por semana.6
Exame físico
O exame físico da fratura por estresse é bastante sensível, porém pouco específico.20and36 O paciente apresenta-se com aumento da sensibilidade no local da lesão, dor e edema após aumento abrupto e/ou repetitivo da atividade física sem intervalos suficientes de descanso para recuperação fisiológica tecidual.6 Inicialmente a dor é reduzida e aliviada com o repouso e permite a atividade física sem prejuízo. Entretanto, com a manutenção do gesto agressor há progressão da lesão, que resulta em aumento da dor e limitação de sua prática.9and20 A existência de fraturas prévias, peso, altura, índice de massa corpórea e suas alterações nos últimos 12 meses, história menstrual e puberdade, avaliação nutricional são informações importantes para identificar possíveis fatores de risco intrínsecos para lesão durante o exame físico.10
Testes clínicos como o uso do ultrassom terapêutico e de diapasões também são úteis na investigação diagnóstica das fraturas por estresse.3 Quando usados diretamente sobre o local da suspeita da lesão podem desencadear ou piorar a dor devido à grande reabsorção osteoclástica local que resulta na lesão do periósteo.3and37 Além disso, pode-se fazer o teste da corda (Hop Test), que consiste em pedir ao paciente que pule no lugar apenas com o apoio do membro investigado. O teste é positivo quando desencadear forte dor ou incapacidade na região lesada.6and38
Alguns exames laboratoriais podem ser úteis na investigação da fratura por estresse: níveis séricos de cálcio, fósforo, creatinina e 25(OH)D3. Marcadores nutricionais devem ser solicitados na presença de quadros clínicos de perda de peso e anorexia e pesquisa de níveis hormonais (FSH e estradiol) quando existe uma história de dismenorreia.10
Exame de imagem
Exames de imagem são fundamentais para o diagnóstico, prognóstico e acompanhamento da fratura por estresse.6
A radiografia simples (RX) é o exame de imagem inicial devido ao fácil acesso e baixo custo.4,13,36,38,39,40,41and42 Contudo, tem alto índice de falsos negativos, já que as alterações provocadas pela fratura por estresse são tardias nesse exame de imagem (após duas a quatro semanas do início da dor) e podem retardar o diagnóstico.6,14,18and43 Inicialmente pode-se observar uma área luzente fraca e sutil diretamente no tecido ósseo acometido e/ou esclerose e espessamento periosteal, mudanças corticais com diminuição da densidade óssea cortical (gray córtex) e/ou aparecimento de uma delicada linha de fratura. Finalmente, observa-se a tentativa do organismo de formar um calo ósseo, com espessamento endosteal e esclerose, os quais são os achados mais comuns. 6,10,14,38and44 O sinal conhecido comoDreaded Black Line ocorre na cortical anterior da tíbia e sugere uma fratura de mau prognóstico e alta probabilidade de evolução para fratura completa por se localizar em uma região de tensão óssea e baixa vascularização. 44
A tomografia computadorizada (TC) é usada principalmente quando existe uma contraindicação para o uso da ressonância magnética.43,44,45and46 Lesões crônicas e quiescentes podem ser mais evidentes nesse exame quando comparado à ressonância magnética ou cintilografia óssea devido ao fato de apresentar um baixo turnover ósseo.46Single photon emission CT (SPECT) tem sido particularmente mais útil na verificação de fraturas por estresse que envolvem a coluna dorsal especificamente na pars interarticularis (espondilólise). 6,45and46
A medicina nuclear com a cintilografia de tripla fase (tecnécio-99 m) apresenta sensibilidade importante (74-100%) à remodelação óssea e apresenta alterações de imagem três a cinco dias após o início dos sintomas.3,6,41,42and47 O radiofármaco se concentra nas regiões afetadas e detecta áreas de remodelação óssea, microfraturas do osso trabecular, reação periosteal e formação do calo ósseo.46
A ressonância nuclear magnética (RNM) é o exame de imagem mais sensível e específico para o diagnóstico da fratura por estresse. É recomendada pelo Colégio Americano de Radiologia como o exame de escolha na ausência de alterações radiográficas.6 As anormalidades provocadas pela fratura podem ser identificadas um a dois dias após o início dos sintomas.6,10,12,38,41,43,46and48 com detecção precoce do edema no tecido ósseo e áreas adjacentes.10,41and46 Esse exame permite diferenciar o dano medular do cortical, endosteal e periosteal e permite a graduação das lesões quanto a sua gravidade e prognóstico.6 Edema intramedular endosteal é um dos primeiros sinais de remodelação óssea e pode permanecer por até seis meses após o diagnóstico e tratamento da fratura, enquanto ocorre a maturação e o remodelamento cortical.16and48 O edema medular ou sinais de estresse ósseo também podem estar presentes em pacientes assintomáticos e fisicamente ativos, os quais não se correlacionam com o aumento da incidência de fraturas por estresse, principalmente na tíbia em maratonistas.46 A linha de fratura é menos comumente visível.10 Ela tem sensibilidade igual ou levemente superior à cintilografia, porém é considerado um exame mais específico.6,38and41
Classificação
As fraturas podem e devem ser classificadas para que o prognóstico e tratamento sejam mensurados e resultem no melhor resultado para o paciente.
Arendt e Griffiths apud Royer et al.11 usaram parâmetros da imagem obtida na RNM para dividir as fraturas por estresse em quatro estágios. O objetivo dessa classificação é definir o tempo de repouso necessário para retorno ao esporte de acordo com o estágio em que o paciente se encontra. Os estágios também podem ser usados para a reavaliação durante o acompanhamento da lesão.7 As lesões tratadas no estágio 1 precisam em média de 3,3 semanas de repouso, enquanto que no estágio 4 são necessárias 14,3 semanas.7 (tabela 1)
As fraturas por estresse também podem ser classificadas em fraturas de alto e baixo risco. A localização óssea, o prognóstico de consolidação, característica obtidas com exame de imagem, são algumas das características que definem o risco aumentado ou não de uma fratura por estresse não evoluir satisfatoriamente durante o tratamento.6and11 (Tabela 2and Tabela 3)
Fredericson propôs classificar a fratura por estresse com o uso das alterações visualizadas na RNM. Os estágios progressivos da gravidade da lesão avaliam o acometimento periostal, seguido do acometimento medular até que a cortical óssea também esteja comprometida.10and41 (tabela 4)
Tratamento
Para o adequado tratamento das fraturas por estresse é essencial que os fatores de risco que levaram à doença sejam identificados. O tratamento da fratura por estresse baseia-se na prevenção de novos episódios e na recuperação da área lesada.6,10and20
A prevenção de novos episódios é feita com a modificação das atividades e correção do gesto esportivo, troca de equipamentos esportivos e do local de treinamento que possam estar favorecendo a sobrecarga óssea, mudança dos hábitos nutricionais e o reconhecimento de alterações hormonais, anatômicas, de força muscular e baixo condicionamento cardiomuscular.20 O tipo de calçado ideal para cada prática é o fator externo mais estudado na gênese da fratura por estresse.20 Alguns estudos mostram que existe uma incidência menor de lesões quando sem troca as corridas do asfalto para superfícies mais macias, como pistas de atletismo. Mesmo assim, outros autores relatam em seus estudos não haver relação entre esses.20 Voloshin49 acredita que existe uma interferência das diversas superfícies absorvedoras de choque, mas o estresse ao tecido ósseo não é unicamente produto das forças da reação do solo. As forças combinadas geradas pela ação muscular diante do movimento gerado e a adaptação do atleta à superfície de treinamento também podem ser considerados como fatores de risco para uma determinada lesão.20and49
O tratamento da lesão é feito com a diminuição da sobrecarga no local acometido, medicação para controle da dor e reabilitação fisioterápica.6,10and20
Analgésicos são usados para alívio da dor.6 Anti-inflamatórios, se usados, devem ser prescritos com cautela e por curto período. Estudos em animais demonstraram que pode haver uma interferência negativa no processo de cicatrização óssea.6 Entretanto, revisões mais recentes da literatura reportam que não há evidencia conclusiva sobre essa ação negativa.50,51and52
Em geral, o tempo para consolidação da fratura dura entre quatro e 12 semanas quando as fraturas são de baixo risco.6 Para os metatarsos espera-se entre três a seis semanas; a região posteromedial da diáfise da tíbia,o fêmur e a pelve de seis a 12 semanas.10and11 O paciente deve ser reexaminado a cada duas/três semanas para acompanhamento das modificações dos sintomas e da dor no período de repouso e reabilitação.6,53,54,55and56 Para a manutenção da flexibilidade, força e do condicionamento físico cardiovascular durante o período de repouso o paciente deve engajar-se num programa fisioterápico6,53and54 e de exercícios controlados.57
Imobilizações são raramente usadas para o tratamento da fratura por estresse devido aos seus efeitos deletérios sobre músculos, tendões, ligamentos e articulações.5 Entretanto, existem algumas fraturas específicas em que a imobilização é fundamental para a obtenção de condições adequadas para a cura: é o caso do osso navicular, sesamoides, patela e região posteromedial da tíbia.5
Fraturas de alto risco comumente evoluem para a não consolidação óssea e é necessária a intervenção cirúrgica do médico ortopedista.6 A fratura por estresse da cortical lateral (tensão) do colo do fêmur está associada a resultados catastróficos, como desvio completo da cabeça do fêmur e osteonecrose quando não tratados cirurgicamente.20and53 A cortical anterior do terço médio da diáfise da tíbia é outra fratura que se não tratada cirurgicamente apresenta na maioria das vezes um péssimo prognóstico.20 Podemos citar ainda as fraturas da base do quinto metatarso e do navicular como fraturas que comumente exigem a intervenção cirúrgica para que seja obtido um resultado satisfatório em seu tratamento.20
Novas modalidades terapêuticas
Existem novas modalidades sendo estudadas para o tratamento das faturas por estresse com o objetivo de se obter uma consolidação mais rápida e o retorno precoce às atividades físicas. Elas podem ser divididas em terapias biológicas ou físicas.50
Terapia de suplementação de oxigênio (terapia de oxigênio hiperbárico)
Estudos in vitro demonstraram que a administração de oxigênio 100% é capaz de estimular osteoblastos e conseqüentemente a formação óssea. 50 Porém ainda não existe um consenso na literatura sobre seus benefícios no tratamento da fratura por estresse. 50and54
Bifosfonados
Suprimem a reabsorção óssea e inativam os osteoclastos por meio de sua ligação com cristais de fosfato de cálcio.20and50 Seu alto custo e seus diversos efeitos colaterais podem ser fatores decisivos na escolha e tentativa dessa modalidade terapêutica.50and55 Seu uso profilático ainda não é embasado cientificamente.50and56
Fatores de crescimento e preparados ricos em fatores de crescimento
Aplicados diretamente nos tecidos doentes com o objetivo de acelerar e promover seu reparo, com resultados preliminares animadores em músculos, tendões e ligamentos.50and57 Existem poucos estudos sobre o tratamento das fraturas por estresse. Alguns deles referem que quando usados no momento do tratamento cirúrgico das fraturas de alto risco podem acelerar e melhorar sua recuperação.50
Proteínas morfogênicas ósseas (Bone Morphogenic Protein)
Proteínas com fatores bioativos responsáveis pela indução da atividade da matriz óssea com função osteoindutora.50 Sua atividade primária está na diferenciação das células mesenquimais em células formadoras de tecido ósseo e cartilaginoso por meio da ossificação direta e osteocondral com função importante no reparo de lesões ósseas. Estudos em animais têm demonstrado uma aceleração na cura da lesão em fraturas traumáticas, mas pouco se pode concluir a respeito do seu uso em fraturas por estresse.50
Hormônio paratireoideano recombinante
O paratormônio atua na regulação dos níveis séricos de cálcio por meio da absorção gastrointestinal, da reabsorção de cálcio e fósforo no rim, além de liberar cálcio do tecido esquelético.50 Apesar de promover primeiramente um estímulo dos osteoclastos com sua administração regular, quando essa se faz de forma intermitente e controlada consegue-se a estimulação osteoblástica anabólica e resulta na formação óssea com aumento da força e da densidade, seguida de sua remodelação.50 Estudos demonstram que esse hormônio estimula tanto o reparo ósseo pelo mecanismo endocondral como membranoso.50
Ultrassonografia pulsátil de baixa intensidade
As ondas sonoras de alta frequência acima do limite audível dos seres humanos interagem com o tecido ósseo e tecidos moles adjacentes e geram um microestresse e tensão capaz de estimular a consolidação.6,13and50 Porém, seu mecanismo exato de ação ainda é desconhecido.19 Alguns estudos demonstraram a sua eficácia no tratamento das fraturas por estresse.50and58 Outros estudos não apoiam completamente o seu uso para o tratamento dessas fraturas.6
Aplicação de campo magnético
Pode ser aplicado por corrente direta no foco da fratura por meio da colocação cirúrgica de eletrodos, do uso de aparelho de campo de capacitação elétrica ou por pulso de campo eletromagnético.50 Ainda não há evidências concretas sobre seu uso nas fraturas por estresse.20and50
Critérios para retorno ao esporte
O tempo desde o diagnóstico até a cura e o retorno ao esporte dependem de múltiplos fatores como o local da lesão, a atividade esportiva, a gravidade da lesão, assim como a possibilidade de correção dos fatores de risco intrínsecos do paciente.20 Fraturas por estresse de baixo risco e de tratamento não cirúrgico costumam permitir que o paciente retorne à sua atividade de quatro a 17 semanas após a lesão.6
Os possíveis critérios usados para permitir que o atleta retorne à sua pratica são: ausência total de dor no local acometido, principalmente durante a feitura do gesto esportivo, ausência de sintomas durante a feitura de testes provocativos de dor no local da lesão, ausência de anormalidades nos exames de imagem e acima de tudo a compreensão do paciente, dos treinadores e da equipe técnica esportiva dos fatores de risco e condições as quais levaram àquela lesão para que possam ser corrigidas e se prevenir recorrência e aparecimento de novas lesões.10
O retorno gradual à atividade esportiva definitiva deve ser iniciada após 10-14 dias com ausência total de dor e com aumento de 10% da intensidade do treino por semana.20and50 A formação de calo ósseo e obliteração da linha da fratura nas radiografias simples e principalmente na tomografia são fatores determinantes do processo adequado de cura da fratura por estresse.50
Prevenção
Apesar de vários métodos terem sido propostos para a prevenção das fraturas por estresse, apenas alguns têm sua validade comprovada para justificar suas recomendações.6 Os possíveis fatores de risco contribuintes para o seu aparecimento devem ser cuidadosamente estudados, modificados e acompanhados.6 and 10Controle e modificação constante da atividade física com tempo de recuperação adequado são de extrema importância.6and10 Considerar a ingestão diária de cálcio de 2000 mg e 800IU de vitamina D pode ser um fator de proteção.6and9 Deve-se acompanhar e corrigir ao máximo a cinemática e os fatores biomecânicos predisponentes dessa afecção por meio do entendimento correto do gesto esportivo, dos equipamentos, das órteses, da superfície de treinamento e todos os outros fatores que possam envolver a prática esportiva.6,10and50 Alguns estudos estão investigando o uso profilático de bifosfonados na prevenção das fraturas por estresse, porém ainda não há evidencias de seus benefícios para a prevenção desse tipo de lesão.6
Complicações
As principais complicações ocorrem em fraturas por estresse de alto risco. A condução inadequada pode fazer com que a fratura progrida para um traço completo e desviado e provoque retardo de consolidação, necrose avascular e pseudoartrose.6and20 Além disso, os bifosfonados no tratamento da fratura por estresse podem fragilizar determinadas regiões ósseas quando usados em longo prazo e predispor o aparecimento de fraturas por insuficiência e potencial efeito teratogênico em pacientes gestantes.6
Referências bibliográficas
- 1 Breithaupt MD. Zur pathologie des menschlichen fusses. To the pathology of the human foot. Med Zeitung. 1855;24:169.
- 2 Devas MB. Stress fractures of the tibia in athletes of 'shin soreness. J Bone Joint Surg Br. 1958;40(2):227-39.
- 3 Schneiders AG, Sullivan SJ, Hendrick PA, Hones BDGM, Mcmaster AR, Sugden BA, et al. The ability of clinical tests to diagnose stress fractures: a systematic review and meta- analysis. J Orthop Sports Phys Ther. 2012;42(9):760-71.
- 4 Fayad LM, Kamel IR, Kawamoto S, Bluemke DA, Frassica FJ, Fishman EK. Distinguishing stress fractures from pathologic fractures: a multimodality approach. Skelet Radiol. 2005;34(5):245-59.
- 5 Niva MH, Mattila VM, Kiuru MJ, Pihlajamäki HK. Bone stress injuries are common in female military trainees: a preliminary study. Clin Orthop Relat Res. 2009;467(11):2962-9.
- 6 Carmont RC, Mei-Dan O, Bennell LK. Stress fracture management: current classification and new healing modalities. Oper Tech Sports Med. 2009;17:81-9.
- 7 Patel DS, Roth M, Kapil N. Stress fractures: diagnosis, treatment, and prevention. Am Fam Physician. 2011;83(1):39-46.
- 8 Evans RK, Antczak AJ, Lester M, Yanovich R, Israeli E, Moran DS. Effects of a 4-month recruit training program on markers of bone metabolism. Med Sci Sports Exerc. 2008;40 11 Suppl.:S660-70.
- 9 Cosman F, Ruffing J, Zion M, Uhorchak J, Ralston S, Tendy S, et al. Determinants of stress fractures risk in United States Military Academy cadets. Bone. 2013;55(2):359-66.
- 10 Bennell KL, Malcolm SA, Thomas SA, Wark JD, Brukner PD. The incidence and distribution of stress fractures in competitive track and field athletes. A twelve-month prospective study. Am J Sports Med. 1996;24(2):211-7.
- 11 Royer M, Thomas T, Cesini J, Legrand E. Stress fractures in 2011: practical approach. Joint Bone Spine. 2012;79 Suppl. 2:S86-90.
- 12 Snyder RA, Koester MC, Dunn WR. Epidemiology of stress fractures. Clin Sports Med. 2006;25(1):37-52.
- 13 Iwamoto J, Takeda T. Stress fractures in athletes: review of 196 cases. J Orthop Sci. 2003;8(3):273-8.
- 14 Daffner RH, Pavlov H. Stress fractures: current concepts. Am J Roentgenol. 1992;159(2):245-52.
- 15 Johnson AW, Weiss CB Jr, Wheeler DL. Stress fractures of the femoral shaft in athletes - more common than expected: a new clinical test. Am J Sports Med. 1994;22(2):248-56.
- 16 Jones BH, Bovee MW, Harris JM, Cowan DN. Intrinsic risk factors for exercise- related injuries among male and female army trainees. Am J Sports Med. 1993;21(5):705-10.
- 17 Pester S, Smith PC. Stress fractures in the lower extremities of soldiers in basic training. Orthop Rev. 1992;21(03): 297-303.
- 18 Bolin D, Kemper A, Brolinson G. Current concepts in the evaluation and management of stress fractures. Curr Rep Sport Med. 2005;4(6):295-300.
- 19 Mori S, Burr DB. Increasing intracortical remodelling following fatigue damage. Bone. 1993;14(2):103-9.
- 20 Raasch WG, Hergan DJ. Treatment of stress fractures: the fundamentals. Clin Sports Med. 2006;25(1):29-36.
- 21 Korpelainen R, Orava S, Karpakka J, Siira P, Hulkko A. Risk factors for recurrent stress fracture in athletes. Am J Sports Med. 2001;29(3):304-10.
- 22 Joy EA, Campbell D. Stress fractures in the female athlete. Curr Sports Med Rep. 2005;4(6):323-8.
- 23 Gardner LI Jr, Dziados JE, Jones BH, Brundage JF, Harris JM, Sullivan R, et al. Prevention of lower extremity stress fractures: a controlled trial of a shock absorbent insole. Am J Public Health. 1988;78(12):1563-7.
- 24 Milgrom C, Finestone A, Levi Y, Simkin A, Ekenman I, Mendelson S, et al. Do high impact exercises produce higher tibial strains than running? Br J Sports Med. 2000;34(3):195-9.
- 25 Patel RD. Stress fractures: diagnosis and management in the primary care settings. Pediatr Clin N Am. 2010;81:9-27.
- 26 Shaffer RA, Rauh MJ, Brodine SK, Trone DW, Macera CA. Predictors of stress fracture susceptibility in young female recruits. Am J Sports Med. 2006;34(1):108-15.
- 27 Milgrom C, Finestone A, Shlamkovitch N, Rand N, Lev B, Simkin A, et al. Youth is a risk factor for stress fracture: a study of 783 infantry recruits. J Bone Joint Surg Br. 1994;76(1):20-2.
- 28 Valimaki VV, Alfthan H, Lehmuskallio E, Loyttyniemi E, Sahi T, Suominen H, et al. Risk factors for clinical stress fractures in male military recruits: a prospective cohort study. Bone. 2005;37(2):267-73.
- 29 Myburg KH, Hutchins J, Fataar AB, Hough SF, Noakes TD. Low bone density is an etiologic factor or stress fractures in athletes. Ann Intern Med. 1990;113(10):754-9.
- 30 Nieves JW, Melsop K, Curtis M. Nutritional factors that influence change in bone density and stress fracture risk among young female cross- country runners. PMR. 2010;2(8):740-50.
- 31 Popp KL, Hughes JM, Smock AJ, Novotny SA, Stovitz SD, Koehler SM, et al. Bone geometry, strength, and muscle size in runners with a history of stress fracture. Med Sci Sports Exerc. 2009;41(12):2145-50.
- 32 Giladi M, Milgrom C, Simkin A, Danon Y. Stress fractures: identifiable risk factors. Am J Sports Med. 1991;19(6):647-52.
- 33 Manioli A 2nd, Graham B. The subtle cavus foot: the under pronator: a review. Foot Ankle Int. 2005;26(3):256-63.
- 34 Pohl MB, Mullineaux DR, Milner CE, Hamill J, Davis IS. Biomechanical predictors of retrospective tibial stress fractures in runners. J Biochem. 2008;41(6):1160-5.
- 35 Maitra RS, Johnson DL. Stress fractures. Clinical history and physical examination. Clin Sports Med. 1997;16(2): 259-74.
- 36 Fredericson M, Wun C. Differential diagnosis of leg pain in the athlete. J Am Podiatr Med Assoc. 2003;93(4):321-4.
- 37 Romani WA, Perrin DH, Dussault RG, Ball DW, Kahler DM. Identification of tibial stress fractures using therapeutic continuous ultrasound. J Orthop Sports Phys Ther. 2000;30(8):444-52.
- 38 Ishibashi Y, Okamura Y, Otsuka H, Nishizawa K, Sasaki T, Toh S. Comparison of scintigraphy and magnetic resonance imaging for stress injuries of bone. Clin J Sport Med. 2002;12(2):79-84.
- 39 Sterling JC, Edelstein DW, Calvo RD, Webb R. Stress fractures in the athlete. Diagnosis and management. Sports Med. 1992;14(5):336-46.
- 40 Bennell K, Brukner P. Preventing and managing stress fractures in athletes. Phys Ther Sport. 2005;6:171-80.
- 41 Fredericson M, Bergman AG, Hoffman KL, Dillingham MS. Tibial stress reaction in runners. Correlation of clinical symptoms and scintigraphy with a new magnetic resonance imaging grading system. Am J Sports Med. 1995;23(4): 472-81.
- 42 Strauch WB, Slomiany WP. Evaluating shin pain in active patients. J Musculoskelet Med. 2008;25:138-48.
- 43 Shin AY, Morin WD, Gorman JD, Jones SB, Lapinski AS. The superiority of magnetic resonance imaging in differentiating the cause of hip pain in endurance athletes. Am J Sports Med. 1996;24(2):168-76.
- 44 Dixon S, Newton J, Teh J. Stress fractures in the young athlete: a pictorial review. Curr Probl Diagn Radiol. 2011;40(1): 29-44.
- 45 Zukotynski K, Curtis C, Grant FD, Micheli L, Treves ST. The value of SPECT in the detection of stress injury to the pars interarticularis in patients with low back pain. J Orthop Surg Res. 2010;5:13.
- 46 Sofka CM. Imaging of stress fractures. Clin Sports Med. 2006;25(1):53-62.
- 47 Brukner P, Bennell K. Stress fractures in female athletes. Diagnosis, management and rehabilitation. Sports Med. 1997;24(6):419-29.
- 48 Fredericson M, Jennings F, Beaulieu C, Matheson GO. Stress fractures in athletes. Top Magn Reson Imaging. 2006;17(5):309-25.
- 49 Voloshin KW. Dynamic loading during running on various surfaces. Human Mov Sci. 1992;11:675-89.
- 50 Mehallo CJ, Drezner JA, Bytomski JR. Practical management: non steroidal anti- inflammatory drug (NSAID) use in athletic injuries. Clin J Sport Med. 2006;16:170-4.
- 51 Wheeler P, Batt ME. Do non- steroidal anti- inflammatory drugs adversely affect stress fracture healing? A short review. Br J Sports Med. 2005;39(2):65-9.
- 52 Burns AS, Lauder TD. Deep water running: an effective non weight bearing exercise for the maintenance of land based running performance. Mil Med. 2001;166(3):253-8.
- 53 Johansson C, Ekenman I, Tornkvist H, Eriksson E. Stress fractures of the femoral neck in athletes: the consequence of a delay in diagnosis. Am J Sports Med. 1990;18(5):524-8.
- 54 Bennet MH, Stanford R, Turner R. Hyperbaric oxygen therapy for promoting fracture healing and treating fracture non union. Cochrane Database Syst Rev. 2005;25(1): CD004712.
- 55 Shima Y, Engebretsen L, Iwasa J, Kitaoka K, Tomita K. Use ofbisphosphonates for the treatment of stress fractures inathletes. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc.2009;17(5):542-50.
- 56 Ekenman I. Do not use bisphosphonates without scientificevidence, neither in the treatment nor prophylactic, in thetreatment of stress fractures. Knee Surg Sports TraumatolArthrosc. 2009;17(5):433-4.
- 57 Hammond JW, Hinton RY, Curl LA, Muriel JM, Lovering RM.Use of autologous plateletrich plasma to treat muscle straininjuries. Am J Sports Med. 2009;37(6):1135-42.
- 58 Heckman JD, Ryaby JP, McCabe J, Frey JJ, Kilcoyne RF.Acceleration of tibial fracture healing by noninvasivelow-intensity pulsed ultrasound. J Bone Joint Surg Am.1994;76(1):26-34.