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Um novo método de tratamento de pequenas avulsões osteolabrais associadas a fratura-luxação posterior do quadril

Resumo

Pequenas avulsões osteolabrais do quadril podem passar despercebidas, e testes de estresse pós-redução e tomografia computadorizada do quadril devem ser realizados para sua detecção. O tratamento dessas avulsões osteolabrais instáveis geralmente é feito com âncoras de sutura, parafusos de Herbert ou placas-molas. Em avulsões ósseas pequenas, porém, o uso desses implantes é um trabalho tedioso. Apresentamos uma nova técnica de fixação de pequenas fraturas com avulsões osteocondrais não passíveis de fixação com parafusos ou placas-molas.

Realizamos uma análise retrospectiva de 57 casos de pacientes submetidos à redução aberta e fixação interna de fratura-luxação posterior do acetábulo, e identificamos 6 casos em que um pequeno fragmento osteocondral labral posterior causava instabilidade. Essas lesões foram corrigidas com um novo método. A pontuação média no Harris Hip Score no último acompanhamento foi de 92,5. A fixação de avulsões osteocondrais associadas a fratura-luxação posterior do quadril pode ser difícil se o fragmento ósseo for pequeno. Nossa técnica é uma maneira simples, econômica e confiável de corrigir tais avulsões com resultados satisfatórios.

Palavras-chave
acetábulo; cabeça do fêmur; fraturas ósseas; luxação do quadril

Abstract

Small osteolabral avulsions of the hip can be easily missed, and postreduction stress testing and computed tomography (CT) scans of the hip should be performed to look for these injuries. The usual modality of treatment of these unstable osteolabral avulsions is suture anchors, Herbert screws or spring plates. But when the bony avulsion is small, the use of these implants becomes a tedious job. We present a novel technique to fix small osteochondral avulsion fractures not amenable to fixation using screws or spring plates.

We performed a retrospective analysis of 57 cases of patients who underwent open reduction and internal fixation for posterior fracture dislocation of the acetabulum, and we identified 6 cases of small posterior labral osteochondral fragments leading to instability. These injuries were fixed using a novel method. The mean Harris Hip Score at the final follow-up was of 92.5. Fixation of osteochondral avulsions associated with posterior hip fracture dislocation can be a difficult task if the bony fragment is small. Our technique is a simple, cost-effective and reliable way of fixing such avulsions with satisfactory outcomes.

Keywords
acetabulum; femur head; fractures, bone; hip dislocation

Introdução

A luxação posterior pós-traumática do quadril geralmente é causada por traumatismo de alta energia em indivíduos jovens que sofreram acidentes de trânsito. Seu mecanismo é uma lesão do painel em que há direcionamento axial de uma força do joelho para o quadril flexionado. Dependendo da magnitude da força e da posição do quadril no momento do traumatismo, várias outras lesões associadas podem ocorrer, como avulsão osteocondral, fratura da parede posterior e fratura transversal com acometimento da parede posterior.11 Judet R, Judet J, Letournel E. Fractures of the acetabulum: classification and surgical approaches for open reduction. preliminary report. J Bone Joint Surg Am 1964;46:1615–1646 A redução da luxação do quadril deve ser feita em caráter emergencial em até 12 horas para diminuir o risco de necrose avascular (NAV) do quadril. A redução não concêntrica ou instabilidade persistente após a redução é provocada por corpos soltos no espaço intra-articular, um fragmento encarcerado ou avulsão osteolabral posterior.22 Brooks RA, Ribbans WJ. Diagnosis and imaging studies of traumatic hip dislocations in the adult. Clin Orthop Relat Res 2000; (377):15–23 O tratamento dessas lesões é de suma importância para se alcançar uma redução estável e concêntrica, diminuir o risco de nova luxação, osteoartrite e NAV do quadril, e permitir a mobilização precoce. Pequenas avulsões osteolabrais podem passar despercebidas, e testes de estresse pós-redução e tomografia computadorizada do quadril devem ser realizados para sua detecção.33 Price CT, Pyevich MT, Knapp DR, Phillips JH, Hawker JJ. Traumatic hip dislocation with spontaneous incomplete reduction: a diagnostic trap. J Orthop Trauma 2002;16(10):730–735 Essas avulsões osteolabrais instáveis são tratadas com âncoras de sutura, parafusos de Herbert ou placasmolas.44 Park MS, Yoon SJ, Choi SM. Hip Arthroscopic Management for Femoral Head Fractures and Posterior Acetabular Wall Fractures (Pipkin Type IV). Arthrosc Tech 2013;2(03):e221–e225 No entanto, o uso desses implantes em pequenas avulsões ósseas é um trabalho tedioso. Apresentamos uma nova técnica de fixação de fraturas com pequenas avulsões osteocondrais não passíveis de fixação com parafusos ou placas-molas.

Descrição do Método

Neste estudo, realizamos uma análise retrospectiva de 57 casos de pacientes submetidos à redução aberta e fixação interna de fratura-luxação posterior do acetábulo por um só cirurgião em um centro de traumatismo de nível terciário no norte da Índia de 2012 a 2018. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da instituição, e todos os pacientes assinaram os termos de consentimento livre e esclarecido para a inclusão no estudo e a publicação de dados em uma revista científica sem qualquer divulgação de detalhes pessoais.

Identificamos seis casos em que um pequeno fragmento osteocondral labral posterior causava instabilidade; esses pacientes foram submetidos à fixação pelo novo método. Todos os 6 pacientes eram do sexo masculino, com média de idade de 36,1 (variação de 21 a 54) anos; o lado direito havia sido acometido em 5 indivíduos. O mecanismo da lesão em todos os casos foi acidente automobilístico; todos também apresentavam luxação posterior. Três pacientes tinham uma fratura acetabular transversa com fratura osteolabral posterior, e os outros três apresentavam apenas fragmentos osteocondrais associados à luxação posterior. Nesses três últimos pacientes, a luxação posterior foi reduzida no pronto-socorro sob sedação, mas houve persistência da instabilidade dinâmica. Assim, sua cirurgia foi agendada, e a instabilidade dinâmica foi confirmada por teste de esforço no centro cirúrgico com braço em C na incidência do obturador do quadril. Uma redução aberta conforme os critérios de Matta55 Matta JM. Fractures of the acetabulum: accuracy of reduction and clinical results in patients managed operatively within three weeks after the injury. J Bone Joint Surg Am 1996;78(11): 1632–1645 foi planejada nos pacientes com fratura transversa associada; o fragmento osteocondral foi abordado quando a instabilidade posterior persistente foi observada, após a fixação da fratura transversa.

Todos os pacientes foram submetidos à cirurgia pela abordagem de Kocher Langenbeck. A luxação cirúrgica do quadril não foi realizada em nenhum caso. A osteotomia trocantérica foi realizada em duas fraturas transversas e uma lesão de parede posterior. Em todos esses casos, o fragmento ostecondral era tão pequeno que não podia ser fixado com os métodos de rotina, como parafusos ou placas-molas (Figs. 12). Os fragmentos foram estabilizados com fios de Kirschner com as extremidades laterais dobradas sobre a área retroacetabular, e uma placa buttress (placa de reconstrução de 3,5 mm) foi aplicada sobre os fios dobrados e cortados como um grampo de cabelo para reforçar a fixação (Fig. 3). Os movimentos intraoperatórios foram avaliados imediatamente após a fixação, e a concentricidade da redução foi verificada mediante técnicas de diagnóstico por imagem após teste de estresse dinâmico em todas as incidências. Todos os seis quadris estavam estáveis e reduzidos, eo fragmento osteocondral estava firmemente fixado em toda a amplitude de movimento do quadril.

Fig. 1
Radiografia pré-operatória do quadril esquerdo em incidência anteroposterior de um paciente com pequena avulsão osteocondral da parede posterior após a redução da luxação do quadril.
Fig. 2
Imagens axiais da tomografia computadorizada pré-operatória do quadril acometido após a redução.
Fig. 3
Radiografia anteroposterior no pós-operatório imediato do quadril do mesmo paciente.

Exercícios isométricos de fortalecimento do quadríceps foram iniciados imediatamente após a cirurgia. Os pacientes foram mantidos em mobilização com suporte de peso com andador por cerca de quatro semanas; em seguida, o suporte de peso aumentou de forma gradual, de acordo com a tolerância, por cerca de 8 a 10 semanas após a cirurgia, dependendo do grau de consolidação radiográfica da fratura. O desfecho clínico foi avaliado pela pontuação no Harris Hip Score em 6 semanas, 3 meses, 6 meses, 1 ano e no último acompanhamento. A qualidade da redução articular e a congruência articular foram avaliadas por radiografias simples pós-operatórias usando a classificação de Matta (anatômica/imperfeita/ruim)55 Matta JM. Fractures of the acetabulum: accuracy of reduction and clinical results in patients managed operatively within three weeks after the injury. J Bone Joint Surg Am 1996;78(11): 1632–1645 e tomografias computadorizadas tridimensionais. A avaliação radiológica no último acompanhamento foi realizada conforme os critérios de Matta:55 Matta JM. Fractures of the acetabulum: accuracy of reduction and clinical results in patients managed operatively within three weeks after the injury. J Bone Joint Surg Am 1996;78(11): 1632–1645 excelente (articulação do quadril com aparência normal), boa (alterações brandas com esclerose mínima e estreitamento articular inferior a 1 mm), regular (alterações intermediárias com esclerose moderada e estreitamento articular inferior a 50%) e ruim (alterações avançadas de osteoartrite). Todos os pacientes foram acompanhados por um período mínimo de 2 anos (média: 44 semanas; variação: 24 a 66 semanas). Não houve infecção do sítio cirúrgico, lesão do nervo ciático, perda da redução ou não consolidação no sítio da osteotomia trocantérica. Todas as fraturas acetabulares estavam consolidadas no último acompanhamento. O tempo médio de consolidação foi de 6,4 (variação: 4 a 10) meses. A média de pontuação no Harris Hip Score no último acompanhamento foi de 92,5 (variação: 90,4 a 95,8). Nenhum paciente desenvolveu características sugestivas de NAV do quadril. O resultado radiológico no último acompanhamento foi considerado excelente em quatro e bom em dois pacientes.

Comentários Finais

A luxação posterior do quadril com fratura de parede é uma lesão comum em acidentes automobilísticos de alta energia. A instabilidade persistente após a redução da luxação ou fixação da fratura deve levar os médicos a buscar qualquer laceração osteolabral posterior. A identificação de um pequeno "sinal de mancha" acetabular em radiografias oblíquas do quadril, perto da parede posterior, na ausência de qualquer fratura acetabular importante, é um marcador de avulsão labral posterior, e deve levar à avaliação completa com teste de estresse usando técnicas de diagnóstico por imagem para a detecção de qualquer instabilidade dinâmica.66 Blanchard C, Kushare I, Boyles A, Mundy A, Beebe AC, Klingele KE. Traumatic, Posterior Pediatric Hip Dislocations With Associated Posterior Labrum Osteochondral Avulsion: Recognizing the Acetabular "Fleck" Sign. J Pediatr Orthop 2016;36(06):602–607 A escolha do método de fixação em avulsões com pequenos fragmentos ósseos é discutível, pois o fragmento não é passível de fixação com âncoras, parafusos ou placas, e o uso apenas de fios de Kirschner não oferece estabilidade. Neste estudo, descrevemos uma nova técnica de fixação dessas pequenas lesões labrais osteocondrais com fios de Kirschner com extremidades dobradas recobertas por placas buttress. As placas aumentaram a estabilidade da fixação dos fios de Kirschner e evitaram sua soltura. Após a fixação, os quadris continuaram estáveis no teste de estresse dinâmico realizado com técnicas de diagnóstico por imagem no centro cirúrgico e em todos os acompanhamentos. Nossa técnica é uma maneira simples, econômica e confiável de corrigir tais avulsões com resultados satisfatórios.

  • Trabalho desenvolvido no Government Medical College and Hospital, Chandigarh, Índia.
  • Suporte Financeiro
    Os autors declaram que não receberam suporte financeiro de agências dos setores público, privado ou sem fins lucrativos para a realização deste estudo.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    28 Dez 2021
  • Aceito
    18 Fev 2022
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