Luxação espontânea do polietileno após artroplastia de revisão de joelho: relato de caso ^☆

Resumos

A luxação do polietileno em artroplastia do joelho é uma complicação rara. O principal fator desencadeante é a falha no mecanismo de travamento, que pode ser decorrente de erros técnicos na inserção, do trauma ou ainda de falha do implante. Os autores relatam caso de luxação do polietileno a partir da base tibial, nove anos após artroplastia de revisão. Acredita-se que seja o primeiro caso relatado na literatura nacional.

Artroplastia do joelho; Polietileno; Falha de prótese

Dislocation of the polyethylene component in knee arthroplasty is a rare complication. The main triggering factor is failure of the locking mechanism, which may result from technical errors of insertion, trauma or even implant failure. Here, a case of dislocation of the polyethylene component from the tibial base, nine years after revision arthroplasty, is reported. It is believed that this is the first such case reported in the Brazilian literature.

Knee arthroplasty; Polyethylene; Prosthesis failure

Introdução

A artroplastia total do joelho é relatada como um dos procedimentos ortopédicos de maior sucesso, com longevidade do implante acima de 15 anos em cerca de 90% dos casos.^{1 and 2} Como complicações mais comumente relatadas destacam-se os problemas de cicatrização da ferida operatória, infecção, distúrbios tromboembólicos, rigidez pós-operatória, fratura periprotética, alterações do tracking patelar, osteólise, soltura asséptica, instabilidade e desgaste do polietileno. ^{3 and 4} Embora submetido ao estresse cíclico com possibilidade de falência secundária à fadiga, o polietileno ser luxado é um evento muito raro. ^{4 and 5} Os autores relatam o que acreditam ser o primeiro caso descrito na literatura nacional.

Relato de caso

Paciente feminina, 68 anos, apresentava histórico de artroplastia do joelho esquerdo feita em 2002. Oito meses após o primeiro procedimento, começou a apresentar quadro álgico local e derrame persistentes. Após seis meses de acompanhamento, com provas inflamatórias persistentemente positivas e cintilografia com tecnécio e gálio indicativas, mas com três artrocenteses sem crescimento bacteriano nas culturas, foi retirada a prótese e inserido espaçador de cimento. Foi isolado o germe Streptococcus viridans, cuja antibioticoterapia foi guiada por coleta de tecido profundo durante o procedimento cirúrgico.

Em outubro de 2003 foi feita revisão da artroplastia, com uso de hastes e cunhas, cimento com antibiótico e polietileno posteroestabilizado. Não houve recorrência da infecção no pós-operatório.

Em 2012 a paciente procurou a emergência do hospital, com queixas de dor súbita e instabilidade no joelho operado após esforço físico abrupto. Ao exame, havia instabilidade grosseira do joelho, derrame articular e dor difusa. Apesar de a hipótese diagnóstica inicial apontar para a possibilidade de fratura periprotética, as radiografias demonstraram deslocamento do polietileno tibial (fig. 1).

Figura 1 -
Radiografias em AP e P do joelho esquerdo que demonstram prótese de revisão sem sinais de soltura e luxação do polietileno tibial.

A paciente, então, foi submetida a nova revisão. No ato cirúrgico, foi evidenciada área de osteólise na metáfise tibial proximal medial, além da luxação do polietileno (fig. 2). Apesar disso, a haste tibial apresentava estabilidade adequada. Procedeu-se, assim, à troca do polietileno e à inserção de uma cunha metálica medial maior (Figura 3 and Figura 4).

Figura 2 -
Imagem clínica do transoperatório da revisão da artroplastia do joelho esquerdo que demonstra osteólise na metáfise tibial medial.

Figura 3 -
Imagem clínica do transoperatório (resultado final) da revisão da artroplastia do joelho esquerdo.

Figura 4 -
Radiografia em AP e P do joelho esquerdo que demonstra controle pós-operatório de revisão de artroplastia, com troca do polietileno e de cunha metálica tibial medial.

Atualmente, com um ano de pós-operatório, a paciente apresenta excelente evolução pós-operatória: sem dor e sem derrame, extensão completa, flexão de 115^o, estabilidade em varo e valgo, adequado trilhamento patelar.

Discussão

A incidência real de luxação do polietileno a partir de sua base tibial é desconhecida. Poucos casos foram relatados na literatura. Até 2007 apenas quatro publicações em língua inglesa descreviam o fenômeno.⁵ A maioria dos relatos se deu em implantes que preservavam os ligamentos cruzados.

As causas não são bem determinadas. Erros técnicos na inserção do polietileno durante a cirurgia, como o assentamento incompleto, e o trauma, podem ocasionar dano e falência do sistema de travamento.⁴ Movimentos de flexão forçada a partir da extensão, por gerar concentração de cargas posteriores aumentadas, podem contribuir para soltura anterior. Assim como causas relacionadas ao design dos implantes, entre elas a existência de base tibial rasa ou do trilho de encaixe do polietileno excessivamente fino.^{4 , 5 , 6 , 7 and 8}

Em relação ao tratamento, a literatura recomenda a cirurgia nos casos suspeitos. Existem relatos de bons resultados com apenas a troca do polietileno. Porém, ensaio in vitro demonstrou que a força necessária ao deslocamento do polietileno era progressivamente menor à medida que se fazia sua troca, o que sugere um enfraquecimento do sistema de travamento. ⁴Portanto, durante a cirurgia de revisão, nos casos em que houver movimento entre a base tibial preexistente e novo polietileno, estará indicada a revisão do componente tibial também. ^{4 , 5 , 7 and 8}

References

• ¹
  Scuderi GR. Complications after total knee arthroplasty: how to manage patients with osteolysis. J Bone Joint Surg Am. 2011;93(22):2127-35.
• ²
  Vasconcelos JW, Leite LMS, Sousa JCA, Sousa JOM, Santos MFS. Avaliação em médio prazo da artroplastia total de joelho sem substituição da patela. Rev Bras Ortop. 2013;48(3):251-6.
• ³
  Ayers DC, Dennis DA, Johanson NA, Pellegrini VD Jr. Common complications of total knee arthroplasty. J Bone Joint Surg Am. 1997;79(2):278-311.
• ⁴
  Wright RC, Crouch A, Yacoubian SV, Raven RB 3rd, Falkinstein Y, Yacoubian SV. Nontraumatic spontaneous dislocation of polyethylene tibial insert after 1 year after TKA. Orthopedics. 2011;34(12):933-5.
• ⁵
  Anderson JA, MacDessi SJ, Della Valle AG. Spontaneous recurrent dislodgment of the polyethylene of tibial insert after total knee arthroplasty. A case report. J Bone Joint Surg Am. 2007;89(2):404-7.
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  Chen CE, Juhn RJ, Ko JY. Dissociation of polyethylene insert from the tibial baseplate following revision total knee arthroplasty. J Arthroplasty. 2001;23(2):339.e11-3.
• ⁷
  Kobayashi H, Akamatsu Y, Taki N, Ota H, Mitsugi N, Saito T. Spontaneous dislocation of mobile-bearing polyethylene insert after posterior-stabilized rotating platform total knee arthroplasty: a case report. Knee. 2011;18(6):496-8.
• ⁸
  Lee DH, Lee TG, Park SJ, Han SB. Spontaneous late dissociation of the tibial insert after high-flex posterior-stabilized Genesis II total knee arthroplasty. J Arthroplasty. 2013;28(2):374-6.

• ☆
  Trabalho desenvolvido no Serviço de Ortopedia e Traumatologia da Santa Casa de Misericordia de Porto Alegre, RS, Brasil.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  Jan-Feb 2015

Histórico

• Recebido
  31 Jan 2014
• Aceito
  11 Fev 2014