Acessibilidade / Reportar erro

A objetividade na publicação científica

A agilidade e a objetividade da informação sofreram um avanço importante com as redes sociais de comunicação, assim como a pesquisa de dados com os sites de busca.

Essas novas características têm causado uma grande transformação em todos os meios de comunicação e de divulgação.

As nossas publicações científicas ainda não foram atingidas por essa evolução, de tal forma que nos distanciamos muito da maneira de transmitir o conhecimento aos jovens.

A divulgação e a disseminação de um fato novo são feitas em segundos, enquanto que na vida acadêmica mantemos uma metodologia arcaica que atrasa esse processo em meses.

Se considerarmos os nossos trabalhos, eles obedecem a uma sistemática de produção ainda baseada em um período muito longo.

Iniciamos a redação de nossos trabalhos pela introdução, capítulo longo que justifica e situa o tema a ser descrito. Esse item tinha cabimento quando as revistas eram gerais, sobre várias especialidades; justificava explicar, por exemplo, que a osteoartrose do joelho era uma doença frequente, que acometia mais mulheres etc., pois os leitores eram médicos generalistas.

Hoje as revistas são de especialidades, quando não são de áreas restritas, como segmentos anatômicos ou patologias especificas (Foot and Ankle, Sports Medicine, Journal of Biophotonics), o que torna desnecessária a longa informação sobre o que será estudado.

A revisão bibliográfica é também dispensável, pois o acesso aos trabalhos sobre o assunto é fácil pelos sites de busca, que são muito bem estruturados, talvez possa ser feita uma citação de trabalhos sobre o assunto muito específica.

Material, métodos, resultados e conclusão são o cerne do trabalho e devem ser objetivos e diretos.

A discussão poderá ser apenas sobre aspectos polêmicos do trabalho, pois facilmente o leitor poderá se informar sobre algum ponto duvidoso.

No que se refere a teses, além de uma produção mais elaborada, há as defesas públicas, que se restringem a poucas pessoas da família do candidato, que não entendem nada sobre o assunto e frequentemente se irritam com um arguidor mais detalhado. No fim se encerram com a habitual aprovação, fotos do candidato com a banca e o esquecimento.

As teses, às vezes muito longas, com títulos enormes (discutidos e modificados várias vezes), com mais de 100 citações bibliográficas, têm o destino de uma prateleira, raramente são consultadas.

Um levantamento feito na Faculdade de Medicina da USP demonstrou que a publicação em revistas científicas é excepcional.

Acredito que poderíamos abolir as teses e substituí-las por papers mais modernos e objetivos, que serão lidos e consultados, divulgando o conhecimento gerado pelo candidato, como é o seu objetivo.

As bancas examinadoras reproduzem reuniões de cardeais, vestidos com trajes pouco elegantes (são na maioria das vezes muito pequenos ou muito grandes) emprestados e que fedem a naftalina, que procuram demonstrar na sua estrutura (cintas, coletes, chapéus) uma hierarquia acadêmica que ninguém entende ou a que ninguém dá importância. Os membros, três ou cinco, analisarão o mesmo trabalho da mesma forma.

O julgamento no sistema atual, no qual os membros da banca examinadora avaliam a qualidade de impressão, detalham o uso da língua portuguesa, a qualidade das fotos, os quadros numéricos, a objetividade ou a falta dela, deveria ser substituído pela análise da carreira do candidato, pois o trabalho, na sua forma e oportunidade de publicação, seria analisado pelos revisores das revistas, nas quais seriam publicados os trabalhos. Os sistemas editoriais são muito eficientes e confiáveis e a aprovação para publicação em revistas previamente selecionadas já seria um dos critérios para se conferir o grau pretendido.

A divulgação do trabalho seria mais eficiente e acessível, pois atingiria um número maior de leitores.

No sistema atual de defesas de tese, podemos aprovar um candidato completamente alheio ao tema que defendeu, com português correto, fotos perfeitas, estatística completa e impressão de acordo. Esse fato já aconteceu no início dos programas de pós-graduação, quando se davam aos candidatos trabalhos prontos, feitos por outros autores, para que defendessem suas teses mais rapidamente.

O candidato é aprovado como um bom “fazedor de tese”, e não como um bom pesquisador ou professor.

A divulgação é fundamental para a valorização do trabalho e do autor.

Consideramos hoje dois tipos de leitores dos trabalhos científicos:

  • - o que faz a pesquisa bibliográfica sobre o assunto, para o qual a revista na qual o trabalho foi publicado é de importância secundária;

  • - o leitor da revista que a folheia como um leitor de jornal, que se detém nos assuntos mais importantes.

Os papers hoje aprovados pela RBO são enviados ao Science Direct, que permite o acesso via internet dos trabalhos em pouco tempo, atendendo ao pesquisador de bibliografia; temos também a publicação impressa, que ainda demanda um período longo para a consulta, pois temos uma limitação de espaço e de periodicidade.

Acredito que os dois sistemas suprem a necessidade de informação e divulgação da produção científica atual. Precisamos apenas adequar os textos aos sistemas mais modernos de publicação, considerar a objetividade do assunto e a facilidade de busca nos sites especializados. Teremos trabalhos mais curtos e mais objetivos, que facilitarão a consulta e aumentarão a possibilidade de publicação.

Gilberto Luis Camanho
Revista Brasileira de Ortopedia, São Paulo, SP, Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2017
Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia Al. Lorena, 427 14º andar, 01424-000 São Paulo - SP - Brasil, Tel.: 55 11 2137-5400 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbo@sbot.org.br