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Suicídio em indígenas no Brasil: um problema de saúde pública oculto

CARTA AOS EDITORES

Suicídio em indígenas no Brasil: um problema de saúde pública oculto

A taxa de mortalidade por suicídio (TMS) na população geral do Brasil é baixa (< 5,0 por 100.000 habitantes).1 Entretanto, estudo recente publicado nesta revista mostra que em São Gabriel da Cachoeira, município com a maior proporção de autodeclarados indígenas, o suicídio é uma séria questão de saúde pública.2 Embora o suicídio seja reconhecido como um importante problema de saúde em algumas áreas do Brasil, não há estatísticas nacionais ou regionais sobre a ocorrência de suicídio entre a população indígena. Evidências de diferentes partes do mundo indicam que as populações "nativas" são particularmente vulneráveis a uma série de agravos a saúde, incluindo o suicídio.3 Este estudo compara as taxas de mortalidade por suicídio (TMS) entre as populações indígenas e não indígenas, excluindo crianças com menos de 5 anos de idade, das cinco macrorregiões do país durante o período de 2006 a 2010, a partir de dados do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). Os dados se encontram resumidos na Tabela 1.

A TMS da população indígena do Brasil foi mais do que o dobro da observada na população não indígena. No Centro-oeste, a TMS na população indígena foi 7,0 vezes maior que a observada na população não indígena; para o estado do Mato Grosso do Sul, a TMS foi de 76,4 e 6,9 por 100.000 habitantes nas populações indígena e não indígena, respectivamente. Na macrorregião Norte está situada grande Amazônia brasileira, bem como a maior parcela de autodeclarados indígenas do país. A TMS na população indígena dessa região foi de 15,1 por 100.000 habitantes, 3,8 vezes maior que na população não indígena. É importante ressaltar que no Norte, nos estados do Amazonas e de Roraima, a TMS foi de respectivamente 20,0 e 20,2 por 100.000 habitantes - ou seja, 5,0 e 2,5 vezes maior que o valor observado na população não indígena. Nas regiões Nordeste, Sudeste e Sul, as TMS foram ligeiramente maiores entre as populações não indígenas do que entre as populações indígenas; no entanto, as TMS para ambas não foram superiores a 9,0 por 1000.000 habitantes. Corroborando achados internacionais, demonstramos que o suicídio é um importante problema de saúde no Brasil, especialmente entre os povos indígenas, e particularmente, nas regiões Centro-oeste e Norte. Esses resultados revelam uma questão de saúde pública nacional que, até o momento, encontrava-se oculta e ignorada. Deste modo, propomos que pesquisas adicionais sejam realizadas para explorar ainda mais a variação regional da TMS no Brasil e para investigar as TMS entre as populações indígenas Sul, Nordeste e Sudeste - que foram menores do que as observadas no Centro-oeste e no Norte do país. Por fim, apontamos a necessidade de uma maior atenção por parte das autoridades nacionais e locais para o do suicídio entre os povos indígenas. A diversidade cultural de cerca de 225 povos indígenas deve ser levada em consideração, pois existem diversos grupos culturalmente diferenciados e que possuem distintas histórias de contato com a população não indígena. Deste modo, o objetivo deve ser o desenvolvimento de estratégias culturalmente sensíveis, capazes de enfrentar os contextos sociocultural e sanitário nos quais ocorrem as atuais TMS.

Maximiliano Loiola Ponte de Souza

& Jesem Douglas Yamall Orellana

Instituto Leônidas e Maria Deane,

Fundação Oswaldo Cruz, Brasil

Referências

  • 1. Mello-Santos C, Bertolote JM, Wang YP. Epidemiology of suicide in Brazil (1980-2000). Rev Bras Psiquiatr. 2005;27:131-4.
  • 2. Souza MLP, Orellana JDY. Suicide mortality in São Gabriel da Cachoeira, a predominantly indigenous Brazilian municipality. Rev Bras Psiquiatr. 2012;34:34-7.
  • 3. Hawton K, van Heeringen K. Suicide. Lancet. 2009;373:1372-81.
  • 4. Hunter E, Harvey D. Indigenous suicide in Australia, New Zealand, Canada, and the United States. Emerg Med. 2002;14(1):14-23.
  • 5. Azevedo MM. Diagnóstico da população indígena no Brasil. Cienc Cult. 2008;60(4):19-22.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Jan 2013
  • Data do Fascículo
    Dez 2012
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