Open-access Comparação do desempenho cognitivo entre escolares nascidos prematuros segundo presença de hemorragia intracraniana no período neonatal

Resumo

Objetivos:  comparar o desempenho cognitivo de escolares, nascidos prematuramente, segundo a presença de hemorragia intracraniana (HIC) no período neonatal.

Métodos:  corte transversal de uma coorte de escolares com idade entre seis e oito anos que nasceram prematuramente e apresentaram ou não HIC, realizado entre janeiro e dezembro de 2015, acompanhados em ambulatório de seguimento de hospital terciário e submetidos à avaliação cognitiva, através da Escala de Inteligência Wechsler para Crianças-3ª edição (WISC-III), que foram divididos em dois grupos: sem HIC (grupo controle - GC) e com HIC (grupo de casos - GH) comprovada através de exame ultrassonográfico transfontanelar no período perinatal.

Resultados:  foram incluídos 39 escolares, 18 no GC e 21 no GH. Não se observou dife-rença entre os grupos quanto à idade gestacional e idade cronológica na qual eles foram avaliados. Não foi encontrada diferença estatística entre os grupos estudados nos valores dos subtestes.

Conclusões:  o desempenho cognitivo de crianças nascidas pré-termo que tiveram HIC não difere daquele que não a apresentaram quando avaliadas pelo WISC-III na faixa etária de seis a oito anos. Sugere-se que o diagnóstico neonatal de HIC pode não estar associado ao desempenho cognitivo de prematuros, na idade escolar, o que deverá ser investigado através de estudo longitudinal.

Palavras-chave Recém-nascido prematuro; Hemorragias intracranianas; Inteligência

Abstract

Objectives:  to compare the cognitive performance of schoolchildren born prematurely according to the presence of intracranial hemorrhage (ICH) during the neonatal period.

Methods:  a cross-sectional cohort study of schoolchildren between the ages of 6-8 years old, born prematurely with or without a history of neonatal ICH. Between January and December 2015, some children were followed up at the outpatient clinic of a tertiary hospital and underwent a cognitive evaluation by using the Wechsler Intelligence Scale for Children, Third Edition (WISC-III) and they were divided into two groups: those with no history of ICH (control group) and those with ICH (case group), confirmed by a transfontanelar ultrasound in the prenatal period.

Results:  39 schoolchildren were included, 21 cases and 18 controls. There was no difference in gestational age or chronological age at evaluation between the groups. Also there was no significant difference in subtest scores between the groups.

Conclusions:  WISC-III evaluated the cognitive performance in children, born preterm, aged 6-8 years old, and had neonatal ICH did not differ from those of their peers without a history of ICH. These findings suggest that, in preterm infants, a neonatal diagnosis of ICH may not be associated with cognitive performance at school age and this should be investigated through a longitudinal study.

Key words Preterm birth; Intracranial hemorrhage; Intelligence

Introdução

As consequências da prematuridade sobre o desenvolvimento infantil se configuraram como indicadores importantes do comprometimento do desenvolvimento cognitivo,1,2 em especial na idade escolar, quando as demandas acadêmicas se tornam mais pronunciadas,3 necessitando identificação e intervenção precoces, aproveitando-se da maior plasticidade neuronal observada no período neonatal.4

Há evidências consideráveis de que crianças nascidas prematuramente apresentam maior prevalência da incapacidade cognitiva, pois dificuldades de moderadas a graves no desempenho escolar e funções executivas pobres têm sido observadas,5 que na adolescência e na idade adulta persistem, em relação aos seus pares nascidos a termo.2,5,6

Entre as várias complicações neonatais associadas à prematuridade, destaca-se a hemorragia intracraniana (HIC), citada na literatura como preditora de alterações no desenvolvimento neurológico e da reduzida competência cognitiva.6-8

Atribuída à imaturidade da matriz germinativa, a HIC, em especial a intraventricular, é a principal morbidade encefálica observada no recém-nascido prematuro nas primeiras 24-48 horas de vida, parti-cularmente naqueles com peso de nascimento inferior a 1.500g. Seu mecanismo é multifatorial,9 envolve uma combinação relacionada à imaturidade vascular e anatômica, e de fatores hemodinâmicos, além de possíveis fatores inflamatórios e genéticos, que continuam sendo investigados.10

A gravidade da HIC tem sido avaliada pela classificação de Papile et al.,11 em que o grau I a hemorragia está confinada à matriz germinal, no grau II a hemorragia está presente no ventrículo lateral, sem que haja dilatação, no grau III, achados do grau II estão associados à presença de dilatação ventricular e, no grau IV, além dos achados do grau III, encontra-se hemorragia parenquimatosa.10

Entretanto, ainda não se sabe, adequadamente, se aquelas crianças que nasceram prematuramente e apresentaram HIC no período perinatal, ao chegar à idade escolar, apresentarão ou não alterações na avaliação cognitiva (visto ser nessa fase que pro-blemas relacionados à cognição são mais facilmente detectados).

O uso de instrumentos padronizados para avaliação do desenvolvimento infantil, adaptados e validados para a realidade brasileira, tal como a Escala de Inteligência Wechsler para Crianças-3ª edição (WISC-III),12 tem sido recomendado como estratégia para promoção da saúde infantil. O WISC III é um dos instrumentos mais respeitados e mundialmente utilizados e adaptados para uso em outras culturas e outros países; é voltado para o contexto clínico, psicoeducacional e de pesquisa, possibilitando a avaliação detalhada da capacidade cognitiva de crianças.12-14

Identificar se a HIC é preditora para alterações na avaliação cognitiva de crianças nascidas prematuramente, justifica o interesse em se aprofundar a investigação sobre a questão. Dessa forma, o objetivo do estudo foi comparar o desempenho cognitivo de escolares, que nasceram prematuramente, segundo presença ou ausência de HIC no período neonatal.

Métodos

Trata-se de um estudo de corte transversal de escolares na faixa etária de seis a oito anos, que nasceram com idade gestacional (IG) menor do que 37 semanas, que realizaram ultrassonografia transfontanelar no período neonatal e foram acompa-nhados no ambulatório de Seguimento de Recém-nascido de Risco. O estudo foi realizado no Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP) no período de janeiro a dezembro de 2015.

Os escolares recrutados para o estudo foram divididos em dois grupos: Grupo Controle (GC) - aqueles nascidos prematuramente e que não apresentaram HIC; e Grupo de casos (GH) - aqueles que nasceram prematuramente e apresentaram HIC. Foram incluídas as crianças que se encontravam em situação clínica estável e capazes de manter a atenção necessária para execução das tarefas solicitadas, referentes ao instrumento de avaliação. Foram excluídas crianças portadoras de síndromes genéticas, malformações congênitas, aquelas com perda visual e/ou auditiva que impediam a realização dos procedimentos propostos, e as que apresentaram, entre o período perinatal e a idade escolar, doença neurológica ou outra comprometendo o sistema nervoso central.

Na ocasião da avaliação, todos os participantes estavam frequentando regularmente a escola, e a maioria (95%) apresentava idade cronológica compatível com o ano escolar cursado.

Para compor a amostra foi realizada consulta e análise documental dos prontuários médicos das crianças, com o propósito de obter informações sobre as condições neonatais registradas pelo neonatologista durante a internação na UTI Neonatal do HUAP. A avaliação das crianças foi realizada em duas sessões. A 1ª sessão foi reservada ao preenchimento da ficha de caracterização dos participantes e ao primeiro encontro da psicóloga com a criança e os pais; a 2ª sessão foi destinada à aplicação do instrumento de avaliação para verificação do desempenho cognitivo. Isto foi feito individualmente, em uma única sessão, no Ambulatório do Desenvolvimento Infantil do Setor de Psiquiatria da Infância e Adolescência. As respostas foram registradas em protocolos do próprio instrumento para posterior análise e interpretação.

O WISC-III é um instrumento que avalia a inteligência de crianças entre seis e 16 anos e 11 meses de idade, que permite traçar o perfil cognitivo de cada participante, considerando um modelo que enfatiza as habilidades verbais e não verbais.12 É organizado em dois grupos: escala verbal (Informação, Semelhanças, Aritmética, Vocabulário, Compreensão e Dígitos) e escala de execução ou não verbal (Completar figuras, Código, Arranjo de figuras, Cubos, Armar objetos e Procurar símbolos). A partir de escores ponderados obtém-se o quociente de inteligência total (QIT) resultante de dois grupos de subtestes: o escore verbal que resulta em QI Verbal (QIV) e o escore executivo que resulta em QI de Execução (QIE). Os subtestes oferecem também quatro “Índices Fatoriais” associados às competências especificas: Compreensão verbal, Organização perceptual, Resistência a distração e Velocidade de processamento. Os resultados são expressos como quociente de inteligência (QI) e estão distribuídos em sete categorias: muito superior (≥ 129), superior (120-128), média superior (110-119), média (90-109 pontos), média inferior (80-89), limítrofe (70-79) e pontuações abaixo de 70 sugerem deficiência intelectual.12

O WISC-III foi aplicado por um único profissional, sendo o resultado revisado, imediatamente depois, por outro profissional, ambos psicólogos com mais de 15 anos de experiência na área de desenvolvimento infantil. No momento da realização do estudo, embora a Escala de Inteligência Wechsler para criança- 4ª edição (WISC-IV)14 já tivesse sido publicada, optou-se por utilizar o WISC-III, validado para uso no Brasil até 2018, e que se encontrava em uso no Setor de Psiquiatria da Infância e Adolescência.

A estatística para a idade gestacional e a idade da avaliação cognitiva dos escolares inclusive médias, desvio padrão e intervalo de confiança, e as dife-renças entre os grupos foram avaliadas pelo teste t de Student. Os graus de HIC foram apresentados na forma de frequência. Para avaliação da pontuação ponderada encontrados nos subtestes de ambos os grupos do estudo, após a verificação quanto à normalidade das distribuições (teste de Shapiro-Wilk) foram comparados pelo teste de Mann-Whitney. O nível de significância aceito foi de p<0,05.

Para a análise estatística usou-se o software IBM-SPSS (Versão 18.0, SPSS Inc.©, Chicago, Illinois).

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense, com parecer nº 1.103.474.

Resultados

Cento e quarenta e um escolares que nasceram pré-termo e que em 2015 estavam na faixa etária de seis a oito anos, foram relacionados para participar do estudo. Desses, 27 estavam dentro dos critérios de exclusão, houve 71 perdas e quatro não aceitaram participar. A amostra final do estudo foi composta de 39 participantes, 21 crianças que nasceram prema-turas e apresentaram HIC, grupo de casos (GH) e 18 que não tiveram HIC, o grupo controle (GC), conforme o fluxograma da Figura 1.

Figura 1
Fluxograma da seleção dos participantes do estudo. Niterói-RJ, 2015.

GH = Grupo de casos; GC = Grupo controle.


Os 21 participantes do GH, de acordo com a classificação de Papile et al.,11 foram distribuídos da seguinte forma: 6 (28,6%) apresentaram HIC grau I, 9 (42,9%) tinham HIC grau II e 3 (14,2%) crianças representaram tanto os participantes com HIC grau III como os com HIC grau IV.

Os valores médios e seus indicadores de dispersão relativos aos grupos GC e GH, com relação à idade gestacional e a idade da avaliação cognitiva, estão na Tabela 1.

Tabela 1
Média de idade, desvio padrão e intervalo de confiança, das crianças dos GC e GH. Niterói-RJ, 2015.

Os resultados da avaliação pelo WISC-III para examinar os coeficientes de inteligência e compreender o funcionamento intelectual de crianças do GC e GH encontram-se nas Tabelas 2 e 3.

Tabela 2
Resultados obtidos nos subtestes do WISC-III das crianças dos GC e GH. Niterói-RJ, 2015.
Tabela 3
Escores do QI Total, Verbal e de Execução e dos Índices Fatoriais do WISC-III dos GC e GH. Niterói-RJ, 2015.

Considerando que nas escalas Wechsler o escore médio é dez e o desvio padrão é três, os resultados obtidos mostraram que pontuações acima de 10 pontos ponderados foram observadas em todos os subtestes de ambos os grupos, com exceção do subteste informação (escala verbal), cuja média foi inferior a 10 pontos ponderados no grupo GH. Nos dois grupos o melhor desempenho foi obtido no subteste Completar figuras, que pertence à escala de execução. Os menores valores se referem aos subtestes Informação e Procurar símbolos realizados pelos participantes do GH e Compreensão, aplicado ao GC, indicando maior homogeneidade no desempenho dos participantes. Em contrapartida, os subtestes que apresentaram maior desvio padrão foram Vocabulário (escala verbal) e Cubos (escala execução) do grupo GH e os subtestes Aritmética, Vocabulário e Dígitos (escala verbal) realizados pelos participantes do GC. Não foi encontrada dife-rença estatisticamente significativa nos subtestes entre os dois grupos estudados.

A Tabela 3 apresenta os resultados dos quocientes de inteligência Total, Verbal e Execução e dos Índices Fatoriais do WISC-III. Nota-se que os dois grupos obtiveram resultados na média e acima da média da amostra normativa, onde uma pontuação de 100 em qualquer uma das três escalas define o desempenho médio de uma criança numa determinada idade.

Os dados revelam ainda que o grupo GC obteve médias maiores para QIV, QIE e QIT, como também, melhor desempenho nas dimensões Compreensão verbal e Organização perceptual em comparação com os valores obtidos entre o GH. Nos participantes do GH, a média do QIE foi superior à do QIV; discrepância nesse mesmo sentido foi encontrada nos índices fatoriais Compreensão verbal e Organização perceptual (QICV>QIOP). A amostra de crianças do GC apresentou o mesmo desempenho nas dimensões Compreensão verbal, Organização perceptual e Velocidade de processamento. O melhor desempenho do GH foi obtido na dimensão Velocidade de processamento. Não foram observadas diferenças significativas entre os dois grupos para nenhum dos escores (Tabela 3).

Na Tabela 4 encontram-se os percentuais dos escores do WISC-III, relativos às categorias de Quociente de Inteligência entre os dois grupos. Observa-se que a maioria dos participantes, nos dois grupos, ficou distribuída na categoria considerada média, seguidos pela categoria média superior em relação ao QI total. Agrupando-se as classificações, observou-se que 95,5% das crianças do GH foram classificadas nos níveis médio, médio superior e superior e 9,5% das crianças apresentaram desenvolvimento intelectual abaixo da média, classificadas no nível médio inferior.

Tabela 4
Percentuais de escores do WISC-III relativos às diferentes categorias do QI Total, QI Verbal e QI de Execução dos GC e GH. Niterói-RJ, 2015.

Quanto ao desempenho nas áreas verbal e de execução, a maioria das crianças, nos dois grupos, apresentou resultado classificado na categoria média. Observou-se que 18 (85,7%) do GH obtiveram classificação na média ou acima da média, 2 (9,5%) com desempenho na média inferior e 1 (4,8 %) classificada como limítrofe no QIV. Em relação ao QIE, 100,0% das crianças do GH ficaram com classificação na média ou acima da média. No GC, quanto ao QIV, 16 (88,9%) alcançaram desempenho na média ou acima dela e 2 (5,6%) crianças obtiveram desempenho considerado insatisfatório, sendo uma classificadas na categoria média inferior e outra na categoria limítrofe (Tabela 4).

Discussão

Prematuridade e presença de HIC no período neonatal constituem-se fatores de risco para o desenvolvimento em diferentes etapas evolutivas, em especial na idade escolar, quando as dificuldades de natureza cognitiva tornam-se mais pronunciadas.3 No entanto, no presente estudo, observou-se que os escolares, tanto do GH como do GC, mostraram, na sua maioria, inteligência dentro da média, indicando adequado desempenho intelectual. Quanto ao perfil cognitivo, as crianças avaliadas pelo WISC-III obtiveram pontuação dentro da média encontrada na amostra normativa, onde uma pontuação de 100, em qualquer uma das três escalas, define o desempenho médio de uma criança numa determinada idade.12

O desempenho obtido nos QIT, QIV, QIE e nos índices fatoriais, não se mostrou associado à HIC, embora nos resultados entre participantes dos dois grupos os índices de QIT, QIV e QIE fossem inferiores no GH, como também, os índices Compreensão verbal e Organização perceptual.

Considerando que as crianças pré-termo com HIC I e II tendem a se recuperar bem, mas podem apresentar comprometimento do desenvolvimento quando comparadas às que não apresentam este agravo,8,15,16 observou-se que os resultados obtidos pelo WISC-III, mostraram pequena discrepância, onde crianças do GH obtiveram menores escores nos QIV, QIE e QIT em comparação como o GC, ainda que, as crianças nos dois grupos, tenham apresentado nível intelectual normal.

Não foi encontrado comprometimento genera-lizado das funções cognitivas entre os participantes do estudo, como os resultados de estudo anterior.17 Somente no subteste Informação, que avalia a organização, a eficiência de memória e o nível de conhecimento, realizado pelos participantes do GH, a média foi menor que 10 pontos ponderados, não tendo sido constatadas alterações nas demais funções cognitivas. Outros autores1,2 apontam para alte-rações cognitivas específicas, sendo que a atenção, a memória, a habilidade visomotora, a dificuldade específica com números, a velocidade de processamento e o déficit de função executiva são algumas das mais frequentemente citadas.

Estudo realizado na França mostrou que 68% das crianças nascidas com IG menor que 32 semanas, apresentaram perfis cognitivos normais entre seis e dez anos de idade, distúrbios menores em 18% e transtornos maiores em 14%.18 Esses resultados concordam parcialmente com o estudo atual, enquanto uma revisão desenvolvida com crianças nascidas com IG menor que 33 semanas constatou que seus escores de QI entre cinco e 11 anos estavam na faixa cognitiva média,19 mostrou semelhança com os achados do presente estudo.

Uma coorte que investigou a relação da gravidade de HIC com o desenvolvimento cognitivo em crianças aos oito anos de idade nascidas com menos de 1000g e IG menor que 28 semanas, encontrou paralisia cerebral, dificuldade motora e grande deficiência neurossensorial quando a HIC era grau IV, e os domínios do funcionamento cognitivo foram piores com o aumento de sua gravidade. Essas crianças com HIC grave representaram pequena parcela da amostra, não tendo sido observado comprometimento significativo naquelas que apresentaram menores graus de HIC.20 Esses resultados se assemelham ao atual, principalmente por tratar-se de prematuros maiores de 31 semanas, pois os menores de 30 semanas são mais vulneráveis e apresentam piores prognósticos na presença de HIC, porque além da própria prematuridade existe maior chance de hemorragia, por se encontrarem na maior fase de neovascularização.9

Poucos estudos de seguimento de pré-termo com HIC foram encontrados na literatura,7,15,16 principalmente, a médio e longo prazo e tendo o WISC III como instrumento para avaliação do desempenho cognitivo. Dessa forma, tornou-se necessário contemplar, também como referencial teórico, estudos que se aproximavam mais da população estudada, como os realizados com pré-temo menores que 28 semanas e idade cronológica menor ou maior que a do grupo estudado.6-8,15-18

A maior limitação desta pesquisa foi a não rea-lização de um estudo longitudinal que permitiria avaliar as mudanças no desenvolvimento cognitivo dos participantes ao longo do tempo. Utilizou-se uma amostra de crianças egressas da UTI neonatal e encaminhadas ao ambulatório de segmento, ao qual na maioria das vezes não retornavam, impondo-se a construção de uma amostra por conveniência, que junto com o reduzido tamanho amostral pode ter dificultado a observância de diferenças estatísticas.

É possível que os resultados favoráveis obtidos na avaliação do desempenho cognitivo devam-se ao acompanhamento no ambulatório de segmento da maioria das crianças em pelo menos até os 24 meses de idade, por equipe multidisciplinar constituída por neonatologista, enfermeira, nutricionista e psicóloga e onde os pais ou responsáveis receberam orientação sobre estimulação essencial ao desenvolvimento. Intervenções como brincar, ler, estimulação tátil e/ou motora voltadas para o período da primeira infância, de zero a três anos, ajudam a melhorar o funcionamento neuro-cognitivo ao longo da vida.21

O desempenho cognitivo de crianças nascidas pré-termo que tiveram HIC não difere daquele de crianças que não a apresentaram, quando avaliadas pelo WISC-III na faixa etária de seis a oito anos. Nesse contexto, sugere-se que o diagnóstico neonatal de HIC pode não estar associado ao desempenho cognitivo de prematuros, ao chegar na idade escolar, o que deverá ser investigado através de um estudo longitudinal.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Set 2019
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2019

Histórico

  • Recebido
    27 Abr 2018
  • Revisado
    29 Jan 2019
  • Aceito
    25 Mar 2019
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