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Comprometimento neurológico de gêmeas monozigóticas com infecção congênita presumida pelo Zika vírus: Relato de caso

Resumo

Introdução:

o aumento da incidência de microcefalia congênita no Brasil tem sido associado à epidemia do zika vírus. Este relato objetivou descrever o comprometimento neurológico de gêmeas monozigóticas presumidamente infectadas intra-útero pelo zika vírus durante a epidemia brasileira de 2015.

Descrição do caso:

gêmeas monozigóticas, nascidas a termo, com microcefalia congênita severa, foram encaminhadas ao serviço ambulatorial de Pediatria do Hospital Universitário. Genitora de 17 anos, residente na região Nordeste do Brasil, primigesta, índice de massa corpórea normal, sem história familiar de microcefalia ou relato de história clínica de doenças virais e de exposição a drogas e/ou radiação durante a gestação. Na avaliação médica pré-natal, as sorologias para toxoplasmose, rubéola, sífilis, citomegalovírus e HIV foram negativas e as ultrassonografias obstétricas revelaram gestação gemelar mono-coriônica diamniótica, sem evidências de anormalidades neurológicas. Os exames de imagem do crânio pós-natais evidenciaram maior comprometimento neurológico em uma das geme-lares, que além de apresentar calcificações cerebrais, gliose e cistos subependimários, também portava ventriculomegalia acentuada com hidrocefalia de predomínio supratentorial e atrofia cerebral mais pronunciada em relação à outra gemelar. Ambas apresentaram atraso de desenvolvimento neuropsicomotor.

Discussão:

alterações neurológicas distintas em gêmeas monocoriônicas com infecção presumida por zika vírus podem suscitar a hipótese da existência de fatores de predisposição ou de proteção contra esse agente viral.

Palavras-chave
Infecções por arbovírus; Microcefalia; Gêmeos

Abstract

Introduction:

the increase in the incidence of congenital microcephaly in Brazil has been associated to the Zika virus outbreak. This case report aimed to describe the neurological impairment of monozygotic twins presumably due to an intrauterine infection by Zika virus during the Brazilian outbreak in 2015.

Case description:

The monozygotic twins born at term with severe congenital microcephaly were taken to the Outpatient Pediatric Service of a University Hospital. The 17-yearold mother, primigravida, lives in the Northeast region of Brazil, has a normal body mass index, no family history of microcephaly, no clinical history of viral diseases, or exposure to drugs and/or radiation during pregnancy. Serological tests for toxoplasmosis, rubella, syphilis, cytomegalovirus and HIV were negative at the prenatal evaluation and the obstetrical ultrasounds showed a monochorionic, diamniotic twin pregnancy without any evidence of neurological abnormalities. In the post-natal, the imaging of the skull, was evidenced of a great neurological impairment in one of the twins, who, in addition to presenting cerebral calcifications, gliosis and subependymal cysts, also had ventriculomegaly with hydrocephalus of supratentorial predominance and more pronounced cerebral atrophy compared to the other twin. Both presented delayed neuropsychomotor development.

Discussion:

distinct neurological alterations in the monochorionic twins with an infection presumed by Zika virus may raise the hypothesis of the existence of predisposing factors or protection against this viral agent.

Key words
Arbovirus infections; Microcephaly; Twins

Introdução

No Brasil, observou-se, a partir do ano de 2015, um crescimento inesperado de crianças nascidas com diagnóstico de microcefalia, notadamente na região Nordeste, e esta época coincidiu com o período da confirmação da transmissão autóctone da febre pelo Zika vírus (ZIKV) no país.11 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de vigilância em saúde. Monitoramento dos casos de dengue, febre de chikungunya e febre pelo vírus Zika até a Semana Epidemiológica 52, 2015. Bol Epidemiol. 2016; 47 (3): 110. A relação entre casos de microcefalia e de síndromes neurológicas neonatais com a infecção congênita por ZIKV está bem estabelecida e reconhecida no Brasil, como também em outros dez países e territórios, os quais incluem a Polinésia Francesa, Colômbia, Panamá, Martinica, entre outros.22 World Health Organization (WHO). Situation report: Zika Virus, Microcephaly and Guillain-Barré Syndrome, 26 may 2016. Geneva: WHO Press; 2016. p.14

O aumento do número de casos de microcefalia congênita em Pernambuco e em outros estados do Nordeste brasileiro levou o Ministério da Saúde a decretar, em 11 de novembro de 2015, estado de emergência de saúde pública nacional. Posteriormente, em fevereiro de 2016, em decorrência da disseminação para outros países americanos, a Organização Mundial de Saúde declarou a epidemia por ZIKV uma emergência de saúde pública de interesse internacional.33 Teixeira MG, Costa CN, Oliveira WK De, Nunes ML, Rodrigues LC. The Epidemic of Zika Virus - Related Microcephaly in Brazil: Detection , Control , Etiology , and Future Scenarios. Am J Public Health. 2016; 106 (4): 601-5.

O ZIKV é um flavivírus neurotrópico transmitido por artrópodes e que tem a capacidade de causar surtos infecciosos em larga escala onde o vetor biológico Aedes aegypti é endêmico.44 Minassian ML. Virus Zika: Crónica de una pandemia "impensada". Rev Argent Microbiol. 2016; 48 (2): 97-9. Estima-se que cerca de 80% dos casos das infecções adquiridas sejam assintomáticas, e que os demais cursem com sintomatologia branda (febre súbita, artralgia, rash maculopapular ou conjuntivite não purulenta) e entrem em fase de resolução dentro de poucos dias a uma semana. Além da transmissão vetorial, são reconhecidas as transmissões sexual e vertical materno-fetal.55 Staples JE, Dziuban EJ, Fischer M, Cragan JD, Rasmussen SA, Cannon MJ, Frey MT, Renquist CM, Lanciotti RS, Munoz JL, Powers AM, Honein MA, Moore CA. Interim guidelines for the evaluation and testing of infants with possible congenital Zika Virus infection - United States, 2016. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2016; 65 (3): 63-7.

Microcefalia é caracterizada por um perímetro cefálico abaixo do esperado para a idade e sexo ao nascimento e pode ser causada por qualquer fator que interfira na proliferação e/ou diferenciação das células nervosas, ocasionando distúrbios no desenvolvimento cerebral. As causas podem ser genéticas ou ambientais, tais como a exposição materna a agentes virais, etanol, drogas e radiação durante a gestação.66 Passemard S, Kaindl AM, Verloes A. Microcephaly. In: Handbook of clinical neurology, pediatric neurology part I. Elsevier BV, editor. London: Elsevier; 2013. p. 129-41.

A microcefalia relacionada à infecção pelo ZIKV consiste em tema relevante para a saúde pública global22 World Health Organization (WHO). Situation report: Zika Virus, Microcephaly and Guillain-Barré Syndrome, 26 may 2016. Geneva: WHO Press; 2016. p.14 e compreender seu mecanismo patogênico é um desafio para o sistema de assistência à saúde pois os dados disponíveis na literatura são limitados.77 Adibi JJ, Marques ETA, Cartus A, Beigi RH. Teratogenic effects of the Zika virus and the role of the placenta. Lancet. 2016; 387 (10027): 1587-90. Este relato de caso descreve danos neurológicos distintos em gêmeas monocoriônicas presumida-mente causados por infecção intrauterina por ZIKV.

Descrição

Gêmeas monozigóticas, nascidas em 26 de fevereiro de 2016, a termo às 37 semanas e 1 dia de gestação, em hospital público municipal, por parto cesáreo, a primeira gemelar com peso e perímetro cefálico (PC) ao nascer de 2.362 g e 26 cm, e a segunda gemelar, 2.506 g e 28,5 cm, respectivamente. Ao nascimento, ambas apresentaram Apgar de 10 aos 1º e 5º minutos. A genitora era primigesta, residente na região Nordeste do Brasil, 17 anos de idade, O Rh positivo, índice de massa corpórea normal, sem história familiar de microcefalia e sem relato de história clínica de doenças virais exantemáticas e de exposição a drogas e/ou radiação durante a gestação. Na avaliação médica pré-natal iniciada ao terceiro mês de gestação, as sorologias "TORCHS" (sífilis, toxoplasmose, rubéola, citomegalovírus e HIV) foram normais, com imunidade materna para rubéola, enquanto que três ultrassonografias obstétricas não revelaram anormalidades neurológicas e concluíram tratar-se de gestação gemelar monocoriônica diamniótica.

Devido à microcefalia congênita, as gemelares foram encaminhadas ao ambulatório de Pediatria do Hospital Universitário (HU), iniciando-se a avaliação médica pós-natal aos 48 dias de nascidas. Neste serviço, obteve-se resultados normais para rastrea-mento "TORCHS" das gemelares e da genitora (imune para rubéola). Os resultados dos exames de fundoscopia, raio-X de tórax, ecocardiograma e eletrocardiograma das gemelares foram normais. À avaliação fonoaudiológica realizada com um mês e 24 dias de vida, as gemelares não apresentaram alterações no exame de Emissão Otoacústica (teste da orelhinha) e foi sugerido o acompanhamento para a estimulação precoce. Aos 2 meses e 16 dias de nascidas, foram avaliadas pelo serviço de Neuropediatria do HU, confirmando-se o diagnóstico de microcefalia severa por apresentarem PC abaixo de três desvios-padrão da média para a idade e sexo, o da primeira gemelar de 30,5 cm e o da segunda gemelar de 32,0 cm. Além disso, a primeira gemelar apresentava sinais de atraso de desenvolvimento neuropsicomotor (atraso na motricidade) ao exame físico. Ambas foram encaminhadas e iniciaram reabilitação com fisiote-rapia duas vezes por semana.

Em avaliação neuropediátrica subsequente, aos 5 meses e 29 dias de vida, a genitora relatou o surgimento de crises mioclônicas na primeira gemelar, numa frequência de duas vezes por semana, iniciando-se tratamento com Fenobarbital 3mg/kg em dose fracionada. O atraso de desenvolvimento neuropsicomotor da segunda gemelar (atraso na motricidade e linguagem) foi evidenciado aos 7 meses e 24 dias de vida.

A Ultrassonografia craniana da primeira gemelar evidenciou acentuada dilatação nos cornos posteriores e átrios dos ventrículos laterais; redução significativa da espessura do parênquima cerebral e do corpo caloso e pobreza de circunvoluções; calcifi-cações lentiformes e cistos subependimários a nível do sulco caudotalâmico. Na segunda gemelar, o referido exame revelou leve redução da espessura do parênquima cerebral e do corpo caloso; calcificações puntiformes subcorticais e periventriculares mais evidentes à direita e cistos septados a nível do sulco caudotalâmico. Em ambas as gemelares, a tomo-grafia computadorizada de crânio observou microce-falia; calcificações parenquimatosas esparsas em ambos os hemisférios de predomínio subcortical; gliose e atrofia. A primeira gemelar apresentou ainda hidrocefalia de predomínio supratentorial (Figura 1). O ventrículo lateral direito da segunda gemelar apresentava dimensões aumentadas (Figura 2).

Figura 1
Tomografia de Crânio Computadorizada da primeira gemelar.

Tomografia Computadorizada em plano axial do crânio de criança (primeira gemelar) com microcefalia presumidamente associada ao zika vírus demonstrando aumento acentuado das dimensões do sistema ventricular, redução da espessura do manto cortical e calcificações parenquimatosas esparsas predominantemente subcorticais.


Figura 2
Tomografia de Crânio Computadorizada da segunda gemelar.

Tomografia Computadorizada em plano axial do crânio de criança (segunda gemelar) com microcefalia presumidamente associada ao zika vírus demonstrando aumento das dimensões do sistema ventricular, predominantemente do ventrículo lateral direito, e calcificações parenquimatosas esparsas predominantemente subcorticais.


Devido à coincidência da época da gestação e parto com o período de grande circulação do ZIKV no Nordeste do Brasil e à relação dos achados tomo-gráficos dos crânios de ambas as gemelares com infecção em período intra-útero, tendo sido excluída a soropositividade para "TORCHS", as crianças foram clinicoepdemiologicamente diagnosticadas com presumível infecção por ZIKV intra-uterino. Os testes moleculares e sorológicos específicos para ZIKV permanecem em investigação. Aos um ano e cinco meses de nascidas, a primeira gemelar apresentava sinais clínicos de moderada a severa tetra-paresia espástica e PC de 38 cm e a segunda gemelar, de espasticidade de predomínio braquial e PC de 38,8 cm. Ambas permanecem em acompanhamento pediátrico ambulatorial trimestral no HU.

Discussão

A infecção pelo ZIKV durante o primeiro trimestre da gestação pode prejudicar a neurogênese, uma vez que este vírus induz a morte dos neurônios e inibe o desenvolvimento cerebral, podendo resultar em graves malformações cerebrais.88 Garcez PP, Loiola EC, Costa RM, Higa LM, Trindade P, Delvecchio R. Zika virus impairs growth in human neurospheres and brain organoids. Science. 2016; 352 (6287): 816-18. O diagnóstico do processo infeccioso geralmente é baseado na história e manifestações clínicas da gestante, apesar da existência de testes moleculares e sorológicos para ZIKV, não disponíveis comercialmente. As complicações neurológicas relacionadas à infecção materno-fetal pelo ZIKV podem ser detectadas durante o período pré-natal por meio de ultrassono-grafia obstétrica e no período pós-natal por exames de imagem do crânio como a ultrassonografia trans-fontanela e exames de maior acurácia diagnóstica, como a tomografia computadorizada e a ressonância magnética.55 Staples JE, Dziuban EJ, Fischer M, Cragan JD, Rasmussen SA, Cannon MJ, Frey MT, Renquist CM, Lanciotti RS, Munoz JL, Powers AM, Honein MA, Moore CA. Interim guidelines for the evaluation and testing of infants with possible congenital Zika Virus infection - United States, 2016. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2016; 65 (3): 63-7. Essas complicações neurológicas abrangem microcefalia, calcificações cerebrais, distúrbios da migração neuronal, perda de tecido encefálico e dilatação do sistema ventricular. A gravidade das alterações intracranianas será mais severa em casos de infecção viral fetal durante o primeiro trimestre gestacional, e mais brandas no terceiro trimestre.99 Nunes ML, Carlini CR, Marinowic D, Kalil Neto F, Fiori HH, Scotta MC, Zanella PLA, Soder RB, Costa JC. Microcephaly and Zika virus: a clinical and epidemiolog-ical analysis of the current outbreak in Brazil. J Pediatr. 2016; 92 (3): 230-40.

O diagnóstico clínico da microcefalia baseia-se na medida do perímetro cefálico ao nascer abaixo de dois desvios-padrão da média para a idade gesta-cional e sexo. O Protocolo de Atenção à Saúde e Resposta à Ocorrência de Microcefalia (Versão 3) preconiza que, em recém-nascidos a termo, os valores de referência do perímetro cefálico a serem adotados para definição da microcefalia devem ser iguais ou inferiores a 31,5 cm para meninas e, 31,9 cm para meninos. A microcefalia é considerada grave em casos de perímetro cefálico abaixo de três desvios-padrão da média,1010 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Protocolo de atenção à saúde e resposta à ocorrência de microcefalia. Brasília, 2016. [Acesso em 12 mai 2017]. Disponível em: http://combateaedes.saude.gov.br/images/sala-de-situacao/Protocolo_SAS_versao_3_atualizado.pdf
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tal qual a verificada em ambas as gemelares relatadas.

A medida do perímetro cefálico é feita em torno da cabeça, na altura da maior circunferência do crânio, com fita métrica flexível e não elástica.

Vale lembrar que, em casos de anormalidades no formato craniano decorrentes de características familiares, genéticas ou pelo moldamento do crânio durante o parto normal, o perímetro cefálico pode estar transitoriamente abaixo do valor referencial para a idade gestacional e sexo. Logo, recomenda-se a repetição da medição após um ou mais dias do nascimento.99 Nunes ML, Carlini CR, Marinowic D, Kalil Neto F, Fiori HH, Scotta MC, Zanella PLA, Soder RB, Costa JC. Microcephaly and Zika virus: a clinical and epidemiolog-ical analysis of the current outbreak in Brazil. J Pediatr. 2016; 92 (3): 230-40.

A microcefalia é um sinal clínico de etiologia complexa e multifatorial que pode decorrer de doenças maternas durante a gestação e de agentes teratogênicos ambientais, dentre outras causas que podem impactar o neurodesenvolvimento e, dessa forma, influenciar o crescimento do cérebro.99 Nunes ML, Carlini CR, Marinowic D, Kalil Neto F, Fiori HH, Scotta MC, Zanella PLA, Soder RB, Costa JC. Microcephaly and Zika virus: a clinical and epidemiolog-ical analysis of the current outbreak in Brazil. J Pediatr. 2016; 92 (3): 230-40. Infecções maternas, como as da toxoplasmose, cito-megalovírus, herpes vírus, sífilis, rubéola, HIV e ZIKV provocam alterações no desenvolvimento cerebral intra-útero. Da mesma forma, a exposição a drogas como o etanol, irradiação e carência nutricional materna também alteram o desenvolvimento cerebral normal.1111 European Centre for Disease Prevention and Control (ECDC). Rapid risk assessment: microcephaly in Brazil potentially linked to the Zika virus epidemic. Stockholm, 2015. [Acesso em 12 mai 2017]. Disponível em: http://ecdc.europa.eu/en/http://ecdc.europa.eu/en/publica-tions/Publications/zika-microcephaly-Brazil-rapid-risk-assessment-Nov-2015
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Além da avaliação neurológica, recém-nascidos com microcefalia devem ser investigados quanto à presença de características dismórficas e de anomalias congênitas que comprometam outros órgãos como desordens oftalmológicas, cardíacas, renais, do trato urinário, entre outras. Vale ressaltar que, crianças expostas intra-útero ao ZIKV podem apresentar síndromes complexas com deficiências múltiplas, mas também manifestações de comprometimento de desenvolvimento detectadas mais tardiamente, como déficit de aprendizagem e má adaptação social, sem evidência de alterações anatômicas neurológicas.1212 Brunoni D, Blascovi-Assis SM, Osório AAC, Seabra AG, Amato CAH, Teixeira MCTV, Rocha MM, Carreiro LRR. Microcephaly and other Zika virus related events: the impact on children, families and health teams. Ciên Saúde Colet. 2016; 21 (10): 3297-302.

Alterações do desenvolvimento neuropsicomotor e do comportamento podem ser acompanhadas por problemas auditivos e visuais. Crianças de zero a 3 anos de idade com microcefalia e com prejuízos do desenvolvimento neuropsicomotor e efeitos associados beneficiam-se com o Programa de Estimulação Precoce, o qual consiste num projeto de acompanhamento e intervenção clínico-terapêutica multi-profissional que objetiva estimular a criança e ampliar suas competências, abordando os estímulos que interferem na sua maturação, para favorecer o desenvolvimento motor e cognitivo.1313 Brasil. Ministério da Saúde. Diretrizes de estimulação precoce. Crianças de zero a 3 anos com Atraso no Desenvolvimento Neuropsicomotor Decorrente de Microcefalia. Brasília: 2016. [Acesso em 15 mai 2017]. Disponível em: http://www.saude.go.gov.br/public/media/ZgUINSpZiwmbr3/20066922000062091226.pdf
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Transtornos de desenvolvimento, em especial aqueles associados com déficit intelectual, repercutem diretamente na qualidade de vida das famílias das crianças e ensejam o acompanhamento quanto às condições de saúde mental e o suporte socioemo-cional para os pais.1414 Favero-Nunes MA, Santos MA. Itinerário terapêutico percorrido por mães de crianças com transtorno autístico. Psicol Reflex e Crít. 2010; 23(2): 208-21. Nesse sentido, há que se repensar em programas de políticas públicas sobre o seguimento das crianças com microcefalia relacionada ao ZIKV, o impacto social e o emocional e a carga financeira e qualidade de vida das famílias envolvidas nessa problemática. Trata-se de um desafio que deve ser enfrentado com equipes de saúde multiprofissionais preparadas para avaliar e instituir métodos de intervenção ao longo do tempo.1212 Brunoni D, Blascovi-Assis SM, Osório AAC, Seabra AG, Amato CAH, Teixeira MCTV, Rocha MM, Carreiro LRR. Microcephaly and other Zika virus related events: the impact on children, families and health teams. Ciên Saúde Colet. 2016; 21 (10): 3297-302.

A infecção pelo ZIKV foi considerada emergência em saúde pública de interesse nacional até maio de 2017, devido ao súbito aumento de nascidos com microcefalia e outras alterações neurológicas durante a epidemia iniciada no Brasil em novembro de 2015. Apesar da queda de registros notificados de ZIKV, não se pode afastar a possibilidade de novas epidemias. Trata-se de grande desafio para o sistema de assistência à saúde desvendar o mecanismo patogênico da microcefalia fetal associada ao ZIKV,77 Adibi JJ, Marques ETA, Cartus A, Beigi RH. Teratogenic effects of the Zika virus and the role of the placenta. Lancet. 2016; 387 (10027): 1587-90. assim como ponderar a incidência de co-fatores na magnitude e ocorrência dos danos observados.44 Minassian ML. Virus Zika: Crónica de una pandemia "impensada". Rev Argent Microbiol. 2016; 48 (2): 97-9. Este relato de caso atenta para a ocorrência de alterações neurológicas distintas em gêmeas monocoriônicas presumidamente causadas por infecção intrauterina por ZIKV, o que poderia indicar a hipótese da existência de fatores influencia-dores intrínsecos ou relativos à carga viral no processo final desta afecção.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2018

Histórico

  • Recebido
    30 Jun 2017
  • Aceito
    23 Fev 2018
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