Resumo
Objetivo:
analisar as ações de implantação da Vigilância em Saúde do Trabalhador (Visat) na esfera municipal, pela perspectiva de gestores e tomadores de decisão.
Método:
estudo descritivo-exploratório de abordagem qualitativa, realizado em duas etapas: (1) levantamento documental da legislação relacionada à Saúde do Trabalhador; (2) entrevistas semiestruturadas com 15 gestores e tomadores de decisão na área, que foram gravadas, transcritas e analisadas segundo análise temática.
Resultados:
a análise documental incluiu seis documentos, sendo três relacionados às ações de Visat e três relacionados às ações que guardam interface com a Saúde do Trabalhador. Sete categorias emergiram na análise temática: Aspectos legais da Saúde do Trabalhador; Implementação das ações de Visat; Fluxos de informação e comunicação da Visat; Papéis e competências relacionados à ST no Sistema Único de Saúde; Articulação entre os setores envolvidos na Visat; Atuação do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador regional; Relevância do controle social e participação sindical para implementação da Visat municipal.
Conclusão:
o estudo evidenciou fragilidades na consolidação da Visat, com desarticulação dos setores envolvidos, ações fragmentadas, ausência de definições de papéis e fluxos de trabalhos e, ainda, desconhecimento dos aspectos relacionados à atenção à saúde dos trabalhadores pelos atores envolvidos em sua consolidação.
Palavras-chave:
saúde do trabalhador; vigilância em saúde do trabalhador; política de saúde do trabalhador; estudos de avaliação como assunto
Abstract
Objective:
to analyze the implementation of Workers’ Health Surveillance (WHS) at a regional level, from managers’ and decision-makers’ perspectives.
Methods:
descriptive-exploratory study with a qualitative approach performed in two steps (1) documental analysis related to Workers’ Health legislation; (2) semi-structured interviews with 15 managers and decision-makers, that were recorded, transcribed, and analyzed by thematic analysis.
Results:
documental analysis found six documents, with three related to WHS and three related to actions interfacing Workers’ Health. Seven categories were found in the speeches: Legal aspects of Workers’ Health; Implementation of WHS actions; Communication and information flows of WHS; Roles and competencies related to Workers’ Health in the Brazilian Unified Health System; Articulation among sectors involved in WHS; Role of the Regional Center of Reference in Workers’ Health; and Relevance of social control and union participation for WHS implementation.
Conclusion:
this study shows flaws in the WHS consolidation, including non-articulation of involved sectors, fragmented actions, lack of defined roles and competencies, and lack of knowledge about Workers’ Health care by the actors involved in its consolidation.
Keywords:
occupational health; surveillance of the workers health; occupational health policy; evaluation studies as topic
Introdução
A Vigilância em Saúde do Trabalhador (Visat) integra as ações de Vigilância em Saúde, com foco na promoção da saúde dos trabalhadores e prevenção de riscos advindos das condições laborais, causadores de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho. Pressupõe ações intra e intersetoriais na Rede de Atenção à Saúde (RAS), contemplando a coleta, análise, interpretação e disseminação de dados epidemiológicos, bem como planejamento e implementação de estratégias e intervenções em prol da saúde dos trabalhadores.
Apesar da vasta Legislação Brasileira e da própria Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (PNSTT), a Visat encontra barreiras para sua consolidação como política pública. A desarticulação e a falta de integração dos múltiplos pontos da Rede comprometem sua implementação nos serviços de saúde, evidenciando um descompasso entre o que determinam as normas e sua operacionalização no Sistema Único de Saúde (SUS)11. Aguiar L, Vasconcellos LCF. A gestão do Sistema Único de Saúde e a Saúde do Trabalhador: o direito que se tem e o direito que se perde. Saúde debate. 2015;39(106):830-40..
Estudo realizado com equipes de Saúde da Família de João Pessoa, Paraíba, ressaltou o protagonismo da Atenção Básica (AB) no contexto da Saúde do Trabalhador (ST). A pesquisa apontou a necessidade de fortalecimento dos princípios, diretrizes e ações da PNSTT pelas equipes da AB como porta de entrada preferencial dos trabalhadores na RAS, em especial na realidade atual, marcada pelo desemprego, informalidade e precariedade do trabalho22. Amorim LA, Silva TL, Faria HP, Machado JMH, Dias EC. Vigilância em Saúde do Trabalhador na Atenção Básica: aprendizagens com as equipes de Saúde da Família de João Pessoa, Paraíba, Brasil. Cien Saude Colet. 2017;22(10):3403-13.. Ainda, evidenciou a importância da institucionalização do apoio técnico e pedagógico, de modo a qualificar as ações e assegurar a continuidade do cuidado nos diversos pontos da Rede, enfatizando o importante papel de matriciamento dos Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest) (22. Amorim LA, Silva TL, Faria HP, Machado JMH, Dias EC. Vigilância em Saúde do Trabalhador na Atenção Básica: aprendizagens com as equipes de Saúde da Família de João Pessoa, Paraíba, Brasil. Cien Saude Colet. 2017;22(10):3403-13..
O apoio matricial do Cerest produz efeitos importantes, como a ampliação do cuidado em ST, o aumento da resolutividade dos casos no âmbito da AB e a maior articulação entre profissionais da AB e o Cerest33. Lazarino MSA, Silva TL, Dias EC. Apoio matricial como estratégia para o fortalecimento da saúde do trabalhador na atenção básica. Rev Bras Saude Ocup. 2019;44:e23., possibilitando melhor compreensão do trabalho como determinante social do processo saúde-doença pelos profissionais da AB33. Lazarino MSA, Silva TL, Dias EC. Apoio matricial como estratégia para o fortalecimento da saúde do trabalhador na atenção básica. Rev Bras Saude Ocup. 2019;44:e23.),(44. Petters AA, Ros MA. A Determinação Social da Saúde e a Promoção da Saúde. Arq. Catarin Med. 2018;47(3):183-96. e sua incorporação nas práticas cotidianas. Essa concepção da determinação social do processo saúde-doença considera que todos os fatores sociais podem ou não estar envolvidos no processo de adoecimento não somente do indivíduo, mas também da população, de modo que a produção da saúde e da doença é resultante de processos históricos e sociais, sob constantes mudanças55. Borghi CMSO, Oliveira RM, Savalho G. Determinação ou Determinantes Sociais da Saúde: Texto e Contexto na América Latina. Trab Edu. Saúde. 2018;16(3):869-97..
Deste modo, o planejamento das intervenções deve ocorrer a partir do território da AB, porta de entrada do SUS e espaço de implementação da PNSTT, tendo o Cerest o papel de apoio matricial e educação permanente junto às equipes66. Fonseca BMC, Braga AMCB, Dias EC. Planejamento de intervenções em Saúde do Trabalhador no território: uma experiência participativa. Rev Bras Saude Ocup. 2019;44:e 36.,77. Cavalcante CAA, Cossi MS, Costa RRO, Medeiros SM, Meneses RMP. Análise crítica dos acidentes de trabalho no Brasil. Rev Atenção à Saúde. 2015;13(44):100-9.. Para que isso seja possível, é importante que os gestores públicos propiciem condições favoráveis para melhorar a organização dos ambientes e os processos de trabalho dos profissionais de saúde do SUS, de modo que estes cumpram seu papel de cuidadores da saúde da população88. Silva, TL, Dias EC, Pessoa VM, Fernandes LMM, Gomes EM. Saúde do trabalhador na Atenção Primária: percepções e práticas de equipes de Saúde da Família. Interface. 2014;18(49):273-88..
Assim, é relevante estudar as ações de implementação da Visat, sobretudo no tocante à saúde dos trabalhadores, possibilitando um diagnóstico de implementação de política pública na esfera municipal, campo pouco explorado nas publicações científicas. Dessa forma, compreender os avanços, desafios e entraves enfrentados na esfera municipal pelo olhar de gestores e tomadores de decisão sobre incorporação das propostas e políticas existentes em ST e, mais especificamente, de Visat, possibilitará um diagnóstico situacional da organização da Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador (Renast) e poderá subsidiar os municípios na construção e nas propostas de intervenção na realidade.
Perante o exposto, este estudo teve como objetivo analisar as ações de implementação da Visat na esfera municipal, na perspectiva de gestores e tomadores de decisão.
Métodos
Estudo descritivo-exploratório, de natureza qualitativa. Foi realizado no município de São Carlos, estado de São Paulo, que, em 2021, contava com uma população estimada de 250 mil habitantes. A proporção de pessoas ocupadas em relação à população total era de 35,9% e o salário médio mensal era de 3,1 salários mínimos, em 202099. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (BR). Panorama São Carlos, SP [Internet]. Rio de Janeiro; 2021 [citado em 15 jan 2021]. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/sp/sao-carlos/panorama
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/sp/sa...
. São Carlos é considerada um polo de empreendedorismo tecnológico e industrial, agregando formas de trabalho tradicionais (como nas linhas de produção) e contemporâneas (como startups) (1010. Pires AS. As Novas Configurações Espaciais do Empreendedorismo Tecnológico e as Experiências de Trabalho no Polo de Tecnologia de São Carlos-SP. Rev Bras Ci Soc. 2021;36(106):e3610605..
O estudo foi conduzido em duas etapas:
-
1) Pesquisa documental: a primeira etapa considerou documentos, legislações e demais materiais físicos e digitais que descrevessem as ações de Visat na esfera municipal, a partir de 2002, o ano de implementação da Renast. Focou em compreender como as políticas propostas em legislação federal foram implementadas no contexto municipal, dos pontos de vista legal e organizacional. Para tanto, contemplou buscas em documentos físicos, consultas por telefone e acesso a websites da Câmara Municipal, Secretaria Municipal de Saúde, Departamento Regional de Saúde, Grupo de Vigilância Sanitária Regional e Cerest Regional e Estadual. Para seleção dos documentos, foi elaborado um roteiro contendo os seguintes itens: legislação municipal em saúde do trabalhador; fluxos de informação em saúde do trabalhador; fluxos de processos envolvidos no atendimento ao trabalhador; papeis, competências e ações entre os diversos órgãos. Os documentos selecionados foram analisados previamente à coleta dos dados primários, para subsidiar as entrevistas, no sentido de esclarecer aspectos não elucidados pelos documentos. Os dados documentais foram coletados entre os meses de junho e outubro de 2017, por meio de formulário próprio para registro, e analisados com base no tipo de material, sendo agrupados em legislações, deliberações e planos municipais de saúde.
-
2) Pesquisa qualitativa: a segunda etapa contemplou entrevistas com 15 gestores e tomadores de decisão que atuavam no sistema de saúde municipal, regional e estadual ou em outros órgãos que possuíam interface com a Visat, buscando alcançar a intersetorialidade prevista na transversalidade da atenção à saúde do trabalhador. A seleção dos participantes foi intencional, em decorrência de sua inserção profissional e de seu envolvimento na implementação das políticas, articulação de ações, monitoramento e assistência relacionados à ST. Para fins de preservação do anonimato, não serão mencionados os cargos ocupados ou funções exercidas, apenas os setores e órgãos de trabalho que representam: Cerest Estadual, Procuradoria Regional do Trabalho (PRT), Cerest Regional, Secretaria Municipal de Saúde, Vigilância Epidemiológica (VIGEP), Vigilância Sanitária (VISA), Departamento Regional de Saúde (DRS), Grupo de Vigilância em Saúde (GVS), Comissão Intersetorial de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (CISTT), Conselho Municipal de Saúde (CMS) e Entidade Sindical, conforme apresentado no Quadro 1.
As entrevistas foram realizadas entre os meses de junho e outubro de 2017, por uma entrevistadora com experiência prévia nessa técnica de coleta de dados. Foi utilizado roteiro de entrevista semiestruturado, contemplando questões que exploraram a compreensão do profissional sobre a ST no SUS; ações de Visat desenvolvidas; articulação com os demais órgãos; fluxos de informação; papel dos órgãos e; avaliação das ações de Visat no município estudado.
Os indivíduos elegíveis foram convidados a participar da entrevista e aqueles que consentiram receberam esclarecimentos sobre os objetivos da pesquisa e sobre riscos e benefícios de sua participação, por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). As entrevistas individuais tiveram duração média de 30 minutos, foram gravadas em áudio e transcritas integralmente, com a manutenção das características coloquiais e descontinuidades apresentadas, objetivando não descaracterizar o sentido. Foram excluídas palavras que identificassem pessoas, locais e órgãos, para garantir o sigilo e anonimato. Os nomes dos participantes foram substituídos pela letra P e um número, de acordo com a sequência das entrevistas realizadas.
A análise temática de conteúdo das entrevistas transcritas foi realizada em três etapas: a) pré-análise do material: leitura flutuante do conteúdo e constituição do corpus, observando-se os critérios de exaustividade, representatividade, homogeneidade e pertinência; b) exploração do material: codificação, definição das categorias de análise e identificação das unidades de registro; e c) tratamento dos dados e interpretação à luz do referencial teórico adotado1111. Minayo MCCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14a ed. São Paulo: Hucitec; 2014.. Os resultados foram agrupados nas seguintes categorias: (1) Aspectos legais da ST; (2) Implementação das ações de Visat; (3) Fluxos de informação e comunicação de Visat; (4) Papéis e competências relacionados à ST no SUS; (5) Articulação entre os setores envolvidos na Visat; (6) Atuação do Cerest Regional; e (7) Relevância do controle social e participação sindical para implementação da Visat municipal.
Este estudo respeitou os princípios éticos envolvendo seres humanos contidos nas Resoluções do Conselho Nacional de Saúde n.º 466/2012 e 510/2016 e todos os participantes assinaram o TCLE. A pesquisa foi aprovada pelos campos de estudos e obteve parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos da Universidade Federal de São Carlos, em 5 de março de 2017, sob número de parecer 1.949.869.
Resultados
Os resultados serão apresentados conforme as duas etapas do estudo.
Etapa 1 - Análise documental: foram incluídos seis documentos, sendo três legislações relacionadas às ações de Visat, uma Deliberação do Conselho Municipal de Saúde e dois Planos Municipais de Saúde que contêm ações relacionadas à ST, conforme apresentado no Quadro 2.
A busca de legislações, diretrizes e orientações relacionadas às ações de Visat na esfera municipal, a partir do ano de implementação da Renast (2002), resultou em poucos materiais que atendiam os critérios de inclusão, demonstrando a inexistência de uma política ou de um programa municipal estruturado voltado à ST. Os documentos levantados trouxeram alguns aspectos importantes, como a criação da Comissão Intersetorial de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (CISTT) e obrigatoriedade do Relatório de Atendimento ao Acidentado do Trabalho (RAAT) (vigentes até o momento atual), mas ainda com poucos avanços quanto à implementação organizada em rede, não sendo encontrados documentos referentes a fluxos de informação em saúde do trabalhador, fluxos de processo de atendimento ao trabalhador, papéis, competências e ações entre os diversos órgãos.
Etapa 2 - Entrevistas com gestores e tomadores de decisão: a análise das entrevistas será apresentada conforme categorias que emergiram das falas durante a análise temática de conteúdo1111. Minayo MCCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14a ed. São Paulo: Hucitec; 2014., com trechos que representem os temas.
Com relação aos Aspectos legais da ST (categoria 1), os participantes ressaltaram as fragilidades na consolidação das legislações vigentes:
Eu acho que, em termos de legislação, não, a legislação ela está dada, as condições para atuação nesta área estão aí à disposição, o que acontece é nem tudo que está [...] na lei [...] se transforma automaticamente em política pública efetiva (P2).
Eu acredito que, em termos de legislação, ela está bem amparada, mas o problema é o desconhecimento desta legislação por parte dos funcionários de não entender muito o que é saúde do trabalhador, não entender que é papel do SUS fazer saúde do trabalhador (P4).
Bom, dentro do meu conhecimento que não é muito aprofundado com relação ao SUS, eu vejo que ainda merece uma série de aprimoramentos. Existe uma atenção à pessoa humana como um todo, mas a figura do trabalhador, ela ainda não recebe uma atenção específica que deveria ter dentro de um conceito macro (P8).
Sobre a categoria 2 - Implementação das ações de Visat, os entrevistados constataram as fragilidades em sua consolidação e, também, a incipiência de ações de atenção à saúde dos trabalhadores:
De 2007 para cá, tem-se acompanhado a implantação da saúde do trabalhador no município e a cada ano ou cada administração vai tendo suas prioridades nessa área. Foram feitos os treinamentos para implantar as ações de saúde do trabalhador no município, inicialmente com o RAAT que é para a gente saber conhecer do que adoece e acidenta a população do município e aí propor ações de prevenção (P4).
Então eu sentia que aquilo [treinamento sobre RAAT] foi meio que jogado para gente fazer e assim acabava nem fazendo, tanto que eu acho que hoje nas Unidades o preenchimento do RAAT é muito pequeno [...] a subnotificação é muito grande (P13).
Eu não diria que está estruturada ainda, acho que está começando, isso veio cá, tinha uma pessoa responsável por isso, essa pessoa saiu e esse serviço ficou completamente abandonado [...] não sei se nós teríamos que montar uma equipe maior, com mais pessoas para poder estruturar o serviço, talvez isso (P13).
Olha, é assim de grosso modo eu avalio que a gente está agindo muito mais na parte corretiva (P10).
Uma área que ainda tem muito a conquistar espaço, porque a saúde tradicionalmente se preocupa mais com as questões da doença do que [...] ações de prevenção e de promoção de saúde, então isso não aconteceu só com a saúde do trabalhador, mas com outras áreas de prevenção e de vigilância (P2).
Eu acho ainda muito incipiente, entendeu? Não vejo muitas ações voltadas à saúde do trabalhador [...] falta muita coisa para ser implementada (P6).
Acerca da categoria 3 - Fluxos de Informação e Comunicação de Visat, os participantes trouxeram a falta de sistematização na comunicação e informação, que comprometem a consolidação das ações:
A nossa comunicação é sempre através de e-mail [...] às vezes a gente faz reuniões técnicas, mas têm sido poucas [...], mas é mais assim, mais por e-mail, passando as demandas (P5).
O que importa é na prática não funciona, não existe. Nós estamos começando a estruturar uma rotina [...] o que acontece hoje é pelo “achismo”, se um profissional novo assume uma unidade ele não tem nenhuma orientação por escrito para ele seguir (P14).
As portas de entrada, deveriam notificar [...] os acidentes e encaminhar para a vigilância epidemiológica que dispararia aí, além da análise dos dados, não sei se ela coordenaria esta relação, mas de alguma forma avisaria a sanitária (P15).
Quanto aos papéis e competências relacionadas à ST no SUS, categoria 4, os participantes relataram o despreparo para desempenho de determinadas funções e falta de clareza dos papéis exercidos pelos diferentes atores e serviços:
Quando eu entrei aqui, eu fiquei como interlocutora em saúde do trabalhador, eu me senti [...] um pouco despreparada, porque eu não tenho um curso em saúde do trabalhador nada [...] e nas inspeções eu pensava será que eu não estou fazendo mais do mesmo [...] porque tem o Ministério do Trabalho que faz isso, né [...] o nosso papel é de estar junto como Vigilância Sanitária para poder [...] nas inspeções de trabalho, junto com o Cerest. Então se aprofundar sim, para ter clareza no papel de cada um dos entes envolvidos na saúde do trabalhador (P15).
Alguns municípios têm mais dificuldades e eu atribuo esta dificuldade pela não consciência do gestor do seu papel, que é o responsável e executor dessas ações e também pelo desconhecimento do papel de vigilância (P11).
Outra questão também que eu vejo, é que como é uma área que a competência de algumas ações está dividida entre áreas de governos, entre ministérios, secretarias isso causa uma confusão também, que pode-se de repente esperar mais de um determinado setor, entendendo que é dele a maior responsabilidade quando na verdade a responsabilidade é de todo mundo (P12).
Quanto à categoria 5 - Articulação entre os setores envolvidos na Visat, os entrevistados apontaram que, de forma geral, há uma desarticulação na rede de atenção à ST e que, dependendo da unidade, isso acontece:
Com o Cerest é bem sedimentada, a gente tem uma boa articulação. Com GVS e Grupo de Vigilância Epidemiológica não tenho nenhuma ação. (P6).
A gente teria que estar trabalhando numa rede junto com epidemiológica, junto com a Atenção Básica e a gente não deveria pensar só nos acidentes, mas nas doenças ocupacionais, que penso que é mais difícil de tá diagnosticando... (P15).
Acho que não conseguimos ainda uma forma de unir este trabalho fragmentado, porque a impressão que passa é que a gente… cada um fica dentro da sua área tentando fazer alguma coisa e a gente não consegue articular o sistema pra que ele faça junto, entende? Então, por isso que a saúde do trabalhador é tão fragmentada… falta esta articulação dos diversos setores, meio ambiente, as universidades que têm um papel fundamental [...] então eu acho que a aproximação, esta intersetorialidade precisa ser melhor distribuída, ou investida (P11).
Os participantes enfatizaram a relevância da categoria 6 - Atuação do Cerest Regional, apontando o descompasso entre a infraestrutura e as demandas, bem como a atuação mais presente no município-sede:
Eu acho que o Cerest faz o que é possível fazer dentro da sua estrutura, primeiro que é uma regional grande, né, para toda a necessidade e demanda de serviços [...] claro que acaba tendo uma intervenção mais efetiva no município sede (P2).
E eu acho que os Cerest ele tem um papel importante, a forma como foi desenhado a Renast [...] é um desenho interessante, mas na prática a gente tem problema dele se articular com as estruturas do Estado e [...] de ser reconhecido regionalmente pelos municípios para exercer esta referência técnica (P12).
O Cerest é um órgão que [...] tem uma carência estrutural ainda muito grande, tem uma pequena equipe para atender uma grande demanda de cidades (P8).
Mas a gente teria que ter um Cerest mais atuante principalmente na prevenção e na orientação dos trabalhadores das empresas para evitar ou melhorar as condições de trabalho para que se evite evidentemente acidentes” (P3).
A categoria 7 - Relevância do controle social e participação sindical para implementação da Visat emergiram em algumas falas, que ressaltaram sua contribuição para a consolidação de políticas públicas na esfera municipal:
No caso [do município] uma coisa que surpreendeu positivamente [...] está estruturada a CISTT [...] então eu acho que o fato de ter uma Comissão Intersetorial de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, do controle social, como comissão permanente, como no SUS e como comissão permanente do Conselho Municipal de Saúde, é um fato importantíssimo para questão do SUS com a Saúde do Trabalhador (P9).
Ela [lei do RAAT] se consolidou a partir da CISTT. Inclusive agora a CISTT está discutindo um fluxograma de como proceder para unificar, de como ficar dentro da Rede privada e púbica, para ter uma orientação única, para ter efetividade [...] (P10).
A questão do controle social, é uma questão que a gente precisa avançar [...] a gente precisa ter um Controle Social que olhe para estas questões e que cobre o desenvolvimento delas, porque se o gestor resolve que não vai fazer, que não vai atuar, não tem ninguém de outro lado que tá cobrando isso, então esse salto ele precisa ser dado (P12).
Nós [sindicato] tamos produzindo, mas não estamos divulgando. A investigação dos acidentes, por exemplo, temos a morte do trabalhador lá na [nome da empresa], que foi feito? Fizemos uma ação, fizemos uma assembleia, demos continuidade? E o trabalhador, teve ciência de tudo que nós fizemos, daquilo que legalmente é de nossa responsabilidade? Como sabe que foi apurado isso? Qual a conclusão disso? Como que os trabalhadores vão ter um controle social disso, com participação dos sindicatos, se estão acabando com os sindicatos? (P10).
... a gente não consegue ter um diálogo direto com os trabalhadores, com o sindicato dos trabalhadores [pois] eles são contrários ao banimento, então esse diálogo com a Associação [de trabalhadores] traz pra gente muito mais daquilo que a gente entende como importante, mas a hora que gente entra em contato com os trabalhadores, você fala “é importante mesmo”... muitas delas são pessoas que já estão doentes e que tão ali pautando questões que precisam ser olhadas do ponto de vista da vigilância e da assistência (P12).
Discussão
Os dados documentais revelaram a escassez de materiais direcionados à organização e consolidação das ações em ST no município. Depois de quase 20 anos da criação da Renast, poucas ações sistematizadas foram desenvolvidas no sentido de fortalecer essa linha de cuidado em rede. Os poucos documentos encontrados mostraram uma visão fragmentada da ST, sem continuidade, monitoramento e evolução na área.
O município possui uma lei voltada para proteção do trabalhador do setor canavieiro, alinhada às ações realizadas pelo estado de São Paulo, com apoio do Ministério Público do Trabalho1818. Vilela RAG, Santos SA, Silva AJN, Almeida IM. Experiência de vigilância no setor canavieiro: desafios para interromper a "maratona" perigosa dos canaviais. Cien saude coletiva. 2014;19(12):4659-68.. Embora considerada um avanço, trata-se de uma iniciativa pontual, direcionada a um setor produtivo específico e sem ressonância para outras áreas que, da mesma forma, necessitam de ações semelhantes.
A lei para criação do Conselho Municipal de Segurança e Saúde no Trabalho poderia ter sido um avanço para o fortalecimento da ST, ao articular atores de diferentes áreas de atuação em uma tentativa de assegurar a integração de ações intersetoriais. Contudo, até a conclusão desta pesquisa, não foram encontradas evidências sobre sua concretização.
O município de estudo vem avançando na sistematização das informações coletadas pelo RAAT em parceria com o Cerest Regional, o que tem possibilitado o mapeamento do perfil epidemiológico dos trabalhadores, apesar da parcialidade dos dados e da subnotificação. Um estudo internacional aponta que a maioria das doenças ocupacionais é subnotificada1919. Moreno-Torres LA, Ventura-Alfaro CE. Underreporting trends of occupational illnesses in Mexico. J Occup Health. 2018;60(1):85-8., o que reforça a necessidade de reconhecimento do nexo causal das doenças do trabalho pelos trabalhadores de saúde e de qualificação nas notificações. Tal situação também é observada no Brasil, reflexo da organização das informações em sistemas distintos (o que implica na busca em diferentes bancos de dados), além da própria subnotificação ou baixa qualidade dos registros, tanto dos acidentes de trabalho, quanto das doenças2020. Melo CF, Cavalcante AKS, Façanha KQ. Inviabilização do adoecimento Psíquico do Trabalhador: Limites da Integralidade na Rede de Atenção, Trab Educ Saude. 2019; 17(2):e0020132.), (2121. Rodrigues AB, Santana VS. Acidentes de trabalho fatais em Palmas, Tocantins, Brasil: oportunidades perdidas de informação. Rev Bras Saude Ocup. 2019;44:e8..
No contexto analisado, a CISTT está regulamentada e sua atuação exitosa foi destacada pelos participantes. Considerada como ferramenta no controle social na área de ST, destaca-se, sobretudo, pela articulação com os diversos setores, no sentido de fomentar ações em prol da população, sendo apontada como importante mobilizadora do controle social e propulsora da efetivação da PNSTT, inserindo a saúde do trabalhador, de fato, no SUS2222. Artur K. Participação e direito à saúde dos trabalhadores. Saude Soc. 2015;24(3):853-68..
Os Planos Municipais de Saúde abordam a ST de forma tímida, sem se valer de evidências sobre o contexto local para construção dos indicadores e prioridades. Também não foram observados avanços no sentido de viabilizar as propostas dos Planos, sinalizando que essa temática não tem sido prioridade do município. A ausência de planejamento abrange outros segmentos da organização pública do município, que não dispunham de organograma com a atribuição das várias instâncias, nem fluxos de processo de trabalho.
De forma geral, os participantes informaram que a Visat no SUS privilegiava ações curativas e paliativas, direcionadas a acidentes e doenças relacionadas ao trabalho após ocorrerem, sinalizando a necessidade de avanços na promoção de saúde e prevenção de agravos. Autores apontam que a superação do modelo centrado na doença pressupõe investigação e atuação nas causas dos problemas de saúde, não nos seus efeitos, ressaltando que os profissionais de saúde sejam estimulados a notificar e intervir em acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, proporcionando mudanças na relação saúde-trabalho no país2323. Vasconcellos LCF, Aguiar L. Saúde do Trabalhador: necessidades desconsideradas pela gestão do Sistema Único de Saúde. Saúde debate. 2017;41(113):605-17..
Os entrevistados reconheceram que a ST está bem amparada legalmente, sendo a consolidação dessa legislação e o reconhecimento desta pelos profissionais que atuam na Saúde o grande desafio. A existência de um arcabouço legal é importante e significa um grande avanço para os trabalhadores, mas somente a normatização não transforma a realidade da saúde dos trabalhadores, que continuam sofrendo acidentes e doenças em função da atividade de trabalho. Contudo, a implantação da saúde do trabalhador como uma prática sistematizada ainda está distante da concretização, principalmente com relação à Visat2424. Vasconcellos LCF, Gomez CM, Machado JMH. Entre o definido e o por fazer na Vigilância em Saúde do trabalhador. Cien saude coletiva. 2014;19(12):4617-26., uma das áreas que mais enfrenta desafios para ser consolidada no SUS2525. Daldon MTB, Lancman S. Vigilância em Saúde do Trabalhador: rumos e incertezas. Rev Bras Saude Ocup. 2013;38(127):92-106..
Os entrevistados revelaram que as ações de Visat na esfera municipal são deficientes, não estão estruturadas e apresentam descontinuidades, a depender das prioridades estabelecidas pela gestão local, sem uma sistemática de monitoramento que permita identificar fragilidades e avanços. Verifica-se que a ausência de diretrizes na área e a inexistência de planejamento repercutem negativamente nos rumos da Visat e comprometem os profissionais de saúde, que acabam sobrecarregados e pressionados para encontrar os meios e recursos necessários para a realização da vigilância2626. Mendes MJR, Wünsch DS, Machado FKS, Martins J, Giongo CR. Saúde do trabalhador: desafios na efetivação do direito à saúde. Argum. 2015;7(2):194-207..
As dificuldades nos fluxos de informações e comunicação entre os setores envolvidos na saúde do trabalhador comprometem a integração de ações e do cuidado desenvolvido em rede. Os entrevistados confirmaram a inexistência de um sistema organizado de informações, utilizando-se de outras formas para as trocas, com base nas demandas espontâneas. Também apontaram o despreparo das portas de entradas do SUS em identificar a relação do acidente ou doença com o trabalho, o que compromete a notificação, diagnóstico, intervenções e acompanhamento dos casos, relacionando-os com o trabalho.
A frágil articulação da AB com outros pontos da RAS alerta para a deficiência nos fluxos de referência e contrarreferência, além da inexistência de estruturação das linhas de cuidado aos trabalhadores88. Silva, TL, Dias EC, Pessoa VM, Fernandes LMM, Gomes EM. Saúde do trabalhador na Atenção Primária: percepções e práticas de equipes de Saúde da Família. Interface. 2014;18(49):273-88.. Deste modo, fica clara a necessidade e o desafio de sensibilizar os profissionais, por meio de estratégias de educação e capacitação2626. Mendes MJR, Wünsch DS, Machado FKS, Martins J, Giongo CR. Saúde do trabalhador: desafios na efetivação do direito à saúde. Argum. 2015;7(2):194-207..
Estudos revelam o problema da subnotificação dos acidentes de trabalho no Brasil2727. Cortez EA, Jasmim JS, Silva LM, Queluci GC. Análise da mortalidade por acidentes de trabalho no Brasil: Revisão Integrativa. Rev enferm UFPE. 2017;11(supl 1):429-37. e alertam para inexistência de uma política estadual e municipal que desenvolva ações efetivas para o estabelecimento de fluxos de referência e contrarreferência, assim como o planejamento de ações de prevenção e promoção da saúde do trabalhador2828. Medina FS, Maia MZB. A subnotificação de LER/DORT sob a ótica de profissionais de saúde de Palmas, Tocantins. Rev Bras Saude Ocup. 2016;41:e8..
Observou-se o desconhecimento dos entrevistados - atores sociais que deveriam atuar na consolidação da Visat municipal - sobre os papéis e competências dos órgãos e profissionais envolvidos na ST, sendo o papel do Cerest o mais bem reconhecido entre os participantes. Essa lacuna com relação ao reconhecimento dessas competências pode estar relacionada à gestão municipal, pois a falta de conhecimento do gestor do seu próprio papel reflete negativamente na organização do município, no tocante às suas responsabilidades quanto à saúde do trabalhador e sua estruturação, bem como da própria PNSTT2929. Galindo AC, Gurgel AM. Planejamento de ações de saúde do trabalhador no SUS: uma análise dos planos municipais de saúde da VI Regional de Saúde de Pernambuco. Rev Eletron Comun Inf Inov Saude. 2016;10(4)..
Os achados apontaram para a frágil e incipiente articulação entre os setores envolvidos na Visat das esferas municipal, regional e estadual, com menção à articulação de alguns pontos da rede com o Cerest Regional. Neste sentido, um estudo aponta que a prática dos serviços de saúde tem revelado que o desenvolvimento de ações voltadas para a saúde do trabalhador ocorre de forma fragmentada, com destaque para as ações assistenciais. O grau de articulação dos componentes da vigilância em saúde e níveis de atenção é pequeno e não considera a participação e o saber dos trabalhadores3030. da Silva ES, dos Santos CLR, Barbosa HL. Vigilância em saúde do trabalhador: uma prática necessária para os enfermeiros nas unidades básicas de saúde. Rev Saude Col UEFS. 2016;6(1):20-5..
A caracterização de ações intersetoriais nas intervenções sobre os problemas de saúde dos trabalhadores pressupõe articulação e integração com outros pontos da RAS, em especial com as vigilâncias, apoio dos Cerest, dos movimentos sociais e representações de trabalhadores e de instâncias como setores de fiscalização22. Amorim LA, Silva TL, Faria HP, Machado JMH, Dias EC. Vigilância em Saúde do Trabalhador na Atenção Básica: aprendizagens com as equipes de Saúde da Família de João Pessoa, Paraíba, Brasil. Cien Saude Colet. 2017;22(10):3403-13..
Com relação às ações de Visat no município, fica evidente a necessidade de sua estruturação, transparecendo o desconhecimento de ações desenvolvidas na área. Tais ações, quando existem, são desarticuladas e com ênfase em medidas corretivas, curativas e, portanto, paliativas. Corroborando com tal afirmativa, um estudo nacional evidenciou que os profissionais do Cerest realizam atendimentos assistenciais devido à inexistência de serviços especializados para encaminhar o trabalhador3030. da Silva ES, dos Santos CLR, Barbosa HL. Vigilância em saúde do trabalhador: uma prática necessária para os enfermeiros nas unidades básicas de saúde. Rev Saude Col UEFS. 2016;6(1):20-5.. Com essa lacuna existente na rede, a Visat deixa de fazer seu papel primário de matriciamento para realizar a assistência. Quanto à atuação do Cerest, foi revelada uma tendência para desenvolver ações no município-sede em parceria com determinados órgãos em detrimento de outros, além de o não estabelecimento de uma articulação sistematizada, no sentido de atender integralmente o trabalhador3131. Cardoso MCB, Araújo TM. Os Centros de Referências em Saúde do Trabalhador e as ações em saúde mental: um inquérito no Brasil. Rev Bras Saude Ocup. 2016;41:e7.),(3232. Bastos-Ramos TP, Santana VS, Ferrite S. Estratégia Saúde da Família e notificações de acidentes de trabalho, Brasil, 2007-2011. Epidemiol Serv Saude. 2015;24(4):641-50..
O controle social tem importante papel na implementação da Visat, mas ainda é preciso avançar, pois a institucionalização por meio das Comissões Intersetoriais de Saúde é considerada frágil, existindo um recente esforço visando a sua expansão e regularização2222. Artur K. Participação e direito à saúde dos trabalhadores. Saude Soc. 2015;24(3):853-68.. Ainda, é importante resgatar o papel histórico dos sindicatos na luta por melhores condições de segurança e saúde no trabalho, bem como na representação dos trabalhadores para consolidação das ações de vigilância. O próprio trabalhador, protagonista da PNSTT e, consequentemente, da Visat, não foi mencionado pelos participantes deste estudo, evidenciando uma lacuna na práxis.
Com o intuito de sintetizar os achados deste estudo em ações propositivas que possam ser utilizadas pelos diferentes gestores e tomadores de decisão no fortalecimento das ações de Visat no município, traçam-se as seguintes estratégias:
-
Organizar a Visat a partir da APS, por meio do diagnóstico do perfil produtivo e da atividade econômica do território, bem como do perfil epidemiológico dos trabalhadores;
-
Definir papéis e competências dos órgãos e dos atores envolvidos em ST, disseminando essa informação a toda RAS;
-
Definir protocolos de ações e fluxos de informação e comunicação em Visat, bem como fluxo de referência e contrarreferência entre APS e Cerest Regional;
-
Sistematizar ações de ST na APS, por meio da definição de protocolos, equipes responsáveis e gestão;
-
Fomentar ações de educação junto aos profissionais de saúde, especialmente da AB, por meio da elaboração de Plano de Educação Permanente em ST;
-
Realizar ações para fortalecimento da equipe de VIGEP responsável pela sistematização de dados e investigação dos casos de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho;
-
Compor uma equipe multiprofissional mínima, dentro da estrutura da SMS, direcionada à implementação de ações de Visat, e interlocução com os demais setores envolvidos, inclusive o Cerest Regional;
-
Fortalecer o controle social e assegurar a consolidação da CISTT como órgão assessor do CMS;
-
Estabelecer parcerias com instituições de ensino superior para elaboração de materiais e treinamentos, bem como desenvolvimento de pesquisas na área de ST;
-
Implantar o matriciamento em ST;
-
Construir o Plano Municipal de Saúde do Trabalhador.
Conclusão
O estudo da Visat é uma tarefa complexa, pois a sua existência depende da relação entre diferentes setores, dentro e fora do SUS, em um movimento dinâmico, com ações interprofissionais, intra e intersetoriais, transversais, por meio do controle social e do saber do trabalhador. Assim, a abordagem combinada de pesquisa documental e qualitativa, mediante entrevistas com gestores e tomadores de decisão dos vários setores envolvidos na Visat, permitiu uma análise do conjunto das ações na esfera municipal e possibilitou uma visão ampliada do tema, pois os problemas, fragilidades e dificuldades foram percebidos de forma semelhante pelos diferentes atores.
O estudo evidenciou tais fragilidades na consolidação da Visat, com desarticulação dos setores envolvidos, ações fragmentadas, ausência de definições de papéis e fluxos de trabalhos e, ainda, desconhecimento dos aspectos relacionados à atenção à saúde dos trabalhadores pelos atores envolvidos em sua consolidação.
São limitações deste estudo ser realizado em um único município, com seleção intencional dos participantes, o que pode não ter contemplado outros olhares e perspectivas sobre o mesmo objeto, principalmente dos trabalhadores, importantes protagonistas na construção histórica da ST no Brasil. Esta lacuna pode apontar para novas pesquisas, com o objetivo de contribuir para integração da saúde do trabalhador na rede SUS.
Compreende-se que o diagnóstico situacional é o ponto de partida para mudanças, considerando-se a análise das ações existentes e das lacunas identificadas como potencialidades de melhorias. Nesta ótica, esta pesquisa avança ao propor estratégias para consolidação da Visat, no sentido de incentivar gestores e tomadores de decisão a investir na consolidação da Renast e no fortalecimento das ações de ST e, consequentemente, de Visat.
Referências
-
1Aguiar L, Vasconcellos LCF. A gestão do Sistema Único de Saúde e a Saúde do Trabalhador: o direito que se tem e o direito que se perde. Saúde debate. 2015;39(106):830-40.
-
2Amorim LA, Silva TL, Faria HP, Machado JMH, Dias EC. Vigilância em Saúde do Trabalhador na Atenção Básica: aprendizagens com as equipes de Saúde da Família de João Pessoa, Paraíba, Brasil. Cien Saude Colet. 2017;22(10):3403-13.
-
3Lazarino MSA, Silva TL, Dias EC. Apoio matricial como estratégia para o fortalecimento da saúde do trabalhador na atenção básica. Rev Bras Saude Ocup. 2019;44:e23.
-
4Petters AA, Ros MA. A Determinação Social da Saúde e a Promoção da Saúde. Arq. Catarin Med. 2018;47(3):183-96.
-
5Borghi CMSO, Oliveira RM, Savalho G. Determinação ou Determinantes Sociais da Saúde: Texto e Contexto na América Latina. Trab Edu. Saúde. 2018;16(3):869-97.
-
6Fonseca BMC, Braga AMCB, Dias EC. Planejamento de intervenções em Saúde do Trabalhador no território: uma experiência participativa. Rev Bras Saude Ocup. 2019;44:e 36.
-
7Cavalcante CAA, Cossi MS, Costa RRO, Medeiros SM, Meneses RMP. Análise crítica dos acidentes de trabalho no Brasil. Rev Atenção à Saúde. 2015;13(44):100-9.
-
8Silva, TL, Dias EC, Pessoa VM, Fernandes LMM, Gomes EM. Saúde do trabalhador na Atenção Primária: percepções e práticas de equipes de Saúde da Família. Interface. 2014;18(49):273-88.
-
9Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (BR). Panorama São Carlos, SP [Internet]. Rio de Janeiro; 2021 [citado em 15 jan 2021]. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/sp/sao-carlos/panorama
» https://cidades.ibge.gov.br/brasil/sp/sao-carlos/panorama -
10Pires AS. As Novas Configurações Espaciais do Empreendedorismo Tecnológico e as Experiências de Trabalho no Polo de Tecnologia de São Carlos-SP. Rev Bras Ci Soc. 2021;36(106):e3610605.
-
11Minayo MCCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14a ed. São Paulo: Hucitec; 2014.
-
12São Carlos. Lei 14.803, de 4 de dezembro de 2008: institui no Município de São Carlos o cadastramento obrigatório de alojamentos e moradias do setor canavieiro, e dá outras providências. Jornal A Folha. 2008 Dez. 4.
-
13São Carlos. Lei 15.753, de 18 de julho de 2011: Dispõe sobre a criação do Conselho Municipal de Segurança e Saúde no Trabalho da Cidade de São Carlos-SP. (Prevenção de Acidentes e Doenças Relacionadas ao Trabalho) e dá outras providências. Jornal A Folha. 2011 Jul 18 [citado 12 out 2022]. Disponível em: https://file.camarasaocarlos.sp.gov.br/70792/lei/arquivo/CODIGOLEI_19130.pdf
» https://file.camarasaocarlos.sp.gov.br/70792/lei/arquivo/CODIGOLEI_19130.pdf -
14São Carlos. Lei nº 16.089, de 10 de abril de 2012. Dispõe sobre a obrigatoriedade de notificação de todos os acidentes de trabalho e doenças ocupacionais que Unidades de Pronto-atendimento Médico atenderem, ao Centro de Referência em Saúde do Trabalhador, que especifica e dá outras providências. Jornal A Folha. 2012 Abr 10.
-
15São Carlos. Secretaria Municipal de Saúde. Regimento Interno CISTT Comissão Intersetorial em Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora. São Carlos; 2014.16. São Carlos. Secretaria Municipal de Saúde. Plano Plurianual de Saúde 2010/2013. São Carlos; 2010.
-
16São Carlos. Secretaria Municipal de Saúde. Plano Plurianual de Saúde 2010/2013. São Carlos; 2010.
-
17São Carlos. Secretaria Municipal de Saúde. Plano Plurianual de Saúde 2014/2017. São Carlos; 2014.
-
18Vilela RAG, Santos SA, Silva AJN, Almeida IM. Experiência de vigilância no setor canavieiro: desafios para interromper a "maratona" perigosa dos canaviais. Cien saude coletiva. 2014;19(12):4659-68.
-
19Moreno-Torres LA, Ventura-Alfaro CE. Underreporting trends of occupational illnesses in Mexico. J Occup Health. 2018;60(1):85-8.
-
20Melo CF, Cavalcante AKS, Façanha KQ. Inviabilização do adoecimento Psíquico do Trabalhador: Limites da Integralidade na Rede de Atenção, Trab Educ Saude. 2019; 17(2):e0020132.
-
21Rodrigues AB, Santana VS. Acidentes de trabalho fatais em Palmas, Tocantins, Brasil: oportunidades perdidas de informação. Rev Bras Saude Ocup. 2019;44:e8.
-
22Artur K. Participação e direito à saúde dos trabalhadores. Saude Soc. 2015;24(3):853-68.
-
23Vasconcellos LCF, Aguiar L. Saúde do Trabalhador: necessidades desconsideradas pela gestão do Sistema Único de Saúde. Saúde debate. 2017;41(113):605-17.
-
24Vasconcellos LCF, Gomez CM, Machado JMH. Entre o definido e o por fazer na Vigilância em Saúde do trabalhador. Cien saude coletiva. 2014;19(12):4617-26.
-
25Daldon MTB, Lancman S. Vigilância em Saúde do Trabalhador: rumos e incertezas. Rev Bras Saude Ocup. 2013;38(127):92-106.
-
26Mendes MJR, Wünsch DS, Machado FKS, Martins J, Giongo CR. Saúde do trabalhador: desafios na efetivação do direito à saúde. Argum. 2015;7(2):194-207.
-
27Cortez EA, Jasmim JS, Silva LM, Queluci GC. Análise da mortalidade por acidentes de trabalho no Brasil: Revisão Integrativa. Rev enferm UFPE. 2017;11(supl 1):429-37.
-
28Medina FS, Maia MZB. A subnotificação de LER/DORT sob a ótica de profissionais de saúde de Palmas, Tocantins. Rev Bras Saude Ocup. 2016;41:e8.
-
29Galindo AC, Gurgel AM. Planejamento de ações de saúde do trabalhador no SUS: uma análise dos planos municipais de saúde da VI Regional de Saúde de Pernambuco. Rev Eletron Comun Inf Inov Saude. 2016;10(4).
-
30da Silva ES, dos Santos CLR, Barbosa HL. Vigilância em saúde do trabalhador: uma prática necessária para os enfermeiros nas unidades básicas de saúde. Rev Saude Col UEFS. 2016;6(1):20-5.
-
31Cardoso MCB, Araújo TM. Os Centros de Referências em Saúde do Trabalhador e as ações em saúde mental: um inquérito no Brasil. Rev Bras Saude Ocup. 2016;41:e7.
-
32Bastos-Ramos TP, Santana VS, Ferrite S. Estratégia Saúde da Família e notificações de acidentes de trabalho, Brasil, 2007-2011. Epidemiol Serv Saude. 2015;24(4):641-50.
-
2
Trabalho baseado na dissertação de mestrado de Maria Ferreira da Silva, intitulada “Vigilância em saúde do trabalhador na esfera municipal”, defendida em 2018 no Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de São Carlos.
-
Os autores informam que dados parciais foram apresentados em dois eventos científicos: 1) 32nd Triennial Congress of the International Commission on Occupational Health (ICOH), Dublin, Ireland, 2018, resumo publicado em: https://oem.bmj.com/content/75/Suppl_2/A174.2 e 2) 2º Seminário Nacional sobre Saúde e Trabalho - contribuições da Saúde do Trabalhador ao trabalho docente. Ribeirão Preto, 2017, não houve publicação de resumo.
-
Disponibilidade de dados
Os autores declaram que o conjunto de dados que dá suporte a este estudo não está disponível publicamente devido ser fruto de entrevistas individuais e contém informações sobre serviços de saúde e processos de trabalho que permitem identificar pessoas ou locais de trabalho, mesmo com anonimização.
Editado por
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
03 Fev 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
-
Recebido
17 Fev 2021 -
Revisado
20 Set 2021 -
Aceito
04 Nov 2021