Resumos
Objetivo
estimar a prevalência de Benefícios Auxílio-Doença (BAD) entre trabalhadores do ramo da Construção e a potencial influência do sexo, idade e ramo de atividade no quadro de incapacidade para o trabalho, no Brasil, em 2009.
Método
estudo transversal de base populacional baseado nos BAD concedidos pela Previdência Social. Do Sistema Único de Benefícios e do Cadastro Nacional de Informações Sociais extraíram-se informações sobre ramo de atividade, sexo, idade, causa clínica e espécie de benefício. A população de estudo correspondeu à média mensal dos vínculos empregatícios declarados em 2009 (1.784.772).
Resultados
foram concedidos 81.235 BAD, resultando em prevalência de 455,2/10.000 vínculos, com predomínio da espécie BAD previdenciária (Razão de Prevalência [RP] 3,1), do sexo masculino (RP 1,3) e dos ramos de atividade Obras de acabamento, Construção de obras de arte e Obras de terraplenagem. Homens caracterizaram 76,7% mais BAD acidentários que mulheres. As principais causas diagnósticas foram Lesões, Doenças osteomusculares e Doenças digestivas. As categorias clínicas mais prevalentes foram Dorsalgia, Fratura ao nível do punho e da mão, Fratura da perna e Hérnia inguinal. A prevalência aumentou com a idade.
Conclusão
a prevalência mostrou-se influenciada pela espécie de benefício, ramo de atividade, sexo e idade. Os resultados sugerem potenciais mecanismos de subnotificação/demanda previdenciária.
incapacidade para o trabalho; auxílio-doença; construção; atividade econômica; saúde do trabalhador
Objective
to estimate the prevalence of sickness benefits among workers in the construction industry and the potential influence of sex, age and branch of activity within the framework of incapacity for work in Brazil in 2009.
Methods
a cross-sectional population study based on sickness benefits provided by the Brazilian Social Security. Information about the branch of activity, sex, age, cause and type of clinical benefit of workers was extracted from the Unified Benefits and the National Registry of Social Information. The study population corresponded to the average monthly employment relations declared in 2009 (1,784,772).
Results
the study population was granted 81,235 sickness benefits, resulting in a prevalence of 455.2/10,000 bonds, predominantly non-work related benefits (Prevalence Ratio [PR] 3,1), male (PR 1,3), and branches of activity: Finishing works, Construction works of art and Earthwork. Men were granted 76.7% more sickness benefits related to work than women. The main causes were Injuries, Musculoskeletal Diseases, and Digestive Diseases. The most prevalent clinical categories were Back pain, Fracture at the wrist and hand, Fracture of the leg and Inguinal hernia. Prevalence increased with age.
Conclusion
the prevalence of sickness benefits was influenced by the type of benefit, type of activity, age and sex. The results of this study suggest potential mechanisms of underreporting/social security demand.
work disability; sickness benefit; construction; economic activity; occupational health
Introdução
O absenteísmo por doença e a consequente incapacidade para o trabalho são um problema
de saúde pública em todo o mundo, com considerável custo socioeconômico (ROELEN et al., 2009ROELEN, C. A. et al. Trends in the incidence of sickness absence due
to common mental disorders between 2001 and 2007 in the Netherlands. European
Journal of Public Health, London, v. 19, n. 6, p. 625-630, 2009.
http://dx.doi.org/10.1093/eurpub/ckp090. PMid:19581376
http://dx.doi.org/10.1093/eurpub/ckp090...
). Estudos internacionais
têm mostrado que fatores como ocupação, condições de trabalho e nível de
escolaridade são fortes determinantes de incapacidade para o trabalho (PIHA et al., 2010PIHA, K. et al. Interrelationships between education, occupational
class, income and sickness absence. European Journal of Public Health, Oxford,
v. 20, n. 3, p. 276-280, 2010. http://dx.doi.org/10.1093/eurpub/ckp162.
PMid:19843600
http://dx.doi.org/10.1093/eurpub/ckp162...
; LAAKSONEN et al., 2010LAAKSONEN, M. et al. Gender differences in sickness absence—the
contribution of occupation and workplace. Scandinavian Journal of Work,
Environment & Health, Helsinki, v. 36, n. 5, p. 394-403, 2010.
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.2909. PMid:20213051
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.2909...
).
Estudo brasileiro recente, de base populacional, mostrou a importância do ramo de
atividade econômica na incidência de incapacidade para o trabalho em 2008 (BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA, 2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
). Esse
estudo apontou o ramo Construção de edifícios como a terceira maior
incidência bruta de incapacidade temporária para o trabalho em geral, a quarta
quando analisados separadamente os benefícios auxílio-doença previdenciário (sem
nexo técnico com o trabalho) e a terceira entre os acidentários (com nexo técnico
com o trabalho) (BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA,
2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
). Em outro estudo desenvolvido com a mesma população e com métodos
semelhantes, mas considerando apenas doenças osteomusculares, os resultados em
termos de distribuição das taxas de prevalência desse grupo foram semelhantes aos do
estudo anterior, a saber, a quarta maior taxa de prevalência, no conjunto dos
benefícios auxílio-doença, e a segunda quando considerados apenas os benefícios
relacionados ao trabalho (VIEIRA;
ALBUQUERQUE-OLIVEIRA; BARBOSA-BRANCO, 2011VIEIRA, E. R.; ALBUQUERQUE-OLIVEIRA, P. R.; BARBOSA-BRANCO, A. Work
disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private
sector workers. BMJ Open, London, v. 1, n. 1, p. e000003, 2011.
http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2011-000003. PMid:22021719
http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2011-0...
).
Achados em um estudo de base populacional sobre benefícios auxílio-doença devido a
transtornos mentais no Brasil mostraram que, do total desses benefícios concedidos
aos trabalhadores do ramo Construção, mais de 40% foram decorrentes
de Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de substância
psicoativa. O ramo Construção de edifícios apresentou
a maior duração mediana dos afastamentos por incapacidade para o trabalho
decorrentes de transtornos mentais, o que indica, potencialmente, maior gravidade e
cronicidade dos casos (BARBOSA-BRANCO; BÜLTMANN;
STEENSTRA, 2012BARBOSA-BRANCO, A. B.; BÜLTMANN, U.; STEENSTRA, I. Sickness benefit
claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based
study. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 28, n. 10, p. 1854-1866,
2012. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012001000005.
PMid:23090166
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012...
).
A alta rotatividade, a subnotificação dos registros de acidentes e doenças do
trabalho e as elevadas taxas de informalidade nos ramos da
Construção, em particular na Construção de
edifícios, contribuem para a escassez de pesquisas epidemiológicas
sobre incapacidade para o trabalho nesse setor produtivo (SANTANA; OLIVEIRA, 2004SANTANA, V. S.; OLIVEIRA, R. P. Saúde e trabalho na construção civil
em uma área urbana do Brasil. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 20,
n. 3, p. 797-811, 2004. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2004000300017.
PMid:15263991
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2004...
).
O perfil do trabalhador na construção, mesmo o empregado, é de indivíduos jovens, do
sexo masculino, com baixa escolaridade, reduzida qualificação profissional, além de
notável contingente de migrantes (DEPARTAMENTO
INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS, 2001DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS
– DIEESE. Os trabalhadores e a reestruturação produtiva na construção civil
brasileira. Série Estudos Setoriais, São Paulo, n. 12, 2001.; RINGEN; SEEGAL; WEEKS, 1998RINGEN, K.; SEEGAL, J. L.; WEEKS, J. L. Constructión. In: STELLMAN,
J. M. (Ed.). Enciclopedia de Salud y Seguridad en el Trabajo. Geneva:
International Labour Office, 1998. Disponível em:
http://www.insht.es/InshtWeb/Contenidos/Documentacion/TextosOnline/EnciclopediaOIT/tomo3/93.pdf.
Acesso em: 04 set. 2013.
http://www.insht.es/InshtWeb/Contenidos/...
).
Empiricamente, sabe-se que os trabalhadores informais contam com menor assistência em
relação à saúde do que aqueles minimamente amparados pela legislação trabalhista.
Considerando-se as altas taxas de informalidade observadas no ramo da
Construção (SANTANA; OLIVEIRA,
2004SANTANA, V. S.; OLIVEIRA, R. P. Saúde e trabalho na construção civil
em uma área urbana do Brasil. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 20,
n. 3, p. 797-811, 2004. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2004000300017.
PMid:15263991
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2004...
), é possível que esse grupo de trabalhadores apresente quadros de
adoecimento mais severos do que os encontrados em trabalhadores empregados (BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA, 2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
).
A ocorrência de problemas de saúde na construção civil está potencialmente associada
ao grande número de riscos ocupacionais, como o trabalho em grandes alturas, o
manejo de máquinas, equipamentos e ferramentas perfurocortantes, instalações
elétricas, uso de veículos automotores, posturas e movimentos antiergonômicos, como
na elevação de objetos pesados, além de estresse devido à transitoriedade e à alta
rotatividade (SOROCK; SMITH; GOLDOFT, 1993SOROCK, G. S.; SMITH, E. O.; GOLDOFT, M. Fatal occupational injuries
in the New Jersey construction industry, 1983 to 1989. Journal of Occupational
Medicine, Chicago, v. 35, n. 9, p. 916-921, 1993.
http://dx.doi.org/10.1097/00043764-199309000-00015.
PMid:8229344
http://dx.doi.org/10.1097/00043764-19930...
;
LIPSCOMB; DEMENT; RODRIGUEZ-ACOSTA,
2000LIPSCOMB, H. J.; DEMENT, J. M.; RODRIGUEZ-ACOSTA, R. Deaths from
external causes of injury among construction workers in North Carolina,
1988-1994. Applied Occupational and Environmental Hygiene, Philadelphia, v. 15,
n. 7, p. 569-580, 2000. http://dx.doi.org/10.1080/10473220050028394.
PMid:10893793
http://dx.doi.org/10.1080/10473220050028...
; JEONG, 1998JEONG, B. Y. Occupational deaths and injuries in the construction
industry. Applied Ergonomics, Guildford, v. 29, n. 5, p. 355-360, 1998.
http://dx.doi.org/10.1016/S0003-6870(97)00077-X. PMid:9703349
http://dx.doi.org/10.1016/S0003-6870(97)...
; CATTLEDGE; HENDRICKS; STANEVICH, 1996CATTLEDGE, G. H.; HENDRICKS, S.; STANEVICH, R. Fatal occupational
falls in the U.S. construction industry, 1980-1989. Accident Analysis and
Prevention, Elmsford, v. 28, n. 5, p. 647-654, 1996.
http://dx.doi.org/10.1016/0001-4575(96)00025-5. PMid:8899046
http://dx.doi.org/10.1016/0001-4575(96)0...
).
Estudos internacionais mostram que nesse ramo de atividade, dentre as enfermidades
mais incapacitantes para o trabalho, destacam-se as doenças musculoesqueléticas,
dermatites, intoxicação por chumbo e asbestose (BURKHART et al., 1993BURKHART, G. et al. Job tasks, potential exposures, and health risks
of laborers employed in the construction industry. American Journal of
Industrial Medicine, New York, v. 24, n. 4, p. 413-425, 1993.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.4700240407. PMid:8250061
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.470024040...
) e que trabalhadores apresentam alta prevalência
de abuso de álcool (HOFFMANN; BRITTINGHAM; LARISON,
1996HOFFMANN, J. P.; BRITTINGHAM, A.; LARISON, C. Drug use among U.S.
workers: prevalence and trends by occupation and industry categories. In: OFFICE
OF APPLIED STUDIES. Substance Abuse and Mental Health Services Administration.
Washington: Government Printing Office, 1996. (DHHS Publication, No. SMA
96-3089). Disponível em:
https://books.google.com.br/books?id=Z6vDU_2VZGoC&lpg=PR15&ots=pbhovcFkye&dq=Drug%20use%20among%20U.S.%20workers%3A%20prevalence%20and%20trends%20by%20occupation%20and%20industry%20categories&hl=pt-BR&pg=PR1#v=onepage&q=Drug%20use%20among%20U.S.%20workers:%20prevalence%20and%20trends%20by%20occupation%20and%20industry%20categories&f=true.
Acesso em: 05 jan. 2015.), inclusive durante o horário de trabalho, contribuindo sobremaneira
para o agravamento dos riscos já existentes nos ambientes laborais.
Os trabalhadores desse ramo de atividade no Brasil apresentam os menores níveis salariais dentre os ramos da indústria, o que lhes impõe, com frequência, a necessidade de estender a jornada de trabalho por meio da realização de horas extras ou da adoção de regime de tarefas e, como consequência, tem-se uma maior exposição aos riscos de acidentes e doenças do trabalho (SERVIÇO SOCIAL DA INDÚSTRIA, 1998SERVIÇO SOCIAL DA INDÚSTRIA – SESI. Projeto SESI na Indústria da Construção: diagnóstico da mão-de-obra do setor da construção civil. Brasília: SESI, 1998.).
A atividade da construção civil é considerada uma das mais perigosas em todo o mundo,
liderando as taxas de acidentes de trabalho fatais, não fatais e de anos de vida
perdidos (RINGEN; SEEGAL; WEEKS, 1998RINGEN, K.; SEEGAL, J. L.; WEEKS, J. L. Constructión. In: STELLMAN,
J. M. (Ed.). Enciclopedia de Salud y Seguridad en el Trabajo. Geneva:
International Labour Office, 1998. Disponível em:
http://www.insht.es/InshtWeb/Contenidos/Documentacion/TextosOnline/EnciclopediaOIT/tomo3/93.pdf.
Acesso em: 04 set. 2013.
http://www.insht.es/InshtWeb/Contenidos/...
). Os
acidentes de trabalho são a principal causa ocupacional de morte na construção civil
(SOROCK; SMITH; GOLDOFT, 1993SOROCK, G. S.; SMITH, E. O.; GOLDOFT, M. Fatal occupational injuries
in the New Jersey construction industry, 1983 to 1989. Journal of Occupational
Medicine, Chicago, v. 35, n. 9, p. 916-921, 1993.
http://dx.doi.org/10.1097/00043764-199309000-00015.
PMid:8229344
http://dx.doi.org/10.1097/00043764-19930...
; BURKHART et al., 1993BURKHART, G. et al. Job tasks, potential exposures, and health risks
of laborers employed in the construction industry. American Journal of
Industrial Medicine, New York, v. 24, n. 4, p. 413-425, 1993.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.4700240407. PMid:8250061
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.470024040...
).
Apesar dos dados disponíveis na literatura serem principalmente referentes à Construção de edifícios (Classificação Nacional de Atividades Econômicas [CNAE]-Divisão 41), o ramo da Construção (CNAE-Seção F) é ainda composto pelos ramos Obras de infraestrutura (CNAE-Divisão 42) e Serviços especializados para construção (CNAE-Divisão 43). As atividades típicas realizadas, bem como os riscos ocupacionais presentes nesses três ramos da Construção, diferem sobremaneira entre si, o que nos leva a inferir que o perfil epidemiológico de adoecimento desses trabalhadores seja diferente. Dessa forma, torna-se importante avaliar essas potenciais diferenças visando melhor compreender esses processos de adoecimento, e dessa forma contribuir no estabelecimento de medidas preventivas mais eficazes.
Frente a esse contexto, objetiva-se estimar a prevalência de benefícios auxílio-doença concedidos aos trabalhadores empregados no ramo da Construção e a potencial influência do sexo, da idade, da espécie de benefício e do ramo de atividade específico (CNAE-classe) no quadro de incapacidade para o trabalho no Brasil, em 2009.
Métodos
Trata-se de estudo descritivo, com base na análise dos Benefícios Auxílio-Doença
(BAD) concedidos pelo Instituto Nacional de Seguro Social – INSS aos trabalhadores
empregados no ramo da Construção (CNAE 2.0, Seção F) no Brasil, em
2009. A incapacidade para o trabalho foi avaliada pela prevalência de BAD. Para
concessão de um BAD a perícia do INSS avalia a presença ou não da incapacidade para
o trabalho e não apenas a presença de um agravo. Portanto, neste estudo, BAD e
incapacidade para o trabalho são utilizados como termos equivalentes. Detalhes do
esquema de concessão de auxílio-doença no Brasil, bem como o detalhamento das fontes
de dados utilizadas neste estudo e da forma de tratamento dos dados foram descritos
em estudos anteriores (BARBOSA-BRANCO; SOUZA;
STEENSTRA, 2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
; BARBOSA-BRANCO;
BÜLTMANN; STEENSTRA, 2012BARBOSA-BRANCO, A. B.; BÜLTMANN, U.; STEENSTRA, I. Sickness benefit
claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based
study. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 28, n. 10, p. 1854-1866,
2012. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012001000005.
PMid:23090166
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012...
).
Os dados analisados neste estudo são oriundos de duas grandes bases de dados sob a responsabilidade do INSS: a) Sistema Único de Benefícios – SUB, que concentra o registro de todos os benefícios concedidos aos segurados da iniciativa privada no Brasil, e incluem os BAD, objeto desta investigação; b) Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS, o qual recebe, por determinação legal, informações mensais dos vínculos empregatícios mantidos pelas empresas. Para o tratamento dos dados utilizou-se o sistema de armazenamento e gerenciamento de bancos de dados Microsoft Office Access®. Do SUB foram extraídas informações sobre o ramo de atividade econômica patronal, sexo, idade, causa clínica (CID-10) e espécie de benefício (previdenciário, acidentário). Essa base constitui o numerador. Do CNIS foram coletados dados sobre o ramo de atividade econômica patronal (CNAE Seção, Divisão e Classe), sexo e idade do trabalhador. Os dados dessa base foram usados como denominador para os cálculos da prevalência, que foram realizados por meio do programa de planilha eletrônica Microsoft Office Excel®. As taxas de incapacidade apresentadas referem-se às prevalências e razões de prevalências (RP) obtidas para as variáveis de interesse.
A população de estudo corresponde à média dos vínculos empregatícios declarados pelos empregadores na CNAE-Seção F (Construção) no Brasil, em 2009 (1.784.772), o qual corresponde a 5,4% dos vínculos empregatícios declarados no Brasil em 2009. Foi considerado caso todo benefício auxílio-doença concedido à população de estudo no período de 1/1 a 31/12/2009.
Para a análise individualizada da prevalência dos agrupamentos CID-10 foi adotado o critério de corte de 2.000 casos por agrupamento, a fim de evitar distorções numéricas. Em relação ao ramo de atividade, não foram individualmente consideradas, para análise, as CNAE com menos de 1.000 benefícios concedidos no período. Foram considerados para análise individualizada os resultados para as categorias diagnósticas que apresentaram mais de 1.000 BAD em 2009, representadas em 12 categorias (40,3% da casuística).
A fim de simplificar a leitura e compreensão dos resultados desta pesquisa, os nomes dos grupos diagnósticos (capítulos CID-10) foram simplificados na forma a seguir, sem prejuízo quanto aos agrupamentos e categorias neles contidos: I - Doenças infecciosas; II - Neoplasias; III - Doenças do sangue; IV - Doenças endócrinas; V - Doenças mentais; VI - Doenças do sistema nervoso; VII - Doenças do olho; VIII - Doenças do ouvido; IX - Doenças do aparelho circulatório; X - Doenças respiratórias; XI - Doenças digestivas; XII - Doenças da pele; XIII - Doenças osteomusculares; XIV - Doenças geniturinárias; XIX - Lesões; e XXI - Fatores que influenciam o estado de saúde.
Com o mesmo objetivo, os seguintes ramos de atividades também tiveram sua nomenclatura CNAE-classe simplificada, sem que se alterasse para análise o rol de atividades constantes na relação original: 4211 - Construção de rodovias; 4212 - Construção de obras de arte; 4221 - Obras para energia elétrica e telecomunicações; 4222 - Construção de redes de água e esgoto; 4292 - Montagem de instalações industriais; 4322 - Instalações hidráulicas; e 4329 - Obras de instalações em construções.
Com relação aos aspectos éticos, esclarecemos que foram utilizados exclusivamente dados secundários oriundos de grandes bases públicas de dados, sem que houvesse meios para a identificação dos sujeitos individualmente.
Resultados
Em 2009 foram concedidos 81.235 BAD aos trabalhadores empregados na Construção, resultando em uma prevalência de 455,2 casos para cada 10.000 vínculos empregatícios (Tabela 1). Quanto à espécie de benefício predominaram os BAD previdenciários em uma razão de 3,1 em relação aos BAD acidentários (Tabela 1).
Prevalência de benefícios auxílio-doença no ramo da Construção (por 10 mil vínculos)* * A população de estudo corresponde à média dos vínculos empregatícios declarados pelos empregadores na CNAE-Seção F-Construção no período: 1.784.772 vínculos segundo sexo, espécie de benefício e grupo CID-10 - Brasil - 2009
Em relação aos grupos diagnósticos (capítulos CID-10) que deram origem aos benefícios, predominaram as Lesões (180,1); Doenças osteomusculares (90,1); e as Doenças digestivas (39,4), independente da espécie de benefício (Tabela 1). O grupo das Lesões representou 39,6% dos BAD e esses três grupos juntos responderam por 68,0% dos BAD.
A análise da potencial influência do sexo na prevalência de BAD mostrou que os homens, no geral (476,3), apresentaram prevalência 30,0% maior do que as mulheres (374,5) e 76,7% maior nexo técnico (relação com o trabalho) (Tabela 1). A maior diferença entre os sexos em relação à prevalência de BAD segundo os grupos diagnósticos foi observada em relação às Lesões (RP 2,7), Doenças infecciosas (RP 2,2) e Doenças do olho (RP 2,2) (Tabela 1).
Entre os homens, as Lesões tiveram maior peso no quadro da incapacidade, representando 41,1% do total de BAD e 64,8% daqueles relacionados ao trabalho, enquanto que entre as mulheres essa representatividade foi de 19,1% no geral e 42,3% entre os BAD acidentários.
Dentre os grupos mais prevalentes, as Doenças osteomusculares e as Doenças mentais foram mais impactantes entre as mulheres, representando juntas 34,4% do total de BAD nesse sexo, contrapondo-se a 26,3% entre os homens. Esse impacto fica ainda mais claro quando considerado apenas os BAD acidentários (45,5% no feminino comparado a 25,8% no masculino).
Na análise da espécie de benefício (previdenciário e acidentário) em relação aos grupos diagnósticos, observa-se que, enquanto os BAD previdenciários seguiram a mesma tendência geral independente do sexo, os acidentários apresentaram elevadas razões de prevalência entre os sexos, principalmente para os grupos Doenças digestivas (RP 12,3), Doenças do olho (RP 6,1) e Lesões (RP 3,1) (Tabela 1).
Ao analisar a potencial influência do ramo de atividade na prevalência de BAD segundo os grupos diagnósticos (Tabela 2) observaram-se variações importantes. Os ramos Obras de acabamento, Construção de obras de arte e Obras de terraplenagem apresentaram as maiores prevalências de BAD em geral e lideraram essa taxa em relação à maioria dos grupos diagnósticos. Em todos os ramos de atividades analisados, os três maiores grupos de causa diagnóstica para os afastamentos foram as Lesões, as Doenças osteomusculares e as Doenças digestivas, exceto nos ramos Obras para energia elétrica e telecomunicações, e Instalações elétricas. Nesses ramos, o terceiro maior grupo foi o das Doenças mentais.
Prevalência de benefícios auxílio-doença no ramo da Construção (por 10 mil vínculos)* * A população de estudo corresponde à média dos vínculos empregatícios declarados pelos empregadores na CNAE-Seção F-Construção no período: 1.784.772 vínculos segundo ramo de atividade econômica e grupo CID-10 - Brasil – 2009
Os ramos de atividade apresentaram taxas de incapacidade heterogêneas tanto no geral quanto em relação aos grupos diagnósticos específicos. O ramo com maior prevalência de Lesões, Obras de acabamento, apresentou taxas de afastamentos 58,4% maior que a totalidade dos ramos e 81,8% maior que o ramo com menor prevalência. Chamou atenção a alta prevalência de benefícios decorrentes de Doenças da pele entre os trabalhadores de Obras de terraplenagem (Tabela 2). Nesse ramo, esse grupo de doenças que representou a quarta causa clínica de incapacidade, em termos de correlação com o trabalho (RP 7,1) (Tabela 1), teve prevalência 78,6% maior que a da população de estudo e 177,8% maior que a do ramo Obras para energia elétrica e telecomunicações (Tabela 2).
Essa mesma análise quando realizada segundo o agrupamento CID-10 mostrou que, dentre os 19 maiores agrupamentos, nove destes figuram no grupo das Lesões; três de Doenças osteomusculares e três de Doenças do aparelho circulatório (Tabela 3). O ramo Obras de acabamento apresentou taxas superiores às dos trabalhadores da Construção em geral em todos os agrupamentos, exceto para Doenças hipertensivas (Tabela 3). O ramo Construção de obras de arte apresentou prevalência de Dorsopatias 48,9% maior do que a Construção em geral, enquanto o ramo Perfurações e sondagens apresentou 93,8% maior prevalência para Traumatismos do punho e da mão do que o conjunto dos trabalhadores da Construção.
Prevalência de benefícios auxílio-doença no ramo da Construção (por 10 mil vínculos)* * A população de estudo corresponde à média dos vínculos empregatícios declarados pelos empregadores na CNAE-Seção F-Construção no período: 1.784.772 vínculos segundo ramo de atividade econômica e agrupamento CID-10 - Brasil - 2009
O ramo Construção de edifícios, CNAE divisão 41, apresentou o maior número de vínculos empregatícios dentre os ramos da Construção (dados não tabulados), e taxas de incapacidade para o trabalho, em geral, menores do que as dos demais CNAE (Tabelas 2 e 3).
Ao se buscar um maior detalhamento das causas diagnósticas dos benefícios (categoria CID-10) e sua relação com o sexo e a idade do trabalhador incapacitado, verificou-se que a variável idade apresentou relação direta com o aumento da prevalência de BAD, independente do sexo, até a faixa etária de 50-59 anos de idade. (Tabela 4). Ao se considerar o total das categorias diagnósticas, independente do sexo, também ocorreu aumento da prevalência de BAD com a idade (dados não tabulados).
Prevalência de benefícios auxílio-doença no ramo da Construção (por 10 mil vínculos)* * A população de estudo corresponde à média dos vínculos empregatícios declarados pelos empregadores na CNAE-Seção F-Construção no período: 1.784.772 vínculos segundo faixa etária e categoria CID-10 - Brasil – 2009
Em razão das diferentes atividades exercidas por homens e mulheres na Construção, foram encontradas diferenças substanciais na distribuição das prevalências entre os sexos e categorias diagnósticas. No geral, a categoria mais prevalente foi a Dorsalgia, com taxa pouco superior à Fratura ao nível do punho e da mão, sendo que essas duas categorias de causas diagnósticas representaram 13,2% do total de casos (Tabela 4).
A partir da soma das prevalências de categorias de Doenças osteomusculares por cada faixa etária e sexo, verificou-se para ambos os sexos a mesma relação observada quanto à tendência geral, aumento da prevalência de BAD até os 59 anos (Tabela 4).
Com relação à idade e às categorias do grupo Lesões, entre os homens a maior prevalência foi observada na faixa etária de 20-29 anos, com gradativa queda com o avanço da idade. Entre as mulheres a situação geral é quase que inversa no conjunto dessas categorias. Houve aumento do número de Lesões até os 59 anos. A topografia das lesões também sofreu influência do sexo; enquanto entre os homens a prevalência de lesões nos membros superiores foi 22,2% maior que nos membros inferiores, entre as mulheres ocorre o contrário, as lesões de membros inferiores foram 35,4% maior do que superiores. Esses valores são obtidos avaliando-se as relações entre as somas das prevalências das categorias relacionadas a membros superiores (S42, S52 e S62) e inferiores (S82, S83 e S92), para homens e mulheres (Tabela 4).
Os BAD devido à Hérnia inguinal, quarta categoria mais prevalente, predominaram fortemente entre os homens, havendo aumento da prevalência com o avanço da idade em ambos os sexos (Tabela 4). A categoria mais prevalente dentre as Doenças mentais foi a dos Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de múltiplas drogas e ao uso de outras substâncias psicoativas. Essa categoria prevaleceu entre homens com idade entre 20 e 40 anos, sendo que as prevalências em outras faixas etárias, para homens e mulheres, foram pouco expressivas (Tabela 4).
Discussão
O presente estudo estimou a prevalência de Benefícios Auxílio-Doença (BAD) entre trabalhadores do ramo Construção no Brasil, em 2009, analisados segundo sua relação com a causa diagnóstica, ramo de atividade econômica (no nível classe), espécie de benefício, sexo e idade dos trabalhadores que receberam benefícios. As diferentes metodologias utilizadas em estudos de incapacidade para o trabalho, além dos diversos sistemas de concessão de benefícios, dificultam a comparação desses dados com os da literatura, sobretudo no ramo Construção.
A taxa de prevalência de incapacidade para o trabalho encontrada neste estudo para o
ramo da Construção (4,6%) foi pouco superior à encontrada para o
conjunto da população empregada no Brasil em 2008 (<4,3%), no entanto esta
foi menor do que as apresentadas por ramos de atividade como Esgoto e
atividades relacionadas (24,0%), Fabricação de produtos de
madeira (7,6%) e Fabricação de móveis (6,3%) (BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA, 2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
).
Considerando os riscos existentes nas atividades de Construção
(SOROCK; SMITH; GOLDOFT, 1993SOROCK, G. S.; SMITH, E. O.; GOLDOFT, M. Fatal occupational injuries
in the New Jersey construction industry, 1983 to 1989. Journal of Occupational
Medicine, Chicago, v. 35, n. 9, p. 916-921, 1993.
http://dx.doi.org/10.1097/00043764-199309000-00015.
PMid:8229344
http://dx.doi.org/10.1097/00043764-19930...
; LIPSCOMB; DEMENT; RODRIGUEZ-ACOSTA, 2000LIPSCOMB, H. J.; DEMENT, J. M.; RODRIGUEZ-ACOSTA, R. Deaths from
external causes of injury among construction workers in North Carolina,
1988-1994. Applied Occupational and Environmental Hygiene, Philadelphia, v. 15,
n. 7, p. 569-580, 2000. http://dx.doi.org/10.1080/10473220050028394.
PMid:10893793
http://dx.doi.org/10.1080/10473220050028...
;
JEONG, 1998JEONG, B. Y. Occupational deaths and injuries in the construction
industry. Applied Ergonomics, Guildford, v. 29, n. 5, p. 355-360, 1998.
http://dx.doi.org/10.1016/S0003-6870(97)00077-X. PMid:9703349
http://dx.doi.org/10.1016/S0003-6870(97)...
; CATTLEDGE; HENDRICKS; STANEVICH, 1996CATTLEDGE, G. H.; HENDRICKS, S.; STANEVICH, R. Fatal occupational
falls in the U.S. construction industry, 1980-1989. Accident Analysis and
Prevention, Elmsford, v. 28, n. 5, p. 647-654, 1996.
http://dx.doi.org/10.1016/0001-4575(96)00025-5. PMid:8899046
http://dx.doi.org/10.1016/0001-4575(96)0...
; BURKHART et al., 1993BURKHART, G. et al. Job tasks, potential exposures, and health risks
of laborers employed in the construction industry. American Journal of
Industrial Medicine, New York, v. 24, n. 4, p. 413-425, 1993.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.4700240407. PMid:8250061
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.470024040...
), os resultados deste estudo apontam
para possíveis mecanismos de subnotificação/demanda previdenciária.
A subnotificação no registro de agravos à saúde relacionados ao trabalho é um
fenômeno mundial, tendo sido alvo de estudos científicos que registraram altas taxas
nos Estados Unidos (LEIGH et al., 1997LEIGH, J. P. et al. Occupational injury and illness in the United
States. Estimates of costs, morbidity, and mortality. Archives of Internal
Medicine, Chicago, v. 157, n. 14, p. 1557-1568, 1997.
http://dx.doi.org/10.1001/archinte.1997.00440350063006.
PMid:9236557
http://dx.doi.org/10.1001/archinte.1997....
),
Inglaterra (SOLOMON, 2002SOLOMON, C. Accidental injuries in agriculture in the UK.
Occupational Medicine, Chicago, v. 52, n. 8, p. 461-466, 2002.
http://dx.doi.org/10.1093/occmed/52.8.461. PMid:12488516
http://dx.doi.org/10.1093/occmed/52.8.46...
) e Espanha (GARCÍA GÓMEZ; GIL LÓPEZ, 1996GARCÍA GÓMEZ, M.; GIL LÓPEZ, E. Los sistemas de información y la
vigilancia en salud laboral. Revista Española de Salud Pública, Madrid, v. 70,
n. 4, p. 393-407, 1996. PMid:8998688.). Estudos
nacionais verificaram a subnotificação de acidentes e doenças do trabalho por meio
do sistema de Comunicação de Acidentes de Trabalho – CAT (CORDEIRO et al., 2005CORDEIRO, R. et al. Subnotificação de acidentes do trabalho não
fatais em Botucatu, SP, 2002. Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 39, n. 2,
p. 254-260, 2005. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102005000200017.
PMid:15895146
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102005...
; SOUZA
et al., 2008SOUZA, N. S. S. et al. Doenças do trabalho e benefícios
previdenciários relacionados à saúde, Bahia, 2000. Revista de Saúde Pública, São
Paulo, v. 42, n. 4, p. 630-638, 2008.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102008000400008.
PMid:18709240
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102008...
), sendo esta estimada em 79,5% para uma cidade do estado de
São Paulo (CORDEIRO et al., 2005CORDEIRO, R. et al. Subnotificação de acidentes do trabalho não
fatais em Botucatu, SP, 2002. Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 39, n. 2,
p. 254-260, 2005. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102005000200017.
PMid:15895146
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102005...
), com
destaque para a subnotificação de acidentes de trabalho típicos devidos às causas
externas (SOUZA et al., 2008SOUZA, N. S. S. et al. Doenças do trabalho e benefícios
previdenciários relacionados à saúde, Bahia, 2000. Revista de Saúde Pública, São
Paulo, v. 42, n. 4, p. 630-638, 2008.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102008000400008.
PMid:18709240
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102008...
), principal
grupo diagnóstico para incapacidade laboral de origem acidentária verificada neste
estudo.
Até o ano de 2007, os acidentes de trabalho e as doenças do trabalho no Brasil eram
registrados por meio da CAT e se restringiam, em sua grande maioria às
Lesões, uma vez que a emissão da CAT dependia, quase que
exclusivamente, do empregador, o qual, em geral, somente realizava o procedimento
nos casos de Lesões ocorridas durante a realização das atividades
laborais, por ser fato inegável. Quando o trabalhador incapacitado para o trabalho
passa a receber BAD por motivo acidentário, independente da duração, este adquire
direitos como a estabilidade no emprego por período mínimo de um ano após seu
retorno ao trabalho, a continuidade do depósito pelo empregador do Fundo de Garantia
do Tempo de Serviço (FGTS), e a continuidade da contagem de tempo de serviço para
aposentadoria de forma ininterrupta durante seu afastamento do trabalho (WÜNSCH
FILHO, 1999). A partir da instituição do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário
(NTEP), em abril de 2007, as doenças ganharam peso na caracterização acidentária dos
benefícios auxílio-doença, mas é possível que o perfil dos trabalhadores da
construção e a elevada predominância do sexo masculino no ramo possam ter impactado
ainda mais as taxas de subnotificação, uma vez que esses trabalhadores tendem a
apresentar maior resistência à procura por serviços de saúde (GOMES; NASCIMENTO; ARAÚJO, 2007GOMES, R.; NASCIMENTO, E. F.; ARAÚJO, F. C. Por que os homens buscam
menos os serviços de saúde do que as mulheres? As explicações de homens com
baixa escolaridade e homens com ensino superior. Cadernos de Saúde Pública, São
Paulo, v. 23, n. 3, p. 565-574, 2007.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2007000300015.
PMid:17334571
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2007...
).
Após o aumento da caracterização de benefícios acidentários, observado com a introdução do NTEP, houve em 2008 uma aparente estabilização das taxas tanto dos benefícios previdenciários quanto dos acidentários, sendo possível que as empresas tenham adotado medidas internas visando evitar o afastamento do trabalhador pelo INSS em caso de incapacidade para o trabalho, uma vez que esses registros iriam influenciar na alíquota de impostos pagos a partir da introdução do Fator Acidentário de Prevenção (FAP), cuja metodologia já era conhecida pelos empregadores e sabia-se que o quadro epidemiológico apresentado pelos trabalhadores serviria de base para sua definição. Portanto, se antes do NTEP o desafio era combater a subnotificação do registro dos acidentes do trabalho por meio da CAT, a partir de 2009, ano de introdução do FAP, o desafio passa a ser combater a subnotificação da incapacidade para o trabalho como um todo.
A hipótese de que as empresas se anteciparam à implantação do FAP é reforçada ao se
analisarem os dados sobre incapacidade para o trabalho no Brasil no ano de 2008
(BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA,
2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
). Nesse ano a Construção de edifícios (CNAE divisão 41)
apresentou a terceira maior incidência ajustada quanto às Lesões
(287,9), atrás apenas dos ramos de Esgotos e Manufatura de
madeira, valor bem maior que a prevalência encontrada no presente
estudo. Ainda em comparação com os dados do mesmo estudo (BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA, 2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
), verifica-se que, em
2008, a razão de incidência para Lesões entre os sexos mostrou
sobreprevalência masculina aproximadamente duas vezes maior para as CNAE-Divisão 41
e 42. As causas da ocorrência de subnotificação de incapacidade para o trabalho
foram objeto de estudo internacional (UNITED STATES
HOUSE OF REPRESENTATIVES, 2008UNITED STATES HOUSE OF REPRESENTATIVES. A Majority Staff Report by
the Committee on Education and Labor. Hidden tragedy: underreporting of
workplace injuries and illnesses. Washington: U.S. Government
Printing Office, 2008. Disponível em:
http://www.gpo.gov/fdsys/pkg/CHRG-110hhrg42881/pdf/CHRG-110hhrg42881.pdf.
Acesso em: 04 set. 2013.
http://www.gpo.gov/fdsys/pkg/CHRG-110hhr...
), que apontou associação com os seguintes
fatores: grande número de trabalhadores no mercado informal; a dificuldade em se
caracterizar a relação entre o adoecimento e o trabalho, em especial para as
Doenças osteomusculares; o desconhecimento do sistema de
benefícios por empregados e empregadores; e a relutância do trabalhador em solicitar
o benefício aliada ao desencorajamento provocado pelo empregador. Esse estudo (UNITED STATES HOUSE OF REPRESENTATIVES, 2008UNITED STATES HOUSE OF REPRESENTATIVES. A Majority Staff Report by
the Committee on Education and Labor. Hidden tragedy: underreporting of
workplace injuries and illnesses. Washington: U.S. Government
Printing Office, 2008. Disponível em:
http://www.gpo.gov/fdsys/pkg/CHRG-110hhrg42881/pdf/CHRG-110hhrg42881.pdf.
Acesso em: 04 set. 2013.
http://www.gpo.gov/fdsys/pkg/CHRG-110hhr...
)
indica que o fator mais preocupante está ligado à atitude dos empregadores em não
notificar os eventos, uma vez que baixas taxas de adoecimento e acidentes com os
trabalhadores diminuem as chances de uma fiscalização trabalhista; diminuem os
gastos com os afastamentos por incapacidade para o trabalho; aumentam as chances de
se conseguir contratos governamentais; e melhoram a imagem da empresa perante
clientes, acionistas e comunidade em geral.
Nesse processo de promoção da subnotificação de incapacidade para o trabalho, os empregadores se utilizam de alguns métodos para que os registros não ocorram (CONWAY; SVENSON, 1998CONWAY, H.; SVENSON, J. Occupational injury and illness rates, 1992-96: why they fell. Monthly Labor Review, Washington, p. 36-58, nov. 1998.), entre os quais se encontram a intimidação direta ao empregado, com ameaças de perda do emprego, cortes salariais, supressão de horas extras e oportunidades de promoção, e assédio moral; o retorno precoce ao trabalho do empregado incapacitado, ainda que para o exercício de “trabalho leve”; o oferecimento de primeiros-socorros por meio de equipe médica própria, instruída a não promover o registro de acidentes de menor gravidade; políticas de abono de faltas em que os empregados dispõem de certa quantidade de dias de folga para quaisquer usos; falso incentivo às práticas laborais seguras por meio de folgas ou recompensas monetárias para as equipes de trabalho que não registraram acidentes e afastamentos; intimidação por meio de exames toxicológicos em caso de acidentes; terceirização de mão de obra para atividades de maior risco e a contratação de “autônomos” em substituição de empregados regulares, uma vez que nesse caso o registro de acidentes não estaria associado ao contratante (CONWAY; SVENSON, 1998CONWAY, H.; SVENSON, J. Occupational injury and illness rates, 1992-96: why they fell. Monthly Labor Review, Washington, p. 36-58, nov. 1998.). Essas práticas podem ser observadas no ramo da Construção e são agravadas devido ao grande número de trabalhadores em atividades não especializadas, cujo temor em perder o emprego se deve à grande facilidade de reposição.
A análise da potencial influência do sexo na prevalência de incapacidade para o
trabalho (benefício auxílio-doença) mostra que a maior (30,0%) prevalência de BAD
concedidos ao sexo masculino nesse ramo de atividade, quando comparada aos
trabalhadores femininos, vai ao encontro da maioria dos resultados nacionais (PIHA et al., 2010PIHA, K. et al. Interrelationships between education, occupational
class, income and sickness absence. European Journal of Public Health, Oxford,
v. 20, n. 3, p. 276-280, 2010. http://dx.doi.org/10.1093/eurpub/ckp162.
PMid:19843600
http://dx.doi.org/10.1093/eurpub/ckp162...
; LAAKSONEN et al., 2010LAAKSONEN, M. et al. Gender differences in sickness absence—the
contribution of occupation and workplace. Scandinavian Journal of Work,
Environment & Health, Helsinki, v. 36, n. 5, p. 394-403, 2010.
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.2909. PMid:20213051
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.2909...
; ILDEFONSO; BARBOSA-BRANCO; ALBUQUERQUE-OLIVEIRA, 2009ILDEFONSO, S. A.; BARBOSA-BRANCO, A.; ALBUQUERQUE-OLIVEIRA, P. R.
Prevalência de benefícios de seguridade social temporários devido a doença
respiratória no Brasil. Jornal Brasileiro de Pneumologia, São Paulo, v. 35, n.
1, p. 44-53, 2009. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132009000100007.
PMid:19219330
http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132009...
; BRANCO; ILDEFONSO, 2012 BRANCO, A. B.; ILDEFONSO, S. A. G. Prevalência e duração dos
benefícios auxílio-doença decorrentes de asma no Brasil em 2008. Jornal
Brasileiro de Pneumologia, São Paulo, v. 38, n. 5, p. 550-558, 2012.
http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132012000500003.
PMid:23147046
http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132012...
) e internacionais
(OCCUPATIONAL SAFE & HEALTH
ADMINISTRATION, 1999OCCUPATIONAL SAFE & HEALTH ADMINISTRATION – OSHA. US
Department of Labour. Women in the construction workplace: providing equitable
safety and health protection. Washington: OSHA, 1999. Disponível em:
https://www.osha.gov/doc/accsh/haswicformal.html. Acesso em 04
set. 2013.
https://www.osha.gov/doc/accsh/haswicfor...
), que incluem trabalhadores da
Construção no campo da incapacidade para o trabalho.
Conhecendo-se a influência do ambiente de trabalho no perfil de adoecimento dos
trabalhadores (LAAKSONEN et al., 2010LAAKSONEN, M. et al. Gender differences in sickness absence—the
contribution of occupation and workplace. Scandinavian Journal of Work,
Environment & Health, Helsinki, v. 36, n. 5, p. 394-403, 2010.
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.2909. PMid:20213051
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.2909...
), a
maior prevalência de BAD entre os homens nesse ramo pode estar associada à maior
exposição aos riscos ocupacionais comumente presentes na construção (SOROCK; SMITH; GOLDOFT, 1993SOROCK, G. S.; SMITH, E. O.; GOLDOFT, M. Fatal occupational injuries
in the New Jersey construction industry, 1983 to 1989. Journal of Occupational
Medicine, Chicago, v. 35, n. 9, p. 916-921, 1993.
http://dx.doi.org/10.1097/00043764-199309000-00015.
PMid:8229344
http://dx.doi.org/10.1097/00043764-19930...
; LIPSCOMB; DEMENT; RODRIGUEZ-ACOSTA, 2000LIPSCOMB, H. J.; DEMENT, J. M.; RODRIGUEZ-ACOSTA, R. Deaths from
external causes of injury among construction workers in North Carolina,
1988-1994. Applied Occupational and Environmental Hygiene, Philadelphia, v. 15,
n. 7, p. 569-580, 2000. http://dx.doi.org/10.1080/10473220050028394.
PMid:10893793
http://dx.doi.org/10.1080/10473220050028...
;
JEONG, 1998JEONG, B. Y. Occupational deaths and injuries in the construction
industry. Applied Ergonomics, Guildford, v. 29, n. 5, p. 355-360, 1998.
http://dx.doi.org/10.1016/S0003-6870(97)00077-X. PMid:9703349
http://dx.doi.org/10.1016/S0003-6870(97)...
; CATTLEDGE; HENDRICKS; STANEVICH, 1996CATTLEDGE, G. H.; HENDRICKS, S.; STANEVICH, R. Fatal occupational
falls in the U.S. construction industry, 1980-1989. Accident Analysis and
Prevention, Elmsford, v. 28, n. 5, p. 647-654, 1996.
http://dx.doi.org/10.1016/0001-4575(96)00025-5. PMid:8899046
http://dx.doi.org/10.1016/0001-4575(96)0...
; BURKHART et al., 1993BURKHART, G. et al. Job tasks, potential exposures, and health risks
of laborers employed in the construction industry. American Journal of
Industrial Medicine, New York, v. 24, n. 4, p. 413-425, 1993.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.4700240407. PMid:8250061
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.470024040...
). Apesar da grande variação nas taxas de
incapacidade para o trabalho apresentada em diferentes países, alguns autores (NELSON et al., 2005NELSON, D. I. et al. The global burden of selected occupational
diseases and injury risks: Methodology and summary. American Journal of
Industrial Medicine, New York, v. 48, n. 6, p. 400-418, 2005.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20211. PMid:16299700
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20211...
) concluem que, em países
em desenvolvimento, os trabalhadores do sexo masculino estão mais expostos aos
riscos ocupacionais, além de estarem mais expostos à violência social e acidentes de
trânsito (BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA,
2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
).
Quando analisados os grupos diagnósticos, homens e mulheres apresentaram quadros de
adoecimento específicos. A elevada sobretaxa de prevalência masculina devido a
Doenças digestivas relacionadas ao trabalho pode decorrer de
fatores como o tipo de alimentação ofertada, condições de higiene pessoal
(banheiros, pias, vestuário), pressões de ritmo de trabalho e produtividade. Esses
fatores podem contribuir para os agravos digestivos nesses trabalhadores (RINGEN; SEEGAL; WEEKS, 1998RINGEN, K.; SEEGAL, J. L.; WEEKS, J. L. Constructión. In: STELLMAN,
J. M. (Ed.). Enciclopedia de Salud y Seguridad en el Trabajo. Geneva:
International Labour Office, 1998. Disponível em:
http://www.insht.es/InshtWeb/Contenidos/Documentacion/TextosOnline/EnciclopediaOIT/tomo3/93.pdf.
Acesso em: 04 set. 2013.
http://www.insht.es/InshtWeb/Contenidos/...
; BRODKIN; LEE; REDLICH, 1994BRODKIN, C. A.; LEE, S.; REDLICH, C. A. Gastrointestinal disorders.
In: ROSENSTOCK, L.; CULLEN, M. R. (Eds.). Textbook of clinical occupational and
environmental medicine. Philadelphia: Saunders, 1994. p.
423-436.), entretanto no
presente estudo nota-se que as características das atividades relacionadas ao
esforço físico e carregamento de peso podem ter influenciado diretamente na maior
prevalência de Hérnia inguinal entre os homens.
Revisão sistemática (SVENDSEN et al., 2013SVENDSEN, S. W. et al. Risk and prognosis of inguinal hernia in
relation to occupational mechanical exposures—a systematic review of the
epidemiologic evidence. Scandinavian Journal of Work, Environment &
Health, Helsinki, v. 39, n. 1, p. 5-26, 2013.
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.3305. PMid:22643828
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.3305...
)
avaliando as evidências da relação entre exposição ocupacional e Hérnia
inguinal em trabalhos com moderada a grande exigência mecânica conclui
que apesar de ser uma doença comum entre homens, e das limitadas evidências
epidemiológicas, trabalhos com grande exigência física podem aumentar os riscos de
um prognóstico desfavorável. Uma importante parte dessa sobretaxa de Doenças
digestivas observada no sexo masculino foi influenciada pelo elevado
número de auxílio-doença decorrente de Hérnias (K40-K46), em
particular, das Hérnias inguinais, mais prevalentes entre os homens
(7,5:1) (SVENDSEN et al., 2013SVENDSEN, S. W. et al. Risk and prognosis of inguinal hernia in
relation to occupational mechanical exposures—a systematic review of the
epidemiologic evidence. Scandinavian Journal of Work, Environment &
Health, Helsinki, v. 39, n. 1, p. 5-26, 2013.
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.3305. PMid:22643828
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.3305...
).
No ramo da Construção, outro potencial fator de risco para as
Doenças digestivas é a comorbidade decorrente dos
Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool,
também mais prevalente no sexo masculino. Apesar dos resultados do presente estudo
não apresentarem os Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de
álcool entre as categorias diagnósticas mais prevalentes, estudos
nacionais (BARBOSA-BRANCO; BÜLTMANN; STEENSTRA,
2012BARBOSA-BRANCO, A. B.; BÜLTMANN, U.; STEENSTRA, I. Sickness benefit
claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based
study. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 28, n. 10, p. 1854-1866,
2012. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012001000005.
PMid:23090166
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012...
) e internacionais (HOFFMANN;
BRITTINGHAM; LARISON, 1996HOFFMANN, J. P.; BRITTINGHAM, A.; LARISON, C. Drug use among U.S.
workers: prevalence and trends by occupation and industry categories. In: OFFICE
OF APPLIED STUDIES. Substance Abuse and Mental Health Services Administration.
Washington: Government Printing Office, 1996. (DHHS Publication, No. SMA
96-3089). Disponível em:
https://books.google.com.br/books?id=Z6vDU_2VZGoC&lpg=PR15&ots=pbhovcFkye&dq=Drug%20use%20among%20U.S.%20workers%3A%20prevalence%20and%20trends%20by%20occupation%20and%20industry%20categories&hl=pt-BR&pg=PR1#v=onepage&q=Drug%20use%20among%20U.S.%20workers:%20prevalence%20and%20trends%20by%20occupation%20and%20industry%20categories&f=true.
Acesso em: 05 jan. 2015.; SUBSTANCE
ABUSE AND MENTAL HEALTH SERVICES ADMINISTRATION, 2007SUBSTANCE ABUSE AND MENTAL HEALTH SERVICES ADMINISTRATION – SAMHSA.
Office of Applied Studies. The NSDUH report: worker substance use by industry
category. Rockville: Office of Applied Studies, 2007. Disponível em:
http://www.samhsa.gov/data/2k7/industry/worker.htm. Acesso em:
04 set. 2013.
http://www.samhsa.gov/data/2k7/industry/...
; HARFORD; BROOKS, 1992HARFORD, T. C.; BROOKS, S. D. Cirrhosis mortality and occupation.
Journal of Studies on Alcohol, New Brunswick, v. 53, n. 5, p. 463-468, 1992.
PMid:1405639.) mostraram que o ramo da
Construção figura entre os que mais apresentam trabalhadores
com esse tipo de agravo. A baixa remuneração dos trabalhadores, como ocorre no ramo
da Construção, se apresenta como fator de risco para o uso abusivo
de álcool (HWANG et al., 2005HWANG, S. W. et al. Age- and sex-specific income gradients in
alcohol-related hospitalization rates in an urban area. Annals of Epidemiology,
Raleigh, v. 15, n. 1, p. 56-63, 2005.
http://dx.doi.org/10.1016/j.annepidem.2004.04.003.
PMid:15571994
http://dx.doi.org/10.1016/j.annepidem.20...
). A elevada
prevalência de doenças digestivas verificadas por este estudo, juntamente com a
conhecida relação entre abuso de álcool e doenças digestivas (BRODKIN; LEE; REDLICH, 1994BRODKIN, C. A.; LEE, S.; REDLICH, C. A. Gastrointestinal disorders.
In: ROSENSTOCK, L.; CULLEN, M. R. (Eds.). Textbook of clinical occupational and
environmental medicine. Philadelphia: Saunders, 1994. p.
423-436.), sugere potenciais desvios de
classificação diagnóstica em favor das consequências clínicas de agravos como
Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool.
Empiricamente, verifica-se que trabalhadores da Construção ingerem
grandes quantidades de álcool, inclusive em dias de trabalho, entretanto a pressão
pelo cumprimento de metas de produção faz com que, muitas vezes, haja tolerância a
esse comportamento por parte de encarregados e demais membros da equipe de
produção.
As mais altas prevalências de Transtornos mentais e comportamentais devidos
ao uso de múltiplas drogas e ao uso de outras substâncias psicoativas –
principal causa clínica entre as doenças mentais na Construção –
encontradas entre trabalhadores com menos de 40 anos encontram-se em concordância
com os achados de Barbosa-Branco, Bültmann e
Steenstra (2012)BARBOSA-BRANCO, A. B.; BÜLTMANN, U.; STEENSTRA, I. Sickness benefit
claims due to mental disorders in Brazil: associations in a population-based
study. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 28, n. 10, p. 1854-1866,
2012. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012001000005.
PMid:23090166
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012...
para o conjunto dos trabalhadores empregados em 2008. No
ramo da Construção, trabalhadores mais jovens são mais exigidos
fisicamente e, em grande parte, dependem de sua força física para a prática laboral,
mas essa fase conjuga fatores sociais como a maior propensão de jovens ao uso de
substâncias psicoativas e os momentos de estabelecimento no emprego e constituição
familiar, estressores que podem influir no uso dessas substâncias. Estudo
internacional (WEBB et al., 2005WEBB, C. P. et al. Epidemiology of heavy alcohol use in Ukraine:
findings from the world mental health survey. Alcohol and Alcoholism, Oxford, v.
40, n. 4, p. 327-335, 2005. http://dx.doi.org/10.1093/alcalc/agh152.
PMid:15824065
http://dx.doi.org/10.1093/alcalc/agh152...
) mostrou
que homens com idade entre 26 e 34 anos tem duas vezes mais chance de apresentarem
um quadro de uso severo de álcool do que aqueles com idade ente 18 e 25 anos,
constituindo-se fatores de risco para esse uso a baixa escolaridade e a relação
parental com crianças.
Em comparação com a prevalência de BAD para trabalhadores brasileiros em 2008 (BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA, 2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
), o
ramo da Construção, em 2009, mostrou maior prevalência em relação
às Doenças do aparelho circulatório, com destaque para
Doenças das veias; Doenças isquêmicas do
coração e Doenças hipertensivas. Essa maior
prevalência se deve ao fato da predominância masculina no ramo, uma vez que esse
tipo de adoecimento acomete mais os homens (LAAKSONEN et al., 2010LAAKSONEN, M. et al. Gender differences in sickness absence—the
contribution of occupation and workplace. Scandinavian Journal of Work,
Environment & Health, Helsinki, v. 36, n. 5, p. 394-403, 2010.
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.2909. PMid:20213051
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.2909...
; SALA; MENDES,
2010SALA, A.; MENDES, J. D. V. Perfil da mortalidade masculina no Estado
de São Paulo. Boletim Epidemiológico Paulista, São Paulo, v. 7, n. 82, p. 15-25,
2010.).
A influência da idade no perfil epidemiológico da incapacidade laboral, de forma
geral, seguiu a tendência já descrita em estudos anteriores (ROELEN et al., 2009ROELEN, C. A. et al. Trends in the incidence of sickness absence due
to common mental disorders between 2001 and 2007 in the Netherlands. European
Journal of Public Health, London, v. 19, n. 6, p. 625-630, 2009.
http://dx.doi.org/10.1093/eurpub/ckp090. PMid:19581376
http://dx.doi.org/10.1093/eurpub/ckp090...
; BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA, 2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
; VIEIRA; ALBUQUERQUE-OLIVEIRA; BARBOSA-BRANCO, 2011VIEIRA, E. R.; ALBUQUERQUE-OLIVEIRA, P. R.; BARBOSA-BRANCO, A. Work
disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private
sector workers. BMJ Open, London, v. 1, n. 1, p. e000003, 2011.
http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2011-000003. PMid:22021719
http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2011-0...
; ILDEFONSO; BARBOSA-BRANCO; ALBUQUERQUE-OLIVEIRA,
2009ILDEFONSO, S. A.; BARBOSA-BRANCO, A.; ALBUQUERQUE-OLIVEIRA, P. R.
Prevalência de benefícios de seguridade social temporários devido a doença
respiratória no Brasil. Jornal Brasileiro de Pneumologia, São Paulo, v. 35, n.
1, p. 44-53, 2009. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132009000100007.
PMid:19219330
http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132009...
; PRANSKY et al., 2006PRANSKY, G. S. et al. Length of disability prognosis in acute
occupational low back pain claims. The Spine Journal, New York, v. 31, n. 6, p.
690-697, 2006.
http://dx.doi.org/10.1097/01.brs.0000202761.20896.02.
http://dx.doi.org/10.1097/01.brs.0000202...
), os
quais mostraram que as taxas de afastamento aumentam com a idade, podendo
influenciar na duração dos afastamentos, pois trabalhadores com maior idade podem
precisar de mais tempo para se recuperar de agravos e retornarem ao trabalho (ALMEIDA; BARBOSA-BRANCO, 2011ALMEIDA, P. C. A.; BARBOSA-BRANCO, A. Acidentes de trabalho no
Brasil: prevalência, duração e despesa previdenciária dos auxílios-doença.
Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, São Paulo, v. 36, n. 124, p. 195-207,
2011. http://dx.doi.org/10.1590/S0303-76572011000200003.
http://dx.doi.org/10.1590/S0303-76572011...
).
O aumento da prevalência de Doenças osteomusculares com a idade já
foi mostrado em estudos anteriores (BARBOSA-BRANCO;
SOUZA; STEENSTRA, 2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
; VIEIRA;
ALBUQUERQUE-OLIVEIRA; BARBOSA-BRANCO, 2011VIEIRA, E. R.; ALBUQUERQUE-OLIVEIRA, P. R.; BARBOSA-BRANCO, A. Work
disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private
sector workers. BMJ Open, London, v. 1, n. 1, p. e000003, 2011.
http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2011-000003. PMid:22021719
http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2011-0...
; PRANSKY et al., 2006PRANSKY, G. S. et al. Length of disability prognosis in acute
occupational low back pain claims. The Spine Journal, New York, v. 31, n. 6, p.
690-697, 2006.
http://dx.doi.org/10.1097/01.brs.0000202761.20896.02.
http://dx.doi.org/10.1097/01.brs.0000202...
), entretanto a comparação da razão de
prevalência desse tipo de adoecimento entre trabalhadores com idades ≥40 anos e
<40 anos (RP 3,2; dados não mostrados), com o geral da população empregada no
Brasil (RP 2,6) (BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA,
2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
), aponta para a existência de grande exigência física nas atividades
da Construção.
A tendência geral da prevalência de Lesões verificada neste estudo
foi inversa ao comportamento apresentado pelas Doenças
osteomusculares, pois a maior taxa foi encontrada entre trabalhadores
com idade abaixo de 40 anos, em especial para diagnósticos relacionados aos membros
superiores dos homens. Apesar da exigência física e da exposição aos riscos
ocupacionais decrescer pouco com a idade, a experiência adquirida ao longo dos anos
de profissão aparenta ser um fator de proteção para esses trabalhadores (ALMEIDA; BARBOSA-BRANCO, 2011ALMEIDA, P. C. A.; BARBOSA-BRANCO, A. Acidentes de trabalho no
Brasil: prevalência, duração e despesa previdenciária dos auxílios-doença.
Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, São Paulo, v. 36, n. 124, p. 195-207,
2011. http://dx.doi.org/10.1590/S0303-76572011000200003.
http://dx.doi.org/10.1590/S0303-76572011...
), inclusive
devido à maior chance destes terem recebido treinamento adequado para o exercício da
tarefa.
De modo geral, a maior prevalência de Lesões nos membros superiores
dos homens relaciona-se ao trabalho, enquanto entre as mulheres a maior prevalência
desses agravos ocorreu nos membros inferiores, e pode estar ligada aos acidentes de
percurso, acidentes domésticos e quedas. A razão de incidência de
Lesões em relação à idade dicotomizada encontrada em 2008
(BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA, 2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
)
para trabalhadores da construção mostrou diferenças de até 20% para trabalhadores
mais idosos, de modo que em 2009 pode ter havido maior subnotificação de
Lesões em trabalhadores mais idosos, ou ainda apontar para uma
mudança no perfil de contratação de trabalhadores. O setor da Construção Civil no
Brasil vem passando por uma grande transformação na última década, saindo de um
período de estagnação, com poucos investimentos, para um período com grandes obras
em andamento e fortes investimentos imobiliários (MELLO; AMORIM, 2009MELLO, L. C. B. B.; AMORIM, S. R. L. O subsetor de edificações da
construção civil no Brasil: uma análise comparativa em relação à União Europeia
e aos Estados Unidos. Production, São Paulo, v. 19, n. 2, p. 388-399, 2009.
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-65132009000200013.
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-65132009...
), sendo possível uma maior contratação de jovens
para se evitarem os efeitos de adoecimentos relacionados com a idade, como no caso
de Hérnia inguinal, de grande prevalência e cujo aumento da
ocorrência com o avanço da idade foi exaustivamente descrito na literatura (SVENDSEN et al., 2013SVENDSEN, S. W. et al. Risk and prognosis of inguinal hernia in
relation to occupational mechanical exposures—a systematic review of the
epidemiologic evidence. Scandinavian Journal of Work, Environment &
Health, Helsinki, v. 39, n. 1, p. 5-26, 2013.
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.3305. PMid:22643828
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.3305...
).
Em relação à influência do ramo de atividade no quadro de adoecimento dos trabalhadores estudados, os dados sugerem relação entre os fatores de risco presentes nas atividades típicas realizadas por cada ramo e as causas diagnósticas mais prevalentes.
A maior caracterização da relação dos agravos com o trabalho encontrada no ramo da
Construção, quando comparada a outros ramos de atividades
(BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA,
2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
), pode decorrer da grande contribuição das Lesões, cuja
elevada prevalência tanto entre os BAD previdenciários quanto os acidentários
decorre, em grande parte, das características e condições de trabalho encontradas
nesses ramos de atividade (CNAE-Divisão 41, 42, 43), assim como a fatores gerais
representados pelas violências urbana e no trânsito (BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA, 2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
). Nesse sentido,
contribuem para o aumento da prevalência de Lesões as atividades
com alta demanda de esforço físico e o fato de que no Brasil os afastamentos devido
a lesões ocorridas no trajeto entre casa e trabalho serem considerados como
acidentários.
Os dados obtidos sobre a prevalência de Lesões e Doenças
osteomusculares corroboram aqueles descritos na literatura (SOROCK; SMITH; GOLDOFT, 1993SOROCK, G. S.; SMITH, E. O.; GOLDOFT, M. Fatal occupational injuries
in the New Jersey construction industry, 1983 to 1989. Journal of Occupational
Medicine, Chicago, v. 35, n. 9, p. 916-921, 1993.
http://dx.doi.org/10.1097/00043764-199309000-00015.
PMid:8229344
http://dx.doi.org/10.1097/00043764-19930...
; LIPSCOMB; DEMENT; RODRIGUEZ-ACOSTA, 2000LIPSCOMB, H. J.; DEMENT, J. M.; RODRIGUEZ-ACOSTA, R. Deaths from
external causes of injury among construction workers in North Carolina,
1988-1994. Applied Occupational and Environmental Hygiene, Philadelphia, v. 15,
n. 7, p. 569-580, 2000. http://dx.doi.org/10.1080/10473220050028394.
PMid:10893793
http://dx.doi.org/10.1080/10473220050028...
;
JEONG, 1998JEONG, B. Y. Occupational deaths and injuries in the construction
industry. Applied Ergonomics, Guildford, v. 29, n. 5, p. 355-360, 1998.
http://dx.doi.org/10.1016/S0003-6870(97)00077-X. PMid:9703349
http://dx.doi.org/10.1016/S0003-6870(97)...
; CATTLEDGE; HENDRICKS; STANEVICH, 1996CATTLEDGE, G. H.; HENDRICKS, S.; STANEVICH, R. Fatal occupational
falls in the U.S. construction industry, 1980-1989. Accident Analysis and
Prevention, Elmsford, v. 28, n. 5, p. 647-654, 1996.
http://dx.doi.org/10.1016/0001-4575(96)00025-5. PMid:8899046
http://dx.doi.org/10.1016/0001-4575(96)0...
; BURKHART et al., 1993BURKHART, G. et al. Job tasks, potential exposures, and health risks
of laborers employed in the construction industry. American Journal of
Industrial Medicine, New York, v. 24, n. 4, p. 413-425, 1993.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.4700240407. PMid:8250061
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.470024040...
), acerca dos riscos e características
desse ramo de atividade, e reforçam a necessidade de maior fiscalização quanto ao
cumprimento da legislação relativa à saúde e segurança ocupacional em atividades do
ramo da Construção, uma vez que o grande número de afastamentos
relacionados ao trabalho devido às Lesões pode estar relacionado à
ineficácia da gestão de segurança do trabalho na Construção.
Estudo brasileiro (MIRANDA; DIAS, 2004MIRANDA, C. R.; DIAS, C. R. PPRA/PCMSO: auditoria, inspeção do
trabalho e controle social. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 20, n.
1, p. 224-232, 2004. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2004000100039.
PMid:15029324
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2004...
)
apontou a baixa qualidade técnica em programas obrigatórios de gestão de saúde e
segurança ocupacional que devem ser desenvolvidos pelos empregadores, como o
Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) e o Programa de Controle Médico de
Saúde Ocupacional (PCMSO). Segundo os autores, isso decorre da ineficiência da
fiscalização estatal, que não possui recursos humanos suficientes para o
desenvolvimento das ações, além de que o quadro ora existente carece de treinamento
adequado e atualização técnica. O estudo apontou ainda a necessidade de estimular
maior controle social, a ser exercido por empregados e seus representantes no âmbito
sindical.
Estudo avaliando as percepções de trabalhadores do ramo da
Construção sobre os riscos ocupacionais a que estariam expostos
(SAURIN; RIBEIRO, 2000SAURIN, T. A.; RIBEIRO, J. L. D. Segurança no trabalho em um
canteiro de obras: percepções dos operários e da gerência. Production, São
Paulo, v. 10, n. 1, p. 5-17, 2000.) identificou
diversas necessidades de melhoria gerencial, as quais influenciam de modo direto ou
indireto a segurança no trabalho. Foi verificado que tanto gestores quanto
operários, além de não possuírem sugestões para a melhoria das condições de
segurança, tenderam a culpar os trabalhadores pela ocorrência de acidentes, de modo
que é necessário estender as ações de treinamento e capacitação a todos os níveis da
empresa. Segundo os autores, quando a segurança do trabalho é colocada em segundo
plano, ocorrem implicações negativas diretas como treinamento inadequado dos
trabalhadores quanto aos riscos laborais, fornecimento inadequado e utilização
incorreta de equipamentos de proteção individual (EPI), bem como ineficácia da
Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), que, na
Construção, enfrenta barreiras adicionais em razão da baixa
escolaridade dos trabalhadores e da alta rotatividade no ramo (LAAKSONEN et al., 2010LAAKSONEN, M. et al. Gender differences in sickness absence—the
contribution of occupation and workplace. Scandinavian Journal of Work,
Environment & Health, Helsinki, v. 36, n. 5, p. 394-403, 2010.
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.2909. PMid:20213051
http://dx.doi.org/10.5271/sjweh.2909...
; BARBOSA-BRANCO; SOUZA; STEENSTRA, 2011BARBOSA-BRANCO, A.; SOUZA, W. R.; STEENSTRA, I. A. Incidence of work
and non-work related disability claims in Brazil. American Journal of Industrial
Medicine, New York, v. 54, n. 11, p. 858-871, 2011.
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974. PMid:21630300
http://dx.doi.org/10.1002/ajim.20974...
; DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS,
2001DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS
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http://www.insht.es/InshtWeb/Contenidos/...
; SAURIN; RIBEIRO, 2000SAURIN, T. A.; RIBEIRO, J. L. D. Segurança no trabalho em um
canteiro de obras: percepções dos operários e da gerência. Production, São
Paulo, v. 10, n. 1, p. 5-17, 2000.), e
reflete a falta de controle social ao não cumprir atribuições como a produção de
mapas de riscos ambientais, que em geral, quando são desenvolvidos, não contam com a
participação dos empregados (MIRANDA; DIAS,
2004MIRANDA, C. R.; DIAS, C. R. PPRA/PCMSO: auditoria, inspeção do
trabalho e controle social. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 20, n.
1, p. 224-232, 2004. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2004000100039.
PMid:15029324
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2004...
).
O ramo Obras de acabamento, que mostrou a maior prevalência de BAD em geral, e também liderou a taxa em relação às Lesões, dedica-se aos serviços de acabamento, ou seja, todas as atividades que contribuem para a conclusão da construção bem como para a sua manutenção, tais como: pintura, revestimentos, polimento, colocação de esquadrias e vidros, limpeza de fachadas, colocação de pisos etc. Existem riscos ocupacionais de acidentes devido à utilização de ferramentas manuais, equipamentos de corte e acabamento de materiais, trabalhos em altura com utilização de andaimes e balancins, posturas antiergonômicas e manuseio de tintas e vernizes. A fase de acabamento de uma obra, que normalmente é acompanhada por pressões por parte do empregador para aceleração do prazo de entrega, pode vir a ser o momento em que o trabalhador é levado a se preocupar menos com os riscos de acidentes, e por vezes adota práticas inseguras que culminam em elevado número de acidentes com frequente incapacidade para o trabalho.
A maior prevalência de Traumatismos da mão e punho no ramo Perfurações e sondagens pode estar associada à grande exigência de trabalhos manuais com ferramentas na montagem e desmontagem de sistemas de perfuração e sondagem, além da utilização essencial de trados manuais.
O correto dimensionamento dos equipamentos de proteção coletiva (EPC), a fiscalização e o uso adequado de EPI como luvas, máscaras, calçados, capacetes e cintos de segurança e o conhecimento dos riscos específicos da tarefa (treinamento) podem contribuir positivamente para a redução desse tipo de ocorrência.
Em relação às Doenças osteomusculares, a distribuição dos
agrupamentos no ramo Construção foi semelhante àquela apresentada
por Vieira, Albuquerque-Oliveira e Barbosa-Branco
(2011VIEIRA, E. R.; ALBUQUERQUE-OLIVEIRA, P. R.; BARBOSA-BRANCO, A. Work
disability benefits due to musculoskeletal disorders among Brazilian private
sector workers. BMJ Open, London, v. 1, n. 1, p. e000003, 2011.
http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2011-000003. PMid:22021719
http://dx.doi.org/10.1136/bmjopen-2011-0...
), no qual predominaram as Dorsalgias,
Outros transtornos de discos invertebrais, Transtornos
internos dos joelhos,
Sinovites e tenossinovites e Lesões do ombro. Vale
ressaltar que o trabalhador da Construção comumente desenvolve
atividades em condições antiergonômicas que representam importantes riscos para o
desenvolvimento/agravamento das doenças osteomusculares, principalmente aquelas que
afetam a coluna e as articulações. Considerando esses riscos é possível supor que
essas taxas sejam ainda mais elevadas.
A grande diferença encontrada entre a prevalência de Dorsopatias entre os ramos Construção de obras de arte e Instalações hidráulicas pode decorrer das diferentes atividades realizadas por essas classes. A CNAE Construção de obras de arte compreende atividades de construção e recuperação de pontes, viadutos, elevados, passarelas e outros, além da construção de túneis (urbanos, em rodovias, ferrovias, subterrâneos), sendo comum a realização de movimentos altamente repetitivos e com elevada exigência postural, principalmente em atividades de armação de ferragens, nas quais predominam movimentos de torção do punho e posturas inclinadas para frente ou totalmente inclinadas (> 90°). O ramo Instalações hidráulicas atua na instalação, alteração, manutenção e reparo em todos os tipos de construções de sistemas de aquecimento (coletor solar, gás e óleo), exceto elétricos; equipamentos hidráulicos e sanitários; ligações de gás; tubulações de vapor; de refrigeração central, quando não realizados pelo fabricante; e de ventilação mecânica controlada, de modo que o transporte manual de cargas é reduzido e predominam os movimentos finos de coordenação motora durante a utilização de ferramentas manuais.
Em termos gerais, apesar do ramo Construção de edifícios ser o mais representativo em número de trabalhadores e, consequentemente, o mais estudado na totalidade dos ramos da Construção, os adoecimentos que geraram afastamentos do trabalho nesse ramo não se refletiram em taxas de prevalência acentuadas. É possível supor que esse ramo, por suas características, seja mais fiscalizado pelos órgãos competentes e, portanto, receba mais investimentos e atenção às questões de saúde e segurança ocupacional.
A análise geral dos dados levantados por este estudo permite inferir a existência de grupos homogêneos de exposição aos riscos ocupacionais presentes em cada conjunto de atividades. Esses riscos associados à inadequada gestão dos mesmos podem estar contribuindo para o adoecimento dos trabalhadores. Um exemplo dessa constatação poderia ser verificado no ramo Obras de terraplanagem, no qual a grande exposição dos trabalhadores às poeiras e a utilização de equipamentos ruidosos e de grande porte podem ter influenciado a elevada prevalência de Doenças da pele e Doenças do ouvido nesse ramo.
Este estudo utilizou-se da taxa de prevalência de benefícios auxílio-doença como indicador para avaliar a influência do sexo, da idade e do ramo de atividade específico no quadro de incapacidade para o trabalho de empregados da Construção no Brasil em 2009, contribuindo de forma inédita para o estabelecimento do perfil de morbidade desses trabalhadores no país. A relação entre as atividades realizadas e as altas prevalências de grupos diagnósticos como Lesões e Doenças osteomusculares indica haver nexos causais entre atividades específicas e o quadro de incapacidade, ainda que parte dos adoecimentos não tenha sido reconhecida como de causa acidentária para a concessão de BAD. As evidências epidemiológicas deste estudo podem contribuir para elucidar questões científicas ainda não consolidadas, como a relação entre atividades com alta exigência física e o desenvolvimento de Doenças digestivas, em especial as Hérnias.
Em relação às limitações deste estudo, é possível citar a falta de controle quanto à recorrência de benefícios, que possivelmente pode ocorrer quando um mesmo trabalhador recebe um novo BAD pela mesma causa diagnóstica de benefício encerrado há mais de 60 dias. Apesar da recorrência de benefícios afetar o valor da prevalência calculada, estima-se que tal efeito seja minimizado pela magnitude dos dados analisados. Apesar das limitações, considera-se que a população de estudo foi suficientemente ampla para que, dentre os trabalhadores empregados, os resultados fossem representativos. Ressalta-se a qualidade dos bancos de dados utilizados que se destacam em termos de tamanho, homogeneidade e padronização de protocolos decorrente do sistema de concessão de benefícios.
Conclusão
Verificou-se influência do diagnóstico da incapacidade, do sexo e da idade do empregado sobre a prevalência e duração dos benefícios auxílio-doença previdenciário e acidentário.
A forte caracterização acidentária dos afastamentos relacionados às Lesões entre os homens mostrou que no âmbito ocupacional há sobre-exposição destes aos riscos do ambiente de trabalho, cujo gerenciamento tem sido ineficaz por parte dos empregadores. Estes, por sua vez, podem ter se aproveitado da ineficiente fiscalização promovida pelas autoridades competentes, que dispõem insuficientemente de recursos humanos e materiais.
Apesar de a idade contribuir para o aumento da prevalência de benefícios auxílio-doença, para as Lesões de membros superiores entre homens a idade apresentou-se como fator de proteção para esses trabalhadores, podendo-se atribuir o fato à maior chance em ter recebido treinamento adequado para o exercício das tarefas.
Ao se analisar o contexto legal dos benefícios auxílio-doença e as implicações (econômicas, trabalhistas, tributárias e outras) geradas, principalmente para os empregadores, a partir da adoção do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário – NTEP e da iminente adoção do Fator Acidentário de Prevenção – FAP, verificou-se a possibilidade das empresas do ramo da Construção terem buscado diversos meios alternativos objetivando evitar o afastamento legal dos trabalhadores incapacitados, inclusive com práticas já verificadas em outros países. Portanto, ao passo que o NTEP permitiu a caracterização de doenças relacionadas ao trabalho de modo independente da emissão da CAT, em parte, também pode ter contribuído para o aprimoramento de mecanismos de subnotificação dos agravos à saúde dos trabalhadores. Nesse sentido, os trabalhadores da Construção apresentam-se evidentemente vulneráveis por conta de suas características de fragilidade socioeconômica e baixa representatividade sindical.
Para que se tenham melhorias no quadro de incapacidade para o trabalho dos trabalhadores estudados, torna-se indispensável desfazer os conceitos socialmente aceitos de que risco de morte, exposição ao perigo e condições de trabalho inadequadas são inerentes ao ramo da Construção.
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Este artigo é parte da dissertação de mestrado de Thiago Antônio de Mello, intitulada “Incapacidade para o trabalho no ramo da Construção no Brasil”, defendida em 2013 junto ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília.
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O presente trabalho não contou com financiamento externo, não é baseado em tese e não foi apresentado em reunião científica.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Jul-Dec 2014
Histórico
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Recebido
09 Set 2013 -
Revisado
02 Jul 2014 -
Aceito
07 Jul 2014