A Índia é um país de renda média-baixa, que se encontra em rápido
desenvolvimento.(11 The World Bank. Data. Countries and lending groups. Available from
http://data.worldbank.org/about/country-and-lending-groups#Lower_middle_income.
Accessed February 1, 2015
http://data.worldbank.org/about/country-...
) Nos
últimos 20 anos, tem ocorrido, nesse país, um enorme crescimento do conhecimento,
tecnologia e capacitação necessários para tratar pacientes gravemente enfermos. A terapia
intensiva é uma modalidade cara de tratamento, e a provisão de serviços para esse tipo de
terapia tem sido um desafio no presente ambiente socioeconômico.
CUSTOS DO TRATAMENTO
As instalações de saúde na Índia são instituições privadas ou dependem de financiamento
púbico. A maior parte dos leitos em unidades de terapia intensiva (UTI) na Índia se
encontra em hospitais privados. Os relativamente poucos leitos disponíveis em hospitais
públicos (que oferecem tratamento gratuito) constituem cerca de 10% das estruturas
disponíveis para pacientes graves na Índia. Seguros de saúde e previdência social são
quase inexistentes, sendo que 57,6% do custeio total da saúde é desembolsado pelo
próprio paciente ou família.(22 World Health Organization. Global Health Observatory Data Repository
(2014) Health expenditure ratios: data by country. Available from
http://apps.who.int/gho/data/node.main.75. Accessed February 1, 2015
http://apps.who.int/gho/data/node.main.7...
) Os custos diários de uma UTI podem ser de aproximadamente cem
vezes a renda per capita indiana.(33 Kulkarni AP, Divatia JV. A prospective audit of costs of intensive care
in cancer patients in India. Indian J Crit Care Med.
2013;17(5):292-7.) Assim, um único episódio de admissão à UTI pode
empobrecer uma família. Entretanto, esquemas inovadores de financiamento via diversos
governos estaduais e contribuições de organizações sociais têm permitido um aumento do
número de pacientes com acesso a instalações avançadas para cuidados da saúde. Há um
claro papel para a terapia intensiva, considerando-se uma população relativamente jovem
e o ônus significativo de diversas doenças infecciosas tropicais, trauma, intoxicações e
envenenamentos, e a crescente incidência de doenças não contagiosas, como diabetes,
doença arterial coronariana e câncer. Na verdade, a terapia intensiva na Índia pode não
ser tão cara quanto tratar um linfoma não Hodgkin.(33 Kulkarni AP, Divatia JV. A prospective audit of costs of intensive care
in cancer patients in India. Indian J Crit Care Med.
2013;17(5):292-7.) É essencial aumentar o número de leitos de UTI, e
melhorar as instalações e recursos humanos dos hospitais públicos.(44 Divatia JV, Iyer S. Ten major priorities for intensive care in India.
Intensive Care Med. 2015 Jan 9. [Epub ahead of print].) Os investimentos na terapia intensiva,
envolvendo equipamentos, organização, treinamento da equipe e investimentos em educação
podem aumentar os custos iniciais, mas esses esforços se comprovarão custo-efetivos em
longo prazo.
FORÇA DE TRABALHO EM TERAPIA INTENSIVA
A Indian Society of Critical Care Medicine (ISCCM) foi fundada em 9 de
outubro de 1993 e tem sido um catalisador do crescimento sistemático da terapia
intensiva na Índia.(55 Divatia JV, Jog S. Intensive care research and publication in India: quo
vadis? Intensive Care Med. 2014;40(3):445-7.) No
início da história da sociedade, a medicina intensiva não era reconhecida pelo
Medical Council of India (MCI), o principal órgão de acreditação em
pós-graduação médica, como uma especialidade. A ISCCM introduziu, em 1996, um
certificado de 1 ano denominado Indian Diploma in Critical Care (IDCC),
com a finalidade de suprir uma lacuna, para a seguir, em 2007, introduzir um curso de
formação de 2 anos, denominado Indian Fellowship in Critical Care
(IFCC). Mais de 130 UTI foram acreditadas, e mais de 60 intensivistas são certificados
anualmente.(66 Indian Society of Critical Care Medicine - ISCCM. ISCCM courses.
Available from http://isccm.org/courses.aspx. Accessed February 1,
2015
http://isccm.org/courses.aspx...
) Foi
somente em 2012 que o MCI reconheceu a terapia intensiva como uma especialidade
independente, o que permitiu a introdução de programas de treinamento de 3 anos após uma
formação básica, que proporciona um diploma universitário em terapia intensiva.
Há problemas similares para o desenvolvimento da força de trabalho em áreas críticas da equipe de terapia intensiva, inclusive no que se refere a enfermeiros e técnicos em terapia intensiva, terapeutas respiratórios, nutricionistas, fisioterapeutas e farmacêuticos clínicos. Os programas de treinamento e cursos de sociedades profissionais, hospitais e faculdades de medicina precisam desenvolver uma força de trabalho para equipar e atuar em UTI modernas.
A ISCCM tem diretrizes e padrões para o projeto, estrutura, funcionamento e qualidade do
cuidado em UTI.(77 Guidelines Committee ISCCM. Intensive Care Unit Planning and Designing
in India: Guidelines 2010. Available from http://isccm.org/images/Section1.pdf.
Accessed February 1, 2015
http://isccm.org/images/Section1.pdf...
,88 Indian Society of Critical Care Medicine 2009. Quality indicators for
ICU. Available from http://isccm.org/images/Section8.pdf. Accessed February 1,
2015
http://isccm.org/images/Section8.pdf...
) Contudo, a acreditação pelo órgão
responsável, o National Accreditation Board for Hospitals and Healthcare
Providers (NABH), é voluntária, sendo que, em sua maioria, os hospitais e
UTI não são acreditados. A ISCCM também produziu diretrizes a respeito dos papéis e das
responsabilidades do médico intensivista em hospitais.(99 Indian Society of Critical Care Medicine Committee on Defining the
Functions, Roles and Responsibilities of a Consultant intensivist. Critical Care
Delivery in Intensive Care Units in India: Defining the Functions, Roles and
Responsibilities of a Consultant intensivist. Available from
http://isccm.org/images/ISCCM%20Intensivist%20guidelines.pdf. Accessed February 1,
2015
http://isccm.org/images/ISCCM%20Intensiv...
) Muitos centros têm treinado intensivistas que equipam
suas UTI e, atualmente, esses especialistas detêm maior respeito e são melhor
remunerados do que no passado.
CUIDADOS DE FIM DE VIDA
A eutanásia e o suicídio assistido por médico não são legais, porém o sistema judiciário não explorou conceitos como autonomia e morte com dignidade. A situação ética e legal da conduta de evitar/retirar terapias de suporte à vida é ambígua. Em recente julgamento relativo a um paciente em persistente estado vegetativo, a Suprema Corte da Índia esclareceu que essa medida é permissível em um paciente terminal, desde que se obtenha autorização prévia por parte da suprema corte. Entretanto, tal procedimento não é prático nas condições de uma UTI.
As barreiras para os cuidados de fim de vida, na Índia, incluem o temor de desdobramentos legais, a falta de conhecimento de questões éticas e a cultura de “lutar até o fim”, falta de orientação quanto a cuidados paliativos e a pressão para admitir casos de futilidade em pacientes privados.(1010 Mani RK. End-of-life care in India. Intensive Care Med. 2006;32(7):1066-8.) Apesar disso, evitar/retirar terapias de suporte ocorre em 19-50% dos óbitos em UTIs da Índia.(1111 Kapadia F, Singh M, Divatia J, Vaidyanathan P, Udwadia FE, Raisinghaney SJ, et al. Limitation and withdrawal of intensive therapy at end of life: practices in intensive care units in Mumbai, India. Crit Care Med. 2005;33(6):1272-5.) Evitar o início de suporte à vida é mais comum, enquanto retirar o suporte à vida só ocorre em 8% dos casos. Alta a pedido parece ser uma prática comum, que ocorre quando o paciente é transferido para fora da UTI em condições terminais por questões financeiras ou de outra ordem. A alta a pedido tira do paciente a possibilidade de receber cuidados paliativos, analgesia e medidas de conforto no fim da vida, sendo fortemente desencorajada em uma declaração da ISCCM e da Indian Association of Palliative Care.(1212 Myatra SN, Salins N, Iyer S, Macaden SC, Divatia JV, Muckaden M, et al. End-of-life care policy: An integrated care plan for the dying: A Joint Position Statement of the Indian Society of Critical Care Medicine (ISCCM) and the Indian Association of Palliative Care (IAPC). Indian J Crit Care Med. 2014;18(9):615-35.)
INFECÇÕES HOSPITALARES E RESISTÊNCIA BACTERIANA
Um estudo(1313 Mehta A, Rosenthal VD, Mehta Y, Chakravarthy M, Todi SK, Sen N, et al.
Device-associated nosocomial infection rates in intensive care units of seven Indian
cities. Findings of the International Nosocomial Infection Control Consortium
(INICC). J Hosp Infect. 2007;67(2):168-74.) realizado em
12 UTI de sete cidades da Índia relatou taxas de infecções associadas a cuidados de
saúde muito superiores às obtidas em situação similar, segundo o National
Nosocomial Infections Surveillance (NNIS) dos Estados Unidos. Há diversos
relatos que dão conta de uma proporção alarmante de infecções por cepas resistentes de
Pseudomonas, Enterobacteriaceae produtoras de
betalactamase de amplo espectro (ESBL, sigla do inglês extended-spectrum
betalactamase) e Acinetobacter. Um fenômeno preocupante se
refere ao problema do crescimento da resistência aos antibióticos
carbapenêmicos.(1414 Deshpande P, Rodrigues C, Shetty A, Kapadia F, Hedge A, Soman R. New
Delhi Metallo-beta lactamase (NDM-1) in Enterobacteriaceae: treatment options with
carbapenems compromised. J Assoc Physicians India. 2010;58:147-9.) É
essencial ter um programa nacional(1515 Government of India. Directorate General of Health Services. Ministry of
Health & Family Welfare. National policy for containment of antimicrobial
resistance in India (2011). Available from http://nicd.nic.in/ab_policy.pdf. Accessed
February 1, 2015.
http://nicd.nic.in/ab_policy.pdf...
) para monitorar a resistência bacteriana e desenvolver
estratégias relativas à educação e ao manejo de antibióticos. Utilizar dados
hospitalares gerais da literatura ocidental para guiar a terapia antimicrobiana na UTI
na Índia pode ser inadequado. Organizações profissionais e governamentais precisam
trabalhar em conjunto para lutar contra a ameaça que a resistência bacteriana
representa.
PESQUISA
É vital que se realizem pesquisas em áreas da medicina intensiva relevantes para a Índia. Isso necessita primeiramente da obtenção de informações básicas adequadas com relação às práticas e aos pacientes em nossas UTI. O estudo Indian Intensive Care Case Mix and Practice Patterns Study (INDICAPS), realizado pela ISCCM, obteve dados relativos a 124 UTI e mais de 4.000 pacientes. Brevemente, seus dados deverão ser disponibilizados.
Este artigo se focalizou nos progressos e desafios da medicina intensiva na Índia. Permanecem desafios em termos de infraestrutura, desenvolvimento de recursos humanos e aplicação de cuidados críticos em todo o país. Continuamos lutando por soluções para tornar nossas UTI mais seguras, e proporcionar cuidado de melhor qualidade e melhores desfechos para nossos pacientes.
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Editor responsável: Jorge Ibrain Figueira Salluh
REFERÊNCIAS
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1The World Bank. Data. Countries and lending groups. Available from http://data.worldbank.org/about/country-and-lending-groups#Lower_middle_income. Accessed February 1, 2015
» http://data.worldbank.org/about/country-and-lending-groups#Lower_middle_income -
2World Health Organization. Global Health Observatory Data Repository (2014) Health expenditure ratios: data by country. Available from http://apps.who.int/gho/data/node.main.75. Accessed February 1, 2015
» http://apps.who.int/gho/data/node.main.75 -
3Kulkarni AP, Divatia JV. A prospective audit of costs of intensive care in cancer patients in India. Indian J Crit Care Med. 2013;17(5):292-7.
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4Divatia JV, Iyer S. Ten major priorities for intensive care in India. Intensive Care Med. 2015 Jan 9. [Epub ahead of print].
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5Divatia JV, Jog S. Intensive care research and publication in India: quo vadis? Intensive Care Med. 2014;40(3):445-7.
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6Indian Society of Critical Care Medicine - ISCCM. ISCCM courses. Available from http://isccm.org/courses.aspx. Accessed February 1, 2015
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8Indian Society of Critical Care Medicine 2009. Quality indicators for ICU. Available from http://isccm.org/images/Section8.pdf. Accessed February 1, 2015
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9Indian Society of Critical Care Medicine Committee on Defining the Functions, Roles and Responsibilities of a Consultant intensivist. Critical Care Delivery in Intensive Care Units in India: Defining the Functions, Roles and Responsibilities of a Consultant intensivist. Available from http://isccm.org/images/ISCCM%20Intensivist%20guidelines.pdf. Accessed February 1, 2015
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10Mani RK. End-of-life care in India. Intensive Care Med. 2006;32(7):1066-8.
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11Kapadia F, Singh M, Divatia J, Vaidyanathan P, Udwadia FE, Raisinghaney SJ, et al. Limitation and withdrawal of intensive therapy at end of life: practices in intensive care units in Mumbai, India. Crit Care Med. 2005;33(6):1272-5.
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12Myatra SN, Salins N, Iyer S, Macaden SC, Divatia JV, Muckaden M, et al. End-of-life care policy: An integrated care plan for the dying: A Joint Position Statement of the Indian Society of Critical Care Medicine (ISCCM) and the Indian Association of Palliative Care (IAPC). Indian J Crit Care Med. 2014;18(9):615-35.
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13Mehta A, Rosenthal VD, Mehta Y, Chakravarthy M, Todi SK, Sen N, et al. Device-associated nosocomial infection rates in intensive care units of seven Indian cities. Findings of the International Nosocomial Infection Control Consortium (INICC). J Hosp Infect. 2007;67(2):168-74.
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14Deshpande P, Rodrigues C, Shetty A, Kapadia F, Hedge A, Soman R. New Delhi Metallo-beta lactamase (NDM-1) in Enterobacteriaceae: treatment options with carbapenems compromised. J Assoc Physicians India. 2010;58:147-9.
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15Government of India. Directorate General of Health Services. Ministry of Health & Family Welfare. National policy for containment of antimicrobial resistance in India (2011). Available from http://nicd.nic.in/ab_policy.pdf. Accessed February 1, 2015.
» http://nicd.nic.in/ab_policy.pdf
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Mar 2015
Histórico
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Recebido
03 Fev 2015 -
Aceito
11 Mar 2015