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Técnicas de análise multivariada na determinação de grupos homogêneos de produtores de leite

Multivariate analysis that can be used to determine of dairy producers homogeneous groups

Resumos

Nesta pesquisa objetivou-se captar a variedade de situações tecnológicas para identificar grupos de produtores, o mais semelhante possível, no conjunto de variáveis e características selecionadas. Foram considerados 72 produtores, 8,33% da amostra total, selecionados conforme 29 variáveis relacionadas a fatores produtivos. Avaliaram-se as variáveis de melhor representatividade dentro de cada fator e suas comunalidades dentro do conjunto de fatores analisados. Para a avaliação desses resultados, foram utilizados métodos de análise fatorial em componentes principais. Posteriormente, aplicou-se o método de análise de agrupamentos. O pluralismo tecnológico requer análises de agrupamento para viabilizar intervenções técnicas diferenciadas, o que permite a consolidação de condições de sustentabilidade a partir das reais necessidades de incorporação tecnológica dos produtores.

pecuária leiteira; tecnologia


A study was conducted aiming to determine the variety of technological situations to identify groups of producers, most similar possible, in the set of selected variable and characteristics. From the totality of producers, 72 (8.33%) were selected after taking into account 29 variables related to the production factors. The best representative variables from each factor as well as common variables were found within the group of factors analyzed. Data were analyzed using factorial analysis methods for the main components followed by grouping analysis method. Technological pluralism requires grouping analyses to make possible differentiated techniques interventions, which allows the consolidation of conditions of sustainability from the real necessities of technological incorporation of the producers.

technology; dairy herds


SISTEMAS DE PRODUÇÃO E AGRONEGÓCIOS

Técnicas de análise multivariada na determinação de grupos homogêneos de produtores de leite

Multivariate analysis that can be used to determine of dairy producers homogeneous groups

Sany Spinola AleixoI; José Gilberto de SouzaII; Antonio Sergio FerraudoIII

IMestre em Zootecnia, Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias UNESP. C. Jaboticabal-SP

IIDepartamento de Economia Rural da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias UNESP. C. Jaboticabal-SP

IIIDepartamento de Ciências Exatas da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias Unesp. C. Jaboticabal-SP

RESUMO

Nesta pesquisa objetivou-se captar a variedade de situações tecnológicas para identificar grupos de produtores, o mais semelhante possível, no conjunto de variáveis e características selecionadas. Foram considerados 72 produtores, 8,33% da amostra total, selecionados conforme 29 variáveis relacionadas a fatores produtivos. Avaliaram-se as variáveis de melhor representatividade dentro de cada fator e suas comunalidades dentro do conjunto de fatores analisados. Para a avaliação desses resultados, foram utilizados métodos de análise fatorial em componentes principais. Posteriormente, aplicou-se o método de análise de agrupamentos. O pluralismo tecnológico requer análises de agrupamento para viabilizar intervenções técnicas diferenciadas, o que permite a consolidação de condições de sustentabilidade a partir das reais necessidades de incorporação tecnológica dos produtores.

Palavras-chave: pecuária leiteira, tecnologia

ABSTRACT

A study was conducted aiming to determine the variety of technological situations to identify groups of producers, most similar possible, in the set of selected variable and characteristics. From the totality of producers, 72 (8.33%) were selected after taking into account 29 variables related to the production factors. The best representative variables from each factor as well as common variables were found within the group of factors analyzed. Data were analyzed using factorial analysis methods for the main components followed by grouping analysis method. Technological pluralism requires grouping analyses to make possible differentiated techniques interventions, which allows the consolidation of conditions of sustainability from the real necessities of technological incorporation of the producers.

Key Words: technology, dairy herds

Introdução

A tecnologia é um dos principais fatores determinantes para manutenção de um sistema produtivo, ou seja, com base na tecnologia e no meio utilizados, torna-se um sistema de produção sustentável ou não, eficiente para manter a atividade produtiva, seja em caráter familiar seja empresarial. Neste sentido, a tecnologia deve ser incorporada e orientada por um planejamento sistêmico em que todas as partes sejam complementares e realmente necessárias.

Aleixo & Souza (2001) analisaram indicadores de nível tecnológico da Cooperativa Nacional Agroindustrial – COONAI e observaram que os resultados evidenciaram a demanda de trabalhos de extensão rural e serviram para a elaboração de estratégias de intervenção com vistas a minimizar a heterogeneidade das ações produtivas, alterar o pluralismo tecnológico e promover o desenvolvimento social e econômico, sobretudo dos pequenos e médios produtores. Ressalta-se que, segundo esses autores, minimizar a heterogeneidade produtiva não significa padronizar sistemas de produção, e sim torná-los sustentáveis, cada um dentro de sua realidade.

Ao reconhecer o processo de modernização da agricultura brasileira e os impactos da adoção de tecnologia pelas diferentes camadas de produtores, permite-se melhor análise sobre a bovinocultura de leite e sua trajetória de sustentabilidade (Souza, 1997).

Segundo Aleixo & Souza (2001), na cooperativa avaliada, os produtores utilizavam em alta proporção técnicas como fornecimento de silagem (70,7%), ração diferenciada para cada categoria do rebanho e grupo leiteiro (63,4%) e inseminação artificial (48,7%), mas reduzido percentual de produtores efetuava o controle zootécnico (34,1%). Essa incoerência explica a demanda por ações integradas envolvendo tecnificação (equipamentos), técnica (procedimentos) e cultura (saber fazer).

A COONAI é uma cooperativa de pequenos produtores (65%) e necessita de elaboração de estratégias de desenvolvimento para as classes produtivas diferenciadamente. Neste sentido, objetivou-se reconhecer os diferentes grupos de produtores da COONAI para serem avaliados dentro de suas características e, posteriormente, verificar sua viabilidade e seus entraves econômicos.

Material e Métodos

As ferramentas constituídas pelas técnicas de análise multivariada de dados, sobretudo as análises, fatorial em componentes principais e por correspondências múltiplas, combinadas a análise de agrupamento (cluster), têm grande potencial para a elucidação de problemas semelhantes aos investigados neste trabalho: produzir um diagnóstico do estádio atual de um setor produtivo, neste caso a pecuária de leite, e determinar as diferenças que afetam o desempenho sócio produtivo desses setores.

Os dados originais dos procedimentos matemáticos da análise multivariada foram submetidos inicialmente a uma análise fatorial, técnica que consiste em identificar um número relativamente pequeno de fatores que podem ser usados para representar relações entre um conjunto de variáveis inter-relacionadas. A pressuposição básica da análise fatorial é que existem determinados fatores causais gerais que originam as correlações observadas entre as variáveis de estudo. Considerando que muitas relações entre as variáveis são, na maior parte, decorrentes dos mesmos fatores causais gerais, o número de fatores será quase sempre menor que o número de variáveis.

Segundo Hoffmann (1992), a análise fatorial em componentes principais (ACP) é uma técnica estatística estreitamente associada à análise fatorial e, em um conjunto de variáveis, os componentes principais são combinações lineares dessas variáveis construídas com o objetivo de explicar o máximo da variância das variáveis originais.

Outra técnica multivariada de grande aplicabilidade é a análise de agrupamento, cujo objetivo da classificação é repartir os indivíduos em grupos homogêneos, de modo que cada grupo seja bem diferenciado. Normalmente, o resultado é uma hierarquia, representada por um gráfico denominado dendrograma. Após a obtenção dos resultados gráficos, esses dados servirão para a definição do número de grupos distintos. Ao escolher um nível elevado de "corte", obtêm-se maior número de grupos, ocorrendo o contrário se o nível de corte for mais baixo.

Conhecendo a classificação, é fácil deduzir partições em um número maior ou menor de classes (Bouroche & Saporta, 1981; Aleixo & Souza, 2001). O exame do dendrograma induz ao privilégio de partições supostamente consistentes e à rejeição de outras (Volle, 1993). De acordo com Aleixo & Souza (2001), conhecendo a classificação, obtêm-se os grupos de indivíduos (propriedades rurais), o que permite verificar os parâmetros que evidenciam as características homogêneas dentro de um grupo e também as principais diferenças entre esses grupos.

Os dados desta pesquisa foram obtidos de questionários realizados diretamente aos produtores da Cooperativa Nacional Agro-Industrial, com uma amostra de 72 produtores, representando 8,33% do universo total de cooperados (865 produtores). De acordo com Thompkin (1967), que trata de estatísticas e métodos de pesquisa em sociologia rural, em um universo de 5.000, uma amostra satisfatória seria 50 indivíduos + 2%. No caso desta pesquisa, a amostra foi composta por 50 indivíduos + 2,54%. Os indivíduos da amostra foram selecionados de acordo com a participação nos Comitês Educativos Regionais da Cooperativa, visto que, além da facilidade de acesso nestas reuniões, nestes comitês se encontram produtores pertencentes a todas as faixas de produção, atendendo ao objetivo de caracterização dos grupos e criando uma amostra heterogênea.

A aplicação dos questionários foi realizada pelo próprio pesquisador e um colaborador, garantindo a fidelidade dos dados quanto às respostas dos produtores. Constaram no instrumento informações sobre as condições tecnológicas dos produtores, desde a produção diária, com intervalo de partos, até o valor dos investimentos em animais.

As 27 variáveis relacionadas à caracterização tecnológica das unidades produtivas utilizadas na Análise Fatorial em Componentes Principais e posterior Classificação Automática Hierárquica foram: V1 - idade do produtor (anos); V2 - nível de escolaridade do produtor (anos de estudo); V3 - área total da propriedade (ha); V4 - área utilizada para pecuária de leite (ha); V5 - produção no período das águas (litros); V6 - produção no período da seca (litros); V7 - número de animais em lactação no período das águas (unidades); V8 - número de animais em lactação no período da seca (unidades); V9 - número total de animais do rebanho (unidades); V10 - preço bruto pago ao produtor pelo litro do leite (R$); V11 - preço líquido pago ao produtor (R$), preço bruto menos descontos com frete, associações e sindicatos, impostos e integralização ao capital da cooperativa para o cooperado que ainda não completou sua integralização; V12 - tempo que o produtor está na atividade agropecuária (anos); V13 - tempo que o produtor está na atividade leiteira (anos); V14 - tempo que o produtor dedica a atividade leiteira por dia (horas); V15 - se possui, a capacidade do tanque (litros); V16 - participação da pecuária leiteira na receita total da propriedade – neste caso, considera-se o valor estimado pelo produtor da receita média da propriedade no período de um ano e qual o percentual de participação da pecuária leiteira neste valor (%); V17 - participação da pecuária leiteira na receita total do produtor – neste segundo caso, consideram-se o valor estimado pelo produtor de sua receita média entre todas as atividades que exerce no período de um ano e qual o percentual de participação da pecuária leiteira neste valor (%); V18 - valor gasto com mão-de-obra permanente (R$/mês); V19 - valor gasto com mão-de-obra temporária (R$/ano); V20 - quantidade de membros da família que auxiliam na atividade (número de pessoas); V21 - valor de venda das máquinas e dos implementos existentes na propriedade, segundo o produtor (R$); V22 - valor de instrumentos e equipamentos existentes na propriedade, segundo o produtor (R$); V23 - valor de todos os animais destinados à pecuária leiteira existentes na propriedade, segundo o produtor (R$); V24 - idade ao primeiro parto das novilhas (meses); V25 - intervalo de partos das vacas (meses); V26 - manejo – para a formação dessa valor, consideraram-se práticas comuns relacionadas ao manejo geral da propriedade: análise de solo; adubação de pastagens e capineiras; reforma e conservação de pastagens; utilização de silagem; separação dos animais por lotes de idade; separação dos animais por lotes de produção; utilização de ração diferenciada por lotes de produção; suplementação mineral do rebanho; utilização de capineiras; cuidados bezerros; V27 - sanidade: realização de teste de brucelose; teste de tuberculose; vacinação contra aftosa; vacinação contra brucelose; vacinação contra paratifo; vacinação contra carbúnculo; vacinação contra raiva; prevenção de mastite; fornecimento de colostro.

Ressalta-se que as variáveis V26 e V27 foram calculadas pelo número de respostas positivas e transformadas em percentual para compor o valor utilizado na análise, por se tratar de informações de ordem qualitativa.

Para aplicação das análises multivariadas, o conjunto de dados foi padronizado de modo que cada descritor foi mantido com média nula e variância unitária. A análise de agrupamento foi processada segundo metodologia proposta por Sneath & Sokal (1973). A estratégia de agrupamento adotada foi a Average Linkage (UPGMA Unweighted Pair Group Method with Arithmetic Averages). As variáveis foram processadas no software Statistica, versão 6.0, permitindo a identificação dos componentes principais e a realização da análise de agrupamento.

Resultados e Discussão

Aplicando-se o método da análise fatorial em componentes principais, foram analisados os três primeiros fatores, com 52,76% da variância explicada acumulada (Tabela 1), demonstrando ainda a importância dos fatores e que o fator 1 reúne dez varíaveis com alto grau de correlação.

O fator 1 (F1) explica 30,8% da variação total da análise. Neste caso, este fator está fortemente vinculado a variáveis de capitalização dos produtores, o que permite inferir sobre a importância da avaliação dos outros fatores que consideram características fundamentais na formação dos grupos e que não estão ligadas ao capital financeiro, indicando o grau de pluralidade tecnológica da pecuária leiteira que denota, para o modelo, a importância consignada às variáveis de capital.

O primeiro fator (F1) apresentou correlações elevadas e negativas, principalmente com as variáveis de indicadores de produção e econômicos e com algumas variáveis relacionadas ao capital produtivo: área total da propriedade (V3); produção nas águas e na seca (V5 e V6); número de animais em lactação nas águas e na seca (V7 e V8); número total de animais (V9), capacidade do tanque de expansão (V15) e gasto com mão-de-obra permanente (V18); valor de instrumentos e equipamentos existentes na propriedade (V22); valor de todos os animais (V23).

O principal fator (F1) exprime, portanto, a dimensão da exploração leiteira e a formação do capital produtivo e tem valor positivo para as propriedades com produção e capital produtivo elevado. Assumirá valor negativo sempre que a propriedade leiteira apresentar menor produção, menor número de vacas, menor gasto com mão-de-obra e capital produtivo mais contido. É necessário, no entanto, ponderar a relação entre o capital agrário e a produtividade, principalmente quando se considera o fator terra; no caso desta pesquisa, foram encontrados produtores com capital agrário (terra) elevado mas com baixa produtividade (ARC, por exemplo) e, ao mesmo tempo, produtor com capital terra também elevado mas com boa produtividade e rentabilidade, pois tem sistema de produção de leite em pastagens muito eficiente. Quando se avaliam propriedades com área menor, as comparações também se inserem, como no caso da propriedade de JMC, que, ao mesmo tempo que possui um capital agrário (terra) pequeno, tem altíssimo custo de produção, padrão de tecnificação e material genético pouco adaptado às condições de produção e ao mercado, o que torna o custo de produção alto e na maioria das vezes superior ao preço pago pela indústria. Neste sentido, ressalta-se a relativa importância de questões relacionadas ao capital (agrário e produtivo) na determinação de padrões tecnológicos.

As outras variáveis relacionadas à produção e ao restante do capital produtivo, apesar da forte ligação entre si, também não permitem que essas características sejam utilizadas como determinantes dos padrões tecnológicos mais eficientes, uma vez que altos investimentos em estrutura de produção exigem, por força do sistema produtivo optimum, o aproveitamento dessa estrutura. Outra questão é a correlação de investimento em estrutura e em animais e a conseqüente inflexão no perfil da produção, no entanto, essas questões não estão necessariamente ligadas à viabilidade daquele sistema.

O segundo fator (F2) em ordem de importância explica 14,9% da inércia total e está relacionado à idade do produtor (V1), ao nível de escolaridade do produtor (V2), ao tempo que o produtor tem tanto na atividade agropecuária como um todo (V12) como somente na atividade leiteira (V13), fator de fundamental importância quando se analisa o nível tecnológico do produtor, não somente quanto ao conhecimento do processo de produção, mas principalmente à incorporação ou à adoção de novas tecnologias e à participação da pecuária leiteira na receita total do produtor (V17).

Como fator positivo, verifica-se o nível de escolaridade do produtor e, como negativo, a idade do produtor (V1), a experiência do produtor na atividade agropecuária como um todo (V12) e na atividade leiteira (V13) apenas e a participação da pecuária leiteira na receita total do produtor (V17).

Assim, a relação de escolaridade é diametralmente oposta às outras características socioeconômicas; por exemplo, quanto maior o grau de escolaridade, menor a idade do produtor, menor a dependência da atividade e menor a participação da pecuária leiteira na receita total. Dessa forma, é fundamental a adoção de estratégias especiais de desenvolvimento para formar os produtores com menor grau de escolaridade, uma vez que a produção também é menor e essa circunstância exige planejamento na difusão tecnológica (Figura 1), proporcionando a esses produtores familiarização e sua posterior inserção/adoção dentro de um novo sistema de produção.

A idade do produtor ganha importância quando relacionada à adoção tecnológica, pois está inversamente relacionada ao grau de escolaridade e ao período que o produtor foi "formado" enquanto produtor de leite. Em uma realidade completamente diferente da atual; assim, as dificuldades de entendimento das condições de produção atuais são maiores. Por outro lado, a experiência, associada ao acesso a informação e à incorporação de novas tecnologias – quando o produtor possui maior entendimento do processo produtivo – é importante do ponto de vista técnico.

O fator 3 está relacionado à variável V26, que caracteriza os membros da família que auxiliam na atividade e representa 7,06% da inércia total. Ao visualizar no plano fatorial observa-se que esta variável está relacionada ao fator 2. A presença dessa variável nos fatores explicativos ratifica a necessidade de um planejamento diferenciado em sistemas de produção que têm a atividade familiar presente. Além disso, a presença de membros da família permite a geração de um sistema de produção mais eficiente e/ou pelo menos a um custo de produção do litro de leite mais baixo, pois diminui custos com encargos sociais e gera melhor controle da produção.

A pecuária leiteira ocupa papel importante na agropecuária brasileira, envolve grande número de pequenos produtores no processo produtivo e apresenta significativa capacidade de geração de empregos, trabalho e renda, desde as atividades produtivas até a industrialização dos produtos, com capacidade de gerar um fluxo rápido de capital, o que define a pecuária leiteira como fundamental na manutenção da estrutura produtiva familiar, principalmente pela questão da renda constante.

Neste sentido, quando a variável aparece como componente principal de um fator explicativo (F3), é necessária uma postura defensiva do Estado para manutenção dos produtores na atividade e na viabilização do crédito subsidiado à produção familiar, proporcionando mudanças no padrão tecnológico dos produtores, objetivando a sustentabilidade da produção e, principalmente, gerando políticas reativas ao mercado, diante da concorrência a que se expôs esse setor produtivo na abertura comercial brasileira a partir de 1990 (Aleixo et al., 2003).

Complementando os resultados obtidos na análise fatorial em componentes principais, foi realizada a classificação hierárquica (Sneath & Sokal, 1973). Houve a divisão de quatro grupos, divisão que melhor se adapta à realidade considerada (Tabela 2). Dispondo os grupos ao longo dos dois eixos fatoriais, nota-se o agrupamento das unidades produtivas. Como dito anteriormente, a análise de grupos reúne as observações internamente homogêneas. Após a análise hierárquica e a divisão dos grupos, foram utilizadas as variáveis de indicadores sociais, tecnológicos, econômicos e de manejo geral e sanitário para detectar as diferenciações entre os mesmos.

Quanto às variáveis sócioprodutivas (Tabela 2), as diferenças entre os grupos foram bem acentuadas. Destacou-se o grupo A, que se diferenciou muito dos outros quanto a todas as variáveis analisadas, principalmente em relação ao grupo C, com maior tempo na atividade agropecuária e leiteira e maior percentual de participação da pecuária leiteira na renda total da propriedade e do produtor.

A formação dos valores médios com relação às variáveis sócioprodutivas deixa clara a importância do fator 2 na composição dos grupos, uma vez que o grupo A se diferencia mais em relação ao grupo C, o primeiro com maior tempo na atividade agropecuária menor que a média e mais ainda a participação da pecuária leiteira na receita total da propriedade e do produtor assume valores discrepantes entre os demais.

As diferenciações das variáveis de desempenho produtivo (Tabela 3) não foram tão grandes entre os quatro grupos, pois, ao verificar o valor médio dos animais do rebanho, observaram-se diferentes grupos genéticos e, ao "questionar" o produtor, procurou-se captar o valor de venda do animal na tentativa de caracterizar o material genético utilizado dentro do sistema, saindo do paradigma de que animal eficiente é animal de origem européia, uma vez que um bom animal cruzado (Holandês/Zebu) ou mesmo um Girolando pode atingir maiores valores no mercado em comparação a um animal de raça especializada, por exemplo Holandesa. A eficiência não acompanha o preço, principalmente quando comparados os grupos A e C, pois o valor médio dos animais do grupo A foi 166% maior que o do grupo D, no entanto, a diferença na produção foi apenas 55% maior, o que exige valor diferente entre valor animal e eficiência produtiva em relação ao capital investido.

Nesse sentido, diferentes sistemas, apesar das discrepâncias no tamanho da produção e da relevância quanto à formação dos grupos, não são tão importantes do ponto de vista da produtividade. A maior produção em alguns casos não acompanha o investimento e mostra que, apesar de o capital produtivo ser significativo na formação dos grupos, não sé tão relevante na adequação da produção. Portanto, para se ter um padrão tecnológico eficiente, o capital não é a variável mais significativa.

Ao analisar as duas variáveis relacionadas ao desempenho produtivo, verificou-se que, dentro de cada grupo, mesmo com as diferenças de manejo, cada sistema alcança seu desempenho de forma diferente, uma vez que, entre os grupos, a variável idade ao primeiro parto participa com grande homogeneidade entre os grupos, com pequena diferença para o grupo A. Praticamente não houve diferenças quanto ao intervalo de partos, o que confirma a hipótese de que a eficiência não se vincula à adoção de um único sistema de produção.

Os dados da Tabela 4 confirmam que a caracterização dos grupos foi realmente influenciada pelo fator 1. Os grupos também se diferenciaram pouco quanto aos investimentos realizados: o grupo A gasta menos com mão-de-obra permanente por litro de leite; o grupo C mantém-se em estádio intermediário; e os grupos B e D gastam um pouco mais. No valor gasto com mão-de-obra permanente, a situação dos grupos foi muito parecida e, novamente, as diferenças se mantiveram entre os grupos A e D neste item de despesa.

Os dados do grupo A para o capital empregado por litro de leite produzido/dia revelaram grande diferença; neste grupo, investe-se mais que nos outros grupos, demonstrando que, em pecuária leiteira, a caracterização de grupos é possível mas a formação de padrões homogêneos de produção não pode ser eficiente.

Quando se considera o valor total do capital produtivo por litro de leite nos diferentes períodos do ano, águas e seca, verifica-se que o manejo é o que realmente diferencia os produtores vis a vis (o valor empregado por litro de leite produzido) e que, para aumento na produção, é necessária a incorporação de conhecimento ao produtor desse grupo.

A diferenciação no grupo D foi clara quanto ao manejo geral (Tabela 5), apesar das diferenças nas variáveis de indicadores sociais, tecnológicos e econômicos, que não permitiram diferenciação efetiva entre os grupos, o que não ocorreu para as variáveis de manejo. Assim, o grande grupo formado (grupo D) tem realmente carência de formação, pois a estrutura média de produção, ou seja, o capital imobilizado em relação à produção, é satisfatória e pode ser mais alta que nos demais grupos.

As variáveis de desempenho produtivo e tecnológico nesse grupo tiveram índices adequados de idade ao primeiro parto e intervalo de parto em torno de 24 meses e 12 meses, respectivamente, mas a produção foi um pouco inferior, fator diretamente relacionado ao manejo geral. Neste sentido, para o grupo constituído (grupo D) avalia-se a necessidade da difusão e posterior adoção da tecnologia, salientando ainda, no caso das variáveis analisadas na Tabela 5, que a necessidade de capital para a implantação das tecnologias é baixa; por exemplo, cuidados com o bezerro não requerem investimento em capital, separação dos animais por lotes, tanto de idade quanto de produção, entre todas as outras variáveis, que poderiam ser implementadas sem maiores interferências nos custo de produção. Para a análise das ações ligadas ao manejo sanitário (Tabela 6), a afirmação da necessidade de assistência técnica ao grupo D é ainda mais pontual, pois mais uma vez a necessidade de investimentos seria muito pequena.

O acesso à informação poderia estar desfazendo um ciclo muito comum dentro de sistemas de produção de leite, que funciona mais ou menos da seguinte forma: o produtor descapitalizado não investe na produção e prefere, por exemplo, aplicar o pouco capital disponível em outra atividade mais rentável. Assim, ao deixar de investir na atividade leiteira, perde eficiência e se descapitaliza gerando um ciclo vicioso dentro da atividade.

Se o processo ocorre de forma diferente, o produtor tem acesso à formação, a tecnologias de baixo impacto nos custos e maior entendimento sobre seu sistema de produção, necessidades reais de ações e conseqüente incorporação tecnológica, portanto, melhora sua rentabilidade e passa a investir no processo produtivo. Assim, o primeiro passo para adoção tecnológica é a conscientização e formação dos produtores.

Conclusões

O pluralismo tecnológico na pecuária leiteira requer a inserção de ações diferenciadas que atendam os vários sistemas e grupos de produtores. O sistema de criação necessita de aperfeiçoamento e de aumento de produtividade do rebanho para viabilizar a criação e dar condições de sustentabilidade ao homem do campo.

Um eficiente processo de adoção de tecnologia e melhoria da eficiência produtiva na pecuária leiteira, assim como a difusão de conhecimento por parte de produtores e técnicos e a incorporação das reais necessidades de cada um dentro do processo de produção, é fundamental para o êxito da atividade.

Literatura Citada

Recebido: 13/3/2006

Aprovado: 5/7/2007

Correspondências devem ser enviadas para: sanyspinola@hotmail.com

  • ALEIXO, S.S.; SOUZA, J,G. Análise de nível tecnológico de produtores de leite: estudo de caso da Cooperativa Nacional Agro-Industrial (COONAI). Informações Econômicas, v.31, n.10, p.27-36, 2001.
  • ALEIXO, S.S.; PAULINO, R.L.; SOUZA, J.G. As legislações para o setor leiteiro e seus impactos sobre a produção após a abertura comercial no Brasil. In: BARROS, H.; RUBIO, B. (Eds.) Globalización y desarrollo rural em América Latina Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2003. p.59-78.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Dez 2007
  • Data do Fascículo
    Dez 2007

Histórico

  • Aceito
    05 Jul 2007
  • Recebido
    13 Mar 2006
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