Open-access Digestibilidade aparente da farinha de aguapé em tilápias-do-nilo

Apparent digestibility of water hyacinth meal by Nile tilapia

Resumos

Objetivou-se com este trabalho determinar e comparar as digestibilidades aparentes da matéria seca (MS), proteína bruta (PB), extrato etéreo (EE) e energia bruta (EB) e as disponibilidades aparentes de minerais das farinhas da biomassa emersa (lâmina foliar e pecíolo), submersa (raiz e rizoma) e total do aguapé em tilápias-do-nilo (Oreochromis niloticus). Foram elaboradas quatro rações marcadas com 0,10% de óxido de crômio-III (uma ração-referência purificada e três contendo 30,0% de cada ingrediente). As tilápias-do-nilo (125,5 ± 10,5 g) foram alimentadas até a saciedade e a coleta de fezes foi realizada pelo sistema Ghelph modificado. As digestibilidades aparentes da farinha da biomassa emersa (MS = 57,8; PB = 72,3; EE = 63,2 e EB = 62,0%) foram maiores que as das farinhas da biomassa total (MS = 45,7; PB = 57,3; EE = 50,3 e EB = 42,3%) e submersa (MS = 38,3; PB = 50,8; EE = 43,5 e EB = 32,0%). As disponibilidades aparentes de fósforo (P), cálcio (Ca), magnésio (Mg), manganês (Mn), cobre (Cu) e zinco (Zn) da farinha da biomassa emersa também foram maiores. A farinha de biomassa emersa do aguapé apresenta melhor digestibilidade e disponibilidade aparente dos nutrientes em comparação às farinhas da biomassa total e submersa.

disponibilidade; energia; macrófita aquática; minerais; proteína


This study was carried out to determine and compare the apparent digestibility of dry matter (DM), crude protein (CP), crude fat (CF), gross energy (GE), and the apparent availability of minerals (P, Ca, Mg, Mn, Cu, and Zn) of emergent (leaf and petiole), submerged (root and rhizome) and total biomass meal of water hyacinth for Nile tilapia. Four diets were prepared, containing 0.10% chromic oxide-III, one being the reference diet (purified) and the others containing 30% of each ingredient. The Nile tilapias (125.5 ± 10.5 g) were fed until satiation and the feces were collected by the modified Guelph system. The apparent digestibility of emergent biomass meal (DM = 57.8, CP = 72.3, CF = 63.2, and GE = 62.0%) was higher than the apparent digestibility of the total biomass (DM = 45.7, CP = 57.3, CF = 50.3, and GE = 42.3%) and submerged (DM = 38.3, CP = 50.8, CF = 43.5, and GE = 32.0%) biomass meal. The apparent availability of P, Ca, Mg, Mn, Cu, and Zn of emergent biomass meal was also higher. The emergent biomass meal had higher apparent digestibility and apparent availability compared to submerged and total biomass meal.

aquatic macrophyte; availability; energy; minerals; protein


AQUICULTURA

Digestibilidade aparente da farinha de aguapé em tilápias-do-nilo1

Apparent digestibility of water hyacinth meal by Nile tilapia

José Francisco Vicente BiudesI; Luiz Edivaldo PezzatoII; Antonio Fernando Monteiro CamargoIII

ICentro de Aqüicultura da UNESP, Jaboticabal, SP

IIDepartamento de Melhoramento e Nutrição Animal, FMVZ, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP

IIIDepartamento de Ecologia, IB, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, SP

RESUMO

Objetivou-se com este trabalho determinar e comparar as digestibilidades aparentes da matéria seca (MS), proteína bruta (PB), extrato etéreo (EE) e energia bruta (EB) e as disponibilidades aparentes de minerais das farinhas da biomassa emersa (lâmina foliar e pecíolo), submersa (raiz e rizoma) e total do aguapé em tilápias-do-nilo (Oreochromis niloticus). Foram elaboradas quatro rações marcadas com 0,10% de óxido de crômio-III (uma ração-referência purificada e três contendo 30,0% de cada ingrediente). As tilápias-do-nilo (125,5 ± 10,5 g) foram alimentadas até a saciedade e a coleta de fezes foi realizada pelo sistema Ghelph modificado. As digestibilidades aparentes da farinha da biomassa emersa (MS = 57,8; PB = 72,3; EE = 63,2 e EB = 62,0%) foram maiores que as das farinhas da biomassa total (MS = 45,7; PB = 57,3; EE = 50,3 e EB = 42,3%) e submersa (MS = 38,3; PB = 50,8; EE = 43,5 e EB = 32,0%). As disponibilidades aparentes de fósforo (P), cálcio (Ca), magnésio (Mg), manganês (Mn), cobre (Cu) e zinco (Zn) da farinha da biomassa emersa também foram maiores. A farinha de biomassa emersa do aguapé apresenta melhor digestibilidade e disponibilidade aparente dos nutrientes em comparação às farinhas da biomassa total e submersa.

Palavras-chave: disponibilidade, energia, macrófita aquática, minerais, proteína

ABSTRACT

This study was carried out to determine and compare the apparent digestibility of dry matter (DM), crude protein (CP), crude fat (CF), gross energy (GE), and the apparent availability of minerals (P, Ca, Mg, Mn, Cu, and Zn) of emergent (leaf and petiole), submerged (root and rhizome) and total biomass meal of water hyacinth for Nile tilapia. Four diets were prepared, containing 0.10% chromic oxide-III, one being the reference diet (purified) and the others containing 30% of each ingredient. The Nile tilapias (125.5 ± 10.5 g) were fed until satiation and the feces were collected by the modified Guelph system. The apparent digestibility of emergent biomass meal (DM = 57.8, CP = 72.3, CF = 63.2, and GE = 62.0%) was higher than the apparent digestibility of the total biomass (DM = 45.7, CP = 57.3, CF = 50.3, and GE = 42.3%) and submerged (DM = 38.3, CP = 50.8, CF = 43.5, and GE = 32.0%) biomass meal. The apparent availability of P, Ca, Mg, Mn, Cu, and Zn of emergent biomass meal was also higher. The emergent biomass meal had higher apparent digestibility and apparent availability compared to submerged and total biomass meal.

Key words: aquatic macrophyte, availability, energy, minerals, protein

Introdução

O aguapé (Eichhornia crassipes) é uma espécie de macrófita aquática flutuante frequentemente utilizada em wetlands construídas para tratamento de efluentes de aquicultura (Henry-Silva & Camargo, 2006). Naswetlands, o aguapé absorve nutrientes da água e os incorpora à sua biomassa, reduzindo as concentrações de nutrientes do efluente (Tilley et al., 2002). Segundo Henry-Silva & Camargo (2006), a produção de biomassa do aguapé em uma wetland pode chegar a 50 t/ha/ano. No entanto, o aproveitamento da biomassa produzida nas wetlands é muito reduzido.

Estudos comprovam que as macrófitas aquáticas Azolla pinata e Lemna sp. podem substituir parcialmente ingredientes convencionais em dietas para tilápia-do-nilo sem prejudicar o crescimento dos peixes (Santiago et al., 1988; Essa, 1997). No entanto, as espécies de macrófitas podem apresentar variações na composição química (Henry-Silva & Camargo, 2002), o que torna necessário testar cada espécie que se pretende utilizar na composição das dietas. Nesse sentido, é importante a realização de estudos de digestibilidade para conhecer os valores digestíveis dos nutrientes dos alimentos que se pretende utilizar nas dietas (Pezzato et al., 2004).

Os estudos de digestibilidade têm viabilizado a utilização de vários alimentos em dietas balanceadas para peixes (Pezzato et al., 2002), entre eles, destacam-se as pesquisas de Leonard et al. (1998), Furuya et al. (2001), Boscolo et al. (2002) e Henry-Silva et al. (2006), que permitem ainda conhecer os alimentos que proporcionam baixos excedentes de nutrientes ao meio, especialmente nitrogênio e fósforo. Isso pode reduzir o impacto do cultivo na qualidade da água dos viveiros e dos corpos de água receptores dos efluentes de aquicultura (Valenti et al., 2000).

Os objetivos neste trabalho foram estudar as digestibilidades aparentes de matéria seca, proteína bruta, energia bruta e extrato etéreo e as disponibilidades aparentes de alguns minerais das farinhas da biomassa emersa, submersa e total do aguapé por tilápias-do-nilo e determinar o impacto das excretas desses peixes nas concentrações de nitrogênio e fósforo da água.

Material e Métodos

O experimento foi realizado em 2006 na Universidade Estadual Paulista (UNESP), no Laboratório de Pesquisa em Nutrição de Organismos Aquáticos da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ), Campus de Botucatu, São Paulo.

Para fabricação das farinhas testadas no experimento, o aguapé foi desidratado nas seguintes formas: farinha da biomassa emersa (lâmina foliar e pecíolo), farinha da biomassa submersa (raiz e rizoma) e farinha da biomassa total (biomassa emersa + submersa). O aguapé foi coletado em uma wetland construída utilizada para o tratamento de efluentes de carcinicultura. As farinhas do aguapé foram obtidas pela secagem da planta em estufa a 60 ºC por cinco dias e posterior moagem em moinho com peneiras com crivos circulares de 0,25 mm de diâmetro.

Foram confeccionadas quatro rações: uma raçãoreferência (purificada) (Tabela 1) e três rações-teste, compostas de 70% da ração-referência e 30% do alimento a ser testado (Tabela 2). As digestibilidades aparentes e as disponibilidades aparentes foram determinadas pelo método indireto usando óxido de crômio-III (0,1%) nas rações como indicador inerte (Bremer Neto et al., 2005).

Na confecção das quatro rações, após pesagem e homogeneização dos ingredientes, foi acrescida água (55,0 ºC) na proporção de 30,0% do peso total da ração. As misturas foram peletizadas em peletizadora experimental para ração purificada e secas em estufa com ventilação forçada a 55,0 ºC por 24 horas. Posteriormente, os péletes foram desintegrados para obtenção de grânulos homogêneos com diâmetro de 4,0 mm.

Para alimentação dos peixes, foram utilizados quatro tanques experimentais de formato circular com capacidade de 250 L e com renovação contínua de água a uma taxa de 50% do volume total por dia. Para coleta de fezes, foram utilizadas quatro cubas de formato cônico com capacidade de 300 L e sem renovação contínua da água. A temperatura e o oxigênio dissolvido da água dos tanques de alimentação e das cubas de digestibilidade foram controlados, respectivamente, por meio de aquecedores e pedra porosa acoplada a um aerador central. Diariamente, foram realizadas medidas de temperatura, oxigênio dissolvido e amônia nos tanques e nas cubas.

Empregou-se a metodologia utilizada por Furuya et al. (2001), de modo que os peixes foram arraçoados fora do sistema coletor de fezes. Foram alojados 60 juvenis de tilápia-do-nilo com 125,5 ± 10,5 g, distribuídos aleatoriamente em quatro tanques-rede (15 peixes/tanque) de formato circular, confeccionados em tela plástica (malha de 1,5 cm entre nós). Durante o dia, os peixes foram mantidos nos tanques experimentais, onde foram alimentados à vontade, das 8h30 às 17h30, por meio de arraçoamento manual. Em seguida, foram transferidos para as cubas de coleta de fezes, onde foram mantidos até a manhã do dia subsequente. Essas cubas, dotadas de sistema de coleta de fezes por gravidade, possibilitaram a obtenção do material para análise. Após o período de alimentação e de coleta de fezes, efetuou-se a limpeza dos tanques experimentais e das cubas, preparando-os para nova coleta (repetição). A coleta de fezes (repetição/dia) foi realizada durante cinco dias, tanto para a ração-referência como para cada uma das rações contendo os alimentos testados. As fezes foram armazenadas e congeladas a -20,0 ºC e posteriormente desidratadas em estufa com ventilação forçada a 55,0 ºC por 48 horas.

As análises bromatológicas (PB, MS, EE, EB) dos alimentos, das rações e das fezes foram realizadas no Laboratório de Bromatologia da FMVZ e a dos minerais (P, Ca, Mg, Mn, Cu e Zn) no Laboratório de Fertilizantes e Corretivos da Faculdade de Ciências Agronômicas, UNESP, Campus de Botucatu, segundo a AOAC (1995). As determinações das concentrações de óxido de crômio-III das fezes e das rações foram feitas no Laboratório de Bromatologia da FMVZ, segundo Bremer Neto et al. (2005). As digestibilidades aparentes de PB, MS, EE, EB e as disponibilidades aparentes dos minerais da raçãoreferência e das três rações contendo 30% dos alimentos estudados (farinhas da biomassa emersa, submersa e total) foram calculadas segundo Nose (1966). As digestibilidades aparentes da PB, MS, EE, EB e as disponibilidades aparentes dos minerais exclusivamente dos alimentos estudados foram calculadas de acordo com metodologia descrita por Cho & Slinger (1979).

Amostras de água foram coletadas nas cubas de coleta de fezes e na sua fonte de abastecimento para determinação do impacto das excretas das tilápias-do-nilo alimentadas com a ração-referência e com as rações contendo as farinhas da biomassa emersa, submersa e total do aguapé nas concentrações de nitrogênio total e fósforo total da água. As amostras de água das cubas foram obtidas após a permanência dos peixes por 15 horas (17h30 às 8h30). As análises de nitrogênio total (Mackreth et al., 1978) e fósforo total (Golterman et al., 1978) foram realizadas no Laboratório de Ecologia Aquática do Instituto de Biociência da UNESP, Campus de Rio Claro.

Aos resultados obtidos foi aplicada a análise de variância de uma classificação (ANOVA-One way). Posteriormente, foi aplicado o teste de Tukey (5% de probabilidade) para comparação múltipla entre médias. A análise estatística foi realizada pelo programa Statistica, versão 7.1 (StatSoft, 2005).

Resultados e Discussão

A temperatura e o oxigênio dissolvido da água dos tanques experimentais e das cubas foram, respectivamente, 26,0 ± 0,4 ºC e 6,5 ± 0,3 mg/L durante o experimento. O nível de amônia foi mantido abaixo de 0,01 mg/L, ou seja, na faixa recomendada por Popma & Green (1990) para tilápias.

As digestibilidades da matéria seca (MS), proteína bruta (PB), extrato etéreo (EE) e da energia bruta (EB) da farinha da biomassa emersa foram as maiores, as da farinha da biomassa total, intermediárias, e as da farinha da biomassa submersa foram as menores (Tabela 3), provavelmente em razão das menores concentrações de fibra bruta da farinha da biomassa emersa (27,0%) em relação às da farinha da biomassa total (35,0%) e da farinha da biomassa submersa (45,0%) (Tabela 2). A fibra bruta diminui o tempo de trânsito gastrintetinal do alimento em tilápias-do-nilo (Meurer et al., 2003a; Lanna et al., 2004), o que reduz o tempo para realização dos processos de digestão e absorção e pode resultar na diminuição da digestibilidade dos nutrientes do alimento. Além disso, a fibra pode diminuir a digestibilidade dos nutrientes do alimento, pois interage com a superfície da parede intestinal (Madar & Thorme, 1987) e atua como barreira física entre os nutrientes e as enzimas digestivas (Potty, 1996). De fato, Lanna et al. (2004) constataram que níveis de fibra bruta superiores a 5% na ração diminuem as digestibilidades da MS e PB em tilápias-do-nilo, enquanto níveis de fibra bruta superiores a 7,5% diminuem a digestibilidade do EE nessa espécie. Shiau et al. (1988) constataram efeito negativo do aumento de carboximetilcelulose na ração sobre o desempenho e a conversão alimentar de tilápias-do-nilo. Dioundick & Stom (1990), em estudo com Oreochromis mossambicus, observaram menor digestibilidade da ração purificada com 10% de celulose e maior digestibilidade com 2,5 e 5,0% de celulose na composição da ração.

As digestibilidades aparentes da MS da farinha da biomassa emersa (57,8%), da farinha da biomassa total (45,7%) e da farinha da biomassa submersa (38,3%) foram inferiores às da MS do milho (77,9%) e do farelo de soja (65,5%) observadas por Boscolo et al. (2002) em tilápia-donilo. As digestibilidades da MS das farinhas do aguapé também foram inferiores às de alguns alimentos com altos níveis de fibra, como a aveia integral (81,1%) e a levedura de álcool (67,7%), obtidas por Pezzato et. al. (2003) na mesma espécie, assim como a digestibilidade da MS das farinhas do aguapé foram inferiores às de outros alimentos com altos níveis de fibra, como o trigo integral (86,5%) e o triticale (68,5%), obtidas por Boscolo et al. (2002) na mesma espécie. Por outro lado, a digestibilidade da MS da farinha da biomassa emersa foi superior às da MS do amido de milho (48,6%) e do sorgo (23,4%), encontradas por Pezzato et al. (2002) em tilápias-do-nilo. A digestibilidade aparente da MS da farinha da biomassa emersa em tilápiasdo-nilo foi semelhante à da levedura de álcool spray dried, 58,7% (Meurer et al., 2003b), e à de alimentos com altos níveis de fibra, como o feno de alfafa, 59,7%, e maior que a do feno de leucena, 37,6% (Pezzato et al., 2003).

As proteínas digestíveis das farinhas de biomassa emersa (9,5%), total (6,7%) e submersa (5,2%) foram baixas em comparação às de alimentos proteicos como farelo de soja (41,7%) e glúten 60 (57,7%), observadas por Pezzato et al. (2002) em tilápias-do-nilo. As proteínas digestíveis das farinhas do aguapé também foram baixas em comparação às de alguns alimentos com altos níveis de fibra, como o feno de alfafa (14,5%), o feno de leucena (23,6%) e a levedura de álcool (30,1%) (Pezzato et. al., 2003), determinadas na mesma espécie. Também são baixas em comparação às de outros alimentos com altos níveis de fibra, como a levedura de álcool spray dried, 32,2% (Meurer et al., 2003b), e às do trigo integral, 11,0%, e triticale, 13,7% (Boscolo et al., 2002), observadas na mesma espécie. As digestibilidades aparentes das farinhas do aguapé são menores que as do farelo de soja (91,5%) e glúten 60 (95,9%) obtidas por Pezzato et al. (2002) em tilápias-do-nilo, enquanto a digestibilidade de proteína bruta foi menor que as do feno de alfafa (93,3%), feno de leucena (72,5%) e da levedura de álcool (88,6%) (Pezzato et al., 2003) determinadas na mesma espécie. Também foi menor que da PB do trigo integral (96,3%) e do triticale (94,7%), encontradas por Boscolo et al. (2002) na mesma espécie.

A digestibilidade aparente do EE das farinhas das biomassas emersa (63,2%), total (50,2%) e submersa (43,5%) do aguapé foi inferior à do farelo de soja (92,1%) e do glúten de milho (94,0%), segundo Köprücü & Özdenir (2005). Também foi inferior à do milho (69,0%), farelo de trigo (67,3%), farelo de soja (82,7%) e farelo de algodão (99,3%), de acordo com Pezzato et al. (2002), entretanto, a digestibilidade aparente do EE da farinha da biomassa emersa foi superior à do amido de milho (58,8%), do farelo de arroz (57,5%) e do sorgo (38,6%).

As energias digestíveis das farinhas das biomassas emersa (2.687 kcal/kg), total (1.830 kcal/kg) e submersa (1.312 kcal/kg) foram inferiores às de alimentos energéticos como o milho (3.150 kcal/kg), sorgo (2.933 kcal/kg) e farelo de arroz (3.679 kcal/kg), observadas por Gonçalves et al. (2004) em tilápias-do-nilo. As energias digestíveis das farinhas do aguapé também foram inferiores às de alguns alimentos com altos níveis de fibra como o trigo integral (3.423 kcal/kg) e o triticale (3.230 kcal/kg), observadas por Boscolo et al. (2002) na mesma espécie. Por outro lado, a energia digestível da farinha da biomassa emersa foi maior que as de ingredientes energéticos como o amido de milho (2.515 kcal/kg), milho extrusado (2.429 kcal/kg) e gérmen de milho (2.153 kcal/kg) (Pezzato et al., 2002). A energia digestível da farinha da biomassa emersa também foi maior que as de alguns alimentos com altos níveis de fibra bruta, como o feno de alfafa (2503 kcal/kg) e a aveia integral (2636 kcal/kg), encontradas por Pezzato et al. (2003) na mesma espécie. A energia digestível da farinha da biomassa emersa foi seme-lhante à da levedura de álcool spray dried (2.700 kcal/kg), encontrada por Meurer et al. (2003b) na mesma espécie.

As disponibilidades aparentes do fósforo, cálcio, magnésio, manganês, cobre e zinco da farinha da biomassa emersa foram maiores que as das farinhas de biomassa total e submersa, que não diferiram (P>0,05) entre si (Tabela 3). Da mesma forma que para as digestibilidades aparentes da MS, PB, EB e EE, as maiores disponibilidades aparentes dos minerais da farinha da biomassa emersa podem ser explicadas por sua menor concentração de fibra bruta (27,0%) em comparação às farinhas das biomassas total (35,0%)

A disponibilidade de fósforo da farinha da biomassa emersa (27,7%) foi semelhante às do farelo de soja (30,1%) e do glúten de milho (28,2%) obtidas por Köprücü & Özdenir (2005) em tilápias-do-nilo. As baixas disponibilidades do fósforo dos vegetais se devem ao fitato, que se apresenta na forma de fósforo não-disponível aos peixes. Entre 50,0 e 90,0% do fósforo total dos alimentos vegetais ocorre na forma de fitato (Nolan & Dufafin, 1987) e está indisponível, em decorrência da ausência da enzima fitase no intestino dos peixes (Hughes & Soares, 1998).

As farinhas avaliadas apresentaram valores negativos para a disponibilidade de cálcio, o que está relacionado à presença de cálcio na água dos aquários de digestibilidade, pois o cálcio presente na água é assimilado pela tilápia-do-nilo mesmo quando presente na ração (Steffens, 1987). Da mesma maneira que neste estudo, Gonçalves et al. (2005), estudando alimentos para tilápia-do-nilo, também obtiveram disponibilidade do cálcio negativa para o milho, milho extrusado, sorgo, glúten de milho e farelos de arroz, trigo, soja, algodão e girassol.

As disponibilidades do magnésio, manganês, cobre e zinco da farinha da biomassa emersa (76,8; 32,8; 60,7 e 55,5%; respectivamente) foram maiores ou semelhantes às do magnésio, manganês, cobre e zinco do milho extrusado (50,4; 34,0; 17,3 e 58,7%; respectivamente), farelo de arroz (62,9; 6,3; 15,8 e -106,5%; respectivamente), farelo de soja (75,6; 21,5; 1,5 e 48,0%; respectivamente) e glúten de milho (38,9; 23,2; 22,7 e -98,5%; respectivamente), obtidas por Gonçalves et al. (2005) em tilápias-do-nilo. Por outro lado, as disponibilidades do manganês e do zinco da farinha da biomassa total (15,2 e 25,7%, respectivamente) e da farinha da biomassa submersa (10,5 e 15,3%, respectivamente) só foram superiores às do farelo de arroz. Em comparação ao estudo de Gonçalves et al. (2005), as disponibilidades do cobre da farinha da biomassa total (33,4%) e submersa (28,0%) foram superiores às do milho extrusado (17,7%), farelo de arroz (15,8%), farelo de soja (1,5%) e glúten de milho (22,7%).

A farinha da biomassa emersa apresenta energia digestível e digestibilidade aparente dos nutrientes semelhantes ou melhores que alguns alimentos convencionais e com altos níveis de fibra, (Boscollo et al., 2002; Pezzato et al., 2002; Meurer et al., 2003b; Pezzato et al., 2003; Gonçalves et al., 2005; Köprücü & Özdenir, 2005). No entanto, a proteína digestível da farinha da biomassa emersa (9,5%) é baixa para esse alimento ser utilizado como fonte de proteína. A concentração de fibra bruta da farinha da biomassa emersa (27,0%) é alta e limita sua utilização em rações. Segundo Lanna et al. (2004), níveis de fibra bruta superiores a 5,0% na ração diminuem as digestibilidades aparentes da MS e da PB em tilápias-do-nilo. Portanto, o possível uso de farinha da biomassa emersa na composição de uma ração deve ser restrito a pequenas frações.

As concentrações de nitrogênio e fósforo total foram menores na água de abastecimento das cubas de coleta de fezes (Tabela 4), intermediárias na água das cubas onde se empregou a ração-referência e a ração contendo farinha da biomassa emersa e maiores na água das cubas onde foram utilizadas as rações contendo farinha da biomassa total e submersa (Tabela 4). Esses resultados comprovam que as excretas de tilápias alimentadas com ração contendo farinha da biomassa emersa contribuíram menos para os acréscimos de nitrogênio e fósforo na água que as excretas das tilápias alimentadas com as rações contendo farinha da biomassa total e submersa. Isso ocorreu provavelmente porque a digestibilidade da proteína e do fósforo da farinha da biomassa emersa do aguapé são maiores em relação às da farinha da biomassa total e submersa. De fato, os nutrientes da ração não assimilados pelos peixes são eliminados na água (Sugiura et al., 1998).

Conclusões

A farinha da biomassa emersa do aguapé apresenta melhor digestibilidade aparente de matéria seca, proteína bruta, extrato etéreo e energia bruta e melhores disponibilidades aparentes de minerais em comparação às farinhas da biomassa total e submersa. As excretas de tilápias-donilo alimentadas com ração contendo farinha da biomassa emersa do aguapé proporcionam menores acréscimos de nitrogênio e fósforo na água em comparação às excretas de tilápias alimentadas com as rações contendo as farinhas da biomassa total e submersa.

Agradecimentos

À FAPESP, pelo suporte financeiro (Processo: 04/06962-0); ao Prof. Dr. Wagner Cotroni Valenti e aos pós-graduandos Igo Gomes Guimarães e Vivian Gomes dos Santos, pelo auxílio durante a realização do estudo.

Literatura Citada

Este artigo foi recebido em 21/12/2007 e aprovado em 5/12/2008.

Correspondências devem ser enviadas para: jfvbiudes@gmail.com

Referências bibliográficas

  • ASSOCIATION OF OFFICIAL ANALYTICAL CHEMISTRY AOAC. Official methods of analysis 16.ed. Arlington: AOAC International, 1995. 1025p.
  • BOSCOLO, W.R.; HAYASHI, C.; MEURER, F. Digestibilidade aparente da energia e nutrientes de alimentos convencionais e alternativos para a tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus, L.). Revista Brasileira de Zootecnia, v.31, n.2, p.539-545, 2002.
  • BREMER NETO, H.; GRANER, C.A.F.; PEZZATO, L.E. et al. Determinação de rotina do crômio em fezes, como marcador biológico, pelo método espectrofotométrico ajustado da 1,5difenilcarbazida. Ciência Rural, v.35, n.3, p.691-697, 2005.
  • CHO, C.Y.; SLINGER, S.I. Apparent digestibility measurement in feedstuff for rainbow trout. In: WORLD SYMPOSIUM ON FINFISH NUTRITION AND FISHFEED TECHNOLOGY, 1979, Hamburg. Proceedings... Heeneman: HALVER, J.; TIEWS, K., 1979. p.239-247.
  • DIOUNDICK, O.B.; STOM, D. Effects of dietary alfa cellulose on the juvenile tilapia, Oreochromis mossambicus (Peters). Aquaculture, v.91, n.3/4, p.311-315, 1990.
  • ESSA, M.A. Utilization of some aquatic plants in diets for Nile tilapia, Oreochromis niloticus, fingerlings. Egypt Journal Aquatic Biology Fish, v.1, n.2, p.19-34, 1997.
  • FURUYA, W.M.; PEZZATO, L.E.; MIRANDA, E.C. et al. Digestibilidade aparente da energia e nutrientes do farelo de canola pela tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus). Revista Brasileira de Zootecnia, v.30, n.3, p.611-616, 2001.
  • GOLTERMAN, H.L.; CLYNO, R.S.; OHNSTAD, M.A.M. Methods for chemical analysis of fresh water Boston: Blackwell, 1978. 214p.
  • GONÇALVES, G.S.; PEZZATO, L.E.; BARROS, M.M. et al. Digestibilidade aparente e suplementação por fitase em alimentos vegetais para tilápia do Nilo. Acta Scientiarum, v.26, n.3, p.313-321, 2004.
  • GONÇALVES, G.S.; PEZZATO, L.E; BARROS, M.M. et al. Efeitos da suplementação de fitase sobre a disponibilidade aparente de Mg, Ca, Zn, Cu, Mn e Fe em alimentos vegetais para a tilápiado-Nilo. Revista Brasileira de Zootecnia, v.34, n.6, p.2155-2163, 2005.
  • HENRY-SILVA, G.G.; CAMARGO, A.F.M. Valor nutritivo de macrófitas aquáticas flutuantes (Eichhornia crassipes, Pistia stratiotes e Salvinia molesta) utilizadas no tratamento de efluentes de aqüicultura. Acta Scientiarum, v.24, n.2, p.519-526, 2002.
  • HENRY-SILVA, G.G.; CAMARGO, A.F.M. Efficiency of aquatic macrophytes to treat Nile tilapia pond effluents. Scientia Agricola, v.63, n.5, p.433-438, 2006.
  • HENRY-SILVA, G.G.; CAMARGO, A.F.M.; PEZZATO, L.E. Digestibilidade aparente de macrófitas aquáticas pela tilápiado-nilo (Oreochromis niloticus) e qualidade da água em relação às concentrações de nutrientes. Revista Brasileira de Zootecnia, v.35, n.3, p.641-647, 2006.
  • HUGHES, K.P.; SOARES JR., J.H. Efficacy of phytase on phosphorus utilization in practical diets fed to striped bass Morone saxatilis Aquaculture Nutrition, v.4, n.2, p.133-140, 1998.
  • KÖPRÜCÜ, K.; ÖZDEMIR, Y. Apparent digestibility of selected feed ingredients for Nile tilapia (Oreochromis niloticus). Aquaculture, v.250, p.308-316, 2005.
  • LANNA, E.A.T.; PEZZATO, L.E.; CECON, P.R. et al. Digestibilidade aparente e trânsito gastrintestinal em tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus), em função da fibra bruta da dieta. Revista Brasileira de Zootecnia, v.33, n.6, p.2186-2192, 2004.
  • LEONARD, V.; BREYNE, C.; MICHA, J-C. Digestibility and transit time of Azolla filiculoides Lamarck in Oreochromis aureus (Steindachner). Aquaculture Research, v.29, p.159-165, 1998.
  • MACKRETH, F.I.F.; HERON, J.; TALLING, J.F. Water analysis: some revised methods for limnologist. London: Freshwater Biological Association, 1978. 121p.
  • MADAR, Z.; THORME, R. Dietary fiber. Progress in Food and Nutrition Science, v.11, p.153-174, 1987.
  • MEURER, F.; HAYASHI, C.; BOSCOLO, W.R. Fibra bruta para alevinos de tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus, L). Revista Brasileira de Zootecnia, v.32, n.2, p.256-261, 2003a.
  • MEURER, F.; HAYASHI, C.; BOSCOLO, W.R. Digestibilidade aparente de alguns alimentos protéicos pela tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus). Revista Brasileira de Zootecnia, v.32, n.6, p.1801-1809, 2003b.
  • NOLAN, K.B.; DUFAFIN. P.A. Effects of phytase on mineral bioavailability, in vitro studies on Mg2+, Ca2+, Fe2+, Cu2+ and Zn2+ (also Cd2+) solubility in the presence of phytase. Journal Science Food Agriculture, v.40, p.79-85, 1987.
  • NOSE, T. Recent advances in the study of fish digestion in Japan. In: SIMPOSIUM ON FINFISH NUTRITION AND FISH FEED TECHNOLOGY, 1966, Belgrade. Proceedings... Belgrade: EIFAC/FAO, 1966, p.15 se II-7.
  • PEZZATO, L.E.; MIRANDA, E.C.; BARROS, M.M. et al. Digestibilidade aparente de ingredientes pela tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus). Revista Brasileira de Zootecnia, v.31, n.4, p.1595-1604, 2002.
  • PEZZATO, L.E.; MIRANDA, E.C.; BARROS, M.M. et al. Digestibilidade aparente da matéria seca e da proteína bruta e a energia digestível de alguns alimentos alternativos pela tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus). Acta Scientiarum, v.26, n.3, p.329-337, 2003.
  • PEZZATO, L.E.; BARROS, M.M.; FRACALOSSI, D.M. et al. Nutrição de Peixes. In: CYRINO, J.E.P. et al. (Eds.) Tópicos especiais em piscicultura de água doce tropical intensiva São Paulo: Aquabil, 2004, p.75-170.
  • POPMA, T.J.; GREEN, B.W. Aquaculture production manual: Sex reversal of tilapia in earthen ponds Auburn: Auburn University, International Center for Aquaculture, 1990. 15p. (Series 35).
  • POTTY, V.H. Physic-chemical aspects, physiological functions, nutritional importance and technological significance of dietary fibers - a critical appraisal. Journal of Food Science and Technology, v.33, n.1, p.1-18, 1996.
  • SANTIAGO, C.B.; ALDABA, M.B.; REYES, O.S. et al. Response of Nile tilapia (Oreochromis niloticus) fry to diets containing Azolla meal. In: INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON TILAPIA IN AQUACULTURE, 2., 1988, Philippines. Proceedings... Philippines: WAS, 1988. p.377-382.
  • SHIAU, S.Y.; YU, H.L.; HWA, S. et al. The influence of carboxymethycellulose on growth, digestion, gastric emptying time and body composition of tilapia. Aquaculture, v.70, p.345-354, 1988.
  • STATSOFT, INC. 2005. Statistica (data analysis software system). Version 7.1. Disponível em: <www.statsoft.com>. Acesso em: 12/12/2007.
  • STEFFENS, W. Principios fundamentales de la alimentación de los peces Zaragosa: Acribia, 1987. 272p.
  • SUGIURA, S.H.; DONG, F.M.; RATHBONE, C.K. et al. Apparent protein digestibility and mineral availabities in various feed ingredients for salmonid feeds. Aquaculture, v.159, p.177-202, 1998.
  • TILLEY, D.R.; BADRINARAYANAN, H.; ROSATI, R. et al. Constructed wetland as recirculation filters in large-scale shrimp aquaculture. Aquacultural Engineering, v.26, n.2, p.81-109, 2002.
  • VALENTI, W.C. Aqüicultura no Brasil: bases para um desenvolvimento sustentável Brasília: CNPq/Ministério da Ciência e Tecnologia, 2000. 399p.
  • 1
    Pesquisa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Jan 2010
    • Data do Fascículo
      Nov 2009

    Histórico

    • Recebido
      21 Dez 2007
    • Aceito
      05 Dez 2008
    location_on
    Sociedade Brasileira de Zootecnia Universidade Federal de Viçosa / Departamento de Zootecnia, 36570-900 Viçosa MG Brazil, Tel.: +55 31 3612-4602, +55 31 3612-4612 - Viçosa - MG - Brazil
    E-mail: rbz@sbz.org.br
    rss_feed Acompanhe os números deste periódico no seu leitor de RSS
    Acessibilidade / Reportar erro