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Comparação entre os critérios prognósticos de Glasgow e os índices fisiológicos O-POSSUM / P-POSSUM em pacientes com adenocarcinoma gástrico submetidos à gastrectomia e a ocorrência de complicações no pós-operatório precoce

RESUMO

Introdução:

O câncer gástrico segue como terceira causa de mortalidade mundial por neoplasias malignas. Seus índices prognósticos ainda não foram bem definidos para intervenção cirúrgica quanto à estratificação da intensidade da inflamação crônica. Os Critérios Prognósticos de Glasgow (CPG) e os índices de O-POSSUM e PPOSSUM podem constituir essas padronizações e foram testados para avaliar a associação entre eles e o prognóstico após gastrectomia curativa.

Método:

Estudo retrospectivo, analisando prontuários de pacientes com adenocarcinoma gástrico e submetidos à gastrectomia, no período de 2015 até 2021, em dois hospitais no Rio de Janeiro. Foram observados a extensão cirúrgica, os dados clínicos e laboratoriais pré, peri e pós-operatórios, até 30 dias após a cirurgia. Os pacientes foram estratificados pelos CPG e comparados segundo classificação de ClavienDindo (CD). Regressão logística foi realizada para testar associação entre o desfecho e variáveis independentes.

Resultados:

Dos 48 doentes, 56,25% eram do sexo feminino. Houve diferença entre os grupos quanto à extensão cirúrgica e CPG (ambos com p<0,001), enquanto O-POSSUM, P-POSSUM e idade não apresentaram diferença. Fatores associados com complicação CD ≥ III-a na análise univariada foram CPG (OR: 85,261; IC: 24,909-291,831) e P-POSSUM (OR: 1,211; IC: 1,044-1,404). Na análise multivariada, os fatores independentes associados ao CD ≥ III-a foram CPG (OR: 114,865; IC: 15,430-855,086), P-POSSUM (OR: 1,133; IC: 1,086-1,181) e O-POSSUM (OR: 2,238; IC: 1,790-2,797).

Conclusão:

Neste modelo, CPG, P-POSSUM e O-POSSUM previram complicações cirúrgicas graves. Há necessidade de estudos mais aprofundados para instituir estratégias de forma a minimizar a resposta inflamatória no período pré-operatório.

Palavras-chave:
Neoplasias Gástricas; Inflamação; Gastrectomia; Prognóstico

ABSTRACT

Introduction:

Gastric cancer is still the third cause of death worldwide due to malignant neoplasms. Its prognostic indices have not yet been well defined for surgical intervention in terms of stratifying the intensity of chronic inflammation. The Glasgow Prognostic Score (GPS) and O-POSSUM and P-POSSUM Indices may constitute these standardizations and were tested to assess the association between them and the prognosis after curative gastrectomy.

Method:

Retrospective observational study, analysing medical records of patients with gastric adenocarcinoma who underwent gastrectomy, from 2015 to 2021, in two hospitals in Rio de Janeiro. Surgical extension, pre, peri and postoperative clinical and laboratory data were observed, up to 30 days after surgery. Patients were layered by GPS and compared according to the Clavien-Dindo (CD) classification. Logistic regression was performed to test the association between the outcome and independent variables.

Results:

Of the 48 patients, 56.25% were female. There was difference between the groups regarding surgical extension and GPS (both with p<0.001), while O-POSSUM, P-POSSUM and age showed no difference. Factors associated with CD ≥ III-a complication in the univariate analysis were GPS (OR: 85,261; CI: 24,909- 291,831) and P-POSSUM (OR: 1,211; CI:1,044-1,404). In the multivariate analysis, the independent factors associated with CD ≥ III-a were GPS (OR:114,865; CI: 15,430-855,086), P-POSSUM (OR: 1,133; CI: 1,086-1,181) and O-POSSUM (OR: 2,238; CI: 1,790-2,797).

Conclusion:

In this model, GPS, P-POSSUM and O-POSSUM predicted serious surgical complications. There is a need for further studies to establish strategies to minimize the inflammatory response in the preoperative period.

Keywords:
Inflammation; Gastrectomy; Prognosis; Stomach Neoplasms

INTRODUÇÃO

O câncer gástrico é o quinto tipo mais comum de câncer no mundo e a terceira causa de mortalidade, em ambos os sexos. O pico de incidência ocorre em homens, em torno de 60 anos11 Bray F, Ferlay J, Soerjomataram I, Siegel RL, Torre LA, Jemal A. Global cancer statistics 2018: GLOBOCAN estimates of incidence and mortality worldwide for 36 cancers in 185 countries. CA Cancer J Clin. 2018;68(6):394-424. doi: 10.3322/caac.21492.
https://doi.org/10.3322/caac.21492....
. Os fatores de risco são infecção por Helicobacter pylori, alto consumo de sódio e de álcool, tabagismo e idade22 Butt J, Varga MG, Wang T, Tsugane S, Shimazu T, Zheng W, et al. Smoking, Helicobacter pylori serology, and gastric cancer risk in prospective studies from China, Japan, and Korea. Cancer Prev Res (Phila). 2019;12(10):667-74. doi: 10.1158/1940-6207.CAPR-19-0238.
https://doi.org/10.1158/1940-6207.CAPR-1...

3 Kumar S, Metz DC, Ellenberg S, Kaplan DE, Goldberg DS. Risk factors and incidence of gastric cancer after detection of Helicobacter pylori infection: a large cohort study. Gastroenterology. 2020;158(3):527-36. doi: 10.1053/j.gastro.2019.10.019.
https://doi.org/10.1053/j.gastro.2019.10...
-44 Li Y, Eshak ES, Shirai K, Liu K, Dong J, Iso H, et al. Alcohol consumption and risk of gastric cancer: the Japan collaborative cohort study. J Epidemiol. 2021;31(1):30-6. doi: 10.2188/jea.JE20190304.
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, sendo o principal fator de risco a inflamação crônica associada a essa bactéria55 Liabeuf D, Oshima M, Stange DE, Sigal M. Stem cells, Helicobacter pylori, and mutational landscape: utility of preclinical models to understand carcinogenesis and to direct management of gastric cancer. Gastroenterology. 2022;162(4):1067-87. doi: 10.1053/j.gastro.2021.12.252.
https://doi.org/10.1053/j.gastro.2021.12...

6 Smyth EC, Nilsson M, Grabsch HI, van Grieken NC, Lordick F. Gastric cancer. Lancet. 2020;396(10251):635-48. doi: 10.1016/S0140-6736(20)31288-5.
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)31...
-77 Israel DA, Peek RM. Pathogenesis of Helicobacter pylori-induced gastric inflammation. Aliment Pharmacol Ther. 2001;15(9):1271-90. doi: 10.1046/j.1365-2036.2001.01052.x.
https://doi.org/10.1046/j.1365-2036.2001...
.

O diagnóstico precoce é limitado, pois a maioria dos pacientes apresenta sintomas em estágio avançado no momento da apresentação22 Butt J, Varga MG, Wang T, Tsugane S, Shimazu T, Zheng W, et al. Smoking, Helicobacter pylori serology, and gastric cancer risk in prospective studies from China, Japan, and Korea. Cancer Prev Res (Phila). 2019;12(10):667-74. doi: 10.1158/1940-6207.CAPR-19-0238.
https://doi.org/10.1158/1940-6207.CAPR-1...

3 Kumar S, Metz DC, Ellenberg S, Kaplan DE, Goldberg DS. Risk factors and incidence of gastric cancer after detection of Helicobacter pylori infection: a large cohort study. Gastroenterology. 2020;158(3):527-36. doi: 10.1053/j.gastro.2019.10.019.
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-44 Li Y, Eshak ES, Shirai K, Liu K, Dong J, Iso H, et al. Alcohol consumption and risk of gastric cancer: the Japan collaborative cohort study. J Epidemiol. 2021;31(1):30-6. doi: 10.2188/jea.JE20190304.
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. O tratamento cirúrgico com intenção curativa consiste na realização de gastrectomia total ou subtotal e eventual ressecção de órgãos adjacentes e linfadenectomias extensas; estes procedimentos podem influenciar nas possíveis complicações pós-operatórias, constituindo assim, um fator adicional de mau prognóstico para o câncer gástrico88 Ma J, Yao S, Li XS, Kang HR, Yao FF, Du N. Neoadjuvant therapy of DOF regimen plus bevacizumab can increase surgical resection ratein locally advanced gastric cancer: a randomized, controlled study. Medicine (Baltimore). 2015;94(42):e1489. doi: 10.1097/MD.0000000000001489.
https://doi.org/10.1097/MD.0000000000001...
,99 Bernardo AT, Eloi T, Amaral LA, Quintanilha R, Melo AS. Avaliação da performance cirúrgica pelo P-POSSUM em doentes com cancro gástrico: revisão de 5 anos. Rev Port Cir. 2016;(36):9-18..

A identificação e estratificação da intensidade da resposta inflamatória nesses pacientes pode ajudar na customização da terapêutica (cirúrgica ou não), uma vez que a resposta inflamatória exacerbada está associada a altos índices de complicações cirúrgicas. O tratamento dessas complicações e suas consequentes internações, apresentam custos muito elevados para o sistema de saúde1010 Forrest LM, McMillan DC, McArdle CS, Angerson WJ, Dunlop DJ. Evaluation of cumulative prognostic scores based on the systemic inflammatory response in patients with inoperable non-small-cell lung cancer. Br J Cancer. 2003;89(6):1028-30. doi: 10.1038/sj.bjc.6601242.
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,1111 Kubota T, Hiki N, Sano T, Nomura S, Nunobe S, Kumagai K, et al. Prognostic significance of complications after curative surgery for gastric cancer. Ann Surg Oncol. 2014;21(3):891-8. doi: 10.1245/s10434-013-3384-9.
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.

Os Critérios Prognósticos de Glasgow (CPG) foram inicialmente definidos para avaliar a intensidade da resposta inflamatória nos pacientes com diagnóstico de neoplasia maligna, principalmente nos casos oriundos do trato digestivo. Esta avaliação é realizada mediante a atribuição de valores às alterações de proteína C reativa (PCR) e albumina1212 McMillan DC. The systemic inflammation-based Glasgow Prognostic Score: a decade of experience in patients with cancer. Cancer Treat Rev. 2013;39(5):534-40. doi: 10.1016/j.ctrv.2012.08.003.
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.

Pacientes com avaliação 0 (PCR <10mg/l e albumina >3,5g/dl) apresentam morbimortalidade pós-operatória em torno de 10%; com avaliação final 1 ponto (PCR >10mg/l ou albumina <3,5g/dl), apresentam morbimortalidade pós-operatório em torno de 30% a 40%; e pacientes avaliados com 2 pontos (PCR >10mg/l e albumina <3,5g/l) apresentam perspectiva de complicação pós-operatória maior que 60%. Recentemente, esses critérios foram acrescidos da avaliação das relações neutrófilo/linfócito, plaqueta/linfócito e monócito/linfócito, com o objetivo de melhorar a caracterização da intensidade da resposta inflamatória1111 Kubota T, Hiki N, Sano T, Nomura S, Nunobe S, Kumagai K, et al. Prognostic significance of complications after curative surgery for gastric cancer. Ann Surg Oncol. 2014;21(3):891-8. doi: 10.1245/s10434-013-3384-9.
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.

O critério de Pontuação de Severidade Fisiológica e Operatória para a enumeração de Morbidade e Mortalidade (P-POSSUM e O-POSSUM) foi proposto como uma forma de padronizar os dados dos pacientes que se submeteram a tratamento cirúrgico. O critério leva em consideração tanto o aspecto fisiológico na admissão do paciente, quanto a gravidade da operação realizada1313 Horzic M, Kopljar M, Cupurdija K, Bielen DV, Vergles D, Lackovic Z. Comparison of P-POSSUM and Cr-POSSUM scores in patients undergoing colorectal cancer resection. Arch Surg. 2007;142(11):1043-8. doi: 10.1001/archsurg.142.11.1043.
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. Os parâmetros a serem observados são simples, sendo atribuída uma pontuação de 12 variáveis fisiológicas, medidas na admissão, e seis variáveis operatórias para a gravidade do procedimento operatório1313 Horzic M, Kopljar M, Cupurdija K, Bielen DV, Vergles D, Lackovic Z. Comparison of P-POSSUM and Cr-POSSUM scores in patients undergoing colorectal cancer resection. Arch Surg. 2007;142(11):1043-8. doi: 10.1001/archsurg.142.11.1043.
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.

O objetivo deste estudo foi testar a associação entre os critérios de Glasgow, O-POSSUM e P-POSSUM, para verificar o desfecho de complicação de Clavien-Dindo maior que III-a, em pacientes submetidos à gastrectomia com intenção curativa.

MÉTODO

Trata-se de estudo observacional retrospectivo, realizado no período de 01/01/2015 até 31/12/2021, no Hospital Federal da Lagoa e no Hospital Universitário Pedro Ernesto, ambos situados na cidade do Rio de Janeiro. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Plataforma Brasil, sob o número do parecer 5.782.089 e CAAE: 6488 1422.3.0000.5259.

Foram selecionados inicialmente, 160 prontuários de pacientes com diagnóstico de adenocarcinoma gástrico submetidos a gastrectomia com intenção curativa, sendo 42 do Hospital Federal da Lagoa e 118 do Hospital Universitário Pedro Ernesto.

Foram incluídos todos os pacientes portadores de câncer gástrico comprovado por endoscopia digestiva alta e com diagnóstico histopatológico de adenocarcinoma; com presença de todos os critérios fisiológicos e cirúrgicos necessários para realização da análise de P-POSSUM/O-POSSUM no período perioperatório; que tenham sido submetidos por vias laparatômica ou laparoscópica a gastrectomia total ou subtotal com descolamento coloepiploico mais linfadenectomia dos linfonodos perigástricos até ligadura da gastroepiploica e omentectomia. Realizada secção duodenal com Grampeador e reforço com Prolene 3.0; Linfadenectomia da bolsa omental e ligamento gastro-hepático com ligadura das artérias gástrica direita e gastroduodenal na sua origem; Linfadenectomia peri- aórtica e tronco celíaco e ligadura da gástrica esquerda. Nas subtotais, realizada secção gástrica e nas totais: linfadenectomia do cárdia e ligadura dos vasos curtos. Realizada reconstrução em y de Roux com Grampeador + Prolene 3.0. E estes pacientes foram acompanhados até no mínimo, os primeiros 30 dias de pós-operatório, através dos seus prontuários.

Após aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, 48 pacientes se mostraram elegíveis para este estudo (Figura 1).

Figura 1
Casuística e aplicação dos critérios de inclusão e exclusão.

Critérios analisados

Os dados dos Critérios Prognósticos de Glasgow foram colhidos no período pré-operatório, o último exame realizado antes do procedimento cirúrgico, enquanto os critérios de P-POSSUM e de O-POSSUM foram baseados nos exames realizados logo após o procedimento. Esses dados foram correlacionados com os desfechos ocorridos no período de 30 dias após o procedimento cirúrgico.

Utilizamos a estratificação do risco cirúrgico da Sociedade Americana de Anestesiologistas (ASA), que não leva em consideração os procedimentos a serem realizados e remete à presença de comorbidades clínicas prévias, controladas ou não. Neste estudo, calculamos esta classificação em paralelo. Enquanto o índice de pontuação fisiológica P-POSSUM avalia parâmetros laboratoriais, o índice de pontuação O-POSSUM avalia parâmetros intraoperatórios. As pontuações de ambos os critérios POSSUM são inseridas em duas fórmulas complexas com cálculos matemáticos, que podem prever os riscos de morbidade e mortalidade. Esses critérios resultam em uma medida direta em número absoluto, somando-se a pontuação.

Grupos de acordo com a morbimortalidade

Os pacientes foram alocados de acordo com a gravidade de suas complicações segundo a classificação de Clavien-Dindo (CD) em dois grupos:

  • CD < III-a (complicações sem necessidade de intervenção)
    • - CD grau I: Qualquer desvio do curso pós-operatório ideal sem necessidade de tratamento farmacológico ou de intervenções cirúrgicas, endoscópicas e radiológicas. Os regimes terapêuticos permitidos são: drogas antieméticas, antipiréticos, analgésicos, diuréticos, eletrólitos e fisioterapia. Esta categoria também inclui feridas operatórias drenadas à beira do leito;

    • - CD grau II: Complicação que requer tratamento farmacológico com drogas diferentes daquelas permitidas para complicações grau I. Transfusão sanguínea e nutrição parenteral total também estão incluídas;

  • CD ≥ III-a (complicações com necessidade de intervenções)
    • - CD grau III: Complicação que exige intervenção cirúrgica, endoscópica ou intervenção radiológica;

    • - CD grau III-a: Intervenção sem anestesia geral;

    • - CD grau III-b: Intervenção sob anestesia geral;

    • - CD grau IV: Complicação com risco de vida (incluindo SNC*). Há necessidade de UTI.; * Hemorragia encefálica, AVC isquêmico, sangramento subaracnóideo; exclui acidentes isquêmicos transitórios

    • - CD grau IV-a: Disfunção de um só órgão (incluindo diálise);

    • - CD grau IV-b: Disfunção de múltiplos órgãos;

    • - CD grau V: Morte do paciente.

Isto possibilitou utilizar a regressão logística binomial, facilitando a interpretação dos dados estatísticos.

Análise estatística

Na análise estatística, as variáveis contínuas foram expressas em média (± DP) ou mediana e intervalo interquartis, dependendo de sua distribuição normal ou não. As variáveis categóricas foram expressas em porcentagens.

O teste T foi utilizado para variáveis de distribuição normal; o teste de ranqueamento de somas não-paramétrico Mann-Whitney, para variáveis sem distribuição normal; e o teste do qui-quadrado foi utilizado para determinar a comparação entre percentuais.

Regressão logística agrupada por hospital foi realizada para testar associação entre o desfecho binário (possuir ou não CD ≥ III-a) e variáveis independentes, como os escores de Glasgow, O-POSSUM e P-POSSUM, além de gastrectomia total contra subtotal.

Utilizamos erro alfa de 0,05 para determinação de significância estatística e poder do estudo em 80% (erro beta).

O software Stata versão 17.0 (StataCorp LP, College Station, TX) foi utilizado para avaliação estatística.

RESULTADOS

A Tabela 2 contém as características clinicodemográficas e suas diferenças quanto ao desfecho analisado. Dos 48 prontuários incluídos no estudo, a maioria era do género feminino com 27 mulheres (56,25%). E a idade dos pacientes variou de 60 a 70 anos, com média de 63,72 anos. A média de idade dos pacientes que apresentaram complicação CD ≥ III-a foi de 69,27 anos. Das pacientes femininas, 12,50% apresentaram complicações CD ≥ III-a, e entre os masculinos, 10,41%. Em relação à extensão cirúrgica, as gastrectomias totais (GT) representaram 45,83% (22) dos casos, dos quais 12,5% (6) apresentaram complicação CD ≥ III-a. Houve diferença no grupo de complicação CD ≥ III-a, com maior proporção para GT e ASA III, (p<0,001 e p=0,074, respectivamente), assim como P-POSSUM e GT (p<0,001 e p=0,065, respectivamente).

Tabela 1
Critérios de POSSUM/P-POSSUM 13 13 Horzic M, Kopljar M, Cupurdija K, Bielen DV, Vergles D, Lackovic Z. Comparison of P-POSSUM and Cr-POSSUM scores in patients undergoing colorectal cancer resection. Arch Surg. 2007;142(11):1043-8. doi: 10.1001/archsurg.142.11.1043.
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Tabela 2
Dados clínicodemográficos agrupados por complicações de Clavien-Dindo.

A estratificação dos pacientes, segundo os Critérios Prognósticos de Glasgow, resultou em: 37,50% (18 pacientes) com CPG 0, apresentando CD < III-a; 41,6% (20) com CPG 1 e 20,8% (10) com CPG 2. Dos dois últimos subgrupos, 4,1% (02) e 18,8% (09), respectivamente, apresentaram complicações cirúrgicas com necessidade de intervenção ou internação em unidade de terapia intensiva (CD ≥ III-a). Não houve registro de óbito nos primeiros 30 dias de pós-operatório (Figura 2).

Figura 2
Relação entre CPG e complicações pós-operatórias.

Figura 3
Média de morbidade observada pelo P-POSSUM.

Figura 4
Média de morbidade observada pelo O-POSSUM.

Figura 5
Média de morbidade do Índice Fisiológico POSSUM.

Figura 6
Relação entre complicações pós-operatórias e classificação de ASA.

Além da idade, também foram calculadas as médias das seguintes variáveis: CPG (0,83), P-POSSUM (16,95) e O-POSSUM (2,25), obtendo estimativa da morbidade pelo parâmetro POSSUM, em média de 30,82%.

Segundo avaliação do risco cirúrgico, pela classificação da ASA, os pacientes que obtiveram ASA I (8,3%) apresentaram complicação CD < III-a; nos grupos ASA II e III, 16,7% e 6,3% apresentaram complicação de CD ≥ III-a contra 64,6% e 4,2% com complicação CD < III-a respectivamente. As pontuações ASA IV ou V contraindica o procedimento, portanto não houve pacientes.

Ao utilizar a regressão univariada, as variáveis P-POSSUM (OR: 1,211; IC: 1,044-1,404) e CPG (OR: 85,261; IC: 24,909-291,831) foram capazes de predizer isoladamente as complicações CD ≥ III-a, enquanto O-POSSUM (OR: 0,897; IC: 0,398-2,021) e GT (OR: 1,575; IC: 0,407-6,095) não foram associadas ao desfecho quando testadas de forma isolada (Tabela 3).

Tabela 3
Análise univariada dos escores prognósticos e realização de gastrectomia total, em relação ao desfecho CD ≥ III-a.

Na análise multivariada, houve associação independente ao desfecho de complicação CD ≥ III-a, com as variáveis CPG (OR: 114,865; IC: 15,430-855,086), O-POSSUM (OR: 2,238; IC: 1,790-2,797) e P-POSSUM (OR: 1,133; IC: 1,086-1,181), como demonstrado na tabela 4. Também mostra que neste modelo, apesar de apresentar proporcionalmente mais complicações nas gastrectomias totais, não houve associação quanto à extensão cirúrgica da gastrectomia.

Tabela 4
Análise multivariada dos escores prognósticos e Gastrectomia Total em relação ao desfecho CD ≥ III-a.

DISCUSSÃO

O estudo mostra que há uma relação de positividade do CPG com o desfecho da apresentação de complicações (CD ≥ III-a). A cada ponto que sobe a escala, aumenta em 85,281 a chance de surgirem complicações CD ≥ III-a, quando visto de forma isolada, e 114,86 a razão de chance deste desfecho no modelo multivariado. No estudo de Kubota et al., foi avaliada a resposta inflamatória sistêmica por meio do CPG e a gravidade das complicações pós-operatórias, pela classificação de Clavien-Dindo, em 1.017 pacientes, após resseção curativa de câncer gástrico. Os autores mostraram que o CPG não foi associado à incidência de complicações (p=0,9289) e que 163 pacientes (16,0%) tiveram complicações pós-operatórias de CD ≥ II14. A não convergência com os nossos resultados talvez ocorra pela especificidade da relação do CPG com complicações que necessitam de intervenções (CD ≥ III-a), marco este que interessa ao cirurgião e que, por sinal, pode também constituir um fator prognóstico adicional para câncer gástrico, após ressecção curativa. Esta forte associação entre o CPG e incidência de complicações (CD ≥ III-a) pode, de forma eficiente, com rapidez e simplicidade, prever a probabilidade de aparecimento de complicações cirúrgicas graves, sem cálculos matemáticos complexos. Assim sendo, essa associação pode ser utilizada na avaliação prognóstica em procedimentos cirúrgicos com intenção curativa1515 Figueiredo HF, Da Rosa RD, Fujimoto LBM, Pereira RMA, Westphal FL, Nakajima GS. Desempenho do escore prognóstico de Glasgow no câncer gástrico. Medicina. 2021;54(4):e-174590. doi: 10.11606/issn.21767262.rmrp.2021.174590.
https://doi.org/10.11606/issn.21767262.r...
,1616 Poziomyck AK, Cavazzola LT, Coelho LJ, Lameu EB, Weston AC, Moreira LF. Nutritional assessment methods as predictors of postoperative mortality in gastric cancer patients submitted to gastrectomy. Rev Col Bras Cir. 2017;44(5):482-90. doi: 10.1590/0100-69912017005010.
https://doi.org/10.1590/0100-69912017005...
.

Nossos dados indicam que CPG e P-POSSUM tiveram associação com o desfecho CD ≥ III-a em análise univariada. Quando analisados em modelo multivariado, CPG e os índices fisiológicos POSSUM (P-POSSUM e O-POSSUM) foram preditores independentes de CD ≥ III-a. A extensão do procedimento cirúrgico (gastrectomia total vs. subtotal) não teve associação com o desfecho CD ≥ III-a na análise univariada, e, na multivariada, GT não foi preditor independente de CD ≥ III-a. Em relação ao acesso utilizado no procedimento cirúrgico (gastrectomia laparoscópica vs. aberta), não podemos relacionar esta variável com complicação CD ≥ III-a, apesar do acesso laparoscópico resultar em menor taxa de complicações pós-operatórias, menor tempo de internação e recuperação mais rápida. O acesso laparoscópico fica reservado ainda a casos mais iniciais, menor morbidade do paciente e uma seleção de doente menos complicado1717 Mortensen K, Nilsson M, Slim K, Schäfer M, Mariette C, Braga M, et al. Consensus guidelines for enhanced recovery after gastrectomy. Brit J Surg. 2014;101(10):1209-29. doi: 10.1002/bjs.9582.
https://doi.org/10.1002/bjs.9582...

18 Haverkamp L, Weijs TJ, van der Sluis PC, van der Tweel I, Ruurda JP, van Hillegersberg R. Laparoscopic total gastrectomy versus open total gastrectomy for cancer: a systematic review and meta-analysis. Surg Endosc. 2013;27(5):1509-20. doi: 10.1007/s00464-012-2661-1.
https://doi.org/10.1007/s00464-012-2661-...
-1919 Etoh T, Honda M, Kumamaru H, Miyata H, Yoshida K, Kodera Y, et al. Morbidity and mortality from a propensity score-matched, prospective cohort study of laparoscopic versus open total gastrectomy for gastric cancer: data from a nationwide web-based database. Surg Endosc. 2018;32(6):2766-73. doi: 10.1007/s00464-017-5976-0.
https://doi.org/10.1007/s00464-017-5976-...
. Em contraposição, a gastrectomia robótica, em comparação com a laparoscópica para câncer gástrico, apresenta vantagens tanto operatórias (tempo operatório, perda sanguínea estimada, número de linfonodos recuperados) quanto perioperatórias (tempo até a primeira flatulência, tempo para reiniciar a ingestão oral, tempo de internação, complicações de Clavien-Dindo (CD) ≥ III, complicações pancreáticas), na ausência de diferenças claras de resultados oncológicos2020 Shen J, Feng X, Li Z, Wang Y. Comparison of short-term outcomes between robotic and laparoscopic distal gastrectomy performed by the same surgical team during the same period. Front Oncol. 2023;13:1174396. doi: 10.3389/fonc.2023.1174396.
https://doi.org/10.3389/fonc.2023.117439...

21 Guerrini GP, Esposito G, Magistri P, Serra V, Guidetti C, Olivieri T, et al. Robotic versus laparoscopic gastrectomy for gastric cancer: the largest metaanalysis. Int J Surg. 2020;82:210-28. doi: 10.1016/j.ijsu.2020.07.053.
https://doi.org/10.1016/j.ijsu.2020.07.0...
-2222 Zizzo M, Zanelli M, Sanguedolce F, Torricelli F, Morini A, Tumiati D, et al. Robotic versus laparoscopic gastrectomy for gastric cancer: an updated systematic review. Medicina (Kaunas). 2022;58(6):834. doi: 10.3390/medicina58060834.
https://doi.org/10.3390/medicina58060834...
.

A idade não revelou significância, tal como em cinco outros estudos de coortes mencionados na revisão sistemática e meta-análise, realizada por Figueiredo et al., em que foram identificadas 255 publicações e analisados 15 estudos1515 Figueiredo HF, Da Rosa RD, Fujimoto LBM, Pereira RMA, Westphal FL, Nakajima GS. Desempenho do escore prognóstico de Glasgow no câncer gástrico. Medicina. 2021;54(4):e-174590. doi: 10.11606/issn.21767262.rmrp.2021.174590.
https://doi.org/10.11606/issn.21767262.r...
. Porém, na revisão retrospectiva com 650 pacientes submetidos a cirurgia eletiva para câncer gástrico, conduzida pelo Ishizuka et al., o CPG foi associado à idade (≤70/>70 anos) com uma taxa de risco de 2,348; 95% de intervalo de confiança (1,570-3,511)2323 Ishizuka M, Oyama Y, Abe A, Tago K, Tanaka G, Kubota K. Clinical significance of an inflammation-based prognostic system for gastric cancer patients with a preoperative normal serum level of carcinoembryonic antigen. Anticancer Res. 2014;34(12):7219-26..

De uma forma geral, a literatura mostra que os índices O-POSSUM/P-POSSUM sobrevaloram o risco de morbimortalidade, gerando estimativas de aparecimento de complicações bem acima do apresentado. Um exemplo pode ser observado na revisão retrospectiva de cinco anos dos casos de 81 doentes com adenocarcinoma gástrico operados, em que P-POSSUM previu o dobro (12,4%) da mortalidade verificada (6,2%) e superestimou as complicações pós-operatórias, sobretudo nos grupos de maior risco, com uma incidência observada de 33,3% contra a esperada de 63%9. Isto também foi observado por Carvalho-e-Carvalho et al. em pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos para câncer colorretal, em que sua morbidade real foi de 15,6%, em contraposição com a morbidade esperada de 39,2%, de acordo com P-POSSUM. Este dado foi confirmado por nossa análise e nossa amostra segue um padrão de distribuição semelhante, apesar de não haver registro de óbitos nos 30 dias de pós-operatório1414 Kubota T, Hiki N, Nunobe S, Kumagai K, Aikou S, Watanabe R, et al. Significance of the inflammation-based Glasgow prognostic score for short- and longterm outcomes after curative resection of gastric cancer. J Gastrointest Surg. 2012;16(11):2037-44. doi: 10.1007/s11605-012-2036-x.
https://doi.org/10.1007/s11605-012-2036-...
,2424 Carvalho-E-Carvalho ME, De-Queiroz FL, Martins-Da-Costa BX, WerneckCôrtes MG, Pires-Rodrigues V. Aplicação dos escores POSSUM e P-POSSUM como preditores de morbimortalidade em cirurgia colorretal. Rev Col Bras Cir. 2018;45(1):e1347. doi: 10.1590/0100-6991e-20181347.
https://doi.org/10.1590/0100-6991e-20181...

25 Mukherjee S, Kedia A, Goswami J, Chakraborty A. Validity of P-POSSUM in adult cancer surgery (PACS). J Anaesthesiol Clin Pharmacol. 2022;38(1):61-5. doi: 10.4103/joacp.JOACP_128_20.
https://doi.org/10.4103/joacp.JOACP_128_...

26 Dutta S, Al-Mrabt NM, Fullarton GM, Horgan PG, McMillan DC. A comparison of POSSUM and GPS models in the prediction of post-operative outcome in patients undergoing oesophago-gastric cancer resection. Ann Surg Oncol. 2011;18(10):2808-17. doi: 10.1245/s10434-011-1676-5.
https://doi.org/10.1245/s10434-011-1676-...
-2727 Dutta S, Horgan PG, McMillan DC. POSSUM and its related models as predictors of postoperative mortality and morbidity in patients undergoing surgery for gastro-oesophageal cancer: a systematic review. World J Surg. 2010;34(9):2076-82. doi: 10.1007/s00268-010-0685-z.
https://doi.org/10.1007/s00268-010-0685-...
.

Com o resultado deste estudo, podemos sugerir o emprego de possibilidades para diminuir o estado inflamatório do paciente no período pré-operatório, por exemplo utilizando imunonutrição, apesar de que o possível benefício da redução de complicações após grandes procedimentos cirúrgicos para câncer gastrointestinal, em geral, não foi reproduzido em pacientes submetidos à gastrectomia1717 Mortensen K, Nilsson M, Slim K, Schäfer M, Mariette C, Braga M, et al. Consensus guidelines for enhanced recovery after gastrectomy. Brit J Surg. 2014;101(10):1209-29. doi: 10.1002/bjs.9582.
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. Assim, embora um benefício não possa ser excluído, atualmente não há evidências suficientes para apoiar a administração de rotina de nutrientes imunoestimulantes (geralmente arginina, glutamina, ácidos graxos ω-3 e/ou nucleotídeos) neste grupo de pacientes1717 Mortensen K, Nilsson M, Slim K, Schäfer M, Mariette C, Braga M, et al. Consensus guidelines for enhanced recovery after gastrectomy. Brit J Surg. 2014;101(10):1209-29. doi: 10.1002/bjs.9582.
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.

O processo inflamatório cria um ambiente tóxico para as células porque torna o ambiente rico em radicais livres de oxigênio que, associado à superexpressão de determinados genes, levam a lesões exponenciais do DNA celular2828 Machlowska J, Baj J, Sitarz M, Maciejewski R, Sitarz R. Gastric cancer: epidemiology, risk factors, classification, genomic characteristics and treatment strategies. Int J Mol Sci. 2020;21(11):4012. doi: 10.3390/ijms21114012.
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,2929 Figueiredo C, Machado JC, Pharoah P, Seruca R, Sousa S, Carvalho R, et al. Helicobacter pylori and interleukin 1 genotyping: an opportunity to identify high-risk individuals for gastric carcinoma. J Natl Cancer Inst. 2002;94(22):1680-7. doi: 10.1093/jnci/94.22.1680.
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. A inflamação que acompanha e cresce junto com os tumores está implicada também na sequência de eventos que conduzem o paciente à perda de peso, desnutrição e caquexia, comprometendo o tratamento e, por conseguinte, o prognóstico desses pacientes2929 Figueiredo C, Machado JC, Pharoah P, Seruca R, Sousa S, Carvalho R, et al. Helicobacter pylori and interleukin 1 genotyping: an opportunity to identify high-risk individuals for gastric carcinoma. J Natl Cancer Inst. 2002;94(22):1680-7. doi: 10.1093/jnci/94.22.1680.
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30 Toh JWT, Wilson RB. Pathways of gastric carcinogenesis, Helicobacter pylori virulence and interactions with antioxidant systems, vitamin c and phytochemicals. Int J Mol Sci. 2020;21(17):6451. doi: 10.3390/ijms21176451.
https://doi.org/10.3390/ijms21176451...

31 Leung WK, Sung JJ. Review article: intestinal metaplasia and gastric carcinogenesis. Aliment Pharmacol Ther. 2002;16(7):1209-16. doi: 10.1046/j.13652036.2002.01300. x.
https://doi.org/10.1046/j.13652036.2002....
-3232 Jin Y, Zhao L, Peng F. Prognostic impact of serum albumin levels on the recurrence of stage I non-small cell lung cancer. Clinics (São Paulo). 2013;68(5):686-93. doi: 10.6061/clinics/2013(05)17.
https://doi.org/10.6061/clinics/2013(05)...
. Desde a publicação de McMillan, alguns poucos serviços mundiais passaram a adotar as medidas de PCR e albumina como obrigatórias na avaliação pré-operatória1212 McMillan DC. The systemic inflammation-based Glasgow Prognostic Score: a decade of experience in patients with cancer. Cancer Treat Rev. 2013;39(5):534-40. doi: 10.1016/j.ctrv.2012.08.003.
https://doi.org/10.1016/j.ctrv.2012.08.0...
. No Brasil, ainda não há uma discussão ampla sobre este tema, portanto esses marcadores não são solicitados pelos serviços cirúrgicos, rotineiramente.

Presume-se que a aplicação clínica principal de nossos achados seja que o uso do CPG poderá nortear as melhores escolhas das equipes cirúrgicas, inclusive optando-se por terapêuticas inicialmente não cirúrgicas em pacientes com grande intensidade da resposta inflamatória, a partir da realização de exames laboratoriais simples e amplamente disponíveis.

Importante ressaltar que existem taxas de complicações diferenciadas em populações diferentes. Vários fatores interferem nesse processo, como, por exemplo, os protocolos de cada serviço para monitorar, examinar, avaliar riscos, organizar o sistema de saúde para atendimento da população, dentre outras variáveis3333 Leedham SJ, Schier S, Thliveris AT, Halberg RB, Newton MA, Wright NA. From gene mutations to tumours: stem cells in gastrointestinal carcinogenesis. Cell Prolif. 2005;38(6):387-405. doi: 10.1111/j.1365-2184.2005.00359. x.
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. Isto talvez justifique as diferentes taxas de complicações pós-operatórias entre os estudos ocidentais e orientais2323 Ishizuka M, Oyama Y, Abe A, Tago K, Tanaka G, Kubota K. Clinical significance of an inflammation-based prognostic system for gastric cancer patients with a preoperative normal serum level of carcinoembryonic antigen. Anticancer Res. 2014;34(12):7219-26.. Exemplifica-se isso com a detecção precoce nos países asiáticos onde, além de diagnosticar numa fase da doença menos avançada que no Ocidente, a diferença de idade do paciente ocidental no momento do diagnóstico pode superar em muito a idade do oriental diagnosticado, o que influencia diretamente na resposta ao tratamento2828 Machlowska J, Baj J, Sitarz M, Maciejewski R, Sitarz R. Gastric cancer: epidemiology, risk factors, classification, genomic characteristics and treatment strategies. Int J Mol Sci. 2020;21(11):4012. doi: 10.3390/ijms21114012.
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,3333 Leedham SJ, Schier S, Thliveris AT, Halberg RB, Newton MA, Wright NA. From gene mutations to tumours: stem cells in gastrointestinal carcinogenesis. Cell Prolif. 2005;38(6):387-405. doi: 10.1111/j.1365-2184.2005.00359. x.
https://doi.org/10.1111/j.1365-2184.2005...
.

No período da pandemia de SARS-COV-2, o diagnóstico de câncer gástrico com possibilidade terapêutica cirúrgica com intuito curativo ficou muito abaixo do esperado. Neste período, houve também redução significativa de volume de cirurgias eletivas, acrescentado o fato de que alguns pacientes não tinham PCR mensurado na ausência de quadro infeccioso e foram excluídos do estudo lá no início. Estes fatores influenciaram no reduzido tamanho da amostra. Além destes, os procedimentos cirúrgicos foram realizados em dois hospitais, por diferentes equipes.

A dosagem da PCR e da albumina que estão presentes no CPG se mostraram promissores na previsão das complicações, o que cabe trazer a discussão da necessidade de incluir tais parâmetros no estadiamento e preparo cirúrgico pré-operatório obrigatório nesta enfermidade e, possivelmente, em toda neoplasia maligna. Para corroborar esta associação entre CPG e CD ≥ III-a, sugere-se que, futuramente, sejam realizados mais estudos sobre o tema, com maior número de amostra, principalmente estudos prospectivos, com realce nos ensaios clínicos randomizados.

CONCLUSÃO

Independentemente dos fatores limitantes acima apontados, este estudo mostrou que o Critério Prognóstico de Glasgow demonstrou prever no pré-operatório complicações cirúrgicas graves num modelo controlado para complicações intra e perioperatórias, representadas pelo O-POSSUM e P-POSSUM. Sugere-se a realização de estudos mais aprofundados, no sentido da instituição de estratégias, visando à minimização da resposta inflamatória no período pré-operatório.

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  • Fonte de financiamento:

    nenhuma.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    03 Out 2023
  • Aceito
    12 Fev 2024
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