Acessibilidade / Reportar erro

Influência do alinhamento de preferências dos operadores no uso das informações gerenciais* * Artigo apresentado na XX USP International Conference in Accounting, julho de 2020. ,** ** Esta pesquisa foi realizada com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) - Código de financiamento 001.

RESUMO

O objetivo deste artigo foi avaliar a influência do alinhamento de preferências dos operadores por agregar ou desagregar no uso de informações gerenciais. Embora pesquisas apontem que informações contábeis têm potencial para apoiar o processo decisório, elas também sinalizam a utilização limitada. Entretanto, essas pesquisas basicamente investigaram aspectos como informações recebidas versus demandadas, tempestividade, aspectos legais e societários. Questiona-se se a divergência de preferências na forma de apresentação das informações, entre quem as elabora e quem as usa ou deveria usar, poderia também ser um fator explicativo. Assim, busca-se investigar, sob a lente da teoria da contabilidade mental (TCM), se existem diferenças nas preferências dos operadores que ajudem a explicar a pouca utilização das informações contábeis para apoiar o processo decisório. A relevância deste artigo é compreender melhor as razões da pouca utilização das informações contábeis para apoiar o processo decisório, apesar do seu potencial contributivo, visando a continuidade e a prosperidade das organizações. Como impacto na área, este artigo ajuda os preparadores a compreender e contemplar as demandas e preferências dos usuários, resultando em maior uso das informações. Assim, esperam-se decisões embasadas sem influência de oportunismos, aleatoriedade ou viés de quem as prepara. Operacionalizou-se um quase-experimento com 1.074 estudantes, sendo 550 de ciências contábeis (preparadores) e 524 de administração (usuários) de quatro universidades (públicas e privadas) do sul do Brasil. Trata-se de pesquisa empírica, quantitativa, descritiva e aplicada. Para análise dos dados, utilizou-se estatística descritiva, regressões logísticas e análise de homogeneidade (homogeneity analysis by menos of least square - HOMALS). Os operadores (preparadores e usuários), na maioria dos cenários, apresentam preferência por desagregar as informações, independentemente se essas seguem ou não os pressupostos da TCM. Observa-se que a busca pelo volume informacional para tomada de decisão mais assertiva predomina sobre os ganhos psicológicos e a função de valor percebida pelo indivíduo. Quem prefere informações desagregadas dispõe-se a alinhar/utilizar informações contábeis para gestão.

Palavras-chave:
alinhamento de preferências; informações contábeis; preparadores e usuários; teoria da contabilidade mental

ABSTRACT

This article aimed to evaluate the influence of the alignment of operators’ preferences for aggregating or disaggregating on the use of managerial information. Although studies indicate that accounting information has the potential to support the decision-making process, they also point to its limited use. However, those studies have basically investigated aspects such as information received versus demanded, timeliness, and legal and corporate aspects. There remains the question of whether divergences in preferences regarding the way information is presented, between those who elaborate and those who use it, could also be an explanatory factor. Thus, this study sought to investigate, under the lens of Mental Accounting Theory (MAT), whether there are differences in operators’ preferences that help to explain the low use of accounting information to support the decision-making process. The relevance of this article lies in better understanding the reasons for the low use of accounting information to support the decision-making process, despite its contributive potential, seeking organizational continuity and prosperity. As an impact on the area, this article helps preparers to understand and contemplate users’ demands and preferences, resulting in greater use of information. The aim is for informed decisions to be taken without the influence of opportunisms, randomness, or the bias of whoever prepares the information. A quasi-experiment was operationalized with 1,074 students, 550 of accounting courses (preparers) and 524 of management courses (users) at four (public and private) universities in the south of Brazil. The study involves empirical, quantitative, descriptive, and applied research. For the data analysis, descriptive statistics, logistic regressions, and homogeneity analysis by means of alternating least squares (HOMALS) were used. In most of the scenarios, the operators (preparers and users) presented a preference for disaggregating the information, independently of whether they follow the assumptions of MAT or not. It was observed that the search for informational volume for more assertive decision making predominates over the psychological gains and the value function perceived by the individual. Those who prefer disaggregated information are willing to align/use accounting information for management.

Keywords:
alignment of preferences; accounting information; preparers and users; mental accounting theory

1. INTRODUÇÃO

A percepção do potencial contributivo das informações contábeis gerenciais para apoiar o processo decisório está consolidada na literatura da área (Fernandes et al., 2011Fernandes, F. C., Klann, R. C., & Figueredo, M. S. (2011). A utilidade da informação contábil para a tomada de decisões: uma pesquisa com usuários alunos. Contabilidade Vista & Revista, 22(3), 99-126.;Moreira et al., 2013Moreira, R. L., Encarnação, L. V., de Almeida Bispo, O. N., Colauto, R. D., & Angotti, M. (2013). A importância da informação contábil no processo de tomada de decisão nas micro e pequenas empresas. Revista Contemporânea de Contabilidade, 10(19), 119-140.). Apesar disso, as pesquisas indicam que sua utilização pelos gestores é limitada (Amoako, 2013Amoako, G. K. (2013). Accounting practices of SMEs: A case study of Kumasi Metropolis in Ghana. International Journal of Business and Management, 8(24), 73.;Armitage et al., 2016Armitage, H. M., Webb, A., & Glynn, J. (2016). The use of management accounting techniques by small and medium‐sized enterprises: A field study of Canadian and Australian practice. Accounting Perspectives, 15(1), 31-69.;Maseko & Manyani, 2011Maseko, N., & Manyani, O. (2011). Accounting practices of SMEs in Zimbabwe: An investigative study of record keeping for performance measurement (A case study of Bindura). Journal of Accounting and Taxation, 3(8), 158-161.;Santos et al., 2009Santos, V., Rengel, S., Paterno, A. A. P., & Beuren, I. M. (2009). Instrumentos da contabilidade gerencial utilizados em micro e pequenas empresas comerciais e disponibilizados por empresas de serviços contábeis. Revista Catarinense da Ciência Contábil, 8(24), 41-58.,2016Santos, V. D., Dorow, D. R., & Beuren, I. M. (2016). Práticas gerenciais de micro e pequenas empresas. Revista Ambiente Contábil, 8(1), 153-186.;Stroeher & Freitas, 2008Stroeher, A. M., & Freitas, H. (2008). O uso das informações contábeis na tomada de decisão em pequenas empresas. Revista RAUSP-e, 1(1), 1-25.). Dentre as razões para o pouco uso, aponta-se o fato de o enfoque das pesquisas se limitar a olhares pontuais, como informações recebidas versus demandadas, temporalidade e tempestividade e aspectos tributários, legais e societários.

Outra razão pode ser o desalinhamento de preferências dos operadores (preparadores e gestores) e mesmo da técnica recomendada (Amoako, 2013Amoako, G. K. (2013). Accounting practices of SMEs: A case study of Kumasi Metropolis in Ghana. International Journal of Business and Management, 8(24), 73.;Armitage et al., 2016Armitage, H. M., Webb, A., & Glynn, J. (2016). The use of management accounting techniques by small and medium‐sized enterprises: A field study of Canadian and Australian practice. Accounting Perspectives, 15(1), 31-69.;Maseko & Manyani, 2011Maseko, N., & Manyani, O. (2011). Accounting practices of SMEs in Zimbabwe: An investigative study of record keeping for performance measurement (A case study of Bindura). Journal of Accounting and Taxation, 3(8), 158-161.;Santos et al., 2016Santos, V. D., Dorow, D. R., & Beuren, I. M. (2016). Práticas gerenciais de micro e pequenas empresas. Revista Ambiente Contábil, 8(1), 153-186.). Logo, para obter maior sinergia das partes envolvidas em termos de esforços e oportunidades, faz-se necessário o aperfeiçoamento do processo (Santos et al., 2009Santos, V., Rengel, S., Paterno, A. A. P., & Beuren, I. M. (2009). Instrumentos da contabilidade gerencial utilizados em micro e pequenas empresas comerciais e disponibilizados por empresas de serviços contábeis. Revista Catarinense da Ciência Contábil, 8(24), 41-58.). Para tanto, quem prepara as informações deve melhorar os modos de preparação, apresentação e comunicação para identificar e incorporar as preferências e demandas dos usuários (Amoako, 2013Amoako, G. K. (2013). Accounting practices of SMEs: A case study of Kumasi Metropolis in Ghana. International Journal of Business and Management, 8(24), 73.;Maseko & Manyani, 2011Maseko, N., & Manyani, O. (2011). Accounting practices of SMEs in Zimbabwe: An investigative study of record keeping for performance measurement (A case study of Bindura). Journal of Accounting and Taxation, 3(8), 158-161.). Isso implica em compreender que a familiaridade e a consciência dos gestores sobre a utilidade das informações nem sempre estarão em sintonia com o idealizado por quem as prepara (Santos et al., 2016Santos, V. D., Dorow, D. R., & Beuren, I. M. (2016). Práticas gerenciais de micro e pequenas empresas. Revista Ambiente Contábil, 8(1), 153-186.). O desafio reside em identificá-las, compreendê-las e alinhá-las.

Diante desse dilema de alto potencial contributivo, mas pouca utilização, e da insuficiência das explicações tradicionais, levanta-se, neste estudo, a hipótese de que investigar esse fenômeno sob a lente da teoria da contabilidade mental (TCM), mais especificamente sobre as preferências dos operadores por agregar ou desagregar informações, pode contribuir para sua compreensão.

As decisões são influenciadas pelas informações disponíveis, características cognitivas e experiências vividas (Faraci et al., 2013Faraci, P., Lock, M., & Wheeler, R. (2013). Assessing leadership decision-making styles: Psychometric properties of the leadership Judgement indicator. Psychology Research and Behavior Management, 6, 117-123.;Luft et al., 2016Luft, J., Shields, M. D., & Thomas, T. F. (2016). Additional information in accounting reports: Effects on management decisions and subjective performance evaluations under causal ambiguity. Contemporary Accounting Research, 33(2), 526-550.). Assim, informações importantes para uns são ignoradas por outros, provocando decisões e resultados distintos (Faraci, et al., 2013Faraci, P., Lock, M., & Wheeler, R. (2013). Assessing leadership decision-making styles: Psychometric properties of the leadership Judgement indicator. Psychology Research and Behavior Management, 6, 117-123.;Penolazzi et al., 2013Penolazzi, B., Leone, L., & Russo, P. M. (2013). Individual differences and decision making: When the lure effect of gain is a matter of size. PloSOne, 8(3), e58946.).

A TCM investiga tais situações por um conjunto de operações cognitivas usadas para organizar, avaliar e acompanhar suas decisões (Kahneman & Tversky, 1984Kahneman, D., & Tversky, A. (1984). Choices, values, and frames. The American Psychologist, 39(4), 341-350.;Thaler, 1980Thaler, R. (1980). Toward a positive theory of consumer choice. Journal of Economic Behavior & Organization, 1(1), 39-60.,1999Thaler, R. H. (1999). Mental accounting matters. Journal of Behavioral Decision Making, 12(3), 183-206.,2008Thaler, R. H. (2008). Mental accounting and consumer choice. Marketing Science, 27(1), 15-25.). Dentre os elementos da teoria, encontram-se as preferências por agregação (apresentação sintetizada) e desagregação (apresentação analítica) das informações, que se dividem em quatro perspectivas: (i) desagregar ganhos múltiplos; (ii) agregar perdas múltiplas; (iii) agregar ganhos mistos (ganhos maiores com perdas menores); e (iv) desagregar perdas mistas (perdas maiores com ganhos menores).

Existem diversos estudos sobre as preferências dos usuários (Bonner et al., 2014Bonner, S. E., Clor-Proell, S. M., & Koonce, L. (2014). Mental accounting and disaggregation based on the sign and relative magnitude of income statement items. The Accounting Review, 89(6), 2087-2114.;Jackson et al., 2010Jackson, S. B., Rodgers, T. C., & Tuttle, B. (2010). The effect of depreciation method choice on asset selling prices. Accounting, Organizations and Society, 35(8), 757-774.;Suave, 2017Suave, R. (2017). Preferências dos usuários por agregação e desagregação em relatórios internos para fins de ratcheting de metas e avaliação de desempenho [Doctoral Thesis]. Universidade de São Paulo.), bem como sobre a influência das características dos indivíduos em decisões (Brooks et al., 2018Brooks, C., Sangiorgi, I., Hillenbrand, C., & Money, K. (2018). Why are older investors less willing to take financial risks? International Review of Financial Analysis, 56(C), 52-72.;Geetha & Selvakumar, 2016Geetha,S. N., & Selvakumar, M. M. (2016). An analysis on the factors influencing risk tolerance level of individual investors. International Journal of Business Excellence, 9(2), 253-264.). Porém, o foco desses estudos não foi identificar possíveis razões para o baixo uso das informações contábeis para gestão com olhar simultâneo para as preferências por agregar ou desagregar (PADs) informações, tanto sob a perspectiva de quem as prepara quanto de quem as usa ou deveria usar (Fennema & Koonce, 2010Fennema, M. G., & Koonce, L. (2010). Mental accounting in financial reporting and voluntary disclosure [Working Paper]. Social Science Research Network.https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1717078
https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?...
;Sprinkle, 2003Sprinkle, G. B. (2003). Perspectives on experimental research in managerial accounting. Accounting, Organizations and Society, 28(2-3), 287-318.). Dessa forma, essa constitui-se na lacuna da pesquisa, bem como contribuição para a literatura do tema.

Assim, a questão que norteia a pesquisa é: qual a influência do alinhamento de PADs dos operadores no uso de informações gerenciais? Para responder tal questionamento, tem-se como objetivo avaliar a influência do alinhamento de preferências dos operadores por agregar ou desagregar no uso de informações gerenciais.

A justificativa reside na insuficiência ou incompletude das razões apontadas pelas pesquisas, com olhar tradicional sobre pouca utilização das informações gerenciais para apoiar a tomada de decisões, apesar de a literatura indicar seu potencial contributivo para a gestão eficiente (Amoako, 2013Amoako, G. K. (2013). Accounting practices of SMEs: A case study of Kumasi Metropolis in Ghana. International Journal of Business and Management, 8(24), 73.;Armitage et al., 2016Armitage, H. M., Webb, A., & Glynn, J. (2016). The use of management accounting techniques by small and medium‐sized enterprises: A field study of Canadian and Australian practice. Accounting Perspectives, 15(1), 31-69.;Maseko & Manyani, 2011Maseko, N., & Manyani, O. (2011). Accounting practices of SMEs in Zimbabwe: An investigative study of record keeping for performance measurement (A case study of Bindura). Journal of Accounting and Taxation, 3(8), 158-161.;Mendes et al., 2019Mendes, A. C. A., Lunkes, R. J., Menegazzo, G. D., Schnorrenberger, D., & Lavarda, C. E. F. (2019). Características observáveis dos usuários e a utilização da informação contábil: um estudo com base na teoria dos escalões superiores. Enfoque, 38(1), 67.;Menegazzo et al., 2017Menegazzo, G. D., Lunkes, R. J., Mendes, A., & Schnorrenberge, D. (2017). Relação entre características demográficas dos usuários e uso de informações para tomada de decisões: um estudo em micro e pequenas empresas. Journal of Globalization, Competitiveness & Governability, 11(3), 90-110.;Santos et al., 2009Santos, V., Rengel, S., Paterno, A. A. P., & Beuren, I. M. (2009). Instrumentos da contabilidade gerencial utilizados em micro e pequenas empresas comerciais e disponibilizados por empresas de serviços contábeis. Revista Catarinense da Ciência Contábil, 8(24), 41-58., 2016;Stroeher & Freitas, 2008Stroeher, A. M., & Freitas, H. (2008). O uso das informações contábeis na tomada de decisão em pequenas empresas. Revista RAUSP-e, 1(1), 1-25.). Justifica-se, também, pela busca da compreensão da influência da dimensão perceptual no processo decisório, implicando em potencial auxílio às organizações de menor porte, visando sua continuidade e crescimento (Fernandes et al., 2011Fernandes, F. C., Klann, R. C., & Figueredo, M. S. (2011). A utilidade da informação contábil para a tomada de decisões: uma pesquisa com usuários alunos. Contabilidade Vista & Revista, 22(3), 99-126.;Moreira et al., 2013Moreira, R. L., Encarnação, L. V., de Almeida Bispo, O. N., Colauto, R. D., & Angotti, M. (2013). A importância da informação contábil no processo de tomada de decisão nas micro e pequenas empresas. Revista Contemporânea de Contabilidade, 10(19), 119-140.).

Entretanto, apenas produzir informações não basta; essas devem estar alinhadas com as preferências e demandas dos usuários (Santos et al., 2016Santos, V. D., Dorow, D. R., & Beuren, I. M. (2016). Práticas gerenciais de micro e pequenas empresas. Revista Ambiente Contábil, 8(1), 153-186.). A contribuição para a literatura caracteriza-se pela busca da compreensão das preferências dos operadores e seu alinhamento, visando aumentar o uso para apoiar as decisões. O olhar simultâneo, paralelo e complementar para as preferências dos operadores por agregar ou desagregar informações contábeis de cunho gerencial, de modo que impacte no desejo de utilização (Fennema & Koonce, 2010Fennema, M. G., & Koonce, L. (2010). Mental accounting in financial reporting and voluntary disclosure [Working Paper]. Social Science Research Network.https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1717078
https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?...
;Siegel & Ramanauskas-Marconi, 1989Siegel, G., & Ramanauskas-Marconi, H. (1989). Behavioral accounting. South-Western Publishing Company.;Sprinkle, 2003Sprinkle, G. B. (2003). Perspectives on experimental research in managerial accounting. Accounting, Organizations and Society, 28(2-3), 287-318.), também se constitui numa novidade da pesquisa e, consequentemente, numa contribuição original para os estudos da área (Amoako, 2013Amoako, G. K. (2013). Accounting practices of SMEs: A case study of Kumasi Metropolis in Ghana. International Journal of Business and Management, 8(24), 73.;Armitage et al., 2016Armitage, H. M., Webb, A., & Glynn, J. (2016). The use of management accounting techniques by small and medium‐sized enterprises: A field study of Canadian and Australian practice. Accounting Perspectives, 15(1), 31-69.;Maseko & Manyani, 2011Maseko, N., & Manyani, O. (2011). Accounting practices of SMEs in Zimbabwe: An investigative study of record keeping for performance measurement (A case study of Bindura). Journal of Accounting and Taxation, 3(8), 158-161.;Menegazzo et al., 2017Menegazzo, G. D., Lunkes, R. J., Mendes, A., & Schnorrenberge, D. (2017). Relação entre características demográficas dos usuários e uso de informações para tomada de decisões: um estudo em micro e pequenas empresas. Journal of Globalization, Competitiveness & Governability, 11(3), 90-110.;Santos et al., 2016Santos, V. D., Dorow, D. R., & Beuren, I. M. (2016). Práticas gerenciais de micro e pequenas empresas. Revista Ambiente Contábil, 8(1), 153-186.).

No que tange aos aspectos práticos, oferece um apoio aos preparadores para alinharem suas preferências com as dos usuários, inibindo decisões influenciadas por informações aleatórias e oportunistas. Dentre os principais resultados, destaca-se que a compreensão e o alinhamento de preferência dos operadores podem levar à melhor utilização das informações contábeis gerenciais e, assim, contribuir para minimizar problemas de compreensão e baixo uso das informações apontados por estudos anteriores (Santos et al., 2009Santos, V., Rengel, S., Paterno, A. A. P., & Beuren, I. M. (2009). Instrumentos da contabilidade gerencial utilizados em micro e pequenas empresas comerciais e disponibilizados por empresas de serviços contábeis. Revista Catarinense da Ciência Contábil, 8(24), 41-58.,2016Santos, V. D., Dorow, D. R., & Beuren, I. M. (2016). Práticas gerenciais de micro e pequenas empresas. Revista Ambiente Contábil, 8(1), 153-186.;Stroeher & Freitas, 2008Stroeher, A. M., & Freitas, H. (2008). O uso das informações contábeis na tomada de decisão em pequenas empresas. Revista RAUSP-e, 1(1), 1-25.). Complementarmente, demonstra-se que, em cenários gerenciais, os princípios da TCM são colocados em segundo plano para maximizar o poder informacional para a tomada de decisões mais assertiva.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 TCM

O processo de contabilidade mental é um mecanismo de organização mental das contas e transações proposto por RichardThaler, em meados da década de 1980Thaler, R. (1980). Toward a positive theory of consumer choice. Journal of Economic Behavior & Organization, 1(1), 39-60.. Essas podem conter irregularidades psicológicas, por conseguinte, a percepção de valor de ganhos e perdas tem impacto nas opções escolhidas para maximizar a utilidade percebida (Kahneman & Tversky, 1984Kahneman, D., & Tversky, A. (1984). Choices, values, and frames. The American Psychologist, 39(4), 341-350.). Esse processo de contabilização mental pode ser enquadrado em três estágios (Thaler, 1980Thaler, R. (1980). Toward a positive theory of consumer choice. Journal of Economic Behavior & Organization, 1(1), 39-60.,1999Thaler, R. H. (1999). Mental accounting matters. Journal of Behavioral Decision Making, 12(3), 183-206.,2008Thaler, R. H. (2008). Mental accounting and consumer choice. Marketing Science, 27(1), 15-25.;Tversky & Kahneman, 1981Tversky, A., & Kahneman, D. (1981). The framing of decisions and the psychology of choice. Science, 211(4481), 453-458.).

O primeiro (conta mínima) examina as diferenças entre as possibilidades de escolha e seu custo/benefício (Tversky & Kahneman, 1981Tversky, A., & Kahneman, D. (1981). The framing of decisions and the psychology of choice. Science, 211(4481), 453-458.). No entanto, há uma maleabilidade sob certas condições de ambiguidade, isto é, os indivíduos podem deliberadamente empregar apenas certos custos e benefícios na conta analisada e ignorar os demais, bem como classificá-los em outras contas mentais (Cheema & Soman, 2006Cheema, A., & Soman, D. (2006). Malleable mental accounting: The effect of flexibility on the justification of attractive spending and consumption decisions. Journal of Consumer Psychology, 16(1), 33-44.). O chamado tópico de conta (segundo estágio) enquadra mentalmente os custos e benefícios de modo atraente (maior utilidade percebida), por meio da edição hedônica (Thaler, 1999Thaler, R. H. (1999). Mental accounting matters. Journal of Behavioral Decision Making, 12(3), 183-206.). ParaTversky e Kahneman (1981Tversky, A., & Kahneman, D. (1981). The framing of decisions and the psychology of choice. Science, 211(4481), 453-458.), essa é uma etapa de análise das possíveis consequências que a opção escolhida pode gerar. Já o terceiro estágio (conta global) engloba todos os fatores que impactam no processo decisório (Tversky & Kahneman, 1981Tversky, A., & Kahneman, D. (1981). The framing of decisions and the psychology of choice. Science, 211(4481), 453-458.). De acordo comThaler (1999Thaler, R. H. (1999). Mental accounting matters. Journal of Behavioral Decision Making, 12(3), 183-206.), essa é a etapa de “fechar a conta mental”, em que o indivíduo computa todos os dados e encerra a operação mental.

Para formar os estágios, vários aspectos são analisados na TCM. Basicamente, todos focam na mentalização de transações econômico-financeiras. Dentre esses, têm-se: utilidade da transação versus aquisição (Thaler, 1999Thaler, R. H. (1999). Mental accounting matters. Journal of Behavioral Decision Making, 12(3), 183-206.); dissociação de pagamento (Prelec & Loewenstein, 1998Prelec, D., & Loewenstein, G. (1998). The red and the black: Mental accounting of savings and debt. Marketing Science, 17(1), 4-28.); custos irrecuperáveis (Arkes & Blumer, 1985Arkes, H. R., & Blumer, C. (1985). The psychology of sunk cost. Organizational behavior and human decision processes, 35(1), 124-140.); bracketing de escolha (Read et al., 1999Read, D., Loewenstein, G., Rabin, M., Keren, G., & Laibson, D. (1999). Choice bracketing. In Elicitation of preferences (pp. 171-202). Springer.); e edição hedônica (Bonner et al., 2014Bonner, S. E., Clor-Proell, S. M., & Koonce, L. (2014). Mental accounting and disaggregation based on the sign and relative magnitude of income statement items. The Accounting Review, 89(6), 2087-2114.;Jackson et al., 2010Jackson, S. B., Rodgers, T. C., & Tuttle, B. (2010). The effect of depreciation method choice on asset selling prices. Accounting, Organizations and Society, 35(8), 757-774.;Suave, 2017Suave, R. (2017). Preferências dos usuários por agregação e desagregação em relatórios internos para fins de ratcheting de metas e avaliação de desempenho [Doctoral Thesis]. Universidade de São Paulo.). Optou-se por trabalhar com a edição hedônica, que se refere à preferência dos indivíduos por agregar ou desagregar informações, com regras baseadas na função de valor da teoria do prospecto (TP) (Thaler, 2008Thaler, R. H. (2008). Mental accounting and consumer choice. Marketing Science, 27(1), 15-25.).

Busca-se examinar o impacto das preferências e comportamentos dos indivíduos alinhados à contabilidade gerencial ao abordar a edição hedônica de modo comparativo entre preparadores e usuários de informações. Como exposto pela TCM, a operação mental pode ser dividida em quatro perspectivas: (i) desagregar ganhos múltiplos; (ii) agregar perdas múltiplas; (iii) agregar ganhos mistos; e (iv) desagregar perdas mistas.

Desagregar ganhos múltiplos para que o prazer dos ganhos seja ampliado e não unificado em apenas uma transação. Assim, percebe-se maior utilidade psicológica, mostrando-os separadamente, haja vista que a função de ganho é côncava (Thaler, 1999Thaler, R. (1980). Toward a positive theory of consumer choice. Journal of Economic Behavior & Organization, 1(1), 39-60.,2008Thaler, R. H. (2008). Mental accounting and consumer choice. Marketing Science, 27(1), 15-25.). Como exemplo,Thaler (1999Thaler, R. H. (1999). Mental accounting matters. Journal of Behavioral Decision Making, 12(3), 183-206.) apresenta que 64% das pessoas acham que alguém que ganha duas loterias com valores de $ 50 e $ 25, respectivamente, é mais feliz do que alguém que ganha $ 75 em uma única loteria, mesmo que o valor total seja igual.

Agregar perdas múltiplas, visto que a função de perdas é convexa. Assim, a utilidade psicológica percebida ao apresentar perdas separadamente é menor do que apresentá-las combinadas. Como exemplo, cartões de crédito se utilizam desse artifício para que o agrupamento de pequenas perdas se torne uma perda maior e, por conseguinte, reduzem a perda sentida por meio da utilidade percebida, como apresenta a TCM (Thaler, 2008Thaler, R. H. (2008). Mental accounting and consumer choice. Marketing Science, 27(1), 15-25.).

Ao agregar ganhos mistos, objetiva-se compensar a aversão à perda, já que o valor psicológico é mais acentuado no domínio das perdas. Como as pessoas não gostam de assumir que tiveram prejuízos, apresentar resultados (ganhos e perdas) separados pode resultar em utilidade percebida menor do que apresentá-los apenas pelo saldo (ganhos menos perdas), quando esse for positivo. Nesses casos, a agregação equivale a um “cancelamento” mental das perdas (Thaler, 2008Thaler, R. H. (2008). Mental accounting and consumer choice. Marketing Science, 27(1), 15-25.).

No campo das perdas, desagregar perdas mistas (perdas maiores do que os ganhos) pode aumentar a utilidade percebida. Isso porque a pessoa prefere mostrar que também obteve ganhos, mesmo que menores do que as perdas. Isso é o queThaler (2008Thaler, R. H. (2008). Mental accounting and consumer choice. Marketing Science, 27(1), 15-25.) denomina esperança de dias melhores após a tempestade.

A TCM difere da TP ao apresentar combinações de cenários e não visões isoladas, com resultados únicos e unidimensionais (Thaler, 2008Thaler, R. H. (2008). Mental accounting and consumer choice. Marketing Science, 27(1), 15-25.). Para a análise da TCM, é necessário expandir as perspectivas de decisão dos indivíduos, porém todas devem ser medidas na mesma dimensão e unidade de medida. Devido ao posicionamento de cada operador (preparador ou usuário) perante a manifestação de preferência a ser realizada, presumem-se diferenças em suas preferências, como apontado porSiegel e Ramanauskas-Marconi (1989Siegel, G., & Ramanauskas-Marconi, H. (1989). Behavioral accounting. South-Western Publishing Company.).

2.2 Informações Contábeis Gerenciais

Ao tratar de informações contábeis alinhadas à contabilidade gerencial, têm-se duas funções ante os objetivos da organização: fornecer informações para apoiar o processo decisório e motivar os indivíduos (Sprinkle & Williamson, 2006Sprinkle, G. B., & Williamson, M. G. (2006). Experimental research in managerial accounting. Handbooks of Management Accounting Research, 1, 415-444.). As informações gerenciais podem auxiliar na tomada de decisões, bem como influenciar o processo decisório (Sprinkle, 2003Sprinkle, G. B. (2003). Perspectives on experimental research in managerial accounting. Accounting, Organizations and Society, 28(2-3), 287-318.). Pesquisas experimentais demonstram influência significativa das práticas e procedimentos contábeis na qualidade dos julgamentos (Sprinkle & Williamson, 2006Sprinkle, G. B., & Williamson, M. G. (2006). Experimental research in managerial accounting. Handbooks of Management Accounting Research, 1, 415-444.).

Mesmo assim, estudos destacam a pouca utilização para fins gerenciais.Stroeher e Freitas (2008Stroeher, A. M., & Freitas, H. (2008). O uso das informações contábeis na tomada de decisão em pequenas empresas. Revista RAUSP-e, 1(1), 1-25.) apontam que, em empresas menores, as informações contábeis são costumeiramente utilizadas apenas para fins legais, sendo ignoradas para apoio à tomada de decisões. Parte desse comportamento deve-se ao tipo de relacionamento das organizações com seus prestadores de serviços contábeis. Já o estudo deSantos et al. (2016Santos, V. D., Dorow, D. R., & Beuren, I. M. (2016). Práticas gerenciais de micro e pequenas empresas. Revista Ambiente Contábil, 8(1), 153-186.) aponta que a utilidade da contabilidade no processo de gestão muitas vezes é desconhecida pelos gestores.Armitage et al. (2016Armitage, H. M., Webb, A., & Glynn, J. (2016). The use of management accounting techniques by small and medium‐sized enterprises: A field study of Canadian and Australian practice. Accounting Perspectives, 15(1), 31-69.) concluíram que os empresários não percebem vantagens na análise custos versus benefícios.

Portanto, a contabilidade precisa se aperfeiçoar (Santos et al., 2009Santos, V., Rengel, S., Paterno, A. A. P., & Beuren, I. M. (2009). Instrumentos da contabilidade gerencial utilizados em micro e pequenas empresas comerciais e disponibilizados por empresas de serviços contábeis. Revista Catarinense da Ciência Contábil, 8(24), 41-58.).Amoako (2013Amoako, G. K. (2013). Accounting practices of SMEs: A case study of Kumasi Metropolis in Ghana. International Journal of Business and Management, 8(24), 73.) eMaseko e Manyani (2011Maseko, N., & Manyani, O. (2011). Accounting practices of SMEs in Zimbabwe: An investigative study of record keeping for performance measurement (A case study of Bindura). Journal of Accounting and Taxation, 3(8), 158-161.) recomendam que a contabilidade seja realizada de maneira personalizada, de acordo com as características específicas de cada organização, para que se tornem menos técnicas e mais compreensíveis aos usuários. A compreensibilidade do usuário também é influenciada pela quantidade de informações. Há situações em que mais informações, principalmente não organizadas e adequadamente tratadas, prejudicam o julgamento (Iselin, 1988Iselin, E. R. (1988). The effects of information load and information diversity on decision quality in a structured decision task. Accounting, Organizations and Society, 13(2),147-164.;Shields, 1980Shields, M. D. (1980). Some effects on information load on search patterns used to analyze performance reports. Accounting, Organizations and Society, 5(4), 429-442.,1983Shields, M. D. (1983). Effects of information supply and demand on judgment accuracy: Evidence from corporate managers. Accounting Review, I58(2), 284-303.). Essa relação entre o modo de organizar e disponibilizar as informações e sua compreensão pelo usuário afeta o desempenho na tomada de decisões e, consequentemente, das organizações (Lipe & Salterio, 2000Lipe, M. G., & Salterio, S. E. (2000). The balanced scorecard: Judgmental effects of common and unique performance measures. The Accounting Review, 75(3), 283-298.,2002Lipe, M. G., & Salterio, S. (2002). A note on the judgmental effects of the balanced scorecard's information organization. Accounting, Organizations and Society, 27(6), 531-540.).

Pesquisas demonstram que a utilização da informação gerencial está ligada à contabilidade interna (Nunes & Serrasqueiro, 2004Nunes, L. D. C. F., & Serrasqueiro, Z. M. (2004). A informação contabilística nas decisões financeiras das pequenas empresas. Revista Contabilidade & Finanças, 15(36), 87-96.) e a características demográficas dos gestores (Mendes et al., 2019Mendes, A. C. A., Lunkes, R. J., Menegazzo, G. D., Schnorrenberger, D., & Lavarda, C. E. F. (2019). Características observáveis dos usuários e a utilização da informação contábil: um estudo com base na teoria dos escalões superiores. Enfoque, 38(1), 67.;Menegazzo et al., 2017Menegazzo, G. D., Lunkes, R. J., Mendes, A., & Schnorrenberge, D. (2017). Relação entre características demográficas dos usuários e uso de informações para tomada de decisões: um estudo em micro e pequenas empresas. Journal of Globalization, Competitiveness & Governability, 11(3), 90-110.), ou seja, apenas produzir informações não é suficiente. Essas devem ser entregues no momento e para a pessoa certa, bem como devem estar alinhadas com as preferências demandadas dos usuários (Santos et al., 2016Santos, V. D., Dorow, D. R., & Beuren, I. M. (2016). Práticas gerenciais de micro e pequenas empresas. Revista Ambiente Contábil, 8(1), 153-186.).

Dentre essas preferências, aborda-se, nesta pesquisa, a agregação e/ou desagregação de informações como possível divergência entre preparadores e usuários, o que pode justificar, com olhar complementar, o fato de tais suportes não serem utilizados no processo decisório. A partir disso, busca-se investigar as relações entre as informações contábeis e comportamento humano, bem como o efeito do comportamento humano na contabilidade (Birnberg & Shields, 1989Birnberg, J. G., & Shields, J. F. (1989). Three decades of behavioral accounting research: A search for order. Behavioral Research in Accounting, 1, 23-74.). Para esta pesquisa, abordam-se os contextos em que o indivíduo está inserido (preparadores ou usuários de informações gerenciais).

Preparadores têm suas preferências na concepção das informações e podem tomá-las como base, ignorando as dos usuários, gerando, assim, um potencial gap entre a expectativa e a realidade do uso da informação. Tendem a querer mostrar a importância e utilidade do seu trabalho (Dimnik & Felton, 2006Dimnik, T., & Felton, S. (2006). Accountant stereotypes in movies distributed in North America in the twentieth century. Accounting, Organizations and Society, 31(2), 129-155.;Frémeaux et al., 2018Frémeaux, S., Puyou, F. R., & Michelson, G. (2018). Beyond accountants as technocrats: A common good perspective. Critical Perspectives on Accounting, 67-68, Article 102054.). Assim, focam na precisão, na neutralidade e na abstração técnica (Frémeaux et al., 2018Frémeaux, S., Puyou, F. R., & Michelson, G. (2018). Beyond accountants as technocrats: A common good perspective. Critical Perspectives on Accounting, 67-68, Article 102054.), bem como se pautam na postura conservadora, na estabilidade, no autocontrole, na seriedade, na confiabilidade (DeCoster & Rhode, 1971DeCoster, D. T., & Rhode, J. G. (1971). The accountant's stereotype: Real or imagined, deserved or unwarranted. The Accounting Review, 46(4), 651-664.;Michaels & Levas, 2003Michaels, N. M., & Levas, M. G. (2003).The relationship of personality traits and self-monitoring behavior to choice of business major. Journal of Education for Business, 78(3), 153-157.) e na transparência das informações (Roberts, 2009Roberts, J. (2009). No one is perfect: The limits of transparency and an ethic for ‘intelligent’ accountability. Accounting, Organizations and Society, 34(8), 957-970.); porém, receiam a perda informacional por agregação (Gonçalves et al., 2010Gonçalves, A. O., Gonçalves, R. S., Lustosa, P. R. B., & Celestino, E. C. (2010). Da Secretaria de Saúde ao Conselho: análise de relatórios de prestação de contas com base nas características qualitativas da informação contábil. Revista de Contabilidade e Organizações, 4(8), 92-111.;Lev, 1968Lev, B. (1968). The aggregation problem in financial statements: An informational approach. Journal of Accounting Research, 6(2)247-261.). Por isso, assume-se, nesta pesquisa, o pressuposto de que preparadores preferem apresentar a informação de maneira detalhada (desagregada).

Quanto aos usuários, entende-se que se enquadram no segundo aspecto da contabilidade comportamental, em que se destaca o papel da contabilidade no comportamento humano para a tomada de decisões (Siegel & Ramanauskas-Marconi, 1989Siegel, G., & Ramanauskas-Marconi, H. (1989). Behavioral accounting. South-Western Publishing Company.). Desse modo, suas preferências são moldadas conforme suas características e demandas. Portanto, pode-se entender que seguem os pressupostos da TCM, já que as decisões envolvidas se referem a eles. Com isso, as características comportamentais e profissionais podem afetar suas preferências de apresentação/recebimento de informações contábeis.

2.3 Alinhamento de Preferências

As diferenças entre preparadores e usuários vão além de suas preferências. Características particulares, experiências vividas, conhecimentos técnicos e outros elementos podem influenciar as decisões. A partir dessas constatações,Amoako (2013Amoako, G. K. (2013). Accounting practices of SMEs: A case study of Kumasi Metropolis in Ghana. International Journal of Business and Management, 8(24), 73.) eMaseko e Manyani (2011Maseko, N., & Manyani, O. (2011). Accounting practices of SMEs in Zimbabwe: An investigative study of record keeping for performance measurement (A case study of Bindura). Journal of Accounting and Taxation, 3(8), 158-161.) destacam que é necessário um alinhamento entre a apresentação das informações por parte dos preparadores com os usuários, com intuito de torná-las mais próximas à realidade de quem as recebe. A literatura de sistemas de informações gerenciais destaca a importância a ser dada ao usuário (Pierce & O’Dea, 2003Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.). Pesquisas reconhecem que as motivações de preparadores e usuários são discrepantes, o que pode ocasionar percepções diferentes (Byrne & Pierce, 2018Byrne, S., & Pierce, B. (2018). Exploring management accountants’ role conflicts and ambiguities and how they cope with them. Qualitative Research in Accounting & Management, 15(4), 410-436.;Pierce & O’Dea, 2003Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.).

Ante a essas divergências, há os sistemas de informações [verMcKeen et al. (1994McKeen, J. D., Guimaraes, T., & Wetherbe, J. C. (1994). The relationship between user participation and user satisfaction: An investigation of four contingency factors. MIS Quarterly, 18(4), 427-451.)]. Preparadores entendem que a validade técnica é fruto do sucesso de um sistema de informações. Em contraponto, usuários acreditam que esses sistemas são bem-sucedidos ao apresentarem validade organizacional, isto é, refletirem de modo oportuno a realidade empresarial (Pierce & O’Dea, 2003Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.).

Pesquisas anteriores focaram principalmente nas percepções e intenções de uso (Goodhue, 1998Goodhue, D. L. (1998). Development and measurement validity of a task‐technology fit instrument for user evaluations of information system. Decision sciences, 29(1), 105-138.). Em contrapartida, os antecedentes ao uso (preparadores) não têm sido objeto de pesquisa frequente (Pierce & O’Dea, 2003Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.). Por isso, estudos apontam que se faz necessário o aperfeiçoamento das informações aos usuários (Santos et al., 2009Santos, V., Rengel, S., Paterno, A. A. P., & Beuren, I. M. (2009). Instrumentos da contabilidade gerencial utilizados em micro e pequenas empresas comerciais e disponibilizados por empresas de serviços contábeis. Revista Catarinense da Ciência Contábil, 8(24), 41-58.), bem como que essas devem ser produzidas com alinhamento aos usuários e suas preferências (Santos et al., 2016Santos, V. D., Dorow, D. R., & Beuren, I. M. (2016). Práticas gerenciais de micro e pequenas empresas. Revista Ambiente Contábil, 8(1), 153-186.). Logo, deve-se considerar seu estilo e peculiaridades cognitivas (Huber, 1983Huber, G. P. (1983). Cognitive style as a basis for MIS and DSS designs: Much ado about nothing? Management Science, 29(5), 567-579.).

Para isso, é necessário o alinhamento entre validade técnica e organizacional (Pierce & O’Dea, 2003Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.). Esse alinhamento visa o efetivo uso das informações gerenciais no processo decisório (Powers & Dickson, 1973Powers, R. F., & Dickson, G. W. (1973). MisProject management: Myths, opinions, and reality. California Management Review, 15(3), 147-156.) e reduzir os conflitos de interesses (Byrne & Pierce, 2018Byrne, S., & Pierce, B. (2018). Exploring management accountants’ role conflicts and ambiguities and how they cope with them. Qualitative Research in Accounting & Management, 15(4), 410-436.), porque a contabilidade deve ser voltada para embasar e auxiliar o processo decisório (Fernandes et al., 2011Fernandes, F. C., Klann, R. C., & Figueredo, M. S. (2011). A utilidade da informação contábil para a tomada de decisões: uma pesquisa com usuários alunos. Contabilidade Vista & Revista, 22(3), 99-126.;Moreira et al., 2013Moreira, R. L., Encarnação, L. V., de Almeida Bispo, O. N., Colauto, R. D., & Angotti, M. (2013). A importância da informação contábil no processo de tomada de decisão nas micro e pequenas empresas. Revista Contemporânea de Contabilidade, 10(19), 119-140.). Busca-se, a partir desse alinhamento, a redução dos ruídos na comunicação entre os operadores das informações gerenciais.

Assim como qualquer outro decisor, os preparadores de informações contábeis também têm influências de suas próprias preferências para o desenvolvimento de seus produtos (Enslin, 2019Enslin, Z. (2019). Behavioural aspects that influence business decision-making by management accounting professionals [Doctoral Dissertation]. University of Pretoria.). Porém, alerta-se que eles devem disponibilizar essas informações para terceiros, que por sua vez tomam decisões com base em suas preferências e conjunto de crenças e valores. Logo, o importante para um, pode não ser para outro (Faraci et al., 2013Faraci, P., Lock, M., & Wheeler, R. (2013). Assessing leadership decision-making styles: Psychometric properties of the leadership Judgement indicator. Psychology Research and Behavior Management, 6, 117-123.;Penolazzi et al., 2013Penolazzi, B., Leone, L., & Russo, P. M. (2013). Individual differences and decision making: When the lure effect of gain is a matter of size. PloSOne, 8(3), e58946.).

Com base nisso,Hoozée e Mitchell (2018Hoozée, S., & Mitchell, F. (2018). Who influences the design of management accounting systems? An exploratory study. Australian Accounting Review, 28(3), 374-390.) investigaram aspectos que influenciam o desenho de sistemas de contabilidade gerencial. Seus achados demonstram que os gestores têm forte impacto no desenvolvimento desses por serem os usuários finais. Destacam, ainda, a presença de alinhamento de informações às suas preferências. Em suma, os usuários desejam informações mais confiáveis, compreensíveis, oportunas, flexíveis e em melhor formato de apresentação (Pierce & O’Dea, 2003Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.).

Sob esse enfoque, percebe-se a relação de alguns motivadores/antecedentes ao uso, como o alinhamento de preferências (com preparadores) e a utilidade percebida (Robey, 1979Robey, D. (1979). User attitudes and management information system use. Academy of Management Journal, 22(3), 527-538.), isto é, informações alinhadas às preferências dos usuários tendem a ser mais utilizadas. Diante desses aspectos, a contabilidade deve voltar-se às preferências dos usuários, com objetivo de torná-las mais úteis e utilizadas. Para isso, é preciso conhecimento para contemplar as necessidades dos gestores sem comprometer sua validade (Pierce & O’Dea, 2003Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.).

Diversas são as variáveis que podem impactar na tomada de decisões ao envolver situações de ganhos e perdas, e vão além das características demográficas dos decisores.Blavatskyy (2013Blavatskyy, P. (2013). Which decision theory? Economics Letters, 120(1), 40-44.),Schultz et al. (2018Schultz, K. L., Robinson, L. W., Thomas, L. J., Schultz, J., & McClain, J. O. (2018). The use of framing in inventory decisions. Production and Operations Management, 27(1), 49-57.),Silva et al. (2008Silva, C. A. T., Souza, F. A., & Domingos, N. T. (2008). Efeito do custo perdido: a Influência do custo perdido na decisão de investimento. Revista de Contabilidade e Organizações, 2(2), 87-100.) eTan e Yates (1995Tan, H., & Yates, J. F. (1995). Sunk cost effects: The influences of instruction and future return estimates. Organizational Behavior and Human Decision Processes, 63(3), 331-319.) apontam que o contexto de decisão é uma variável significativa.Aldrighi e Milanez (2005Aldrighi, D. M., & Milanez, D. Y. (2005). Finança comportamental e a hipótese dos mercados eficientes. Revista de Economia Contemporânea, 9(1), 41-72.) apontam que os indivíduos realizam operações mentais que alteram suas preferências conforme o problema é apresentado e o contexto em que está inserido.

Preparadores de informações gerenciais conhecem e desejam mostrar sua utilidade e importância (Fernandes et al., 2011Fernandes, F. C., Klann, R. C., & Figueredo, M. S. (2011). A utilidade da informação contábil para a tomada de decisões: uma pesquisa com usuários alunos. Contabilidade Vista & Revista, 22(3), 99-126.;Moreira et al., 2013Moreira, R. L., Encarnação, L. V., de Almeida Bispo, O. N., Colauto, R. D., & Angotti, M. (2013). A importância da informação contábil no processo de tomada de decisão nas micro e pequenas empresas. Revista Contemporânea de Contabilidade, 10(19), 119-140.). Assim, parte-se do pressuposto de que preferem sempre desagregar as informações para demonstrar sua capacidade contributiva no processo decisório. Já usuários seguem suas preferências e tolerâncias ao risco, conforme estipulado na função de valor da TP (Kahneman & Tversky, 1979Kahneman, D., & Tversky, A. (1979). Prospect theory: An analysis of decisions under risk. Econometrica, 47(2), 263-291.), além de decidirem conforme os preceitos da TCM (Bonner et al., 2014Bonner, S. E., Clor-Proell, S. M., & Koonce, L. (2014). Mental accounting and disaggregation based on the sign and relative magnitude of income statement items. The Accounting Review, 89(6), 2087-2114.;Thaler, 1980Thaler, R. (1980). Toward a positive theory of consumer choice. Journal of Economic Behavior & Organization, 1(1), 39-60.).

Devido a tais constatações, é necessário o alinhamento entre a validade técnica e organizacional (Pierce & O’Dea, 2003Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.) por parte dos preparadores com os usuários e por meio de informações em formatos desejados, para que as informações sejam de fato utilizadas no processo decisório (Powers & Dickson, 1973Powers, R. F., & Dickson, G. W. (1973). MisProject management: Myths, opinions, and reality. California Management Review, 15(3), 147-156.;Robey, 1979Robey, D. (1979). User attitudes and management information system use. Academy of Management Journal, 22(3), 527-538.). Com base no exposto e sob a luz da TCM, entende-se que aspectos comportamentais e a função de valor implícita na preferência por agregar ou desagregar informações resultam na utilização da informação gerencial, como postula a hipótese:

  • H1: o alinhamento de preferências dos operadores influencia o maior uso de informações gerenciais.

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Esta pesquisa caracteriza-se como empírica, quantitativa, descritiva e aplicada. Classifica-se, ainda, em relação aos procedimentos, como quase-experimento. Optou-se por esse modelo de pesquisa por ter grupos distintos que se enquadram nas perspectivas analisadas (preparadores e usuários), não possibilitando sua randomização. ParaHales (2015Hales, J. (2015). Discussion of “The effects of forecast type and performance-based incentives on the quality of management forecasts”. Accounting, Organizations and Society, 46, 19-22.), esse tipo de pesquisa em ambiente controlado pode ser esclarecedor para verificação dos efeitos de agregar ou desagregar, já que é difícil sua verificação no ambiente natural.

Como instrumento de pesquisa, utilizaram-se questionários espelhados, de modo a permitir manipulação apenas sobre o contexto do respondente (preparador ou usuário). Assim, apresentaram-se cenários de decisão por agregar ou desagregar informações contábeis de cunho gerencial, seja para elaborar (preparador) ou utilizar no processo decisório (usuário).

O instrumento foi adaptado deBonner et al. (2014Bonner, S. E., Clor-Proell, S. M., & Koonce, L. (2014). Mental accounting and disaggregation based on the sign and relative magnitude of income statement items. The Accounting Review, 89(6), 2087-2114.),Fennema e Koonce (2010Fennema, M. G., & Koonce, L. (2010). Mental accounting in financial reporting and voluntary disclosure [Working Paper]. Social Science Research Network.https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1717078
https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?...
),Suave (2017Suave, R. (2017). Preferências dos usuários por agregação e desagregação em relatórios internos para fins de ratcheting de metas e avaliação de desempenho [Doctoral Thesis]. Universidade de São Paulo.) eThaler (1999Thaler, R. H. (1999). Mental accounting matters. Journal of Behavioral Decision Making, 12(3), 183-206.) para o contexto do estudo. Realizou-se o pré-teste com 27 pessoas (14 preparadores e 13 usuários) que não participaram da amostra. Ajustes para aperfeiçoar o instrumento de pesquisa, aumentar sua confiabilidade e validade foram promovidos a partir do pré-teste. As variáveis da pesquisa estão apresentadas naTabela 1.

Tabela 1

Informou-se aos participantes o propósito do estudo e que os dados não seriam usados, analisados e divulgados individualmente, garantindo o sigilo requerido por pesquisas dessa natureza. Expôs-se, também, que não havia respostas certas ou erradas. No grupo de controle, buscou-se identificar as preferências quanto ao modo de preparar as informações. Já no grupo experimental, buscou-se identificar as preferências dos usuários sobre o modo de receber essas informações. Ambos os grupos analisaram situações organizacionais individuais, não sendo avaliadas decisões coletivas ou pessoais.

Atendeu-se àResolução nº 196 de 10 de outubro de 1996Resolution n. 196/1996. (1996). Approves the following guidelines and regulatory standards for research involving human beings:…http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/1996/res0196_10_10_1996.html
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
, não havendo remuneração nem gastos para os participantes. Por se tratar de um quase-experimento, não se fez a utilização de aleatoriedade entre os respondentes (Shadish et al., 2002Shadish, W. R., Cook, T. D., & Campbell, D. T. (2002). Experimental and quasi-experimental designs for generalized causal inference. Wadsworth Cengage Learning.). Para obter maior validade externa, agruparam-se os respondentes conforme alinhamento acadêmico.

A população da pesquisa foi composta por 855 estudantes de ciências contábeis (preparadores) e 1.014 de administração (usuários), de universidades públicas e privadas do sul do Brasil.Mortensen et al. (2012Mortensen, T., Fisher, R., & Wines, G. (2012). Students as surrogates for practicing accountants: Further evidence. Accounting Forum, 36(4), 251-265.) fornecem evidências que sustentam a utilização de estudantes como substitutos adequados para estudos experimentais. A coleta de dados foi realizada em agosto e setembro de 2019. Obteve-se retorno de 1.256 estudantes, sendo excluídas 38 respostas de estudantes de outros cursos. Outros 18 não autorizaram a utilização das respostas para fins acadêmicos e 126 respostas estavam incompletas. Assim, tem-se como amostra 550 respostas válidas para preparadores e 524 para usuários de informações.

Ao considerar a população e a amostra, obteve-se o nível de confiança da pesquisa de 99%, o que representa a probabilidade de se obterem os mesmos resultados caso aplicada com outros indivíduos da mesma população. A margem de erro é de 3% (Wooldridge, 2006Wooldridge, J. M. (2006). Introdução à econometria: uma abordagem moderna. Pioneira Thomson Learning.). Verificou-se, também, o alfa de Cronbach para ambas as amostras e os valores foram superiores a 0,7, o que indica a confiabilidade do instrumento (Hair et al., 2019Hair, J. F., Black, W. C., Babin, B. J., & Anderson, R. E. (2019). Multivariate data analysis (8a. ed.). Pearson Education.).

A análise dos dados foi realizada em três partes. Em um primeiro momento, foi realizada a análise descritiva dos dados para identificação das PADs em cada um dos 12 cenários para cada grupo investigado. A partir da observação das preferências, realizaram-se, em um segundo momento, regressões logísticas desses cenários para identificação de qual dos contextos (preparadores ou usuários) apresenta maior PAD, conforme a equação 1.

PPAD= 11+ e-(β0+β1 CONi+β2 GENi+β3 IDAi +β4 CIVi +β5 DEPi +β6 EXPi+ β7 GINi +β8 SEMi +β9 FRMi+ β10 PCPi+ µ)
(1)

em que PAD é a variável dependente (preferência por agregar ou desagregar), β0é o intercepto, β1,2,3são os coeficientes angulares, CON é a variável independente, GEN, IDA, CIV, DEP, EXP, GIN, SEM, FRM e PCP são as variáveis de controle e μ são os resíduos da regressão.

Como última etapa da análise dos dados, operacionalizou-se a análise de homogeneidade (homogeneity analysis by menos of least square - HOMALS). De acordo comFávero et al. (2009Fávero, L. P., Belfiore, P., Silva, F. L., & Chan, B. L. (2009). Análise de dados: modelagem multivariada para tomada de decisões (4a. ed.). Elsevier.), essa técnica permite a acomodação das variáveis qualitativas e revela, de forma visual e bidimensional, as associações entre as variáveis relacionadas. Utilizou-se a PAD como variável independente e variável dependente e utilizou-se o alinhamento de preferências. A função opitmal scaling, do Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) da IBM em sua versão 20, foi operacionalizada. Nessa análise, buscou-se identificar se as preferências por agregação ou desagregação estão associadas à busca pelo alinhamento informacional de preparadores e usuários, o que resultaria em maior uso das informações para o processo decisório.

4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

4.1 PADs

De modo geral, ambos os grupos seguem um padrão similar de características. A maioria dos participantes é jovem, do gênero masculino, solteiro e sem dependentes. Como são alunos de graduação, ainda não têm, em sua maioria, graduação de ensino superior, e houve divisão similar entre os semestres cursados. Também não têm muito tempo de experiência profissional na área do curso e, por isso, a renda é predominantemente de até dois salários mínimos. Complementarmente, não se apresentam endividados. Assim, têm percepção de condição financeira equilibrada. Realizou-se a correlação de Spearman sobre as características demográficas de ambos os grupos e não se constatou correlação entre as variáveis. As preferências de cada grupo são analisadas de forma conjunta e comparativa naTabela 2.

Tabela 2
Preferências por agregar e desagregar

Percebe-se que a tendência de preferências dos preparadores e dos usuários é parecida, não igual. Enquanto em três cenários apresentados preparadores preferiram agregar as informações, usuários de informações contábeis se mostraram mais propensos a desagregar o volume informacional, já que, em todos os casos, a maioria optou por desagregar as informações. Embora os resultados voltem-se mais à desagregação, observa-se variância no número de respostas para cada alternativa, o que garante variabilidade nas respostas. Para isso, realizou-se o teste de Harman e verificou-se a não presença do viés do método comum.

O primeiro cenário com preferências à agregação foi contrário à TCM e se refere a ganhos múltiplos (C6). Tal divergência aos preceitos da teoria pode ser devido ao número de informações envolvidas na situação decisional. Desagregar apenas duas informações pode não apresentar ganhos na função de valor tão relevantes quanto à informação enxuta. Por se tratar de um cenário de descontos obtidos, a ausência informacional de qual produto originou os descontos pode justificar a irrelevância percebida por preparadores para sua desagregação.

Os outros dois cenários voltados para agregação da informação foram para perdas múltiplas (C5 e C10), e uma possível explicação para isso pode ser semelhante ao C6. Em C5, tratou-se de inadimplências e em C10 perdas no estoque. Nesses casos, não houve aprofundamento e detalhamento sobre quais clientes originaram a inadimplência, bem como quais produtos foram perdidos nos estoques. Desse modo, a falta de detalhes informacionais pode ter originado essa preferência por agregar, a fim de agilizar o processo decisório.

De forma complementar, realizou-se a regressão logística estimada a partir de erros padrão robustos para cada cenário. Apresentam-se, naTabela 3, os resultados da razão de chance e nível de significância para cada cenário analisado.

Tabela 3
Regressão logística

Dos 12 cenários analisados, apenas em duas ocasiões não houve confirmação estatística de que o modelo explica a preferência dos operadores por agregar ou desagregar informações (C4 e C9), como apresentado pelo nível de significância do Prob. > chi2, o que indica que outros aspectos não investigados podem explicar a preferência de apresentação da informação gerencial. O teste de Hosmer-Lemeshow aponta que o modelo se encontra ajustado para todos os cenários investigados. Ademais, os cenários C7, C9 e C12 não apresentam relação significativa entre o contexto de decisão e a preferência por agregar ou desagregar as informações. Complementarmente, apenas em C9 nenhuma variável apresentou relação significante com a preferência manifestada pelos indivíduos.

Dentre os nove cenários que têm relação significativa entre o contexto de decisão e PAD, em três os usuários têm razão de chance maior que os preparadores para agregar (C1, C2 e C3). Em C1, os achados seguem a TCM ao agregar perdas múltiplas e minimizar a dor da perda. Já em C2 e C3, os resultados são inconsistentes com as premissas da TCM, já que não buscaram a maximização do valor, conforme os cenários indicavam (perdas mistas e ganhos múltiplos, respectivamente) (Thaler, 1999Thaler, R. H. (1999). Mental accounting matters. Journal of Behavioral Decision Making, 12(3), 183-206.).

Nos demais seis cenários que apresentaram significância, os usuários apresentaram razão de chance significativamente maior para sua desagregação que os preparadores. Em C4, contraria-se a TCM, já que as perdas reduzem a utilidade percebida da informação. Esse achado chama a atenção, já que o cenário apresentado trata de uma mudança atual nas normas contábeis de apresentação de demonstrativos (para informações obrigatórias e não gerenciais) sobre a apresentação de receitas brutas ou líquidas, o que pode ter influenciado os preparadores de informações contábeis por agregar informações.

Os achados ainda confirmam essa preferência para uso gerencial versus maximização do valor percebido nos resultados de C5, C10 e C11 que também contrariam a TCM. A escolha com maior razão de chance de os usuários desagregarem informações reduziria a função de valor por se referir a situações de perdas múltiplas e ganhos mistos. Assim, confirma-se que em nove de 12 cenários o contexto influenciou a preferência por agregar ou desagregar informações. Apenas em C6 e C8 (ganhos múltiplos) a preferência maior para desagregação dos usuários segue a TCM e maximiza valor, ao mesmo tempo em que aumenta o poder informacional.

Quanto às características demográficas, destaca-se que o gênero foi a variável com mais influência no modelo (cinco cenários em que o gênero feminino teve interesse significativo por agregar informações). A literatura aponta que mulheres são mais avessas às perdas que os homens e essa postura foi observada em cenários de perdas múltiplas (C1, C5 e C10), nos quais essas se mostraram favoráveis à agregação das perdas em uma só informação, a seguir o exposto porBrooks et al. (2018Brooks, C., Sangiorgi, I., Hillenbrand, C., & Money, K. (2018). Why are older investors less willing to take financial risks? International Review of Financial Analysis, 56(C), 52-72.) eGeetha e Selvakumar (2016Geetha,S. N., & Selvakumar, M. M. (2016). An analysis on the factors influencing risk tolerance level of individual investors. International Journal of Business Excellence, 9(2), 253-264.). Entretanto, nota-se também essa postura por agregar informações em cenários de ganhos múltiplos (C6 e C8), contrariando a TCM (Thaler, 1980Thaler, R. (1980). Toward a positive theory of consumer choice. Journal of Economic Behavior & Organization, 1(1), 39-60.). O semestre cursado indica que quanto mais avançado no curso o participante está, mais o conhecimento repassado nas disciplinas está inserido em suas decisões, de forma a querer desagregar informações para maior gestão das informações contábeis (Dimnik & Felton, 2006Dimnik, T., & Felton, S. (2006). Accountant stereotypes in movies distributed in North America in the twentieth century. Accounting, Organizations and Society, 31(2), 129-155.). Isso foi evidenciado em quatro cenários (C2, C7, C8 e C12).

Ampliam-se, assim, as discussões apresentadas pela TCM, que trata ganhos e perdas sem adotar contextualização das informações. Observa-se, a partir dos achados da pesquisa, que, ao tratar de informações contábeis de cunho gerencial, os usuários das informações, na maioria dos casos, optam por desagregar informações e aumentar o poder informacional para gestão, mesmo que isso impacte negativamente no valor percebido, como proposto pela TCM.

4.2 Análise do Alinhamento de Preferências

Esta seção busca compreender a pretensão de alinhar as preferências entre os operadores. ATabela 4apresenta a manifestação de mudança de preferências (por agregar ou desagregar) dos preparadores e usuários das informações (C13). Os primeiros responderam se adaptariam suas preferências às dos usuários se assim resultar em maior uso das informações. Em contrapartida, os usuários responderam se ao receber as informações de acordo com suas preferências isso os faria usá-las mais.

Tabela 4
Alinhamento de preferências entre os operadores de informações contábeis

Conforme evidencia aTabela 4, 76,91% dos preparadores mostram-se dispostos a modificar suas preferências para alinhar às necessidades e/ou preferências dos usuários na maioria ou em todas as situações. Em contraponto, 87,02% dos usuários manifestaram intenção de usar as informações caso fossem apresentadas na forma como esperam ou precisam, na maioria ou em todas as situações. Esses achados corroboramSantos et al. (2016Santos, V. D., Dorow, D. R., & Beuren, I. M. (2016). Práticas gerenciais de micro e pequenas empresas. Revista Ambiente Contábil, 8(1), 153-186.) ao apontarem a necessidade de informações alinhadas com as preferências dos indivíduos. Na outra ponta, apenas 7,63% dos preparadores praticamente ignorariam as preferências dos usuários, mudando sua forma de preparar as informações poucas vezes ou nunca. Já entre os usuários, apenas 2,48% alterariam o uso em nenhuma ou poucas das situações apresentadas.

Destaca-se que os preparadores de informações se comportam de maneira conservadora a mudanças de preferências. A compreensão técnica da importância da informação e seu valor para o processo decisório podem ser razões para essas resistências. Já os usuários de informações são adeptos às informações alinhadas às suas preferências e necessidades. Tais achados vão ao encontro da literatura, que destaca a importância não somente do repasse de informações, mas da apresentação nos moldes demandados pelos usuários (Amoako, 2013Amoako, G. K. (2013). Accounting practices of SMEs: A case study of Kumasi Metropolis in Ghana. International Journal of Business and Management, 8(24), 73.;Maseko & Manyani, 2011Maseko, N., & Manyani, O. (2011). Accounting practices of SMEs in Zimbabwe: An investigative study of record keeping for performance measurement (A case study of Bindura). Journal of Accounting and Taxation, 3(8), 158-161.;Santos et al., 2009Santos, V., Rengel, S., Paterno, A. A. P., & Beuren, I. M. (2009). Instrumentos da contabilidade gerencial utilizados em micro e pequenas empresas comerciais e disponibilizados por empresas de serviços contábeis. Revista Catarinense da Ciência Contábil, 8(24), 41-58.).

Com base no exposto, aplicou-se a HOMALS, por meio do procedimento de optimal scaling, considerando primeiramente as variáveis agregação ou desagregação e a busca por alinhamento informacional. A HOMALS mostra padrões de associações entre as variáveis por meio de planos bidimensionais. Quanto às medidas de discriminação, os achados para os operadores estão descritos naTabela 5.

Tabela 5
Medidas de discriminação, operadores das informações contábeis

NaFigura 1, por meio do mapa perceptual bidimensional, podem ser visualizadas as associações identificadas em cada quadrante. Isso não significa que as associações em todos os quadrantes são importantes. Quanto mais a medida se afasta do eixo central, mais forte é sua importância em relação às medidas de discriminação. Vale lembrar que, para realizar essas associações, foi necessária a realização de faixas de valores para cada variável. Nos cenários C1 a C12, tem-se agregar (A) e desagregar (D). Para o alinhamento de preferências (C13), utilizam-se cinco categorias de possibilidade de ajustes das informações (para preparadores) e intenção de uso (usuários): nenhuma, poucas, metade, muitas e todas.

Figura 1
Mapa bidimensional de (des)agregação no alinhamento de informações

No mapa perceptual, observam-se associações similares para preparadores e usuários de informações. Observa-se a intenção dos preparadores, que preferem desagregar informações que modificar ou adaptar suas preferências particulares para alinhá-las às dos usuários, se necessário. Já para os usuários, os que preferem a informação desagregada demonstram maior intenção de uso caso recebam de acordo com essa preferência.

Esses achados indicam que os preparadores com preferências por desagregar informações estão mais dispostos a alterar suas preferências para atender às necessidades dos usuários. Observa-se, ainda, que a maioria se aproxima com o alinhamento em “muitas” situações, mas não em todas. Isso pode ser indicativo de que a validade técnica pode influenciar a decisão de atender ou não às demandas dos usuários (Pierce & O’Dea, 2003Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.). Salienta-se que há tendência para o alinhamento de preferências com os usuários, o que demonstra o interesse dos preparadores para que as informações gerenciais sejam de fato utilizadas e forneçam suporte ao processo decisório (Fernandes et al., 2011Fernandes, F. C., Klann, R. C., & Figueredo, M. S. (2011). A utilidade da informação contábil para a tomada de decisões: uma pesquisa com usuários alunos. Contabilidade Vista & Revista, 22(3), 99-126.;Moreira et al., 2013Moreira, R. L., Encarnação, L. V., de Almeida Bispo, O. N., Colauto, R. D., & Angotti, M. (2013). A importância da informação contábil no processo de tomada de decisão nas micro e pequenas empresas. Revista Contemporânea de Contabilidade, 10(19), 119-140.;Powers & Dickson, 1973Powers, R. F., & Dickson, G. W. (1973). MisProject management: Myths, opinions, and reality. California Management Review, 15(3), 147-156.).

Os usuários que optaram por informações desagregadas indicaram que as utilizariam para a tomada de decisões e gestão organizacional, caso estivessem de acordo com suas preferências. Em contraponto, preparadores que optaram por agregar informações não se mostraram dispostos a modificar a forma de apresentação para atender às preferências dos usuários. Isso corroboraEnslin (2019Enslin, Z. (2019). Behavioural aspects that influence business decision-making by management accounting professionals [Doctoral Dissertation]. University of Pretoria.), que trata da influência de preferências no desenvolvimento de seus produtos. Demonstra-se, ainda, que os usuários anseiam por informações oportunas, amplas, flexíveis e em melhor forma (Pierce & O’Dea, 2003Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.).

Destarte, buscou-se compreender se as preferências resultariam em maior uso das informações (usuário) e/ou adaptação na preparação, visando seu uso (preparadores). Como demonstrado, os indivíduos que preferem a desagregação das informações estão mais propensos a apresentar associação com a utilização das informações (usuários) e adaptariam suas preferências para atender às necessidades e preferências dos usuários (preparadores). Assim, pode haver divergências entre preparadores e usuários, o que pode tornar a contabilidade gerencial menos utilizada. Destarte, confirma-se a H1ao demonstrar que o alinhamento de preferências dos operadores influencia o uso das informações contábeis.

4.3 Discussão dos Resultados

Os resultados do estudo apontam que o alinhamento de preferências dos preparadores e usuários das informações contábeis resultariam em maior uso para fins de apoio a tomada de decisões. Isso denota que ambos percebem a utilidade e a importância dessas informações para o bem da organização (Dimnik & Felton, 2006Dimnik, T., & Felton, S. (2006). Accountant stereotypes in movies distributed in North America in the twentieth century. Accounting, Organizations and Society, 31(2), 129-155.;Fernandes et al., 2011Fernandes, F. C., Klann, R. C., & Figueredo, M. S. (2011). A utilidade da informação contábil para a tomada de decisões: uma pesquisa com usuários alunos. Contabilidade Vista & Revista, 22(3), 99-126.;Frémeaux et al., 2018Frémeaux, S., Puyou, F. R., & Michelson, G. (2018). Beyond accountants as technocrats: A common good perspective. Critical Perspectives on Accounting, 67-68, Article 102054.;Moreira et al., 2013Moreira, R. L., Encarnação, L. V., de Almeida Bispo, O. N., Colauto, R. D., & Angotti, M. (2013). A importância da informação contábil no processo de tomada de decisão nas micro e pequenas empresas. Revista Contemporânea de Contabilidade, 10(19), 119-140.;Pierce & O’Dea, 2003Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.;Powers & Dickson, 1973Powers, R. F., & Dickson, G. W. (1973). MisProject management: Myths, opinions, and reality. California Management Review, 15(3), 147-156.).

No entanto, num olhar mais pontual, percebe-se que as características e preferências iniciais dos grupos amostrais são similares, denotando importante aspecto de um estudo de natureza experimental. Percebe-se, também, que a maioria dos operadores prefere desagregar as informações, contrariando em alguns casos o que preconizaThaler (1980Thaler, R. (1980). Toward a positive theory of consumer choice. Journal of Economic Behavior & Organization, 1(1), 39-60.) na proposição da TCM. Além disso, diferentemente dos preceitos da TCM, as mulheres, em dois dos três cenários de ganhos múltiplos, optaram por agregar informações. Esse comportamento também foi percebido para perdas múltiplas, o que conota aversão às perdas, como apontado nos estudos deBrooks et al. (2018Brooks, C., Sangiorgi, I., Hillenbrand, C., & Money, K. (2018). Why are older investors less willing to take financial risks? International Review of Financial Analysis, 56(C), 52-72.) eGeetha Selvakumar (2016Geetha,S. N., & Selvakumar, M. M. (2016). An analysis on the factors influencing risk tolerance level of individual investors. International Journal of Business Excellence, 9(2), 253-264.).

Destaque para a predisposição de ambos os grupos em prol do maior uso das informações: preparadores, ao incorporar as preferências dos usuários na forma de apresentação das informações, e usuários, em utilizá-las com mais frequência caso estejam alinhadas com suas necessidades. Esses achados encontram suporte nos estudos deAmoako (2013Amoako, G. K. (2013). Accounting practices of SMEs: A case study of Kumasi Metropolis in Ghana. International Journal of Business and Management, 8(24), 73.),Maseko & Manyani (2011Maseko, N., & Manyani, O. (2011). Accounting practices of SMEs in Zimbabwe: An investigative study of record keeping for performance measurement (A case study of Bindura). Journal of Accounting and Taxation, 3(8), 158-161.),Pierce & O’Dea (2003Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.) eSantos et al. (2009Santos, V., Rengel, S., Paterno, A. A. P., & Beuren, I. M. (2009). Instrumentos da contabilidade gerencial utilizados em micro e pequenas empresas comerciais e disponibilizados por empresas de serviços contábeis. Revista Catarinense da Ciência Contábil, 8(24), 41-58.).

Importantes avanços, tanto no campo literário quanto organizacional, podem emergir dessas constatações. Para a literatura, evidencia-se que, embora a função de valor exposta pela TCM possa influenciar as decisões por agregar ou desagregar, ao tratar de informações de cunho gerencial, a busca pelo suporte ao processo decisório mostrou-se mais relevante, logo, a desagregação foi escolhida, na maioria dos casos, independentemente do valor psicológico percebido pela decisão. Complementarmente, tem-se, como implicação prática, a importância do alinhamento de preferências entre preparadores e usuários de informações quanto à sua forma de apresentação para respaldar as decisões organizacionais.

5. CONCLUSÕES

Dentre os papéis da contabilidade está o suporte ao processo decisório. Nesse, tanto as preferências dos usuários quanto eventuais vieses dos preparadores devem ser considerados. Assim, o objetivo desta pesquisa foi avaliar a influência do alinhamento de preferências dos operadores por agregar ou desagregar no uso de informações gerenciais.

Para tanto, utilizou-se a abordagem psicológica da linha comportamental para compreensão do processo decisório de preparadores e usuários de informações para identificar suas preferências quanto à preparação e à apresentação desse apoio gerencial.

Agrega-se à TCM ao demonstrar que os indivíduos nem sempre seguem os preceitos da teoria, como nos casos evidenciados de informações gerenciais para maximização do volume informacional ao processo decisório. Nesses casos, a desagregação é escolhida, mesmo que prejudique a utilidade percebida.

Quanto ao alinhamento de preferências entre preparadores e usuários, destaca-se, principalmente, que os preparadores que optam por desagregar informações são mais propensos a alterá-las para atender aos usuários, bem como usuários se mostram mais propensos a utilizá-las caso sejam apresentadas conforme suas preferências e necessidades. Destaca-se, ainda, que os indivíduos que preferem a agregação são mais resistentes às mudanças e utilização das informações, o que limita a utilização da contabilidade para fins gerenciais.

Em linhas gerais, os achados da pesquisa demonstram que o uso das informações pode ser reflexo da forma de apresentação e do alinhamento de preferências entre os operadores. Mostram, também, que aspectos comportamentais e vieses cognitivos são inerentes ao ser humano e, consequentemente, ao processo decisório. Observou-se, ainda, que as informações gerenciais são compreendidas por ambos (preparadores e usuários) como importantes para apoiar a tomada de decisões a ponto de relegarem suas preferências a segundo plano, em prol de um melhor suporte decisional. Com isso, os preparadores de informações podem incorporar as preferências dos usuários e, assim, obter maior valor e importância percebida para seu trabalho.

Assim, ao demonstrar a propensão a maior uso das informações contábeis, desde que alinhadas com suas preferências e demandas, este estudo contribui para a literatura comportamental, embasada pela TCM, quanto às preferências por agregação e desagregação de informações dos operadores. Quanto à prática, contribui, ao expor a importância do alinhamento de preferências, para o repasse de informações contábeis entre preparadores e usuários, minimizando o viés na informação por preferências de terceiros. Nessa linha, os participantes da pesquisa se mostraram mais propensos a utilizar informações gerenciais alinhadas às suas preferências de agregação ou desagregação, resultando na utilização mais frequente, contribuindo para o melhor embasamento de suas decisões.

Cabe ressaltar que este estudo tem limitações quanto à utilização de cenários que não envolvem ganhos ou perdas reais para o participante. Dessa forma, pesquisas futuras poderiam averiguar se as preferências se confirmam em situações reais. Limita-se, também, quanto à especificidade de trabalhar somente com as características da edição hedônica, já que a TCM abrange outros aspectos que podem ser investigados e aplicados à contabilidade gerencial. Ademais, o processo de amostragem foi realizado de maneira intencional e não probabilística.

Por se tratar de pesquisa com foco na agregação/desagregação de informações, o volume/número de informações também pode ser considerado limitador. Todos os cenários tinham duas opções, ou seja, não foram analisados ganhos ou perdas conjuntas, nem decisões sequenciais. Para isso, pesquisas futuras poderiam desenvolver um sistema com informações agregadas que o usuário da informação desagregaria conforme suas necessidades, a fim de identificar até que ponto a desagregação da informação é percebida como útil. Análises de decisões individuais e não coletivas também constam como limitação, assim como a ausência de fatores temporais. Adicionalmente, as características qualitativas da informação contábil não foram tratadas no questionário e apresentam caminho para futuras pesquisas.

REFERENCES

  • Aldrighi, D. M., & Milanez, D. Y. (2005). Finança comportamental e a hipótese dos mercados eficientes. Revista de Economia Contemporânea, 9(1), 41-72.
  • Amoako, G. K. (2013). Accounting practices of SMEs: A case study of Kumasi Metropolis in Ghana. International Journal of Business and Management, 8(24), 73.
  • Arkes, H. R., & Blumer, C. (1985). The psychology of sunk cost. Organizational behavior and human decision processes, 35(1), 124-140.
  • Armitage, H. M., Webb, A., & Glynn, J. (2016). The use of management accounting techniques by small and medium‐sized enterprises: A field study of Canadian and Australian practice. Accounting Perspectives, 15(1), 31-69.
  • Birnberg, J. G., & Shields, J. F. (1989). Three decades of behavioral accounting research: A search for order. Behavioral Research in Accounting, 1, 23-74.
  • Blavatskyy, P. (2013). Which decision theory? Economics Letters, 120(1), 40-44.
  • Bonner, S. E., Clor-Proell, S. M., & Koonce, L. (2014). Mental accounting and disaggregation based on the sign and relative magnitude of income statement items. The Accounting Review, 89(6), 2087-2114.
  • Brooks, C., Sangiorgi, I., Hillenbrand, C., & Money, K. (2018). Why are older investors less willing to take financial risks? International Review of Financial Analysis, 56(C), 52-72.
  • Byrne, S., & Pierce, B. (2018). Exploring management accountants’ role conflicts and ambiguities and how they cope with them. Qualitative Research in Accounting & Management, 15(4), 410-436.
  • Camerer, C. (2005). Three cheers - psychological, theoretical, empirical - for loss aversion. Journal of Marketing Research, 42(2), 129-133.
  • Cheema, A., & Soman, D. (2006). Malleable mental accounting: The effect of flexibility on the justification of attractive spending and consumption decisions. Journal of Consumer Psychology, 16(1), 33-44.
  • DeCoster, D. T., & Rhode, J. G. (1971). The accountant's stereotype: Real or imagined, deserved or unwarranted. The Accounting Review, 46(4), 651-664.
  • Dimnik, T., & Felton, S. (2006). Accountant stereotypes in movies distributed in North America in the twentieth century. Accounting, Organizations and Society, 31(2), 129-155.
  • Enslin, Z. (2019). Behavioural aspects that influence business decision-making by management accounting professionals [Doctoral Dissertation]. University of Pretoria.
  • Faraci, P., Lock, M., & Wheeler, R. (2013). Assessing leadership decision-making styles: Psychometric properties of the leadership Judgement indicator. Psychology Research and Behavior Management, 6, 117-123.
  • Fávero, L. P., Belfiore, P., Silva, F. L., & Chan, B. L. (2009). Análise de dados: modelagem multivariada para tomada de decisões (4a. ed.). Elsevier.
  • Fennema, M. G., & Koonce, L. (2010). Mental accounting in financial reporting and voluntary disclosure [Working Paper]. Social Science Research Network.https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1717078
    » https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1717078
  • Fernandes, F. C., Klann, R. C., & Figueredo, M. S. (2011). A utilidade da informação contábil para a tomada de decisões: uma pesquisa com usuários alunos. Contabilidade Vista & Revista, 22(3), 99-126.
  • Frémeaux, S., Puyou, F. R., & Michelson, G. (2018). Beyond accountants as technocrats: A common good perspective. Critical Perspectives on Accounting, 67-68, Article 102054.
  • Geetha,S. N., & Selvakumar, M. M. (2016). An analysis on the factors influencing risk tolerance level of individual investors. International Journal of Business Excellence, 9(2), 253-264.
  • Gonçalves, A. O., Gonçalves, R. S., Lustosa, P. R. B., & Celestino, E. C. (2010). Da Secretaria de Saúde ao Conselho: análise de relatórios de prestação de contas com base nas características qualitativas da informação contábil. Revista de Contabilidade e Organizações, 4(8), 92-111.
  • Goodhue, D. L. (1998). Development and measurement validity of a task‐technology fit instrument for user evaluations of information system. Decision sciences, 29(1), 105-138.
  • Hair, J. F., Black, W. C., Babin, B. J., & Anderson, R. E. (2019). Multivariate data analysis (8a. ed.). Pearson Education.
  • Hales, J. (2015). Discussion of “The effects of forecast type and performance-based incentives on the quality of management forecasts”. Accounting, Organizations and Society, 46, 19-22.
  • Hoozée, S., & Mitchell, F. (2018). Who influences the design of management accounting systems? An exploratory study. Australian Accounting Review, 28(3), 374-390.
  • Huber, G. P. (1983). Cognitive style as a basis for MIS and DSS designs: Much ado about nothing? Management Science, 29(5), 567-579.
  • Iselin, E. R. (1988). The effects of information load and information diversity on decision quality in a structured decision task. Accounting, Organizations and Society, 13(2),147-164.
  • Jackson, S. B., Rodgers, T. C., & Tuttle, B. (2010). The effect of depreciation method choice on asset selling prices. Accounting, Organizations and Society, 35(8), 757-774.
  • Kahneman, D., & Tversky, A. (1979). Prospect theory: An analysis of decisions under risk. Econometrica, 47(2), 263-291.
  • Kahneman, D., & Tversky, A. (1984). Choices, values, and frames. The American Psychologist, 39(4), 341-350.
  • Lev, B. (1968). The aggregation problem in financial statements: An informational approach. Journal of Accounting Research, 6(2)247-261.
  • Lipe, M. G., & Salterio, S. (2002). A note on the judgmental effects of the balanced scorecard's information organization. Accounting, Organizations and Society, 27(6), 531-540.
  • Lipe, M. G., & Salterio, S. E. (2000). The balanced scorecard: Judgmental effects of common and unique performance measures. The Accounting Review, 75(3), 283-298.
  • Luft, J., Shields, M. D., & Thomas, T. F. (2016). Additional information in accounting reports: Effects on management decisions and subjective performance evaluations under causal ambiguity. Contemporary Accounting Research, 33(2), 526-550.
  • McKeen, J. D., Guimaraes, T., & Wetherbe, J. C. (1994). The relationship between user participation and user satisfaction: An investigation of four contingency factors. MIS Quarterly, 18(4), 427-451.
  • Maseko, N., & Manyani, O. (2011). Accounting practices of SMEs in Zimbabwe: An investigative study of record keeping for performance measurement (A case study of Bindura). Journal of Accounting and Taxation, 3(8), 158-161.
  • Mendes, A. C. A., Lunkes, R. J., Menegazzo, G. D., Schnorrenberger, D., & Lavarda, C. E. F. (2019). Características observáveis dos usuários e a utilização da informação contábil: um estudo com base na teoria dos escalões superiores. Enfoque, 38(1), 67.
  • Menegazzo, G. D., Lunkes, R. J., Mendes, A., & Schnorrenberge, D. (2017). Relação entre características demográficas dos usuários e uso de informações para tomada de decisões: um estudo em micro e pequenas empresas. Journal of Globalization, Competitiveness & Governability, 11(3), 90-110.
  • Michaels, N. M., & Levas, M. G. (2003).The relationship of personality traits and self-monitoring behavior to choice of business major. Journal of Education for Business, 78(3), 153-157.
  • Moreira, R. L., Encarnação, L. V., de Almeida Bispo, O. N., Colauto, R. D., & Angotti, M. (2013). A importância da informação contábil no processo de tomada de decisão nas micro e pequenas empresas. Revista Contemporânea de Contabilidade, 10(19), 119-140.
  • Mortensen, T., Fisher, R., & Wines, G. (2012). Students as surrogates for practicing accountants: Further evidence. Accounting Forum, 36(4), 251-265.
  • Nunes, L. D. C. F., & Serrasqueiro, Z. M. (2004). A informação contabilística nas decisões financeiras das pequenas empresas. Revista Contabilidade & Finanças, 15(36), 87-96.
  • Penolazzi, B., Leone, L., & Russo, P. M. (2013). Individual differences and decision making: When the lure effect of gain is a matter of size. PloSOne, 8(3), e58946.
  • Pierce, B., & O'Dea, T. (2003). Management accounting information and the needs of managers: Perceptions of managers and accountants compared. The British Accounting Review, 35(3), 257-290.
  • Powers, R. F., & Dickson, G. W. (1973). MisProject management: Myths, opinions, and reality. California Management Review, 15(3), 147-156.
  • Prelec, D., & Loewenstein, G. (1998). The red and the black: Mental accounting of savings and debt. Marketing Science, 17(1), 4-28.
  • Read, D., Loewenstein, G., Rabin, M., Keren, G., & Laibson, D. (1999). Choice bracketing. In Elicitation of preferences (pp. 171-202). Springer.
  • Rengel, R., Gasparetto, V., & Schnorrenberger, D. (2019). Sunk costs e insistência irracional: o comportamento na tomada de decisões nos contextos pessoal, organizacional e público. Revista Ambiente Contábil, 11(2), 19-39.
  • Resolution n. 196/1996. (1996). Approves the following guidelines and regulatory standards for research involving human beings:…http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/1996/res0196_10_10_1996.html
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/1996/res0196_10_10_1996.html
  • Roberts, J. (2009). No one is perfect: The limits of transparency and an ethic for ‘intelligent’ accountability. Accounting, Organizations and Society, 34(8), 957-970.
  • Robey, D. (1979). User attitudes and management information system use. Academy of Management Journal, 22(3), 527-538.
  • Santos, V. D., Dorow, D. R., & Beuren, I. M. (2016). Práticas gerenciais de micro e pequenas empresas. Revista Ambiente Contábil, 8(1), 153-186.
  • Santos, V., Rengel, S., Paterno, A. A. P., & Beuren, I. M. (2009). Instrumentos da contabilidade gerencial utilizados em micro e pequenas empresas comerciais e disponibilizados por empresas de serviços contábeis. Revista Catarinense da Ciência Contábil, 8(24), 41-58.
  • Schultz, K. L., Robinson, L. W., Thomas, L. J., Schultz, J., & McClain, J. O. (2018). The use of framing in inventory decisions. Production and Operations Management, 27(1), 49-57.
  • Shadish, W. R., Cook, T. D., & Campbell, D. T. (2002). Experimental and quasi-experimental designs for generalized causal inference. Wadsworth Cengage Learning.
  • Shepherd, D. A., Williams, T. A., & Patzelt, H. (2015). Thinking about entrepreneurial decision making: Review and research agenda. Journal of management, 41(1), 11-46.
  • Shields, M. D. (1980). Some effects on information load on search patterns used to analyze performance reports. Accounting, Organizations and Society, 5(4), 429-442.
  • Shields, M. D. (1983). Effects of information supply and demand on judgment accuracy: Evidence from corporate managers. Accounting Review, I58(2), 284-303.
  • Siegel, G., & Ramanauskas-Marconi, H. (1989). Behavioral accounting. South-Western Publishing Company.
  • Silva, C. A. T., Souza, F. A., & Domingos, N. T. (2008). Efeito do custo perdido: a Influência do custo perdido na decisão de investimento. Revista de Contabilidade e Organizações, 2(2), 87-100.
  • Sprinkle, G. B., & Williamson, M. G. (2006). Experimental research in managerial accounting. Handbooks of Management Accounting Research, 1, 415-444.
  • Sprinkle, G. B. (2003). Perspectives on experimental research in managerial accounting. Accounting, Organizations and Society, 28(2-3), 287-318.
  • Stroeher, A. M., & Freitas, H. (2008). O uso das informações contábeis na tomada de decisão em pequenas empresas. Revista RAUSP-e, 1(1), 1-25.
  • Suave, R. (2017). Preferências dos usuários por agregação e desagregação em relatórios internos para fins de ratcheting de metas e avaliação de desempenho [Doctoral Thesis]. Universidade de São Paulo.
  • Tan, H., & Yates, J. F. (1995). Sunk cost effects: The influences of instruction and future return estimates. Organizational Behavior and Human Decision Processes, 63(3), 331-319.
  • Thaler, R. (1980). Toward a positive theory of consumer choice. Journal of Economic Behavior & Organization, 1(1), 39-60.
  • Thaler, R. H. (1999). Mental accounting matters. Journal of Behavioral Decision Making, 12(3), 183-206.
  • Thaler, R. H. (2008). Mental accounting and consumer choice. Marketing Science, 27(1), 15-25.
  • Tversky, A., & Kahneman, D. (1981). The framing of decisions and the psychology of choice. Science, 211(4481), 453-458.
  • Wooldridge, J. M. (2006). Introdução à econometria: uma abordagem moderna. Pioneira Thomson Learning.
  • Yao, R., Sharpe, D. L., & Wang, F. (2011). Decomposing the age effect on risk tolerance. The Journal of Socio-Economics, 40(6), 879-887.
  • *
    Artigo apresentado na XX USP International Conference in Accounting, julho de 2020.
  • **
    Esta pesquisa foi realizada com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) - Código de financiamento 001.

Editado por

Editor-Chefe:

Fábio Frezatti

Editor Associado:

Eliseu Martins

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Out 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    04 Ago 2020
  • Revisado
    21 Set 2020
  • Aceito
    12 Jun 2021
Universidade de São Paulo, Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária, Departamento de Contabilidade e Atuária - Cidade Universitária Avenida: Professor Luciano Gualberto, 908 - FEA 3 - sala 118, CEP: 05508-010, Telefone: (+55 11) 2648-6320 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: recont@usp.br