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A escuta ativa na mediação judicial on-line

ACTIVE LISTENING IN THE ONLINE LEGAL MEDIATION

ESCUCHA ACTIVA EN LA MEDIACIÓN JUDICIAL EN LÍNEA

Resumo

O presente artigo dedica-se ao estudo da mediação judicial de conflitos no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), examinando a empiria concreta da mediação a partir da ferramenta teórico-metodológica da Análise da Conversa, em transcrições de dados reais de fala-em-interação, como lócus interdisciplinar de pesquisa. Este artigo estuda a prática da escuta ativa nas sessões de mediação judicial on-line, com objetivo central de analisar, pela ótica da fala-em-interação, como os mediadores constroem interacionalmente os sentidos da escuta ativa como ferramenta de comunicação no discurso de abertura, e como os participantes colocam-na em prática ao longo das sessões de mediação. A análise mostra as trajetórias distintas da ação na construção do sentido de escuta ativa pelo mediador, seja com o uso da expressão técnica “escuta ativa”, seja com a formulação de expectativa de comportamento, bem como apresenta comportamentos de escuta diferenciados, em função da presença/ausência do elemento conflito, em que se notou o funcionamento (ou não) da regra de não interrupção na mediação judicial on-line.

Palavras-chave
Mediação; escuta ativa; resolução on-line de disputa (ODR); fala-em-interação; análise da conversa

Abstract

The present article is dedicated to the study of legal mediation of conflicts in the Court of Justice of Rio de Janeiro (TJRJ), examining the concrete experience of mediation from the theoretical-methodological tool of Conversation Analysis, in transcripts of real talking-interaction data, as an interdisciplinary research locus. This article studies the practice of active listening in online legal mediation, with the central aim of analyzing it from the perspective of talking-in-interaction how mediators construct the interactional meanings of active listening as a communication tool on the opening speech, and how the participants put it into practice during the mediation sessions. The analysis shows the different trajectories of action in the mediator’s construction of the meaning of active listening, with the use of the technical term “active listening” or with the formulation of behavioral expectations, as well as presents different listening behaviors, depending on the presence/absence of the conflict element, in which the functioning (or not) of the non-interruption rule in online legal mediation was noted.

Keywords
Mediation; mediator’s opening statement; online dispute resolution (ODR); talk-in-interaction; conversation analysis

Resumen

El presente artículo está dedicado al estudio de la mediación judicial de conflictos en el Tribunal de Justicia de Río de Janeiro (TJRJ), examinando la experiencia concreta de la mediación a partir de la herramienta teórico-metodológica del Análisis Conversacional, en transcripciones de datos de habla real-en-interacción, como locus de investigación interdisciplinar. Este artículo estudia la práctica de la escucha activa en las sesiones de mediación judicial en línea, con el objetivo central de analizar, desde la perspectiva del habla real-en-interacción, cómo los mediadores construyen de forma interactiva los significados de la escucha activa como herramienta de comunicación en el discurso de apertura, y cómo los participantes lo pusieron en práctica durante las sesiones de mediación. El análisis muestra las diferentes trayectorias de acción, en la construcción por parte del mediador del significado de la escucha activa, sea utilizando el término técnico “escucha activa”, sea formulando expectativas de comportamiento, así como presenta diferentes comportamientos de escucha, dependiendo de la presencia/ausencia del elemento conflictivo, en el que se constató el funcionamiento (o no) de la regla de no interrupción en la mediación judicial en línea.

Palabras clave
Mediación; escucha activa; resolución de disputas en línea (ODR); conversación-en-interacción; análisis de la conversa

Introdução1 1 Esta pesquisa é apoiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq - 317339/2021-4). Os autores agradecem a Maria do Carmo Leite de Oliveira pela leitura do texto e pelas sugestões.

Este artigo estuda a prática da escuta ativa nas sessões de mediação judicial, com objetivo central de analisar, pela ótica da fala-em-interação, como os mediadores constroem interacionalmente os sentidos da escuta ativa no discurso de abertura como uma ferramenta de comunicação e como os mediandos colocam-na em prática ao longo das sessões. Para isso, analisamos cinco excertos, extraídos de dois casos de mediação judicial familiar, no formato on-line, gravadas nos Centros de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejuscs) do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) ao longo dos anos de 2021 e 2022.

No Brasil, a introdução dos métodos adequados para resolução de conflitos surge por meio da Resolução n. 125/2010 do CNJ (CNJ, 2010CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Resolução n. 125, de 29 de novembro de 2010. Dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providências. Brasília: CNJ, 2010. Disponível em: Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2011/02/Resolucao_n_125-GP.pdf . Acesso em: 6 ago. 2024..
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), que implementa a política judiciária nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário, em prol da disseminação da cultura de pacificação social e da efetividade da justiça. Reforçando esse movimento, surgem a Lei n. 13.105/2015 (Código de Processo Civil - CPC [Brasil, 2015aBRASIL. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Brasília: Presidência da República, 2015a. Disponível em: Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm . Acesso em: 6 ago. 2024.
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]) e a Lei n. 13.140/2015 (Lei de Mediação [Brasil, 2015bBRASIL. Lei n. 13.140, de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública [...]. Brasília: Presidência da República, 2015b. Disponível em: Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13140.htm . Acesso em: 6 ago. 2024.
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]). Nesse contexto, os próprios tribunais adotaram novos meios de solução de conflitos. Para Medina (2023MEDINA, Carolina Martins. Mediação familiar: uma perspectiva luso-brasileira. Porto, Portugal: Cravo, 2023., p. 9), “o viés do célere acesso à Justiça proporcionado pela mediação é um forte aliado à sua expansão”. Para Almeida, Pelajo e Jonathan (2016ALMEIDA, Tania; PELAJO, Samantha; JONATHAN, Eva (coords.). Mediação de conflitos: para iniciantes, praticantes e docentes. Salvador: JusPodivm, 2016.), a mediação como política judiciária permite que os anseios sociais e individuais possam ser atendidos com efetividade.

Ao longo das últimas décadas, o conhecimento acerca da mediação no Brasil vem sendo produzido e disseminado por meio das normas supramencionadas e de manuais majoritariamente teóricos (Braga Neto, 2013BRAGA NETO, Adolfo. Mediação de conflitos: conceito e técnicas. In: SALLES, Carlos Alberto de; LORENCINI, Marco Antônio Garcia Lopes; SILVA, Paulo Eduardo Alves da. Negociação, mediação e arbitragem: curso básico para programas de pós-graduação em Direito. São Paulo: Método, 2013. p. 103-125.; Azevedo, 2016AZEVEDO, André Gomma de (org.). Manual de mediação judicial. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2016.; Almeida, Pelajo, Jonathan, 2016ALMEIDA, Tania; PELAJO, Samantha; JONATHAN, Eva (coords.). Mediação de conflitos: para iniciantes, praticantes e docentes. Salvador: JusPodivm, 2016.; Sampaio, 2019SAMPAIO, Lia Regina Castaldi. Mediação: conceito, etapas e técnicas. In: LAGRASTA, Valeria Ferioli; BACELLAR, Roberto Portugal. Conciliação e mediação: ensino em construção. São Paulo: Instituto Paulista de Magistrados (IPAM), 2019. p. 486-506.; Tartuce, 2021TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. Rio de Janeiro: Forense, 2021.), que aprofundam as discussões em torno do conceito de mediação e suas técnicas, do papel do mediador, dos princípios norteadores da abordagem e suas implicações jurídicas. Nesse cenário, ainda são poucos os estudos empíricos dedicados ao desvelamento desse conhecimento aplicado sobre a prática da mediação nos tribunais, que, atualmente, têm se constituído em um espaço institucional relevante e em expansão, inclusive no período da pandemia de covid-19 e na atuação judiciária por meios telemáticos, em que os tribunais brasileiros adaptaram o funcionamento dos serviços judiciários de forma remota, visando garantir o acesso à justiça (Resolução do CNJ n. 313/2020 [CNJ, 2020CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Resolução n. 313, de 19 de março de 2020. Estabelece, no âmbito do Poder Judiciário, regime de Plantão Extraordinário, para uniformizar o funcionamento dos serviços judiciários, com o objetivo de prevenir o contágio pelo novo Coronavírus - Covid-19, e garantir o acesso à justiça neste período emergencial. Brasília: CNJ, 2020. Disponível em: Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/files/original221425202003195e73eec10a3a2.pdf . Acesso em: 6 ago. 2024.
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]). Dessa forma, o TJRJ2 2 Ato Normativo n. 8/2020 do TJRJ c/c Recomendação n. 1/2020 do NUPEMEC/TJRJ. adotou a resolução on-line de disputa (ODR), inclusive para a mediação, realizada por videoconferência, atual contexto da pesquisa.

É nesse sentido que se propõe aqui examinar a empiria da mediação a partir da Análise da Conversa (AC) (Sidnell; Stivers, 2013SIDNELL, Jack; STIVERS, Tanya (eds.). The Handbook of Conversation Analysis. Oxford: Wiley-Blackwell, 2013.), uma ferramenta teórico-metodológica de origem sociológica, que há anos vem fomentando na esfera jurídica, nomeada como Direito em ação (Atkinson; Drew, 1979ATKINSON, J. Maxwell; DREW, Paul. Order in Court: The Organisation of Verbal Interactions in Judicial Settings. Londres: Macmillan, 1979.; Ferraz de Almeida; Drew, 2020FERRAZ DE ALMEIDA, Fabio; DREW, Paul. The Fabric of Law-In-Action: ‘Formulating’ the Suspect’s Account During Police Interviews in England. Journal of Speech, Language and Law, [s.l.], v. 27, n. 1, p. 35--58, 2020.), perspectiva pela qual se considera que os seres humanos realizam ações pela linguagem, e as instituições, por meio dela, suas tarefas centrais: mediadores abrem a sessão de mediação, as partes relatam suas estórias, os advogados defendem os interesses de seus clientes, etc.

Uma forma de tornar visível a ação humana é por meio do uso de transcrições de dados reais de fala-em-interação, com descrições pormenorizadas de como a ação (verbal e não verbal) transcorre, em sequências organizadas de ação. A organização interacional da mediação emerge, pois, como lócus interdisciplinar relevante para a pesquisa (Garcia, 2010GARCIA, Angela. The Role of Interactional Competence in Mediation. Conflict Resolution Quartely, [s.l.], v. 28, n. 2, p. 205-228, 2010.; 2019GARCIA, Angela. How Mediation Works: Resolving Conflict Through Talk. Cambridge: Cambridge University Press, 2019.). Nesse sentido, os estudos com base nos dados audiovisuais da mediação nos tribunais ajudar-nos-ão a compreender como a atividade forense fabrica o Direito em ação na sociedade.

Uma ferramenta de comunicação central na mediação é a escuta ativa, considerada “primordial nos diálogos colaborativos” (Almeida, 2014ALMEIDA, Tania. Caixa de ferramentas em mediação: aportes práticos e teóricos. São Paulo: Dash, 2014., p. 80), ou, ainda, uma técnica de gestão do conflito (Azevedo, 2016AZEVEDO, André Gomma de (org.). Manual de mediação judicial. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2016., p. 125), que é explicada pelo mediador na abertura da mediação e praticada por ele ao longo das sessões. Essa ferramenta comparece, entretanto, na fala de mediadores no discurso de abertura nas mediações de nosso corpus como ferramenta dos mediandos, e isso não está ainda descrito em nenhuma literatura, pelo que sabemos até o presente momento.

Nesse sentido, este artigo propõe apresentar como a escuta ativa é colocada como ferramenta de comunicação dos mediandos, bem como descrever de que forma ela tem sido aplicada por eles ao longo das sessões de mediação, como contribuição a essa lacuna teórica.

1. A mediação e suas etapas

Primeiro, é importante mencionar que há vários modelos de mediação, fundamentados em pressupostos teóricos distintos, que variam conforme procedimento e forma de atuação. Dentre esses modelos, destacamos três principais: modelo linear (Fisher; Ury, 1981FISHER, Roger; URY, William. Getting to Yes: Negotiating Agreement without Giving In. Boston, MA: Houghton Mifflin Co, 1981.), modelo transformativo (Bush; Folger, 1994BUSH, Robert A. Baruch; FOLGER, Joseph P. The Promise of Mediation: Responding to Conflict Through Empowerment and Recognition. São Francisco: Jossey-Bass, 1994.) e modelo narrativo (Cobb, 1994COBB, Sara. A Narrative Perspective on Mediation: Toward the Materialization of the Storytelling Metaphor. In: FOLGER, Joseph P.; JONES, Tricia S. (eds.) New Directions in Mediation: Communication Research and Perspectives. Thousand Oaks, Califórnia: Sage, 1994. p. 48-63.; Winslade; Monk, 2000WINSLADE, John; MONK, Gerald. Narrative Mediation: A New Approach to Conflict Resolution. São Francisco, CA: Jossey-Bass, 2000.).

Definiremos somente o modelo linear, por ser comumente adotado pelos tribunais brasileiros (Nascimento, 2017NASCIMENTO, Meire Rocha do. Mediação como método de solução consensual de conflitos: definição, modelos, objeto, princípios, previsão no CPC 2015, fases e técnicas, papéis do advogado e do Ministério Público. Revista Fonamec, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p. 321-337, 2017.), inclusive pelo TJRJ, lócus deste artigo. O modelo linear de mediação tem suas origens no Projeto de Negociação de Harvard, o qual identifica a mediação como um processo de negociação assistida. Ele destaca, como metodologia de negociação, a observância das seguintes questões: (i) separar as pessoas do problema, a fim de tratar não apenas dos interesses objetivos, mas preservar o relacionamento subjacente; (ii) focar nos interesses, e não nas posições, isto é, buscar pelas motivações e necessidades a serem atendidas; (iii) gerar opções de benefícios mútuos, ou seja, buscar por alternativas diversas de soluções do conflito; e (iv) utilizar critérios objetivos como meios de se chegar a uma solução sem imposições recíprocas ao longo da negociação (Fisher; Ury; Patton, 2014FISHER, Roger; URY, William; PATTON, Bruce. Como chegar ao sim: como negociar acordos sem fazer concessões. Rio de Janeiro: Solomon, 2014.).

Entendida como um processo de negociação facilitada por um terceiro neutro (mediador), na tentativa de resgate do diálogo entre os envolvidos em um conflito, a mediação tem como macro objetivo a pacificação social por meio da transformação da atual cultura do litígio em cultura de paz/do diálogo (Watanabe, 2013WATANABE, Kazuo. Política judiciária nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses: utilização dos meios alternativos de resolução de controvérsias. In: ZUFELATO, Camilo; YARSHELL, Flávio Luiz. 40 anos da teoria geral do processo no Brasil: passado, presente e futuro. São Paulo: Malheiros Editores, 2013.). A Lei de Mediação (Brasil, 2015bBRASIL. Lei n. 13.140, de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública [...]. Brasília: Presidência da República, 2015b. Disponível em: Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13140.htm . Acesso em: 6 ago. 2024.
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), em seu art. 1o, parágrafo único, descreve a mediação como “a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia”.

Para Azevedo (2016AZEVEDO, André Gomma de (org.). Manual de mediação judicial. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2016.), em manual que orienta a mediação judicial, como nos nossos dados, a mediação é um procedimento estruturado, composto “por um conjunto de atos coordenados lógica e cronologicamente” (Azevedo, 2016AZEVEDO, André Gomma de (org.). Manual de mediação judicial. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2016., p. 147), identificados pelo autor com a seguinte estrutura global da mediação: (i) o início da mediação; (ii) reunião de informações; (iii) identificação de questões, interesses e sentimentos; (iv) esclarecimento das controvérsias e dos interesses; (v) resolução das questões; (vi) registro das soluções encontradas. Já Spengler (2021SPENGLER, Fabiana Marion. Mediação de conflitos: da teoria à prática. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2021.) reporta a estrutura da mediação em cinco estágios: (i) orientação às partes (pré-mediação); (ii) reunião de abertura; (iii) reuniões particulares, se necessário; (iv) reuniões conjuntas e particulares para debater propostas de acordo; (v) acordo e a redação do acordo.

Apesar de diferenças nas duas propostas - a existência de pré-mediação, acompanhamento, e diferenças nas denominações das fases -, firmamos com Jonathan e Almeida (2016JONATHAN, Eva; ALMEIDA, Rafael. Dinâmicas da mediação: etapas. In: ALMEIDA, Tania; PELAJO, Samantha; JONATHAN, Eva (eds.). Mediação de conflitos: para iniciantes, praticantes e docentes. Salvador: JusPodivm, 2016. p. 241-255., p. 242), que, no contexto brasileiro, parece haver “certa tendência de se adotarem práticas similares”. Além disso, é necessário considerar que “os estágios da mediação são frequentemente difíceis de identificar, e, muitas vezes, variam segundo as culturas na sequência, ênfase e abordagem” (Moore, 1998MOORE, Christopher W. O processo de mediação: estratégias práticas para a resolução de conflitos. Porto Alegre: ArtMed, 1998., p. 34).

Há diversos estudos acerca da mediação sob a ótica da AC, mas destacamos a pesquisa da autora Angela Garcia (2019GARCIA, Angela. How Mediation Works: Resolving Conflict Through Talk. Cambridge: Cambridge University Press, 2019.), por se debruçar sobre a organização interacional da mediação, algo mais próximo de um trabalho sobre a estrutura global da referida abordagem. Para a autora, comparada a audiências e julgamentos, a mediação é o procedimento no tribunal que oportuniza aos jurisdicionados um espaço de fala, em que trazem suas estórias, posições e interesses (Garcia, 2019GARCIA, Angela. How Mediation Works: Resolving Conflict Through Talk. Cambridge: Cambridge University Press, 2019., p. 58), uma interação conversacional semelhante a conversa cotidiana, mas diferente no sentido de constituir um sistema de troca de turnos de falas específico: falas geralmente direcionadas ao mediador, observadas as vezes de cada um falar, sem que haja interrupções da fala do outro, características que evitam a escala do conflito (Garcia, 2019GARCIA, Angela. How Mediation Works: Resolving Conflict Through Talk. Cambridge: Cambridge University Press, 2019., p. 59).

2. A escuta ativa na mediação

A escuta ativa é apontada na doutrina como uma ferramenta de comunicação a ser utilizada pelo mediador com a finalidade de acolher e demonstrar compreensão sobre as questões que são trazidas pelos mediandos (Almeida, 2016ALMEIDA, Diogo A. Rezende; PAIVA, Fernanda. Dinâmica da mediação: atores. In: ALMEIDA, Tania; PELAJO, Samantha; JONATHAN, Eva (coords.). Mediação de conflitos: para iniciantes, praticantes e docentes. Salvador: JusPodivm, 2016. p. 257-270., p. 66). O Manual de mediação judicial (Azevedo, 2016AZEVEDO, André Gomma de (org.). Manual de mediação judicial. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2016., p. 125 e 151) afirma que a escuta ativa (escuta dinâmica) é uma técnica específica de gestão de conflito e uma habilidade do mediador de escutar com atenção, e conceitua a escuta ativa do mediador da seguinte forma:

Ouvir ativamente significa escutar e entender o que está sendo dito sem se deixar influenciar por pensamentos judicantes ou que contenham juízos de valor - ao mesmo tempo deve o ouvinte demonstrar, inclusive por linguagem corporal, que está prestando atenção ao que está sendo dito (Azevedo, 2016AZEVEDO, André Gomma de (org.). Manual de mediação judicial. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2016., p. 202).

Tartuce (2021TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. Rio de Janeiro: Forense, 2021., p. 255) afirma que, “pela escuta ativa, o mediador não só ouve, mas considera atentamente as palavras ditas e as mensagens não expressas verbalmente”, ressaltando a importância dos gestos que acompanham a escuta, como a expressão facial do mediador, por exemplo. O autor esclarece que alguns comportamentos fazem parte da escuta ativa, como “evitar escutar e digitar/escrever ao mesmo tempo”, “reduzir ao máximo gestos que possam distrair o interlocutor”, “fugir à tentação de interromper a pessoa no meio de sua fala” (Tartuce, 2021TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. Rio de Janeiro: Forense, 2021., p. 255).

Para Almeida (2014ALMEIDA, Tania. Caixa de ferramentas em mediação: aportes práticos e teóricos. São Paulo: Dash, 2014., p. 290), “uma escuta ativa pressupõe não somente a atenção, como também uma atitude participativa no diálogo - escuta dinâmica”, distinguindo entre ouvir (fisiológico) e escutar (auscultare). Assim, quando o mediador escuta ativamente, uma escuta “permeada por perguntas, resumos, parafraseios, redefinições e recontextualizações de falas e de percepções” (Almeida, 2014ALMEIDA, Tania. Caixa de ferramentas em mediação: aportes práticos e teóricos. São Paulo: Dash, 2014., p. 202), o contexto do conflito pode ser compreendido mais amplamente e as perspectivas e os sentimentos iniciais dos mediandos podem ser modificados.

Medina (2023MEDINA, Carolina Martins. Mediação familiar: uma perspectiva luso-brasileira. Porto, Portugal: Cravo, 2023.) explica que o mediador é uma pessoa imparcial ao conflito e voltada para a reconstrução da comunicação entre os mediandos, comparando-o ao psicólogo na medida em que “ouve e acolhe sem dar respostas aos problemas que lhe são apresentados” (p. 174) e, nesse processo, “constrói uma ponte entre os envolvidos” na mediação (p. 174), de forma que os próprios mediandos possam assumir o protagonismo na construção da solução do conflito.

Segundo Spengler (2021SPENGLER, Fabiana Marion. Mediação de conflitos: da teoria à prática. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2021., p. 65), na escuta ativa, “o ouvinte busca compreender e se comunicar acerca do sentido e o motivo de mensagens verbais e não verbais (postura corporal), percebendo assim informações ocultas contidas na comunicação”. Por isso, Spengler (2021SPENGLER, Fabiana Marion. Mediação de conflitos: da teoria à prática. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2021., p. 65, 66) afirma que “ouvir bem é uma habilidade importante que o mediador pode utilizar”, devendo o mediador ouvir no lugar de aconselhar e “escutar mais do que falar”.

A despeito das concepções teóricas, será mostrado aqui, por meio de análise empírica, quais são os significados atribuídos pelos mediadores à escuta ativa e como o exercício dela é apresentado como uma ferramenta a ser utilizada também pelos demais participantes da mediação, bem como a maneira pela qual os mediandos colocam a técnica em ação ao longo das sessões de mediação, a fim de que seja possível a análise comparativa.

3. Análise da conversa etnometodológica

Utiliza-se aqui a Análise da Conversa Etnometodológica (Sacks, 1992SACKS, Harvey. Lectures on Conversation. Oxford: Basil Blackwell, 1992. v. 1 e 2.) como ferramenta para se descrever a escuta ativa como atividade interacional na mediação. A Análise da Conversa (AC) é um campo de pesquisa estabelecido nas Ciências Sociais e parte do princípio de que o ser humano, ao falar, realiza ações para resolver seus afazeres cotidianos, tais como convidar alguém para um café, marcar uma consulta médica ou ajuizar uma ação de alimentos no tribunal. Há ações humanas que são mais instrumentais, como operar um paciente, consertar um carro ou pintar uma parede, e outras, mais verbais, como fazer uma sustentação oral em tribunal, mas fato é que todas elas envolvem seres humanos, que coordenam suas ações, em alguma medida, por meio da fala-em-interação.

A AC é uma abordagem naturalística, que utiliza gravações de áudio e/ou vídeo de interações ocorridas em ambientes naturais, não laboratoriais, como dado primário da pesquisa, a partir do qual elabora transcrições detalhadas, que permitem ao pesquisador examinar como a ação social foi produzida. Na AC, estuda-se “a fala das pessoas propriamente dita - não seus pensamentos, intenções, emoções, crenças ou experiências de vida, assumidos como subjacentes à fala” (Ostermann, 2008OSTERMANN, Ana Cristina. Análise da Conversa (Aplicada) como uma abordagem para o estudo de linguagem e gênero: o caso dos atendimentos a mulheres em situação de violência no Brasil. Athenea Digital, Barcelona, Espanha, n. 14, p. 245-266, 2008., p. 246). As transcrições são importantes também por permitirem ao pesquisador revisitar seus dados reiteradamente, para checar o grau de acuidade das descrições feitas das ações. Essa é uma das formas de se garantir a validade das pesquisas, por meio da manutenção do ponto de vista êmico, i.e., dos participantes da interação, e não o do analista. Isso faz com que a AC seja uma metodologia de tipo indutiva, produzindo teoria a partir da empiria.

Afirmamos com Garcia (2010GARCIA, Angela. The Role of Interactional Competence in Mediation. Conflict Resolution Quartely, [s.l.], v. 28, n. 2, p. 205-228, 2010., p. 205) que “o substrato interacional é um domínio de estudo muitas vezes negligenciado, mas crítico, para determinar como maximizar a eficácia das interações em uma variedade de ambientes de trabalho e organizacionais”, e isso ainda vale para a área de mediação.

Materialmente, a fala é produzida por meio de elocuções em turnos de fala, ou seja, na vez de cada um falar. Para o entendimento da ação social, é central o exame do formato de como uma ação é produzida, ou seja, do desenho do turno. Um interagente sempre escolhe uma maneira de produzir a ação dentre um leque de alternativas de como essa ação pode ser produzida. Um convite pode ser feito de forma efusiva, e respondido de forma pouco acolhedora, por exemplo. Daí advém outro conceito fundamental: o de sequencialidade. As ações na fala não ocorrem de forma isolada, uma primeira ação desencadeará uma segunda ação responsiva, de forma que podemos ter vários turnos de fala conectados por uma mesma ação central (Schegloff, 2007SCHEGLOFF, Emanuel. Sequence Organization in Interaction: A Primer in Conversation Analysis. Cambridge: Cambridge University Press, 2007.). Daí decorre também outro princípio metodológico, ligado à perspectiva êmica, asseverada anteriormente: um próximo turno de fala representa uma demonstração pública de entendimento do falante corrente da ação executada no turno anterior, de forma que os participantes de interação estão sempre dizendo para o outro em que contexto se encontra aquilo que está dizendo. Esse princípio é chamado de procedimento de prova do próximo turno3 3 Ver Drew (2022) para uma crítica desse conceito. Em síntese, o argumento é de que o próximo turno representa uma análise da ação implementada no turno anterior, logo, não prova nada, mas propõe uma interpretação de ação, sendo, portanto, uma atribuição de ação em si. (Sidnell; Stivers, 2013SIDNELL, Jack; STIVERS, Tanya (eds.). The Handbook of Conversation Analysis. Oxford: Wiley-Blackwell, 2013.).

As interações de ODR, no caso, a mediação on-line, são do tipo institucional. A AC entende um tipo de fala como institucional quando (i) pelo menos um dos participantes orienta-se para uma meta-fim, tarefa ou identidade principal da instituição; (ii) ocorrem restrições ao que pode ser considerado contribuição conversacional possível/desejável naquele contexto; (iii) a fala está sujeita a arcabouços inferenciais específicos daquele contexto (Drew; Heritage, 1992DREW, Paul; HERITAGE, John. Introduction. In: DREW, Paul; HERITAGE, John (eds.). Talk at Work: Interaction in Institutional Settings. Cambridge: Cambridge University Press, 1992. p. 3-65.). Os autores advertem, entretanto, que esses parâmetros não funcionam cem por cento do tempo, trata-se muito mais de uma tentativa de se mapearem “semelhanças de família entre os casos de fala institucional” (Drew; Heritage, 1992DREW, Paul; HERITAGE, John. Introduction. In: DREW, Paul; HERITAGE, John (eds.). Talk at Work: Interaction in Institutional Settings. Cambridge: Cambridge University Press, 1992. p. 3-65., p. 21). Em termos de pesquisa da fala institucional, pode-se tratar das seguintes dimensões: (i) escolha lexical; (ii) desenho do turno de fala; (iii) organização sequencial; (iv) organização estrutural global (as fases da interação); (v) assimetrias epistemológicas (Drew; Heritage, 1992DREW, Paul; HERITAGE, John. Introduction. In: DREW, Paul; HERITAGE, John (eds.). Talk at Work: Interaction in Institutional Settings. Cambridge: Cambridge University Press, 1992. p. 3-65.).

Nos dados de mediação judicial analisados aqui, percebe-se claramente a orientação dos participantes para o contexto institucional judicial: é o mediador quem abre a sessão e toma o turno por um período mais longo, divide sua fala com outro mediador, e as partes precisam pedir o turno para falar, entre outras características.4 4 Ver Garcia (2019) para discussão mais ampla da mediação como fala institucional. Nossa pesquisa abarca a organização sequencial, o desenho do turno, as escolhas lexicais, e, ainda, considera as questões epistemológicas na interação.

4. Metodologia de pesquisa e contextualização dos dados

Relata-se aqui pesquisa de natureza qualitativa, que utiliza gravações e transcrições, por meio das quais se dá visibilidade e materialidade a fenômenos sociais, estudados em cenários naturais de ocorrência (Denzin; Lincoln, 2005DENZIN, Norman K.; LINCOLN, Yvonna S. (eds.). The Sage Handbook of Qualitative Research. Califórnia: Sage, 2005.). Utilizam-se gravações de sessões de mediação judicial on-line, ocorridas nos anos de 2021 e 2022, por videoconferência, via aplicativo Microsoft Teams, em Cejuscs, no âmbito do TJRJ, estando presentes mediadores, mediandos, advogados e pesquisadores, posteriormente transcritas no modelo Jefferson da Análise da Conversa (Jefferson, 2004JEFFERSON, Gail. Glossary of Transcript Symbols with an Introduction. In: LERNER, Gene H. (org.). Conversation Analysis: Studies from the First Generation. Amsterdã: John Benjamins, 2004. p. 13-31.; ver Anexo), que usa a fonte Courier New 10, por permitir melhores ajustes gráficos dos símbolos nos documentos, conforme prática na área. Para captar a perspectiva dos participantes, as transcrições marcam diversos fenômenos da fala-em-interação, centrais para a caracterização da ação, como ritmo, volume, contornos prosódicos, pausas, sobreposições, etc. No que diz respeito ao vernáculo, utiliza-se o sistema misto de transcrição, em que algumas palavras são transcritas do jeito que foram faladas, e outras, de acordo com a Norma Gramatical Brasileira (NGB) vigente, para manter a clareza e legibilidade das transcrições.

Esta pesquisa obteve aprovação do comitê de ética em pesquisa em seres humanos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) (CAAE 52299821.8.0000.5286) e segue todos os preceitos de ética em pesquisa em seres humanos, conforme dispostos nas Resoluções n. 466/2012 e n. 510/2016 do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) (Brasil, 2012BRASIL. Conselho Nacional de Saúde. Resolução n. 466, de 12 de dezembro de 2012. Dispõe sobre as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 13 dez. 2012. Disponível em: Disponível em: http://www.conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Resolucao466.pdf . Acesso em: 8 ago. 24.
http://www.conselho.saude.gov.br/resoluc...
; 2016BRASIL. Conselho Nacional de Saúde. Resolução n. 510, de 7 de abril de 2016. Dispõe sobre as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 8 abr. 2016. Disponível em: Disponível em: http://www.conselho.saude.gov.br/resolucoes/2016/Resolucao510.pdf . Aceso em: 8 ago. 2024.
http://www.conselho.saude.gov.br/resoluc...
, respectivamente) e na Lei n. 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais - LGPD [Brasil, 2018BRASIL. Lei n. 13.709, de 14 de agosto de 2018. Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Brasília: Presidência da República, 2018. Disponível em: Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htm . Acesso em: 6 ago. 2024.
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_a...
]). O processo de livre esclarecimento sobre a pesquisa e obtenção de permissão para gravar seguiu estritamente o disposto na legislação. Para a manutenção da confidencialidade e proteção dos participantes, trocam-se todos os nomes de pessoas, lugares e instituições. Para as identidades institucionais de mediador, usam-se os termos Med 1, Med 2, respectivamente, para o mediador principal e o mediador em formação.

De um corpus de dezenas de mediações judiciais on-line gravadas, apresenta-se aqui extrato de uma coletânea de dados do Discurso de Abertura, em que os mediadores apresentam a escuta ativa às partes na mediação judicial on-line como uma ferramenta dos mediandos. Escolheram-se dois casos de mediação familiar, em que se descreve, com os detalhes da interação, como os mediadores apresentam a escuta ativa às partes. Além disso, a análise mostra momentos em que se pode analisar como as regras combinadas de tomada de turno são vividas, localmente, pelos participantes ao longo da mediação. Na ordem de apresentação disposta na seção de análise de dados, o primeiro caso trata-se de uma mediação pré-processual, que versa sobre a separação de um casal e suas tratativas acerca da convivência familiar e alimentos dos filhos menores, sendo três sessões para a conclusão do caso. O segundo caso é uma mediação endoprocessual sobre revisão de alimentos, na qual o pai requer alteração do valor pago de alimentos ao filho, mediação concluída em duas sessões.

5. Análise de dados

A análise de dados objetiva descrever como os mediadores constroem interacionalmente os sentidos da escuta ativa como ferramenta de comunicação dos mediandos no discurso de abertura na mediação judicial on-line, e como ela é usada pelos mediandos na mediação, a partir da microanálise situada de dados reais de fala-em-interação.

No Excerto 1, o mediador introduz a escuta ativa ligada à explicação do papel institucional geral do mediador de facilitador da comunicação entre as partes - “aqui, o que nós vamos fazer, (...) o diálogo de vocês.” (linhas 01-02):

Excerto 1 -
Excerto_1_1ªSM_MPre_Família_caso1

De maneira geral, aqui, o mediador assume uma postura didática, usando, entre outros recursos, o par adjacente pergunta-resposta para construir sequências interacionais, em que as perguntas do mediador vão selecionando-o como próximo falante, fazendo, assim, com que ele tenha um turno de fala estendido, sem haver troca de falantes, para realizar diversas ações. Corrobora essa postura didática o uso de recursos extralinguísticos que acompanham a fala, como pausas, autointerrupções e prolongamentos de sons, emprestando-lhe certo ritmo e promovendo ajustes nas ações do falante.

A primeira pergunta retórica do mediador é “e ↑como nós fazemos ↑isso.” (linhas 02-03), feita com o pronome interrogativo - “↑como”, destacado em ênfase entoacional, formula uma explicação prática. Na resposta, o mediador anuncia técnicas da mediação - “é:: (0.2) tem uma- algumas técnicas da mediação.” (linha 05), e coloca a escuta ativa como primeira do ranking - “= a primeira delas é a escuta (.) a- ti- va.” (linha 05-06). Note-se a ênfase de sentido com a autointerrupção entre as sílabas da palavra - “a- ti- va”.

O mediador faz sua fala progredir com uma segunda pergunta retórica - “o que que é a escuta a:tiva.” (linha 08). O pronome interrogativo - “o que que” - abre espaço para a introdução de uma definição, feita ao longo de várias elocuções na sequência (linhas 10-20), em que o mediador mantém a postura didática, construindo exemplos e regras, usando o primeiro nome das partes, como forma de aproximação. Centralmente, o mediador apresenta o comportamento não interruptivo, estabelecendo a ordem de fala, via ordem do pedido institucional - “a lívia:: (.) que começo::u- que ↑fez o pedido da mediação, >ela vai começá a falá:.<” (linhas 10-12), e formulando sua expectativa de comportamento da outra parte - “o má:rio vai ouvi-la, (.) não vai interrompê:.” (linhas 14-16), assegurando isonomia de tratamento - “depois o mário terá o tempo dele,” (linha 18), e fixando o papel da parte - “também a lívia ºnão irá interrompê-lo.º” (linhas 18-19).

Novamente, a fala do mediador progride com uma terceira pergunta retórica - “=<aí o ↑que que a gente sugere.” (linhas 19-20), promovendo mais fala sobre a escuta ativa, no caso, com uma sugestão, que será, como veremos, sua instrumentalização. Após breve pausa (linha 21), o mediador, em vez de produzir a resposta à pergunta retórica, usa prestações de contas (accounts) (Buttny, 1993BUTTNY, Richard. Social Accountability in Communication. Londres: Sage, 1993.) - “como a pessoa quando tá:: (.) ouvi:ndo, (...) qué (.) falá a::lgo” (linhas 22-25), formulando vários exemplos de possíveis motivos de incursão de um mediando na fala do outro, mas com conotação positiva. Em geral, a incursão na fala do outro é vista de forma negativa. Essas accounts servem como base para a aceitação da sugestão, iniciada em seguida - “então a gente suge::re que vocês tenham? ao la::do de você::s,” (linhas 25-26), mas interposta pelo anúncio de uma instrução, que não é formulada até o final - “pra isso eu vou dá:: até: inclusive um te::mpo? .h se vocês não es- não tive::rem, (0.2) ca:ne:ta e papel,<” (linhas 26-28). Repare-se novamente no uso de autointerrupções no meio da palavra - “ca:ne:ta” para marcar ênfase.

Esse pedido instrumental (incompleto) é novamente interposto pela produção de novas prestações de contas, comparando a mediação virtual com a presencial - “quando é:: um- quando é: uma mediação (.) é:: o- ao vi:vo, (.) a gente- >>na mesa<< nós temos >caneta e papel.<” (linha 32-34), construindo o pedido como baseado em uma rotina da mediação presencial, o que funciona como argumento para gerar aceitação da proposta do mediador.

A parte instrumental ocorre em seguida, e foi realizada em duas partes. Na primeira, o mediador anuncia um pedido aos mediandos, a se realizar em futuro próximo - “.< então vou pedir que vocês (.) .h é:: depo::is (.) tenham aí:: (.) caneta e pape::l,” (linha 34-35). Em mudança de rota temporal, o mediador, após pausa (linha 36), faz o pedido em si no próximo turno - “vocês têm aí::” (linha 37), mobilizando a ação dos participantes naquele momento. Mário produz uma resposta preferida (Pomerantz, 1984POMERANTZ, Anita M. Agreeing and Disagreeing with Assessments: Some Features of Preferred/Dispreferred Turn Shapes. In: ATKINSON, J. Maxwell; HERITAGE, John. Structures of Social Action: Studies in Conversation Analysis. Cambridge: Cambridge University Press, 1984.) - “[<eu tenho.” (linha 38), realizada prontamente, sem demora, de forma curta, atendendo de modo imediato o pedido do mediador. A partir daí, o mediador volta sua atenção para acompanhar a instrumentação prática do pedido com Lívia, acompanhando-a e a seu advogado na busca de papel e caneta, até a linha 55.

No Excerto 2, a seguir, mostramos um exemplo de comportamento de tomada de turno, como vivenciamento prático da regra de não interrupção combinada no início. Ele ocorre aos 37 minutos da interação, que tinha como pauta oficial o pedido de fixação de alimentos requerido por Lívia (mãe). Nas narrativas das partes, entretanto, surgiram questões relativas à divisão de bens do ex-casal e à troca de nome da ex-esposa, que a mediadora acolheu como extensão de pauta da mediação, sendo combinado que o advogado João Alexandre traria uma minuta com esses pontos na próxima sessão. Na linha 01, o mediador orientava-se para avançar na discussão ao anunciar nova pergunta, mas o advogado sobrepõe-se em linha 02:

Excerto 2 -
Excerto_2_1ªSM_MPre_Família_caso1

A sobreposição ocorre em razão de os dois participantes iniciarem sua fala juntos, quando o piso conversacional estava livre, ou seja, não havia nenhuma fala em andamento, e ninguém havia sido selecionado como próximo falante. Mas é a fala de João Alexandre que prossegue, após a finalização da sobreposição, em projeto interacional de explicar a ordem de encaminhamento da minuta: “eu vou minutá, vou encaminhá pro:: dotô mário.” (linhas 02-03). Repare-se no uso do título honorífico de advogado ao requerente - “dotô mário.”. Em seguida, seu turno de fala entra em problemas de progressão, quando formula o próximo passo (ou seja, para quem/como mandar a minuta após Mário) - “eu mando- eu não sei se eu mando por email. ou -o-o-o ou se-” (linhas 04-05). Seu turno não foi concluído, mas o mediador toma o turno de fala, e João Alexandre se autointerrompe, para corrigir-lhe o encaminhamento - “<não. o senhor pode deixar com o senho:r↑ no dia da mediação o senhor deixaria o uordi ((WORD)) o senhor passa pra mim↑” (linhas 06-08), excluindo Mário da leitura prévia do documento. João Alexandre aceita o encaminhamento do mediador - “pr[ont]o. perfeito.” (linha 09), que fecha a sequência - “[tá?]” (linha 10), adicionando explicação sobre a forma de trabalho conjunto com a minuta - “aí a gente já: faz todos os acertos aqui de acordo com a sua minuta.” (linhas 11-12).

O próximo momento da interação traz três participantes sobrepondo-se - o mediador, o advogado e o requerido (linhas 13-15). A fala do advogado é incompreensível, a do mediador, parcialmente - “[(xxx que vem)]” (linha 14), e orienta-se para desdobramento futuro dos encaminhamentos da minuta, e a fala de Mário, ainda que autointerrompida, sobressai com seu projeto interacional de forma clara na sobreposição - “[mas antes que]ria-” (linha 15), anunciando algo a ser tratado, antes do prosseguimento dos encaminhamentos da minuta. Após a sobreposição, Mário utiliza um marcador de polidez - “dá licença.” (linha 15), e retoma o tema da ordem de circulação da minuta (e de sua exclusão como leitor), propondo outro encaminhamento - “n- não seria bom eu dá uma (.) lida antes também?”. Repare-se a marcação da ação como delicada, via modalização, e acréscimo de account - “pra num- já-já facilitá o trabalho deles?” (linhas 19-20). A sequência termina (linhas 22-34) com os participantes entrando em acordo sobre essa proposta de encaminhamento.

No caso 2, o mediador em treinamento (Med 2) faz a abertura do encontro, falando a partir de anotações que mantém na mão, olhando para o papel. Aos dois minutos da interação, ou seja, logo no início, aborda o comportamento verbal de escuta das partes, introduzido como um pedido ligado à moralidade (linhas 01-03 do Excerto 3, a seguir).

Excerto 3 -
Excerto_3_1ªSM_MPro_Família_caso2

Seu turno entra em problemas de progressão, com várias autointerrupções - “é- s- é- sabemos que: (0.4) em alguns momentos, se vocês-” (linhas 03-04), após as quais o mediador formula o comportamento de escuta como regra de não interrupção durante a fala das partes, sintaticamente produzida como um pedido, via continuação sintática de - “gostaria de pedir (...) que” (linha 01): “quando um tiver fala::ndo, o outro sentir necessidade de falar, (0.3) não interrom::pa, (0.7) que ano:te,” (linhas 04-06), ou seja, como um pedido, justificado com duas prestações de contas, a primeira evocando o princípio da isonomia de tratamento às partes - “vai ser dado a você o mesmo tem:po, e no seu momento você- após ter anotado >o que falá,< você pode falar,” (linhas 06-08), e a segunda evocando consequências práticas de problemas técnicos da “mediação telepresencial,” - “porque se interrompê, (...) pra alguns vai aparecer só: (.) ruídos e vai ficar difícil o nosso entendimento. h. durante a mediação.” (linhas 10-16). Após pausa relativamente longa (linha 17), o mediador produz um próximo turno de encerramento de sequência - “tá? =então eu gostaria de tá lembrando (...) que vocês anotem. =tá? .hh” (linhas 18-20), transformando o que era pedido em lembrança - “tá lembrando”, isto é, em conhecimento prévio compartilhado pelos participantes.

Os Excertos 4 e 5, a seguir, provêm do mesmo caso 2 e retratam um episódio de conflito entre os mediandos, Carlos (requerente) e Luciana (requerida). Carlos é o requerente em processo de regulamentação de visitas. Na mediação, toma-se conhecimento de que não houve relação conjugal entre eles, e a filha nasceu como fruto de uma relação de curto tempo. Luciana demonstrava insatisfação com o não cumprimento de acordos de visitação de Carlos à filha e com constantes mudanças repentinas nos planos de visitação. Durante a mediação, surge também nova pauta: pedido de Luciana de revisão de alimentos. Ambos estão acompanhados de advogado. Houve recondução para uma segunda sessão, 15 dias após a primeira, sessão individual antes da segunda sessão conjunta e troca de minuta do acordo entre os advogados.

O Excerto 4 mostra várias violações ao espaço de fala do outro durante o episódio de conflito, iniciado por Luciana (linha 03).

Excerto 4 -
Excerto_4_ 1ªSM_Pro_Família_caso2

O episódio de conflito é iniciado por um pedido de prestação de contas5 5 Entendemos prestações de contas como produções linguísticas e retóricas usadas quando explicamos ou justificamos algo para outros, ou para nós mesmos. As prestações de contas são mobilizadas para explicar comportamentos imprevistos ou desagradáveis, em acepção tradicional do termo, seguindo Scott e Lyman (1968), ou, ainda, “para fornecer um relato de eventos, ações e assim por diante, que não envolvam comportamento desagradável” (Tileagă, 2015, p. 1). de Luciana a Carlos - “>aí todo mês vai acontecer um problema diferen[te?<=” (linhas 03-04), que na verdade é uma acusação de não cumprir com os acordos de horário de visitação. Em sobreposição final ao turno de Luciana, Carlos produz um turno de fala com uma única elocução, de negação - “[não↓” (linha 05), mas Luciana continua sua fala, sem pausa, cuidando para conseguir produzir um turno de fala com uma elocução do tipo sentencial, ou seja, com vários núcleos verbais “=[>eu con]cordo que:: [que::] que:<” (linha 06) “[>que imprevistos [acontecem, carlos, <” (linha 10), “mas [assim, todo] mês?,” (linha 16). Carlos sobrepõe-se a ela em três momentos, primeiro reemitindo a negativa - “[ n ã o↓ ]” (linha 07), e depois tentando iniciar uma nova elocução - “[você-]” (linha 08), “se [você-” (linha 09), sem sucesso.

Após longa pausa (linha 18), Carlos toma o turno de fala, produzindo sua defesa, rejeitando a acusação, recalibrando a frequência para inaugural “não↓ desde que eu comecei a trabalhá, >é- é essa< foi a primeira vez.” (linhas 19-20). Novamente, temos, no próximo turno, uma ação e oposição por Luciana, produzida inclusive com aumento de volume e aceleração - “>NÃO↓ eu posso contá [aqui pra você:: é:- é:- =” (linha 22) “= as mensagens de whatsapp que eu tenho aqui.” (linha 24). Para Vuchinich (1990VUCHINICH, Samuel. The Sequential Organization of Closing in Verbal Family Conflict. In: GRIMSHAW, Allen Day (ed.). Conflict Talk: Sociolinguistic Investigations of Arguments in Conversations. Nova York: Cambridge University Press, 1990. p. 118-138.), essa é exatamente a típica anatomia do conflito, ou seja, a produção de turnos de fala sucessivamente opositivos.

Após nova (longa) pausa (linha 25), Carlos produz acusação de fabricação por Luciana da situação - “t(h)á. tá, se você quisé começá a falá de- (.) de- de menti:ra,” (linhas 26-27), acompanhada de prestação de contas que o reposiciona identitariamente como alguém atuando em prol dos objetivos da mediação - “<mas eu tô querendo [ser objetivo.” (linha 29). A sequência se encerra com agravamento do conflito, por meio de nova sobreposição por Luciana, em lugar não relevante para a transição, e no meio de um turno de fala em andamento, para produzir nova oposição, com aceleração e aumento de volume em porção considerável do enunciado - “[<DE MENTIRA NÃO, eu tenho aqui [as mensa[gens.” (linhas 30-31).

O Excerto 5 é imediatamente contíguo ao Excerto 4 e mostra a intervenção do mediador no conflito, refocando a interação para objetivos da mediação.

Excerto 5 -
Excerto_5_ 1ªSM_Pro_Família_caso2

A fala de Luciana é sobreposta pelo mediador - “[↑o:lha-” (linha 03) e por Carlos - “[<tá luciana,” (linha 04), tentando tomar o turno de fala, em meio a um turno de fala em andamento e não finalizado, em lugar tecnicamente não relevante para a transição, mas com objetivos distintos: enquanto o de Carlos provavelmente era o de investir no conflito, o do mediador é o de retomar a mediação. O mediador faz um pedido de ordem - “[v a m o só organizá] a conversa,” (linha 06), seguido de explicação que retoma os propósitos da mediação - “porque senão- >é- é-< se vocês começarem a falar ao mesmo tempo, a gente não vai conseguí caminhá: pra uma::- um entendimen::to entre vocês,” (linhas 06-09). A partir desse momento, o mediador mantém o turno de fala sozinho por certo tempo, produzindo elocuções que explicam o sentido da mediação, primeiro afastando efeitos indesejados da mediação - “.h >e a gente também não qué aqui< que a mediação seja::: (0.6) é:::: algo que piore a relação de vocês, =muito pelo contrário.” (linhas 11-13), e depois expressando os efeitos positivos - “o que a gente q- gostaria aqui: é que vocês tivessem uma: comunicação (0.2) que ajudasse vocês a chegá >no mesmo objetivo que vocês têm.<” (linhas 15-17). O mediador fecha essa sequência produzindo uma explicação que retoma o ponto central da mediação, capaz de unir os mediandos e provocar o movimento de superação do conflito entre eles - “porque vocês têm alguns objetivos em comum.” (linha 19), expandido em sua totalidade, retomando a pauta da mediação após pausa (linha 20) - “>vocês- vocês dois< querem definí↓ (0.5) bem- é:- de forma bem definida, é::: (0.7) a visitação da:: da:: (.) ana maíra, né,” (linhas 21-23).

Conclusão

Foi objetivo descrever com dados reais de fala-em-interação de mediação judicial on-line como os mediadores constroem o sentido da escuta ativa como ferramenta de comunicação dos mediandos em cinco excertos, via empiria, para poder-se vislumbrar possibilidades de aplicação dos resultados à mediação.

Nos Excertos 1 e 3, dois diferentes mediadores produzem elocuções para introduzir o tema, mas, no caso 1, o mediador utiliza um termo técnico da mediação - a escuta ativa -, enquanto, no caso 2, o mediador formula uma expectativa (moral) de comportamento na mediação, o respeito ao outro. Os dois mediadores utilizam prestações de conta que acompanham essa ação, justificando a regra, em certo sentido, parecidas, por serem “naturais” (vontade espontânea de falar ao mesmo tempo / ruído provocado pelo modo remoto), mas o Mediador 1 evoca também o princípio da isonomia de tratamento das partes na mediação, assegurando iguais direitos de fala, e, além disso, executa, durante a interação, uma tarefa instrumental de preparação das partes para ouvirem sem interromperem, pedindo que peguem caneta e papel ali, na hora.

Nos Excertos 2, 4 e 5, o funcionamento da regra de não interrupção na mediação por meio da análise do comportamento de tomada de turno dos participantes também mostrou práticas distintas. No Excerto 2 (caso 1), o próprio mediador tomou o turno para fazer uma correção, do ponto de vista da correção da ação em curso, o mais cedo possível; já o mediando utilizou de polidez para poder ter acesso ao turno de fala. Os Excertos 4 e 5 mostraram fenômeno importante em mediações - situações de conflito, em que o comportamento não interruptivo não funcionou; ao contrário, os participantes escalonaram o conflito, interpondo sucessivamente ações opositivas, não cedendo o turno de fala, adentrando o espaço de fala do outro, etc. Apesar de não ser foco do artigo, viu-se também como o mediador lidou com o conflito, utilizando prestações de contas.

A pesquisa em AC sobre mediação judicial contribui para o campo de estudos da mediação e do Direito na medida em que apresenta o fenômeno jurídico em ação, tal como é na realidade, por meio da utilização das transcrições de dados reais, o que pode colaborar para o aprendizado e o aperfeiçoamento profissional de mediadores, já que possibilita compreender como atuar a partir da experiência vivenciada, ao contrário do que dispõem as normas legais e os livros de formação de mediadores, que partem de conceitos abstratos e casos hipotéticos, tornando mais visível o papel do mediador na dinâmica interativa. Além disso, o uso de transcrições permite ao profissional a possibilidade de análise de um caso real, repetidamente, do ponto de vista comunicacional, das causas e dos efeitos de escolhas lexicais, de entonações e, inclusive, do próprio silêncio. Nesta pesquisa, a possível contribuição para o aperfeiçoamento profissional do mediador é a perspectiva da linguagem em uso, que constrói a escuta ativa no sentido de “não interrupção”. Ademais, quando a regra não é posta com clareza, há maior possibilidade de ocorrência da escalada do conflito com a recorrente e prolongada sobreposição de falas. Ainda, as transcrições possibilitam a (auto)análise de performances reais e abrem espaço para mudanças de comportamento, que consistem no cerne de todo processo de aprendizagem.

Como desdobramentos futuros da pesquisa, mais casos podem ser arrolados para estudo, a fim de criar maior adensamento de resultados, com a observância de possível repetição e diferenciação de fenômenos interacionais no âmbito jurídico. Por fim, o viés empírico da mediação mostra-se um caminho produtivo e necessário. Tendo em vista a importância das legislações processuais brasileiras, que priorizam os métodos consensuais para resolução de conflitos, a mediação judicial ganha cada vez mais espaço nos tribunais, inclusive por intermédio tecnológico, como a mediação judicial on-line.

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  • 1
    Esta pesquisa é apoiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq - 317339/2021-4). Os autores agradecem a Maria do Carmo Leite de Oliveira pela leitura do texto e pelas sugestões.
  • 2
    Ato Normativo n. 8/2020 do TJRJ c/c Recomendação n. 1/2020 do NUPEMEC/TJRJ.
  • 3
    Ver Drew (2022DREW, Paul. The Micro-Politics of Social Actions. In: DEPPERMANN, Arnulf; HAUGH, Michael. Action Ascription in Interaction. Cambridge: Cambridge University Press, 2022. p. 57-82.) para uma crítica desse conceito. Em síntese, o argumento é de que o próximo turno representa uma análise da ação implementada no turno anterior, logo, não prova nada, mas propõe uma interpretação de ação, sendo, portanto, uma atribuição de ação em si.
  • 4
    Ver Garcia (2019GARCIA, Angela. How Mediation Works: Resolving Conflict Through Talk. Cambridge: Cambridge University Press, 2019.) para discussão mais ampla da mediação como fala institucional.
  • 5
    Entendemos prestações de contas como produções linguísticas e retóricas usadas quando explicamos ou justificamos algo para outros, ou para nós mesmos. As prestações de contas são mobilizadas para explicar comportamentos imprevistos ou desagradáveis, em acepção tradicional do termo, seguindo Scott e Lyman (1968SCOTT, Marvin B.; LYMAN, Stanford M. Accounts. American Sociological Review, [s.l.], v. 33, n. 1, p. 46-62, 1968.), ou, ainda, “para fornecer um relato de eventos, ações e assim por diante, que não envolvam comportamento desagradável” (Tileagă, 2015TILEAGĂ, Cristian. Account Giving and Soliciting. In: TRACY, Karen; ILIE, Cornelia; SANDEL, Todd (eds.). The International Encyclopedia of Language and Social Interaction. Londres: John Wiley & Sons, 2015., p. 1).
  • Como citar este artigo

    CUNHA, Daniela Rabello da; FERREIRA, Juliana Lopes; GAGO, Paulo Cortes. A escuta ativa na mediação judicial on-line. Revista Direito GV, São Paulo, v. 20, e2428, 2024. https://doi.org/10.1590/2317-6172202428

ANEXO - CONVENÇÕES DE TRANSCRIÇÃO

Editado por

Catarina Helena Cortada Barbieri (Editora-chefe). duas decisões editoriais, incluindo desk review.
Pedro Salomon Bezerra Mouallem (Editor-chefe). duas decisões editoriais, incluindo a decisão final.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    17 Mar 2023
  • Aceito
    28 Mar 2024
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