Resumo
Gênero e sexualidade tornaram-se um foco de polarização política na América Latina. Em muitos países, atores religiosos, líderes políticos e organizações não governamentais (ONGs) “pró-vida” e “pró-família”, entre outros, uniram-se para promover uma mudança neoconservadora na política regional contemporânea. Apesar da constante presença pública de atores religiosos e de sua influência de longa data nas políticas públicas da região, os ataques recentes aos direitos sexuais e reprodutivos vêm de um campo em transformação. A mobilização antiaborto mostra importantes sinais de adaptações e mutações em diferentes frentes – em redes, alianças, estratégias e enquadramentos. Finalmente, esse processo de renovação levou à expansão do próprio campo de disputa para um campo ampliado da aliança antigênero, sendo digna de nota a importância crescente de estratégias e ferramentas legais para atores antiaborto. As transformações no campo do antiaborto foram colocadas em marcha globalmente com a derrota dos conservadores na Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) no Cairo e interagiram com diferentes processos locais, respondendo às dinâmicas relacionais entre movimento e contramovimento. De qualquer modo, observamos convergências importantes entre os casos latino-americanos. A partir de evidências de alguns estudos de caso de países na região, este artigo analisa as principais características do ativismo antiaborto na área e identifica os pontos comuns entre os casos, levantando a hipótese de que as mudanças atuais na composição das redes antiaborto, suas estratégias de mobilização e enquadramentos indicam uma tendência difundida transnacionalmente, embora sujeita a diferentes processos de vernacularização. O texto, em última instância, chama a atenção para a necessidade de mais pesquisa empírica para acessar as dinâmicas regionais de atores transnacionais, processos de difusão e adaptações locais.
Movimento antiaborto na América Latina; aborto; direitos sexuais e reprodutivos; campanhas antigênero; mobilização e contramobilização; neoconservadorismo; América Latina