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Por que a carteira de vacinação do Ex-Presidente da República é um documento público?

Why is the former President’s Vaccination Card a public document?

Resumo

Em 2021, no ápice da maior crise sanitária que o mundo experimentava desde a pandemia de 1918-1919, vacinas com alto grau de segurança e efetividade foram produzidas em tempo recorde, e começaram a ser distribuídas mundo a fora. O então Presidente da República do Brasil, que desde o início da crise sanitária vinha promovendo um discurso falso tentando minimizar a gravidade da nova doença e da crise sanitária, bem como promovendo falsas curas como o uso de remédios comprovadamente inefetivos para tratar o novo coronavírus, começou então uma campanha anti-vacinação. Seus discursos, suas falas e seus gestos tinham o intuito de embutir a dúvida nas pessoas acerca da segurança e da efetividade da vacina no Brasil. Ao mesmo tempo, ele afirmava consistentemente que não se vacinara e não se vacinaria. Muitos começaram a se perguntar sobre a existência de provas acerca da ocorrência de vacinação ou não, mas o governo sempre negava pedidos de acesso à informação, afirmando tratar-se de documento pessoal sensível. O objetivo deste artigo é construir um argumento sobre o porquê de a carteira de vacinação de um Presidente da República ser, ao menos nesse contexto da COVID, um documento de natureza pública, que deve ser de acesso público a todo e qualquer interessado. Chego a essa conclusão a partir do desenvolvimento das seguintes premissas: agentes públicos em geral e o Presidente da República em particular têm uma expectativa reduzida de privacidade; as palavras, gestos e atitudes do Presidente da República têm influências concretas sobre as pessoas e, no contexto pandêmico, podem ter causado mortes evitáveis; as informações contidas na carteira de vacinação do Ex-Presidente são necessárias para fins de responsabilização; o consentimento do titular de informações pessoais sensíveis torna-as públicas.

Palavras-chave:
Carteira de Vacinação; COVID; Fake news; Lei de Acesso à Informação; Erosões democráticas

Abstract

In 2021, at the height of the biggest health crisis the world had experienced since the 1918-1919 pandemic, vaccines with a high degree of safety and effectiveness were produced in record time, and began to be distributed around the world. The then President of of Brazil, who since the beginning of the health crisis had been promoting a false speech trying to minimize the severity of the new disease and the health crisis, as well as promoting false cures such as the use of proven ineffective medicines to treat the new coronavirus, an anti-vaccination campaign began in that year. His speeches, his lines and his gestures were clearly intended to embed doubt in people about the safety and effectiveness of the vaccine in Brazil. At the same time, he consistently stated that he had not been vaccinated and would not be vaccinated. Many began to wonder about the existence of evidence about the occurrence of vaccination or not, but the government always denied requests for access to information, claiming that it was a sensitive personal document. The purpose of this article is to build an argument about why the vaccination card of a President of the Republic is, at least in this context of COVID, a document of a public nature, which should be publicly accessible to any and all interested parties. I come to this by developing the following premises: public agents in general and the President of the Republic in particular have a reduced expectation of privacy; the words, gestures and attitudes of the President of the Republic have concrete influences on people and, in the context of the pandemic, may have caused preventable deaths; the information contained in the Past President's immunization record is required for accountability purposes; the consent of the holder of sensitive personal information makes it public.

Keywords:
Vaccination Card; COVID-19; Fake News; Access to Information Law; Democratic Backsliding

Introdução

Em março de 2020, o mundo entrou no que seria o maior trauma coletivo experimentado por nossa geração. Imediatamente, governos ao redor do mundo adotaram medidas emergenciais para conter o avanço da crise sanitária - como uso de máscaras, distanciamento social, suspensão de atividades presenciais não essenciais. Ao mesmo tempo, começaram a investir na única solução que sabidamente poderia acabar com a crise em definitivo - as vacinas.

Conforme a Organização Mundial da Saúde,1 1 Conforme informações contidas em https://www.who.int/health-topics/vaccines-and-immunization#:~:text=Immunization%20currently%20prevents%203.5%2D5,%2C%20pertussis%2C%20influenza%20and%20measles. vacinas atualmente previnem algo entre 3,5 a 5 milhões de mortes anuais - tétano, gripe, meningite, difteria são algumas das doenças mitigadas por vacinas. Vacinas alteraram profundamente o curso da humanidade e desde que existem salvaram mais vidas do que talvez qualquer outra tecnologia (McINTYRE, 2019McINTYRE, Lee. The scientific attitude: defending science from denial, fraud, and pseudoscience. Cambridge: Massachusetts Institute of Technology Press, 2019.). A história das vacinações é uma história de avanços, de vidas salvas, de progresso da humanidade (HOLMBERG et al, 2017HOLMBERG, Christine, et al. (editors). The Politics of Vaccination: A Global History. Manchester. Manchester University Press, 2017.). Elas são talvez o pilar mais estruturante da saúde global (GREENWOOD, SALISBURY & HILL, 2011GREENWOOD, Brian; SALISBURY, David; HILL, Adrian. Introduction: Vaccines and Global Health. Philosophical Transactions: Biological Sciences 366, no. 1579, 2011.). Estratégias de comunicação anti-vacina, a seu lado, são disruptivas para sua efetividade, por provocarem a quebra da confiança comunitária na imunização, bem como a consequente perda da chamada “imunidade de rebanho”, que só é atingida quando uma grande parte da população se encontra inoculada (ROTHSEIN, 2015)

Conforme a operação Warp Speed ganhava tração no norte global, as primeiras vacinas contra Covid começaram a ser produzidas, distribuídas e aplicadas já em dezembro de 2020, menos de um ano após o início da pandemia. A velocidade com que as vacinas foram testadas, produzidas e distribuídas foi um milagre tecnológico da humanidade. As vacinas combateriam um mal que era inimigo de todos: ainda que tenha atingido desproporcionalmente pessoas de cor, minorias e grupos marginalizados do ponto de vista socioeconômico, o coronavírus matou e destruiu vidas de esquerdistas e direitistas, de jovens e de idosos, de europeus e latinos, de brancos, negros e pardos. A vacina em produção era um bem para a humanidade, não para um grupo de pessoas ou um grupo político. Incentivar a vacinação, vacinar-se e promover estratégias de vacinação eram obrigações de todos os líderes políticos, qualquer que fosse sua ideologia ou seu campo político.

O Brasil foi um dos pouquíssimos países do mundo, senão o único, em que o líder máximo do país optou por se manifestar pública e reiteradamente contra a vacinação. Por diversas ocasiões, o Ex-Presidente da República pediu à população que não se vacinasse. Ao fazê-lo, ele projetou desconfiança no processo de vacinação e criou dúvidas na mente de muitos cidadãos brasileiros. Ao mesmo tempo, afirmou que não se vacinou e não se vacinaria. A partir dessa afirmação reiterada do ex-Presidente da República, começou a se desenhar uma dúvida na população: há provas de que o ex-Presidente não fora vacinado? É possível que o público tenha acesso a esse documento?

Quando demandados sob o governo Bolsonaro, órgãos públicos como a Secretaria-Geral da Presidência da República e o Ministério da Saúde negaram acesso a essa informação. Afirmaram que este era um dado pessoal privado, protegido pelo art. 31 da Lei n. 12.527/11 e também pela Lei Geral de Proteção de Dados. A Controladoria-Geral da União, órgão-garante da promoção da transparência no Brasil, ratificou esse discurso em diversas ocasiões, afirmando que a carteira de vacinação do Presidente era uma informação cuja divulgação afetaria sua honra e privacidade. Em decisão de 30 de dezembro de 2022, já quando o próprio Presidente fugira do país, o então Ouvidor-Geral da União - cargo de alto escalão do governo Bolsonaro, equivalente ao de Secretário de Estado, abaixo apenas do cargo de Ministro - ratificou o entendimento consolidado pelo governo: a carteira de vacinação do ex-presidente é um documento privado, cuja divulgação feriria a sua honra, e portanto não poderia ser divulgado.2 2 Veja-se nesse sentido recurso de acesso à informação n. 00137.014932/2022-16, julgado em 30 de dezembro de 2022 e disponível em http://buscaprecedentes.cgu.gov.br/busca/SitePages/resultadopesquisa.aspx?k=00137.014932/2022-16

Foi somente em março de 2023 que a CGU corrigiu esse erro histórico, afirmando o caráter público da carteira de vacinação do ex-presidente da república. A nova decisão da CGU, emitida no âmbito do recurso de acesso à informação n. 00137.019130/2022-94 (BRASIL, 2023), deve ser celebrada não apenas como uma vitória da transparência, mas como um passo adiante em torno da recuperação da verdade histórica, da publicidade como princípio norteador dos atos estatais. Daí decorre a importância da decisão da CGU e a justificativa do presente texto: é fundamental exponencializar o alcance da decisão e robustecer os argumentos que afirmam que a carteira de vacinação de um Presidente da República é um documento público, para que erros históricos como o da decisão de 30 de dezembro de 2022 não voltem a ser cometidos. O objetivo desse artigo é, assim, desconstruir juridicamente a narrativa que oficialmente vigorou entre 2021 e 2022 de que a carteira de vacinação do Presidente da República é um documento privado que não pode ser disponibilizado publicamente.

Metodologia e objetivo de pesquisa

Por muito tempo, prevaleceu nas ciências sociais o pressuposto metodológico e epistemológico de que uma pesquisa acadêmica deve ser “neutra” ou, ao menos, “objetiva”. Objetividade acadêmica, nesse sentido, significaria a “remoção da persona (emoções, conhecimento, experiência, valores e assim por diante) do pesquisador do processo de pesquisa” (SOMEN e LEWIN, 2005, p. 347). Nessa linha de raciocínio, a objetividade era vista como “central para a qualidade da pesquisa baseada em pressupostos epistemológicos de que a verdade pode ser determinada como algo distinto de contextos ou participantes particulares (idem, ibidem). Esse posicionamento é endossado até hoje por parte dos cientistas sociais, que afirmam que não é recomendável que pesquisas em ciências humanas ou sociais sejam misturadas com emoções, posicionamentos políticos ou identidades ideológicas, pois isso prejudicaria a “cientificidade” da produção acadêmica.3 3 Para uma revisão de literatura mais aprofundada sobre o tema, e que nega de maneira peremptória o pressuposto da incompatibilidade da realização entre pesquisa científica com envolvimento pessoal ou emocional com o tema, veja-se Cunha filho (2019a) e Cunha Filho (2019b).

Este não é um artigo objetivo, imparcial ou neutro. É um artigo que defende uma visão ou uma interpretação jurídica específica. Contudo, não deve e não pode ser confundido com um parecer jurídico ou uma peça advocatícia. Na verdade, trata-se de um texto cujos pressupostos teóricos e metodológicos estão ancorados nos mais recentes e transgressores estudos de epistemologia contemporânea, a partir dos quais questiono o pressuposto da objetividade na pesquisa acadêmica, e no meu tema específico.

O pressuposto da objetividade já foi criticado por Becker há décadas (BECKER, 1968). Ele critica de maneira central a ideia de que a ciência deve ser neutra e que pesquisas corretas são aquelas “livre de valores”, bem como a ideia de que a ciência só é válida se não estiver comprometida com valores ou compromissos prévios. Becker faz um deslocamento epistemológico da pergunta que importa para pesquisadores de ciências sociais: para ele, o relevante não é indagar se “o pesquisador pode tomar lado?”, porque tomar lado é inevitável, mas sim “de que lado o pesquisador está?”

Esse é o enfrentamento metodológico e epistemológico que me faço como autor desse artigo: de que lado estou? A única resposta que aqui me parece possível é a resposta apresentada por Said (2005SAID, Edward. Representações do intelectual: as conferências Reith de 1993. Tradução Milton Hatoum. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.): o único lado possível é manter uma postura crítica frente ao poder, questionar certezas e “verdades absolutas”, especialmente as produzidas e mantidas pelo Estado; em suma, o objetivo do pesquisador é “representar todas as pessoas e todos os assuntos que são sistematicamente esquecidos ou varridos para debaixo do tapete” (SAID, 2005SAID, Edward. Representações do intelectual: as conferências Reith de 1993. Tradução Milton Hatoum. São Paulo: Companhia das Letras, 2005., p. 28). Afinal, o que faz do intelectual alguém comprometido com a justiça e o equilíbrio social é a sua disposição de confrontar o poder (SAID, 2005) e de se recusar “a dar crédito e deferência a uma ordem estabelecida em que o conhecimento sobre a verdade e o Direito de ser ouvido não são distribuídos igualmente” (BECKER, 1967BECKER, Howard S. Whose Side Are We On? Social Problems, v. 14, n. 3, p. 239-247, 1967., p. 242). Não pretendo, portanto, me filiar a falsos ideias de neutralidade e ratificar visões consolidadas, mas sim produzir fissuras e questionar as narrativas oficiais do Estado.

Ou seja, sempre que existir uma relação de poder, o pesquisador não pode ser considerado enviesado por desnudar essa relação de poder; pelo contrário, seu dever é investigar, dar voz, projetar o lugar de fala daqueles que sofrem sistematicamente as consequências das relações de poder, é preciso levar essas declarações tão a sério como se fossem declarações oficiais. O papel do pesquisador é, conforme Becker “equalizar as hierarquias de credibilidade” existentes em uma relação de poder ou em uma sociedade como um todo; nem todas as pessoas usufruem de maneira igualitária o direito de ser ouvido

Assim, metodologicamente me alinho a Sandra Harding (1992HARDING, Sandra. After the Neutrality Ideal. Social Research 9, no. 3: 567-587, 1992; 2015), que se opõe ao conceito de neutralidade e se move em direção ao que chama de “objetividade forte”; para ela, a perspectiva da “ciência livre de valores” ou a perspectiva da neutralidade ou tecnicidade permite a manutenção ou mesmo agravamento de perspectivas ou grupos vulneráveis do pontos de vista econômico, politico ou social e por isso ela propõe que a produção do conhecimento posicione as injustiças do mundo como o foco principal. Dito de outra maneira, em vez de negar a inevitável presença de valores e interesses na produção do conhecimento, o mais honesto é reconhecer socialmente a existência de interesses poderosos e, assim, confrontá-los. Seu conceito de “objetividade forte”, portanto, não significa endossar posturas dotadas apenas de subjetividade ou de opiniões: significa reconhecer que pesquisas científicas devem sim estar embasadas em fatos, evidências e buscar sempre a verdade, mas que ao mesmo tempo estão inevitavelmente embutidas de valores e experiências prévias.

Em suma, não escrevo esse artigo de maneira neutra ou imparcial: escrevo para firmar e reforçar uma posição contra a narrativa de poder emitida pelo governo Bolsonaro, reconhecendo que as visões aqui apresentadas partem de certos valores, mas nem por isso deixam de ser cientificamente válidas ou confiáveis, pois os argumentos aqui apresentados não são baseados apenas em valores ou posições subjetivas, mas também em raciocínios jurídicos interpretativos, em dados objetivos e em construções coerentes acerca de como se devem tomar decisões em um contexto de um Estado Democrático de Direito.

Este é um artigo de construção de uma argumentação jurídica, isto é, trata-se de artigo teórico e exploratório. O objetivo principal do texto é desconstruir a argumentação jurídica de que a carteira de vacinação do ex-Presidente da República constitui uma informação pessoal sensível; pretendo, portanto, elaborar argumentos jurídicos que mostrem tratar-se de uma informação revestida de interesse público e de natureza pública.

A transparência como princípio constitucional e os pressupostos gerais da Lei n. 12.527/11.

A transparência e o acesso à informação são considerados formas de controle social, definido como uma nova modalidade de accountability que inclui “monitoramento e supervisão, por parte dos cidadãos, do desempenho do setor público e/ou do setor privado” (FOX, 2015FOX, Jonathan. Social Accountability: What does the Evidence Really Say? World Development, vol. 72, pp. 346-361, 2015.; 2019). A transparência é um dos elementos da chamada “democracia aberta” (LANDEMORE, 2020LANDEMORE, Hélène. Open Democracy: Reinventing Popular Rule for the Twenty-First Century. Princeton, Princeton University Press, 2020.). Leis de acesso à informação são “um instrumento por excelência do processo de elaboração de políticas públicas” (SCHILLER, 2000SCHILLER, Reuel. Enlarging the Administrative Polity: Administrative Law and the Changing Definition of Pluralism, 1945-1970. Vanderbilt Law Review, v. 53, 5, 2000., p. 1344). Ao longo das últimas décadas, houve uma explosão mundial de leis de acesso à informação, as quais costumam ter dispositivos como ênfase em documentos públicos; permissão de acesso a indivíduos e associações; existência de agências autônomas ou semi-autônomas de revisão de decisões de negativa; exceções que protegem a segurança nacional, segredos comerciais, privacidade e deliberações internas (ACKERMAN; SANDOVAL-BALESTROS, 2006ACKERMAN, John M.; SANDOVAL-BALLESTROS, Irma E. The Global Explosion of Freedom of Information Laws. Administrative Law Review, 58, no. 1 (2006).). É o caso da Lei brasileira, a Lei nº 12.527/11, que incorpora esses princípios e estabelece a publicidade como regra e o sigilo como exceção em caso de atos públicos.

No entanto, nenhum Estado se propõe a ser plenamente transparente. Sempre há exceções ao regime da transparência e muitas dessas exceções são legítimas (CUNHA FILHO, 2017CUNHA FILHO, Marcio. The Right to Information System in Brazil: Tensions between Transparency and Control of Information. VERFASSUNG UND RECHT IN UBERSEE, v. 4, p. 412, 2017.). Uma das exceções legítimas à transparência estatal é a proteção a informações pessoais sensíveis, estabelecida no art. 31 da referida Lei, que afirma que “o tratamento das informações pessoais deve ser feito de forma transparente e com respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, bem como às liberdades e garantias individuais” e que “as informações pessoais, a que se refere este artigo, relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem terão seu acesso restrito, independentemente de classificação de sigilo e pelo prazo máximo de 100 (cem) anos a contar da sua data de produção, a agentes públicos legalmente autorizados e à pessoa a que elas se referirem” (art. 31, §1º, I, Lei n. 12.527/11).

Quando a carteira de vacinação do ex-Presidente foi demandada por meio dos procedimentos previstos na Lei de Acesso à Informação, os órgãos públicos federais competentes negaram acesso à informação com fundamento neste dispositivo legal. Mas eis a pergunta de pesquisa do presente texto: a carteira de vacinação do ex-Presidente da República é um documento público, que segue a regra da publicidade estabelecida no art. 3º da Lei nº 12.527/11, ou é uma informação pessoal sensível, que se submete à restrição de acesso por 100 anos, nos moldes do art. 31, §1º, I? A partir daqui passo a apresentar argumentos jurídicos e sociológicos que fundamentam a primeira alternativa.

Agentes públicos em geral e o Presidente da República em particular têm uma esfera reduzida de privacidade, especialmente no contexto da pandemia da Covid-19

Não há dúvidas de que agentes públicos mantêm um “núcleo duro” do direito à privacidade: questões estritamente pessoais, que digam respeito ao seu foro mais íntimo (como religião, sexualidade, intimidade pessoal), não são públicas. Ao mesmo tempo, contudo, é pacificado no nosso sistema jurídico que agentes públicos, mesmo os que não sejam de alto escalão, têm sim uma redução na sua esfera de privacidade. Sempre há interesse público em gestos, atos e palavras de agentes públicos e, quanto mais alto for a função ou a responsabilidade exercida por tal agente, maior a expectativa de publicidade de seus atos. Nesse sentido, o STF decidiu que há uma preponderância do interesse público em conhecer certas informações de agentes públicos que não caberia solicitar com relação a agentes privados:

Suspensão da Segurança. Acórdãos que impediam a divulgação, em sítio eletrônico oficial, de informações funcionais de servidores públicos, inclusive a respectiva remuneração. (...) Não reconhecimento de violação à privacidade, intimidade e segurança do servidor público. 1. Caso em que a situação específica dos servidores públicos é regida pela 1ª parte do inciso XXXIII do art. 5º da Constituição. Sua remuneração bruta, cargos e funções por eles titularizados, órgãos de sua formal lotação, tudo é constitutivo de informação de interesse coletivo ou geral. Expondo-se, portanto, a divulgação oficial. Sem que a intimidade deles, vida privada e segurança pessoal e familiar se encaixem nas exceções de que trata a parte derradeira do mesmo dispositivo constitucional (inciso XXXIII do art. 5º), pois o fato é que não estão em jogo nem a segurança do Estado nem do conjunto da sociedade. 2. Não cabe, no caso, falar de intimidade ou de vida privada, pois os dados objeto da divulgação em causa dizem respeito a agentes públicos enquanto agentes públicos mesmos; ou, na linguagem da própria Constituição, agentes estatais agindo nessa qualidade (§ 6º do art. 37) (...). 3. A prevalência do princípio da publicidade administrativa outra coisa não é senão um dos mais altaneiros modos de concretizar a República enquanto forma de governo. Se, por um lado, há um necessário modo republicano de administrar o Estado brasileiro, de outra parte é a cidadania mesma que tem o direito de ver o seu Estado republicanamente administrado (...) 4. A negativa de prevalência do princípio da publicidade administrativa implicaria, no caso, inadmissível situação de grave lesão à ordem pública. 5. Agravos Regimentais desprovidos (BRASIL, 2012).

Se a remuneração individualizada dos salários de servidores públicos é considerada informação pública, a carteira de vacinação de um Presidente da República também deve sê-lo, pela presença de dois elementos que elevam a expectativa de publicidade sobre o caso: o primeiro é que não se trata de um agente público comum, mas sim da autoridade máxima do país, cuja esfera de privacidade é ainda mais reduzida; o segundo elemento é que a informação em questão, em um contexto de uma grave crise sanitária, colocou milhares de pessoas em risco de vida, pois estimulou as pessoas a não se vacinarem e assim a continuarem propagando o vírus.

Ademais, se as informações acerca da vacinação contra COVID do ex-Presidente da República fossem informações pessoais sensíveis, de caráter estritamente privado, o ex-Presidente teria o dever de manter reserva e discrição acerca do assunto. Ao contrário disso, ele mesmo proferiu diversas declarações afirmando que não se vacinou e que não se vacinaria nem mesmo depois do último brasileiro.4 4 https://www.poder360.com.br/governo/bolsonaro-diz-que-decidira-se-vai-se-vacinar-depois-do-ultimo-brasileiro/ Esse argumento de que foi o próprio Presidente que abriu mão da expectativa de privacidade existente em torno do documento foi um dos argumentos utilizados pela CGU, em sua decisão de março de 2023 que afirmou o caráter público do documento ainda que tenha perdido a oportunidade de determinar a sua disponibilização imediata ao público:

[No caso da carteira de vacinação de Covid], o próprio titular da informação fez uso público dela, transformando uma questão que poderia sim ser considerada íntima e atinente à vida privada em um debate público. (...) É imperioso reconhecer que quando uma figura pública defende abertamente sua decisão pela não vacinação, em um contexto de pandemia, não há como se defender que se trata de discussão que a autoridade quer que fique absolutamente restrita à sua intimidade ou mesmo à sua vida privada. O dado ou informação, então, deixam de pertencer ao núcleo íntimo da pessoa, não havendo como se configurar a privacidade que teria o condão de afastar o acesso à informação, no presente caso (BRASIL, 2023).

Ou seja, uma informação que poderia em tese ser privada deixou de sê-lo pela ostensividade com que o Presidente falava sobre o seu status vacinal. Nesse sentido, o ex-Presidente afirmou que não se vacinou;5 5 https://www.terra.com.br/noticias/mundo/bolsonaro-admite-que-nao-se-vacinou-em-encontro-com-johnson,36a7e1427c8c6d0a717cb72fb1abe63dxdlwc9a4.html que não tomou a vacina e questionou a eficácia do kit covid;6 6 https://oantagonista.uol.com.br/brasil/bolsonaro-admite-que-nao-tomou-vacina-e-questiona-eficacia-de-kit-covid/ https://oglobo.globo.com/brasil/bolsonaro-muda-discurso-agora-admite-possibilidade-de-se-vacinar-contra-covid-19-24912686 disse que estava imune à doença e que, se se vacinasse, seria apenas após o último brasileiro se vacinar;7 7 https://oglobo.globo.com/brasil/bolsonaro-muda-discurso-agora-admite-possibilidade-de-se-vacinar-contra-covid-19-24912686 reafirmou que não iria se vacinar e afirmou que “deixa eu morrer [se essa for a minha opção].8 8 https://www.poder360.com.br/governo/bolsonaro-volta-a-dizer-que-nao-quer-se-vacinar-deixa-eu-morrer/ Ou seja, mesmo que fossem em tese informações pessoais sensíveis, as afirmações e atitudes de Bolsonaro tornaram essa informação de interesse público; ele as descaracterizou como informações pessoais sensíveis e as converteu em informações de caráter público.

Esses elementos todos tornam impraticável ou inviável utilizar o argumento de “informação pessoal sensível” para ocultar a informação sobre a vacinação de Bolsonaro. Adicionalmente, frise-se que o bem jurídico protegido pelo artigo 31 da LAI, que determina a proteção de “informações pessoais sensíveis”, é destinado a proteger a honra e a intimidade de pessoas privadas, e não para esconder informações de interesse público do chefe de Estado da nação, do agente público de maior escalão da Administração Pública. O argumento de “informações pessoais sensíveis” serve para proteger indivíduos e cidadãos comuns contra a prática predatória da utilização de sua imagem, dados pessoais e privacidade (veja-se, nesse sentido, O’NEIL, 2016O’NEIL, Cathy. Weapons of Math Destruction: how Big Data increases inequality and threatens democracy. New York, Crown, 2016; MENDES E DONEDA, 2018MENDES, Laura Schertel; DONEDA, D. Comentário à nova Lei de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018): o novo paradigma da proteção de dados no Brasil. Revista de Direito do Consumidor, v. 120, p. 555, 2018.; LYON, 2018LYON, David. The Culture of Surveillance: Watching as a Way of Life. Polity, 2018), e não para esconder ou proteger de maneira a esconder atos de um agente público, que atua em nome da nação e que precisa responder e se responsabilizar por seus gestos, palavras e atos, eventualmente até mesmo de forma criminal. Na verdade, beira ao absurdo afirmar, em um contexto de hiperexposição até mesmo de pessoas comuns, que a informação sobre o status vacinal do Presidente da República está ligada à sua esfera de honra pessoal e privada; em um momento histórico em que até mesmo indivíduos comuns têm toda sua vida privada exposta e disponível online, não cabe afirmar que uma informação relativa ao Presidente da República e que foi relevante para a tomada de decisão de milhares de pessoas precisa ser protegida para fins de proteção da honra e da privacidade do indivíduo mais poderoso do país.

Além disso, no excepcionalíssimo contexto da pandemia provocada pelo novo coronavírus, a expectativa de privacidade especificamente com relação a essa vacinação foi drasticamente reduzida - até mesmo para cidadãos comuns, mas ainda mais para líderes e chefes de Estado. O fato é que comprovantes de vacinação contra Covid eram exigidas para praticamente toda e qualquer interação social, como participação e acesso a prédios públicos e privados, ingresso em quaisquer locais fechados; embarque em aeronaves e outras formas de transporte - todas essas atividades realizadas pelo ex-presidente no período pandêmico. Sendo assim, do ponto de vista do contexto social, é frágil o argumento de que havia expectativas de privacidade sobre o status vacinal de qualquer pessoa. Se para pessoas privadas em geral essa expectativa de privacidade já é mitigada, uma figura pública, chefe de Estado, tem essa expectativa de privacidade mais ainda reduzida, senão totalmente eliminada.

A ausência de expectativa de privacidade com relação ao status vacinal do ex-Presidente pode ser sustentada por dois argumentos adicionais. O primeiro é que a própria Lei 13.979/2020 estipulou a obrigatoriedade da vacinação contra a Covid-19. Se se trata de uma obrigação cabível a todos os brasileiros e brasileiras, como esperar que essa seja uma informação estritamente privada? Registre-se que o Ministro Ricardo Lewandowski, relator das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6586 e 6587, reafirmou que a obrigatoriedade da vacinação é constitucional, desde que o Estado não adote medidas invasivas, aflitivas ou coativas - e a transparência seguramente não se enquadra como uma medida “invasiva”, “aflitiva” ou “coativa”. Em seu voto, o ministro Lewandowski destacou que a obrigatoriedade da vacinação, prevista na Lei 13.979/2020, é legítima, desde que não haja imposições em relação à integridade física e moral dos recalcitrantes. E, repita-se: a transparência da informação não pode ser considerada uma imposição física ou moral aos vacinados. A obrigatoriedade do ato tem como consequência o seu caráter público.

O segundo fator que indica uma drástica redução das expectativas de privacidade com relação ao status vacinal de chefes de Estado é o fato de que diversos líderes estrangeiros, independentemente do posicionamento ideológico, comprovaram e expuseram a público sua vacinação. Todos os ex-presidentes vivos do Brasil se vacinaram e divulgaram fotos e comprovações de que tomaram a vacina contra a Covid.9 9 https://g1.globo.com/politica/noticia/2021/03/22/vacinacao-ex-presidentes.ghtml Mesmo figuras públicas como deputados federais admitiram publicamente que tomaram a vacina (apenas 7 deputados federais não declararam publicamente terem tomado a vacina),10 10 https://www.metropoles.com/brasil/so-6-deputados-dizem-nao-ter-se-vacinado-contra-a-covid-veja-lista e até mesmo a ex-primeira dama Michelle Bolsonaro tomou a vacina e confirmou essa informação.11 11 https://www.cnnbrasil.com.br/politica/governo-confirma-que-michelle-bolsonaro-tomou-vacina-contra-a-covid-19-nos-eua/ E, para além do Brasil, também diversos líderes estrangeiros - repita-se, das mais diferentes vertentes ideológicas - adotaram a mesma postura. Xi Jianping, líder da China, divulgou fotos suas tomando a vacina;12 12 https://www.bbc.com/news/world-asia-china-62279377 Vladimir Putin, líder autoritário da Rússia, fez o mesmo;13 13 https://apnews.com/article/europe-business-health-russia-coronavirus-pandemic-035536af03c480bbc4127d7bb5ead1fc Victor Órban, ditador da Hungria, fez o mesmo,14 14 https://www.euronews.com/my-europe/2021/02/28/hungary-s-pm-viktor-orban-vaccinated-against-covid-with-chinese-sinopharm-vaccine assim como o ex-Presidente Donald Trump.15 15 https://www.forbes.com/sites/nicholasreimann/2021/12/20/trump-admits-getting-covid-vaccine-booster-after-earlier-saying-he-probably-wouldnt/

Todos esses fatores servem para evidenciar que agentes públicos de alto escalão no geral e o Presidente da República em especial têm o dever de promover a saúde pública, de promover e incentivar políticas de proteção ao bem-estar da população. Isso é, na verdade, a essência do próprio conceito de representatividade pública, tal como o conhecemos contemporaneamente (PITKIN, 1967PITKIN, H. The concept of representation. Berkeley: University of California Press, 1967.). E, como pessoa pública, o seu compromisso com a saúde individual serve de exemplo para outras pessoas, no sentido de promover a confiabilidade na ciência e na saúde pública. Esse é um dever básico de qualquer governante, ainda mais considerando-se o contexto em que o mundo emergiu entre 2020 e 2022.

Ademais, a promoção da confiabilidade na ciência é também tarefa essencial e tem efeitos difusos/dispersos no tempo, que podem eventualmente implicar em graves danos à saúde pública. Afinal, conforme afirma o Committee on Science, Engineering and Public Policy, “a pesquisa científica é construída a partir de uma profunda raiz de confiança: essa confiança apenas vai perdurar se a comunidade científica se dedicar a dar o exemplo e a transmitir valores associados a uma conduta científica ética.” Discursos anti-ciência e anti-vacinação podem ter efeitos perversos ao longo do tempo, porque afinal minam a confiança das pessoas no processo científico e, com isso, podem causar danos à coletividade.

Mesmo informações pessoais sensíveis podem, de acordo com a legislação, ser disponibilizadas caso o titular dos dados possa autorizar a divulgação da sua informação pessoal, a partir da manifestação do seu consentimento, tal como disposto abaixo:

Art. 31. O tratamento das informações pessoais deve ser feito de forma transparente e com respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, bem como às liberdades e garantias individuais.

§ 1º As informações pessoais, a que se refere este artigo, relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem:

(...)

II - poderão ter autorizada sua divulgação ou acesso por terceiros diante de previsão legal ou consentimento expresso da pessoa a que elas se referirem.

E, no caso concreto, é preciso registrar que houve consentimento por parte do Ex-Presidente da República em conceder acesso à sua carteira de vacinação. De fato, no endereço eletrônico https://www.youtube.com/watch?v=6At1XiaoZgo há uma “live” denominada “Assuntos da semana - 15 set 22”, realizada em 15/09/2022, às 19h, na Plataforma Youtube, no canal denominado "Presidente Jair Bolsonaro". Nas informações abaixo, consta-se que se trata, de fato, de canal oficial do então ex-Presidente da República Jair Bolsonaro:

"O que tem é uma lei de 2011, eu sou obrigado a cumprir lei, como todo presidente é, todo cidadão é obrigado a cumprir leis, que os assuntos de natureza particular, eu não preciso ceder à lei de acesso à informações. Então a imprensa pediu pra mim, meu cartão de vacina, então de acordo com a lei de acesso à informações, como é uma informação de caráter pessoal, particular, tá garantido por esta lei de 2011 - Presidente Dilma Roussef, pra que as informações não sejam divulgadas. Da minha parte não tem problema nenhum, alguém pegar o meu cartão de vacina e mostrar por aí. "

"Quando se fala que eu decretei sigilo de cem anos para determinados assuntos, primeiro, não tem decreto, outra, o que se pode usar é a lei. É você garantir o sigilo de até cem anos para informações pessoais, o que tem de pessoal até hoje que a imprensa pediu e eu não dei? Pelo que eu me lembre, cartão de vacina, da minha parte, falei pra assessoria que quem quiser o meu cartão de vacina pode olhar, tá? É caso pessoal, eu entendo que como a lei permite não mostrar, se ela permite, eu posso mostrar, não tem problema nenhum."

Assim, verifica-se que o próprio Ex-Presidente consentiu em fornecer acesso à sua carteira de vacinação. Ainda que em recurso anterior a Controladoria-Geral da União tenha considerado, sob Bolsonaro, que essas frases do ex-Presidente não poderiam ser consideradas uma forma de consentimento formal, pois um consentimento formal necessitaria de procuração e demais instrumentos formais,16 16 Trata-se aqui do recurso de acesso à informação n. 00137.014932/2022-16, julgado em 2022, disponível em http://buscaprecedentes.cgu.gov.br/busca/SitePages/principal.aspx é fato que essas formalidades são desnecessárias tendo-se em vista o Decreto n. 9.094/2017, que, dentre outros, versa sobre a ratificação a dispensa do reconhecimento de firma e da autenticação em documentos produzidos no País e institui a Carta de Serviços ao Usuário. Os art. 7º e 9º do referido Decreto afirmam a dispensa de exigibilidade de formalidades para documentos cuja autenticidade não é questionada:

Art. 7º Não será exigida prova de fato já comprovado pela apresentação de documento ou informação válida.

(...)

Art. 9º Exceto se existir dúvida fundada quanto à autenticidade ou previsão legal, fica dispensado o reconhecimento de firma e a autenticação de cópia dos documentos expedidos no País e destinados a fazer prova junto a órgãos e entidades do Poder Executivo federal.

Assim, não há dúvidas de que o consentimento a que se refere o art. 31, §1º, II da Lei n. 12.527/11 foi devidamente, legalmente e validamente concedido, não havendo exigência legal para que haja procuração, assinatura formal ou reconhecimento de firma. Assim, mesmo que se considere que as informações constantes da carteira de vacinação do Bolsonaro sejam informações pessoais sensíveis, o fato é que houve consentimento para sua liberação.

As palavras, gestos e atitudes do Presidente da República, como líder da nação, geram consequências concretas no mundo real, e, nesse caso, influenciaram as pessoas a deixar de proteger a sua própria saúde a saúde coletiva.

Considerando que governar é representar, as ações de governantes reverberam não apenas sobre eles próprios, privadamente, mas sobre a população que governam, sobre os que olham para seus líderes políticos em busca de orientação. Isto é, as ações de governantes, mesmo suas ações particulares, transcendem e reverberam sobre a população (PEREIRA, POWER & RENNÓ, 2005PEREIRA, Carlos; POWER, Timothy; RENNÓ, Lúcio. Opinião pública, estratégia presidencial e ação do congresso no Brasil: “quem manda?” Opinião Pública, v. XI, nº 2, Outubro, 2005.), e a transparência é a contrapartida que se exige do poder que é investido aos representantes políticos.

Isso é especialmente verdadeiro no caso da maior crise sanitária dos último 100 anos, que ceifou a vida de quase sete milhões de pessoas mundo afora. E o desempenho do Brasil foi pior do que o da maioria dos outros países. Além de ter sido o segundo país com o maior número de mortes absolutas em todo o mundo (superando países muito mais populosos como China e Índia), o Brasil, mesmo possuindo 2,7% da população mundial, foi responsável por mais de 5% dos casos e por mais de 10% das mortes por COVID-19 em todo mundo, conforme os dados mais confiáveis já produzidos sobre o tema, produzidos pela Universidade John Hopkins.17 17 https://coronavirus.jhu.edu/map.html Por outras palavras, a carteira de vacinação do ex-Presidente da República é um artefato público, pois líderes públicos são um símbolo de modelagem de comportamentos. Além disso, a conduta de um Presidente tem consequências sobre a montagem e elaboração de políticas públicas. Estimular controvérsias sobre um tratamento comprovadamente eficaz é um estimular a controvérsia sobre um tratamento que poderia e teria salvo vidas.

Ainda que não se possa afirmar com absoluta certeza que há uma relação de causa e consequência entre o comportamento do Chefe de Estado e o desastre sanitário ocorrido no Brasil durante o período de emergência sanitária, há no mínimo uma plausibilidade nessa relação, a qual deve ser investigada com maior profundidade pelos órgãos competentes. A informação sobre a vacinação ou não do Presidente é crucial para futuras investigações sobre o assunto. Veja-se, contudo, que há diversos indícios que apontam para uma causalidade entre as atitudes do Presidente e a situação ocorrida no Brasil. Em primeiro lugar, o Brasil, que há décadas tem uma tradição de ampla vacinação, que muito provavelmente foram fruto das amplas campanhas sobre vacinação que houve no Brasil ao longo do tempo, tem experimentado ao longo dos dois últimos anos preocupantes dados acerca da queda geral em índices de vacinação (não apenas em relação à Covid). Entre 2021 e 2023, a taxa de vacinação infantil no Brasil caiu expressivamente, e retornou aos patamares de 1987.18 18 http://to.corens.portalcofen.gov.br/taxa-de-vacinacao-infantil-cai-e-brasil-volta-a-patamar-de-1987/ O Programa Nacional de Imunização (PNI), que sempre foi uma referência mundial, tem sido questionado, ameaçado por notícias falsas e manipulativas, e enfrentado amplos desafios desde o início do período pandêmico. A baixa vacinação contra polimelite, uma grave doença que causa paralisia infantil, voltou a ameaçar o país após 38 anos do último caso registrado no Brasil, conforme pesquisa realizada pelo próprio Senado Federal.19 19 https://www12.senado.leg.br/tv/programas/noticias-1/2022/10/baixa-vacinacao-contra-poliomielite-preocupa-especialistas-e-autoridades As próprias taxas de vacinação contra Covid diminuíram substancialmente ao longo do tempo no Brasil: conforme demonstra dados da Folha de São Paulo, o número de pessoas que tomaram a terceira dose da vacina (considerada hoje essencial para completar o esquema vacinal) foi significativamente menor do que o número de pessoas que tomaram a segunda dose, que por sua vez foi significativamente menor do que o número de pessoas que tomou apenas uma dose.20 20 https://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2023/01/cerca-de-69-milhoes-de-brasileiros-nao-tomaram-dose-de-reforco-contra-a-covid.shtml Essa redução da taxa de vacinação contra Covid possivelmente está relacionada à companha sistemática feita a partir do próprio governo e a partir da própria pessoa do Ex-Presidente em desfavor da vacina contra Covid e em favor de tratamentos comprovadamente ineficazes. É possível argumentar, portanto, que a apuração da responsabilidade do ex-Presidente da República relativamente às consequências concretas associadas a suas condutas ao longo do contexto pandêmico exigem o conhecimento da coerência entre o seu discurso e suas atitudes.

Como todo texto jurídico legal deve ser interpretado à luz do contexto (HESPANHA, 2019), é preciso interpretar a LAI e seu art. 31 à luz do que acontecia no Brasil e no mundo em termos de pandemia e erosão da confiança nas instituições democráticas: se a saúde do Presidente já é, em situações normais, de interesse público, essa condição se fortalece no contexto de uma pandemia global e diante da atuação de um presidente da República que contraria o dever estatal de construção de políticas públicas de saúde que devem ser efetivas. Isso porque o ex-Presidente advogou contra a vacinação, e comprovadamente demorou para comprar vacinas, conforme relatório apontado pela CPI do Senado.21 21 https://www12.senado.leg.br/radio/1/noticia/2021/10/22/relatorio-acusa-governo-federal-de-atraso-na-compra-de-vacinas-e-de-negociacoes-ilicitas-no-caso-covaxin Nesse contexto, é preciso compreender e sedimentar a ideia de o direito fundamental ao acesso à informação, à luz do princípio da máxima transparência (que significa que o Estado tem o dever de conceder o máximo de informações possíveis), abrange saber não só o que o ex-Presidente disse, mas também o que o ex-Presidente de fato fez; é direito da população saber se ele foi coerente com o que disse, porque é fato que o que um Presidente da República faz afeta milhões de pessoas que são seus apoiadores e que o seguiram e continuam seguindo como exemplo.

Necessidade de obter essas informações para fins de recuperação da verdade, da memória histórica e de fatos históricos relevantes

O direito de acesso à informação nasceu junto com o direito à memória e à verdade: ambos foram, inicialmente, destinados ao mesmo fim, o de recuperar a memória histórica e permitir que a população conheça fatos acerca do passado, independentemente de sua influência para comportamentos atuais (CUNHA FILHO, 2015CUNHA FILHO, Marcio C. O Desencontro entre Direito à Informação e Direito à Verdade: Análise das Práticas da Controladoria-Geral da União. Direito, Estado e Sociedade, v. 47, p. 91-107, 2015.). Assim, o direito de acesso à informação está umbilicalmente ligado ao direito à verdade histórica; o direito à verdade é um pressuposto do direito à informação, não há transparência ou acesso se não houver verdade e integridade as afirmações feitas por parte de agentes públicos, especialmente os de alto escalão.

O Estado brasileiro tem um histórico de ocultação sobre práticas ilícitas ou potencialmente danosas; se há suspeita ou mesmo possibilidade de que atos contrários à lei tenham ocorrido, deve-se dar acesso a informações em questão para que tais possíveis ou supostas irregularidades venham à tona para conhecimento da população e para eventuais investigações ou apurações. De qualquer forma, o conhecimento histórico não se dá por mera curiosidade ou por mera finalidade de registro historiográfico; o interesse sobre o passado transborda sobre o interesse atual e, portanto, as informações ocorridas no passado continuam possuindo interesse público relevante até hoje. Nesse sentido, a informação sobre a vacinação do PR contra a Covid-19 constitui fato histórico relevante, e o acesso a esta é fundamental ao exercício do controle social sobre a atuação da autoridade máxima da República com relação à política pública realizada.

Considerando que o Brasil é um país marcado por diversos traumas do passado, muitos dos quais são esquecidos e, por isso, acabam se repetindo ao longo da história, a disponibilização de toda e qualquer informação disponível que possa servir para que as pessoas compreendam o que ocorreu no passado e, com isso, consigam evitar a repetição traumática de eventos passados deletérios. Recuperar a história é, assim, criar condições para a não repetição de traumas históricos, para promover os pilares de responsabilização, acesso à memória e justiça, e a transparência das informações em questão pode ser essencial para atingir tais finalidades (CARVALHO, GUERRA & GUIMARÃES, 2016CARVALHO, C. P.; GUERRA, M. P. (Org.) ; GUIMARAES, J. O. N. (Org.). Justiça de Transição na América Latina: panorama 2015. 1. ed. Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia, RLAJT, 2016. v. 1.).

Há, portanto, evidente interesse público na transparência da carteira de vacinação do Ex-Presidnete, o que autoriza a sua entrega para atendimento ao direito coletivo da sociedade brasileira de apuração sobre sua história recente. Ao estimular a não vacinação das pessoas, o ex-Presidente Bolsonaro foi um dos patronos do trauma histórico e sanitário vivido pelo Brasil entre 2020-2022, e para que esse trauma seja devidamente enfrentado, o direito à verdade e à transparência são impositivos. Além disso, a transparência nesse caso é essencial para a recuperação da memória histórica e para a recuperação da dignidade das pessoas que morreram em decorrência da pandemia da Covid-19; esses brasileiros e brasileiras têm direito de acesso à verdade sobre a conduta de agentes públicos que podem ter influenciado suas ações. Em suma, a verdade e a memória histórica são essenciais para a não repetição de traumas históricos e de possíveis atos criminosos. A verdade e a memória é o que vão permitir que exista justiça e responsabilidade pela condução do tema no Brasil; e, havendo justiça, abrem-se as portas para eventual responsabilização do Estado.

Necessidade de obter a informação para fins de responsabilização

Uma das funções básicas do direito de acesso à informação é que ele deve ser utilizado como um instrumento para consecução de outras finalidades (SUNSTEIN, 2019). como o bem-estar público e, eventualmente, como subsídio à realização do controle social e da responsabilização de autoridades públicas que supostamente tenham cometidos atos irregulares. Nesse sentido, o princípio básico do exercício de uma função pública representativa, que parte da ideia de que agentes públicos representam a população e atuam nos interesses dela, é o de que as prerrogativas dos agentes públicos são contrabalanceadas pela necessidade de prestar contas por suas atitudes e palavras (ABRANCHES, 1988ABRANCHES, S. Presidencialismo de coalizão: o dilema institucional brasileiro. Dados, v. 31, n. 1, p. 5-38, 1988). Nesse sentido, o ex-Presidente Jair Bolsonaro responde por diversas ações de responsabilização e informações sobre o seu status de vacinação podem constituir documentos relevantes para apurar eventuais ilícitos ocorridos durante o período da pandemia.22 22 Cabe relembrar que o relatório da CPI da Covid atribuiu ao ex-Presidente Jair Bolsonaro 9 crimes, conforme consta no relatório final da CPI - https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/10/20/com-nove-crimes-atribuidos-a-bolsonaro-relatorio-da-cpi-e-oficialmente-apresentado Um dos crimes possíveis acerca dos quais o ex-Presidente é investigado é o crime de “charlatanismo”, previsto no art. 283 do Código Penal, e que consiste em “inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível.”

E de fato há diversos atos investigativos atualmente em curso contra o ex-Presidente Jair Bolsonaro e que versam sobre sua suposta responsabilidade pelas consequências sofridas pelo Brasil ao longo do período de emergência sanitária. Em uma ação, Bolsonaro é acusado de ter descumprido determinações do poder público para impedir introdução ou propagação de doença contagiosa.23 23 pgr-peticao-10062.pdf (conjur.com.br) Em outra, há um pedido de indiciamento contra o ex-Presidente por suposta prática do crime de charlatanismo, em razão da promoção da hidroxicloroquina como a cura da Covid-19.24 24 https://www.conjur.com.br/dl/pgr-peticao-10061.pdf Também há investigações no sentido de que o ex-Presidente e outros agentes do alto escalão do governo são investigados pela suposta prática de crime de emprego irregular de verbas ou rendas públicas (por ter comprado medicamentos ineficazes, por ter atrasado a compra de vacinas, entre outros).25 25 https://www.conjur.com.br/dl/pgr-peticao-10060.pdf

Assim, considerando que o direito de acesso à informação tem como uma de suas funções principais promover o controle social e contribuir para a responsabilização de agentes públicos por supostos fatos ilícitos, é certo que a informação a respeito do status vacinal do Ex-Presidente Jair Bolsonaro pode servir para alcançar essas finalidades e, portanto, devem ser fornecidas ao público para fins de averiguação e investigação.

Também existem indícios claros de que as falas, atos, gestos e até mesmo os atos oficiais do Ex-Presidente Jair Bolsonaro contribuíram para o agravamento da condição sanitária no Brasil. Em aprofundado estudo sobre o tema, a Profa. Deisy Ventura, professora titular de Ética da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, afirmou que “a tragédia da covid no Brasil é resultado de estratégia intencional do governo Bolsonaro.”26 26 https://www.redebrasilatual.com.br/saude-e-ciencia/deisy-ventura-tragedia-da-covid-no-brasil-e-resultado-de-estrategia-intencional-do-governo-bolsonaro/ Ao analisar 3.049 normas federais produzidas em 2020, a pesquisadora concluir haver uma estratégia não apenas intencional mas também institucional de propagação do coronavírus. O estudo também apontou ter havido ações de propaganda contra a saúde pública e de obstrução às respostas locais contra a doença. 27 27 Veja-se o estudo Direitos na Pandemia - Mapeamento e Análise das Normas Jurídicas de Resposta à Covid-19 no Brasil, disponível em https://www.conectas.org/noticias/estudo-inedito-governo-bloqueou-medidas-contra-covid-19/ O fato é que o Brasil foi de uma posição de liderança global em termos de política de vacinação à posição de pária internacional no assunto (VENTURA & BUENO, 2021VENTURA, D. F. L.; BUENO, F. T. C. . De líder a paria de la salud global: Brasil como laboratorio del -neoliberalismo epidemiológico- ante la Covid-19. FORO INTERNACIONAL, p. 427-467, 2021).

Assim, em suma, a transparência sobre a informação objeto de disputa é necessária para fins de eventual apuração e responsabilização por quaisquer ações ou omissões indevidas ou ilícitas que tenham ocorrido no decorrer do período de emergência sanitária. Afinal, o Presidente da República tem o dever de atuar de acordo com os princípios da probidade na Administração Pública. Ele está passível, inclusive, ao cometimento de crime de responsabilidade na hipótese de atentar contra a probidade administrativa (art. 85, V, Constituição Federal). De acordo com a Lei 1079 viola a probidade "proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo" (art. 9º). Em relação às regras que regulam a questão da dignidade, o Presidente da República está submetido às mesmas regras sobre a honra e o decoro a que se submetem todos os servidores públicos, de acordo com o código de ética dos servidores públicos, inclusive os da alta gestão.

Além disso, o direito de acesso à informação inclui, abrange e encontra-se imbricado com o direito à verdade. Não cabe falar em direito de acesso à informação sem que haja por trás um direito à verdade. E por isso os servidores públicos, quando são incumbidos de prover o direito de acesso à informação à população, estão também incumbidos de prover o direito à verdade, conforme se depreende do Decreto n. 1.171/1994, que aprova o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal e que afirma que

Toda pessoa tem direito à verdade. O servidor não pode omiti-la ou falseá-la, ainda que contrária aos interesses da própria pessoa interessada ou da Administração Pública. Nenhum Estado pode crescer ou estabilizar-se sobre o poder corruptivo do hábito do erro, da opressão ou da mentira, que sempre aniquilam até mesmo a dignidade humana quanto mais a de uma Nação.

E. em uma síntese de todo este parecer, o fato é que um Presidente da República tem o dever e o compromisso de dizer a verdade sobre o que é de interesse público. É fato que as fake news e a disseminação de notícias falsas têm dominado grande parte do debate contemporâneo (CUNHA FILHO, 2019CUNHA FILHO, Marcio. Post-Truth and Authoritarianism: Reflections about the Antecedents and Consequences of Political Regimes Based on Alternative Facts. Bras. Political Sci Rev., v. 13, n. 2, e0010, 2019 (2019c).c; CUNHA FILHO, CARVALHO & CARVALHO, 2022; 2023; KAKUTANI, 2018KAKUTANI, Michiko. The death of truth. London: William Collins, 2018. 208 pp.). No entanto, o dever com a democracia envolve também o dever de combater as fake news e de perseguir a verdade, pois, afinal, a busca pela verdade é tudo que nos resta em uma sociedade que tenta resgatar o Estado Democrático de Direito.

Conclusões

Este artigo buscou construir teses jurídicas de enfrentamento do poder, em especial de enfrentamento da narrativa oficial do governo Bolsonaro acerca do caráter privado de sua carteira de vacinação. Procurei demonstrar a falsidades dos argumentos que procuraram se utilizar de bricolagens jurídicas para legitimar segredos por meio do desvirtuamento de uma legislação que protege interesses legítimos, em especial a defesa da honra e da vida privada. A revisão do posicionamento da CGU, emitida por meio do recurso de acesso à informação n. 00137.019130/2022-94, não resgata apenas a transparência; contribui também para resgatar a verdade, a moralidade pública e para permitir o acerto de contas com o passado e a responsabilização pública de agentes políticos sobre suas palavras e gestos. Contudo, a decisão determinou que a entrega deve dar-se apenas após o decurso das investigações criminais e administrativas ainda em curso a respeito de uma possível adulteração da carteira de vacinação. É necessário que a sociedade civil se mantenha atenta para exigir a efetiva entrega da carteira de vacinação, tão logo seja possível sua entrega.

A transparência pública é um dos valores fundamentais do Estado de Direito que o Brasil precisa recuperar. A decisão da CGU de março de 2023 é um importante passo no sentido da recuperação desse direito fundamental, porém é preciso ter em mente que há ainda um longo caminho de segredos a serem desobstruídos, e a luta centenária contra a cultura do segredo no Brasil está apenas começando.28 28 Agradeço às imensas contribuições que deram a esse artigo Bruno Franke, Debora Diniz, Luciano da Ros, Luíza Przybylski, Raquel Scalcon e Sinara Gumieri - além das contribuições efetivas para elaboração desse texto, a coragem e força dessas pessoas foi essencial e serviu de inspiração para que eu pudesse escrever e ter clareza sobre esse assunto.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2024

Histórico

  • Recebido
    06 Mar 2023
  • Aceito
    17 Ago 2023
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