Open-access Existe um direito legislado da antidiscriminação para pessoas LGBTQIA+ no Brasil hoje?

Is there a legislated anti-discrimination law for LGBTQIA+ people in Brazil today?

Resumo

Existe um direito da antidiscriminação legislado que proteja as pessoas LGBTQIA+ no Brasil de hoje? Por meio de levantamentos normativos, especialmente legislativos, que atravessam todas as esferas da federação, bem como de pesquisa teórica interdisciplinar, o artigo demonstra que sim, que esse direito existe e que tem uma importante dimensão legislativa. A partir do desenho de um mapa da legislação, propõe-se a leitura de três dimensões: da exigibilidade, em diálogo com a reflexão contemporânea do caráter de direitos fundamentais dos direitos LGBTQIA+; da interdependência, dimensão dos direitos fundamentais explorada para reconectar a legislação da antidiscriminação LGBTQIA+ em múltiplas dimensões e como um corpo normativo; e, por fim, da progressividade social e vedação ao retrocesso, como direcionamento jurídico chave diante de potenciais ataques legislativos a esses direitos.

Palavras-chave: Direito antidiscriminatório; Pessoas LGBTQIA+; Discriminação; Direitos LGBTQIA+; Legislação

Abstract

Is there a legislated anti-discrimination law that protects LGBTQIA+ people in Brazil today? Through the collection of statutory norms, especially legislative ones, crossing all spheres of the federation, as well as interdisciplinary theoretical research, the article demonstrates that yes, that this right exists and that it has an important legislative dimension. From the outlines of this map of laws, three dimensions are analyzed: enforceability, in dialogue with contemporary reflection on the fundamental rights character of LGBTQIA+ rights; interdependence, dimension of fundamental rights, explored to reconnect LGBTQIA+ anti-discrimination legislation in multiple dimensions and as a normative body; and, finally, social progressivity and prohibition of retrogression, as a key legal direction in the face of potential legislative attacks on these rights.

Keywords: Anti-discrimination law; LGBTQIA+ people; Discrimination; LGBTQIA+ rights; Legislation

1. Introdução: uma disputa existencial

Existe um direito da antidiscriminação legislado que proteja as pessoas LGBTQIA+ no Brasil de hoje? Este artigo pretende demonstrar que sim. O ponto de partida é uma certa disputa existencial, que faz desta demonstração algo mais complexo do que parece à primeira vista. De um lado, o direito da antidiscriminação se afirma progressivamente no mundo do direito, o que se passa de modo cada vez mais visível também na literatura jurídica nacional. Essa afirmação se dá tanto de maneira geral, na reflexão jurídica sobre os fundamentos da discriminação e suas muitas formas de expressão, quanto na especificação em matéria de identidades de gênero e sexualidades não hegemônicas, num direito da antidiscriminação LGBTfóbica (RIOS, 2008; MOREIRA, 2020). Pelo outro lado, contudo, o senso comum, as opiniões de circulação midiática, os ativismos, as decisões judiciais e as análises jurídicas insistem na ideia de que este direito antidiscriminatório para pessoas LGBTQIA+ não estaria propriamente previsto em leis expressas, ou estaria de modo bastante restrito (BOMFIM, BAHIA, 2019; VECCHIATTI, 2020; BRITO, 2021).

Diante deste certo impasse jurídico, por meio de levantamentos normativos, especialmente legislativos, que atravessam todas as esferas da federação, bem como de pesquisa teórica interdisciplinar, a ideia é demonstrar que este direito da antidiscriminação de pessoas de gêneros e sexualidades dissidentes existe sim, e tem uma importante e específica dimensão legislativa. Ou seja, ele não é apenas composto de decisões judiciais que interpretam princípios jurídicos igualitários abertos, ou de legislação escassa, aberta e inespecífica. Ou de proposições teóricas, investigativas ou críticas da literatura. Esse direito consta também de regulação expressa e farta contra a LGBTfobia em âmbito estadual e municipal, além da federal. E, como tal, é exigível no presente, se articula de modo interdependente com outros direitos e não admite retrocessos futuros.

Algo, contudo, deve ser reconhecido de início, e este artigo, de modo algum, coloca isso em questão. Há uma sensível e muito problemática omissão legislativa na esfera federal no Brasil, com uma deficiência de leis nacionais que sistematicamente proíbam a discriminação LGBTfóbica. A própria importância das decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que lidam com a omissão jurídica em matéria de direitos afetos às dissidências de gênero e sexualidade confirma esta percepção (BRASIL, 2022). A hipótese do artigo, contudo, é a de que uma leitura totalizante desse quadro de omissão parece estreitar as possibilidades de compreensão do direito nacional antidiscriminatório como um todo. E a partir disso, contribuir para a consolidação do direito da antidiscriminação contra pessoas LGBTQIA+, sobretudo em sua operatividade.

Para fazer sua proposição direta de existência de um direito também legislado de antidiscriminação LGBTQIA+, o artigo se organiza em dois grandes momentos, ao redor de um mapa federado da legislação antidiscriminatória: conhecê-lo e situá-lo. O primeiro momento, conhecer o mapa, é um esforço empírico de consolidação de legislação. Toma-se, claro, por referência inicial o quadro antidiscriminatório constitucional e federal, com as interpretações do STF nos grandes temas dos direitos LGBTQIA+. Mas, diante da profusão de boas análises deste conjunto normativo e decisório mais evidenciado (RIOS, MELLO, 2020; PEDRA, 2020; VECCHIATTI, 2020), a proposta se move rapidamente para aquilo que se constitui na sua contribuição específica: a existência de legislação antidiscriminatória nos estados e municípios. Aqui, um trabalho difícil de coleta e compreensão dos sentidos amplos da regulação regional e local é quem vai garantir um traçado forte para as linhas desse mapa.

O segundo momento o artigo pretende situar o mapa em seu contexto jurídico mais amplo, explorando algumas dimensões reclamadas como fundamentais para a compreensão deste conjunto regulatório. E para colocá-lo em movimento, discutindo sua aplicabilidade imediata. Propõe-se uma leitura de três dimensões: a dimensão da exigibilidade, que abre diálogo com a reflexão contemporânea do caráter de direitos fundamentais dos direitos LGBTQIA+ e com sua exigibilidade geral; a da interdependência, dimensão clássica dos direitos fundamentais, explorada para reconectar a antidiscriminação LGBTQIA+ com outras esferas da regulação da vida, como os direitos sociais em sentido amplo; e, por fim, a progressividade social e vedação ao retrocesso, recuperada em seus sentidos gerais para se colocar como direcionamento jurídico chave num país que de modo recorrente sinaliza na direção de potenciais ataques legislativos a esses direitos.

A conclusão ilumina um processo em curso, com toda sua complexidade: a afirmação da existência dessa dimensão legislada do direito antidiscriminatório para pessoas LGBTQIA+ no Brasil e a constatação de que esse está longe de ser o fim da história, das disputas jurídico-políticas ao redor do tema. No cenário contemporâneo, e consideradas também as formas de se viver concretamente esses direitos, não há como se contentar com uma leitura simples deste conjunto normativo. O artigo termina em um gesto de revisita à disputa de sentidos do qual o mapa traçado não poderá sair.

2. Um mapa da legislação antidiscriminatória protetora de pessoas LGBTQIA+ no Brasil federado

O primeiro movimento do artigo quer desenhar um mapa legislativo: identificar e analisar as principais normas no Brasil federado que, modo direto ou indireto, tratam da discriminação LGBTfóbica. Esse gesto de compilação, contudo, não tem natureza meramente técnica, em mais um desses esforços de sistematização que a história do direito nos apresenta de modo recorrente. No caso do direito antidiscriminatório para pessoas LGBTQIA+, traçar esse mapa é recuperar processos de luta travados em arenas jurídico-políticas que têm um grau de intensidade particularmente importante, sobretudo nos últimos anos. A pauta das questões LGBTQIA+ é percebida, hoje, politicamente como explosiva, no contexto de uma “cruzada antigênero” (MISKOLCI, CAMPANA, 2017; JUNQUEIRA, 2017; BIROLI, VAGGIONE, MACHADO, 2020). Isso, em matéria de dissidências de gênero e sexualidade, em reação também ao do processo de mobilização e luta pelo movimento LGBTQIA+ no mundo e país (GREEN, QUINALHA, FERNANDES, CAETANO, 2018; LIMA, 2021; QUINALHA, 2022), tensionando e reclamando uma reversão dos modos repressivos de tratamento das identidades de gênero e sexualidades dissidentes que vigorou entre nós (QUINALHA, 2021). E isso tece um pano de fundo geral de disputa, que atravessa o mapa que propomos. Porque essa é uma disputa que assume fortemente a linguagem dos direitos e que passa a se desdobrar largamente também no legislativo.

2.1. Projetos de lei como testemunhos da disputa ao redor dos direitos LGBTQIA+

Nas casas legislativas, os primeiros projetos de lei e as leis dirigidos à proteção ou à garantia de direitos a população LGBTQIA+ aparecem no Brasil em meados da década de 1990. Nos municípios e estados, como veremos adiante, o início do século XXI foi marcado pela multiplicação de leis antidiscriminatórias e, muito recentemente, pelo aparecimento de leis que dispõem sobre aspectos importantes das vidas de pessoas transexuais e travestis, como o direito ao uso do nome social. No Congresso Nacional, contudo, essa disputa discursiva pendeu para o lado das forças conservadoras, que desumanizam e recusam o reconhecimento de direitos para pessoas LGBTQIA+. Nas décadas de 1990, 2000 e 2010, apesar das dezenas de projeto de lei propostos1, o Congresso Nacional não produziu, a bem da verdade, nenhuma lei voltada para a população LGBTQIA+. Todos os projetos propostos terminaram arquivados, arrastaram-se ou ainda se arrastam por anos na Câmara dos Deputados e no Senado, sem nunca terem sido levado à votação do plenário2.

O primeiro projeto de lei do Congresso Nacional dirigido a garantia de direitos de pessoas LGBTQIA+ foi proposto em 1995 pela então deputada federal Marta Suplicy (PT). Esse projeto de lei, o PL 1.151/1995, pretendia disciplinar “a união civil entre pessoas do mesmo sexo”, mas foi retirado de pauta em 2001. Em 2003, o senador Sérgio Cabral (MDB) propôs um Projeto de Emenda Constitucional (PEC 70/2003) para alterar o artigo 226 da Constituição, permitindo “a união estável entre casais homossexuais”. A proposta foi retirada pelo próprio autor em 2006. Em 2005, o deputado Maurício Rands (PT) propôs o PL 6297/2005 que pretendia garantir o direito de inclusão do companheiro ou companheira homossexual como dependente do trabalhador ou servidor para fins de proteções previdenciárias. O projeto não teve sucesso e foi arquivado em 2015. Em 2006, a deputada Laura Carneiro (do então PFL) propôs o PL 6874/2006 para alterar o Código Civil a fim de regular “o contrato de união homoafetiva”. O projeto seguiu o mesmo destino e foi arquivado em 2008. Em 2007, o deputado Clodovil Hernandes (PTC) propôs o PL 580/2007 para alterar o Código Civil e regular “o contrato civil de união homoafetiva”. O projeto continua em tramitação, sem qualquer previsão de votação. Em 2007, o deputado Sérgio Barradas Carneiro (PT) propôs o PL 2285/2007 para instituir o “Estatuto das Famílias” com extensa regulação de questões de parentesco, casamento, divórcio, filiação, incluindo o reconhecimento “como entidade familiar a união entre duas pessoas de mesmo sexo”. O projeto ainda está em tramitação, mas sem previsão de votação. Em 2009, o PL 4914/2009 de autoria de José Genoíno (PT), Manuela D’Ávila (PCdoB) e Maria Helena (PSB) propôs a alteração do Código Civil para permitir a aplicação dos dispositivos referentes à união estável também para pessoas do mesmo sexo. Ainda em tramitação. Em 2011, a então senadora Marta Suplicy (PT) propôs o projeto de lei do Senado (PLS 612/2011) para alterar o Código Civil para “permitir o reconhecimento legal da união estável entre pessoas do mesmo sexo”, bem como sua conversão em casamento. O projeto foi arquivado em 2018. Em 2013, os deputados Jean Wyllys (PSOL) e Erika Kokay (PT) propuseram o PL 5120/2013 para alterar o Código Civil, reconhecendo o casamento civil e a união estável entre pessoas do mesmo sexo. Ainda em tramitação. Em 2015, o deputado Bacelar (PTN), propôs um Projeto de Emenda à Constituição (PEC 158/2015) para alterar a redação do artigo 226, reconhecendo como entidade familiar o núcleo social formado por duas ou mais pessoas unidas por laços sanguíneos ou afetivos, originados pelo casamento, união estável ou afinidade”, projeto que segue em tramitação.

O primeiro projeto de lei que pretendeu criminalizar a LGBTfobia - isto é, a discriminação em razão da orientação sexual e identidade de gênero - foi proposto em 2003 pela deputada Iara Bernardi (PT). O projeto (PL 5/2003) pretendia alterar a Lei do Racismo (Lei n. 7716/1989) para “incluir a punição por discriminação ou preconceito de gênero e orientação sexual”, mas foi arquivado, sem ter ido à votação. Entre 2006 e 2014 tramitou no Congresso Nacional projeto de lei complementar, o PLC 122/2006 também de autoria da deputada Iara Bernardi (PT), que propunha estender as proteções da Lei do Racismo (lei n. 7.716 de 1989) também a pessoas LGBTQIA+, criminalizando as discriminações baseadas na orientação sexual e na identidade de gênero. O projeto chegou a ser aprovado na Câmara dos Deputados em 2006, foi aprovado pela Comissão de Assuntos Sociais do Senado em 2009, mas não chegou a ser votado pela Comissão de Direitos Humanos, terminando arquivado em 2014. Em 2014, o PL 7582/2014 da deputada Maria do Rosário (PT) propôs a definição e punição do “crime de ódio” (ofensa a vida, a integridade corporal, ou a saúde de outrem motivada por preconceito ou discriminação) e do “crime de intolerância” (violência psicológica, impedimento de acesso, recusa de emprego, proibição de expressão motivada por preconceito ou discriminação), incluindo o preconceito e a discriminação em razão da identidade de gênero ou orientação sexual. O projeto encontra-se em tramitação, sem qualquer previsão de votação. Em 2014, o senador Vital do Rêgo (MDB) propôs o projeto de lei do Senado (PLS 310/2014) para alterar o Código Penal a fim de “punir os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de orientação sexual ou identidade de gênero”. A proposta foi retirada pelo próprio autor no mesmo ano. Em 2017, o deputado Weverton Rocha (PDT) propôs o PL 7702/2017 para incluir na Lei do Racismo os crimes de discriminação ou preconceito de orientação sexual e/ou identidade de gênero. No mesmo ano, a deputada Luizianne Lins (PT), propôs o PL 7292/2017 para a alteração do Código Penal (Decreto-Lei n. 2.848/1940) e da Lei de Crimes Hediondos (Lei n. 8.072/1990) a fim de “prever o LGBTcídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio” e “incluir o LGBTcídio no rol dos crimes hediondos”. Em 2019, o deputado David Miranda (PSOL) propôs o PL 2653/2019 para proteger “pessoas em situação de violência baseada na orientação sexual, identidade de gênero, expressão de gênero ou características biológicas ou sexuais”. No memo ano, o deputado Otoni de Paula (PSC) propôs o PL 4949/2019 para alterar a Lei do Racismo “para definir e punir os crimes resultantes de discriminação ou preconceito por sexo ou orientação sexual”. Todos esses projetos continuam em tramitação, sem previsão de votação.

Em relação ao direito à livre identidade de gênero de pessoas transexuais e travestis, em 2007, o PL 72/2007 de autoria do deputado Luciano Zica (PT) propôs a alteração da lei de registros públicos (Lei n. 6.015/73) para possibilitar “a substituição do prenome de pessoas transexuais”, mas o projeto foi arquivado em 2014. Em 2011, a senadora Marta Suplicy (PT) propôs o projeto de lei do Senado (PLS 658/2011) para reconhecer “os direitos à identidade de gênero e à troca de nome e sexo nos documentos de identidade de transexuais”. Arquivado em 2018. Em 2013, os deputados Jean Wyllys (PSOL) e Erika Kokay (PT) propuseram o PL 5002/2013 que pretendia estabelecer dispositivos para alteração do nome e sexo no registro civil e documentos, garantindo o direito ao livre desenvolvimento da pessoa conforme sua identidade de gênero. O projeto foi arquivado, sem nunca ter ido à votação do plenário.

Por outro lado, também tramitam no Congresso Nacional muitos projetos de lei que visam retirar direitos de pessoas LGBTQIA+. Em 2003, por exemplo, foi proposto pelo deputado Elimar Damasceno (então do PRONA) o Projeto de Lei 2279/2003 que pretendia tornar “contravenção penal o beijo lascivo entre pessoas do mesmo sexo em público”. O projeto recebeu parecer negativo da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, tendo sido arquivado 2004. Em 2009, o deputado Capitão Assumção (PL) propôs o PL 5167/2009 para proibir a equiparação da relação entre pessoas do mesmo sexo a entidade familiar, projeto que segue em tramitação. Em 2015, a deputada Júlia Marinho (PSC) propôs o PL 620/2015 para alterar o Estatuto da Criança e do Adolescente, proibindo a adoção conjunta por casal homoafetivo. O Plano Nacional de Educação (Lei n. 13.005), aprovado em 2014, retirou do projeto original, o PL 8035/2010, o trecho que estabelecia como estratégia a implementação de “políticas de prevenção à evasão motivada por preconceito e discriminação à orientação sexual ou à identidade de gênero, criando rede de proteção contra formas associadas de exclusão”. Em 2015, o deputado Jair Bolsonaro, mais tarde eleito presidente da República, em uma das poucas iniciativas como parlamentar, propôs o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) 18/2015 para sustar a Resolução 11/2014 do Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de LGBT que estabeleceu a inclusão dos itens “orientação sexual”, “identidade de gênero” e “nome social” nos boletins de ocorrência policial, bem como a Resolução 12/2015 que estabeleceu parâmetros para garantir o acesso e permanência de pessoas travestis e transexuais em instituições de ensino. Em 2016, o deputado Professor Victório Galli (PTB) propôs o PL 5774/2016 para tornar contravenção penal o ato de “usar banheiro público diferente de seu sexo masculino ou feminino”. O projeto segue em tramitação.

Esta não é uma lista exaustiva de todos os projetos de lei da Câmara dos Deputados e do Senado que propuseram ou propõem a garantia de direitos a pessoas LGBTQIA+3. De todo modo, ela nos oferece uma noção inicial dos temas mais sensíveis para essas pessoas nas últimas décadas: o direito de constituir família através da união estável ou do casamento, o direito à livre identidade de gênero com a garantia de alteração do nome e gênero nos registros de pessoas transexuais e travestis e o direito a proteção contra a discriminação em razão da identidade de gênero e orientação sexual. Evidentemente, as demandas pelo reconhecimento de direitos por parte da população LGBTQIA+ não param por aí. Direito à reprodução assistida, direito de atendimento adequado e não discriminatório à saúde de lésbicas, gays, bissexuais, pessoas transexuais e travestis, direito de acesso igualitário à educação e ao trabalho, entre vários outros direitos que não estão protegidos por lei federal no Brasil.

Esta lista também dá conta do caráter disputado dessa dimensão legislada de um direito antidiscriminatório que proteja pessoas LGBTQIA+ no Brasil. As muitas iniciativas legislativas nos fazem perceber a força do debate e da mobilização ao redor do tema. Os muitos arquivamentos, a tramitação lenta, os insucessos nas votações, tudo isso fala da força do conservadorismo no debate legislativo. Essa queda-de-braço é que alimenta a inflexão básica deste artigo. A de alargar o alcance da lente da análise legal, percebendo que há muitas frentes na batalha legislativa pelo reconhecimento de direitos para pessoas LGBTQIA+. E que, ainda que a esfera federal apresente este cenário difícil, esta é uma batalha difundida, que atravessa não só as vidas localizadas de pessoas LGBTQIA+, mas os espaços das cidades, regiões e estados. Engajar todas essas escalas de expressão da disputa na definição dos limites conceituais e da força operativa do direito antidiscriminatório para pessoas LGBTQIA+ nos parece fundamental.

2.2. A escassa legislação federal em matéria de antidiscriminação para pessoas LGBTQIA+

Como visto, o legislativo federal é um campo de batalha ao redor da regulação dos temas-chave para pessoas LGBTQIA+. Todos os projetos de lei referenciados acima são um testemunho vivo dessa atualidade e força do conflito. O que, invariavelmente, vai se firmar como o cenário no qual se pode pensar um direito da antidiscriminação legislado no Brasil. Ele tem uma dimensão federal atravessada de maneira direta pela omissão e incompletude. Mas há, contudo, algumas leis federais relevantes que tratam, de modo mais ou menos direto, da temática.

Uma delas é a Lei n. 12.852/2013, o Estatuto da Juventude. Em seu artigo 17, ela garante aos jovens a igualdade de direitos e oportunidades, proibindo a discriminação por motivo de orientação sexual, além de raça, etnia, religião, opinião etc. Além dela, a Lei n. 11.340/2006, Lei Maria da Penha, afirma que a toda mulher goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, independente da orientação sexual4.

Há, ainda, um último dispositivo de lei federal, que talvez seja o mais exemplificativo da dificuldade e contradição do debate legislativo sobre discriminação e vida de pessoas LGBTQIA+ no país. Trata-se da reforma trabalhista brasileira, de 2017 (Lei n. 13.467/2017). Em meio a um mar de retrocessos sociais graves reconhecidos pelos especialistas do campo (DUTRA, MACHADO, 2021; SOUTO MAIOR, SEVERO, 2017), a reforma trabalhista detalhou a disciplina do chamado dano extrapatrimonial. O art. 223-C, inserido na Consolidação das Leis do Trabalho pela reforma, dispôs, com grande precisão e acuidade de termos, que “a honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física são os bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa física”. A Medida Provisória n. 808, também de 2017, que fez ajustes na legislação reformada logo após sua promulgação, chegou a incluir as palavras gênero e orientação sexual, como direitos inerentes à personalidade5. A MP caducou, mas estrutura da reforma se manteve.

O art. 223-G, §1º, da CLT reformada, diz que a violação a esses bens jurídicos, incluindo a sexualidade, deve gerar uma indenização graduada em leve, média, grave e gravíssima, calculada à luz do último salário contratual da pessoa ofendida. Aqui, a contradição fica mais explícita. O quanto a pessoa ganha passa a influir no valor da indenização que recebe, de maneira expressamente prevista na lei. Se ganha muito, a ofensa vale muito. Se ganha pouco, vale pouco. As ofensas mais leves, até o valor de três salários da pessoa. As mais graves, até cinquenta.

Não que isso já não acontecesse na prática, mas essa explicitação legal foi um transbordamento escandaloso. O modelo de tarifação expõe a lógica crua do valor da pessoa e foi fortemente criticado pela comunidade jurídica. Atualmente, a constitucionalidade do dispositivo está em discussão no Supremo Tribunal Federal. Mas ele traz à tona um contrassenso importante: mesmo quando gênero e sexualidade são reconhecidos na esfera legislativa federal, o contexto é o de perdas sensíveis de direitos fundamentais, como no caso da reforma trabalhista. Reforma que afeta de maneira particularmente forte a vida já caracterizada pela precariedade no trabalho da maior parte das pessoas LGBTQIA+ (NICOLI, DUTRA, 2022).

De todo modo, a menos desses exemplos localizados, a omissão definitivamente ainda impera na matéria legislativa federal de um direito antidiscriminatório para pessoas LGBTQIA+. Em um contexto social no qual a violência ainda atravessa e constitui estruturalmente a vida de pessoas LGBTQIA+, a omissão do Congresso Nacional representa não só uma violação dos fundamentos antidiscriminatórios da Constituição Federal, mas também produz um estado de insegurança jurídica para a população LGBTQIA+. Essa reconhecida omissão, aliás, está por detrás de muitas das decisões judiciais mais relevantes na temática, especialmente por parte do Supremo Tribunal Federal (BRASIL, 2022). Por outro lado, e aqui se justifica largamente a investigação deste artigo, o Congresso Nacional não é a única fonte legítima de produção de direitos. Em contraste com o silêncio normativo dos legisladores federais, tivemos na história recente do Brasil importantes direitos LGBTQIA+ reconhecidos por leis municipais e estaduais. E é este quadro mais amplo que deve também compor o mapa legislativo do direito antidiscriminatório de pessoas LGBTQIA+ no país.

2.3. A amplitude e solidez da legislação antidiscriminatória para pessoas LGBTQIA+ nos estados e municípios brasileiros

Diante da constatação tanto da força das disputas ao redor dos direitos LGBTQIA+ na arena política quanto da omissão legislativa federal a ela associada, o gesto que propomos agora é o de complexificar o debate pelo alargamento espacial da escala política. Por isso, propomos um mapa legislativo que integre seriamente a legislação estadual e municipal na questão, sinalizando para o fato de que a disputa é ainda mais abrangente, radicalmente territorializada, bem como travada em arenas que transbordam as casas legislativas federais. E que, nesses espaços, produzem resultados jurídicos de alta relevância, e que dão corpo a um direito antidiscriminatório vigente e exigível.

O mapeamento legislativo se deu por meio de investigação exaustiva nas páginas virtuais Assembleias Legislativas de estados e nas Câmaras Municipais de capitais e municípios de grande porte brasileiros. Essa metodologia, por certo, não é perfeita, diante da possibilidade de existência de outras leis que não foram identificadas em razão da precariedade ou inexistência de mecanismos de buscas em muitas casas legislativas. Mas ela nos dá ao menos as grandes dimensões da questão.

Em contraste com o silêncio normativo dos legisladores federais, tivemos na história recente do Brasil importantes direitos LGBTQIA+ reconhecidos por leis municipais e estaduais. As primeiras leis municipais dirigidas à população LGBTQIA+ no Brasil começaram a aparecer no final da década de 1990 e, de modo geral, combatiam práticas discriminatórias por orientação sexual em seus territórios. A primeira delas foi a Lei n. 5.275 de 1997 de Salvador (alterada em 2019 pela Lei n. 9.498) que impôs penalidades administrativas para “ato discriminatório contra pessoas em razão de sua orientação sexual e/ou identidade e expressão de gênero” praticadas por estabelecimento privado ou órgãos públicos. Em Juiz de Fora, Minas Gerais, a Lei n. 9.791 de 2000, conhecida como Lei Rosa, estabeleceu punição para cidadãos, servidores públicos, organizações sociais e empresas que praticarem atos discriminatórios contra “cidadãos homossexuais, bissexuais e transgêneros, dentre outros”. Com regras parecidas, temos também a Lei n. 8.176 de 2001 de Belo Horizonte, a Lei n. 16.780 de 2002 de Recife, a Lei n. 4.172 de 2007 de São João Del Rey, em Minas Gerais, a Lei n. 4.774 de 2008 do Rio de Janeiro, a Lei n. 8.627 de 2014 de Vitória, entre outras.

Leis antidiscriminatórias também começaram a ser aprovadas nas Assembleias Legislativas dos estados, impondo a proibição de atos discriminatórios por orientação sexual nos seus territórios. A mais antiga é a Lei n. 2.615 de 2000 do Distrito Federal, mas muitas outras foram aprovadas em seguida: Lei n. 3.406 de 2000 do estado do Rio de Janeiro (substituída em 2015 pela Lei n. 7.041), Lei n. 10.948 de 2001 do estado de São Paulo, Lei n. 14.170 de 2002 do estado de Minas Gerais, Lei n. 11.872 de 2002 do estado do Rio Grande do Sul, Lei n. 12.574 de 2003 do estado de Santa Catarina (substituída Lei Complementar n. 527 de 2010), Lei n. 7.309 de 2003 do estado da Paraíba, Lei n. 5.431 de 2004 do estado do Piauí, Lei n. 3.157 de 2005 do estado de Mato Grosso do Sul, Lei n. 8.444 de 2006 do estado do Maranhão, Lei n. 3.079 de 2006 do estado do Amazonas, Lei n. 9.036 de 2007 do estado do Rio Grande do Norte, Lei n. 8.967 de 2008 do estado de Mato Grosso e Lei n. 7.383 de 2012 do estado de Sergipe6.

De modo geral, essas leis municipais e estaduais definem como atos discriminatórios por orientação sexual a ação violenta, intimidatória ou vexatória, a agressão física, impedir ou dificultar o ingresso ou a permanência em espaços ou logradouros públicos, estabelecimentos abertos ao público ou prédios públicos, criar embaraços à utilização das áreas comuns de edifícios privados, recusar atendimento ou serviço, negar ou dificultar a locação ou aquisição de imóvel, recusar, dificultar ou preterir atendimento médico, inibir ou proibir a livre manifestação pública de carinho ou afeto etc. Elas estabelecem como penalidades para esses atos a advertência, a multa, a suspensão ou revogação de licença de funcionamento de estabelecimentos e até mesmo a demissão, quando o ato for praticado por servidor público7. Muitas estabelecem também como penalidades a proibição de contratar com o estado ou com o município, a inabilitação para acessar créditos estaduais ou municipais ou para receber isenção, remissão ou anistia tributária.

Para pessoas travestis e transexuais, o reconhecimento de direitos específicos, como o direito de uso ao nome social, começa a aparecer apenas na década de 2010 nas legislações estaduais e municipais. Em 2017, foi a primeira vez que esse direito foi garantido por lei, no estado do Acre e na cidade de Uberlândia, em Minas Gerais. A Lei n. 3.355/2017 do estado do Acre assegurou o direito ao uso do nome social nos atos e procedimentos da administração pública, impondo aos servidores públicos o dever de observá-lo. Curiosamente, embora essa lei beneficie diretamente pessoas trans e travestis, não há no seu texto as palavras transexual, travesti ou transgênero. A Lei n. 12.691/2017 da cidade de Uberlândia garantiu expressamente a pessoas travestis e transexuais o direito ao uso do nome social. Em seguida, a Lei n. 23.176 de 2018 do estado de Minas Gerais e a Lei n. 11.021 de 2019 do estado do Maranhão garantiram o direito ao uso do nome social em seus respectivos territórios. Antes, esse direito havia sido garantido apenas por via de decretos dos poderes executivos da federação. A primeira vez, em 2010, com o Decreto n. 35.051 do estado de Pernambuco que garantiu aos servidores públicos estaduais travesti ou transexual o direito ao uso nome social. Mais tarde, nos estados de Alagoas e de Santa Catarina, o direito foi reconhecido pelos Decretos n. 58.187/2018 e n. 16/2019 respectivamente.

Por fim, é preciso também registrar um contexto de enquadramento normativo regionalizado, que, de uma maneira ou de outra, estrutura em normas cada vez mais gerais, com cada vez mais abrangência territorial e populacional esse direito da antidiscriminação descentralizado. Nesse sentido, a proibição da discriminação por orientação sexual está explicitamente afirmada pela Constituição Estadual de oito estados da federação (Alagoas, Ceará, Espírito Santo, Mato Grosso, Pará, Piauí, Santa Catarina e Sergipe), afastando a validade de qualquer regra jurídica discriminatória em seus territórios. Esta proibição também está implicitamente afirmada nas Constituições de nove outros estados8, nas quais há algum dispositivo antidiscriminatório geral. Além disso, ao menos dezesseis estados (Amazonas, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraíba, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Roraima, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe, além do Distrito Federal) têm leis estaduais antidiscriminatórias específicas para pessoas LGBTQIA+. E dos onze estados sem leis antidiscriminatórias para pessoas LGBTQIA+9, quatro, como dito, têm dispositivos antidiscriminatórios por orientação sexual em suas Constituições Estaduais (Alagoas, Ceará, Espírito Santo e Pará). Além disso, mesmo nos estados sem dispositivos antidiscriminatórios específicos em constituição ou lei estadual10, há importantes leis municipais antidiscriminatórias nas maiores cidades, como é o caso de Salvador, na Bahia, e do Recife, em Pernambuco.

Todas essas leis nos dão a dimensão de uma disputa que é descentralizada, regionalizada, territorializada e muito cotidiana. Ela se desenrola, com resultados muito importantes para a defesa das pessoas LGBTQIA+ em face da discriminação, nas cidades, estados e regiões do país. Nos espaços em que essas pessoas efetivamente estão, onde desenvolvem suas relações, suas trocas materiais e simbólicas, ondem vivem seus cotidianos. E, nessa escala, o que vemos é um quadro normativo próprio de um direito antidiscriminatório para pessoas LGBTQIA+ que tem peso e solidez.

Além disso, das 17 maiores cidades brasileiras (cidades com mais de 1 milhão de habitantes), nas quais vivem quase 25% (vinte e cinco porcento) de toda a população do Brasil, 10 passaram a incluir em sua Lei Orgânica dispositivo expresso contra discriminação por orientação sexual. São elas São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Salvador, Fortaleza, Goiânia, Porto Alegre, Campinas, São Gonçalo e Maceió. A lei orgânica é a lei fundamental do município. Ela equivale no município à Constituição estadual no âmbito do estado e à Constituição Federal no âmbito da União Federal. Ela é hierarquicamente superior às demais leis produzidas pela câmara municipal. Isso significa que nenhuma lei municipal pode conter dispositivo contrário à lei orgânica.

Os levantamentos aqui feitos, aliás, vão demonstrar algo fundamental: pelo menos 83% (oitenta e três porcento) da população brasileira vive em estados ou capitais de estado cujas constituições, leis estaduais ou leis municipais proíbem expressamente a discriminação de pessoas LGBTQIA+.

São 20 os estados da Federação (Alagoas, Amazonas, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Roraima, Santa Catarina, São Paulo e Sergipe) que têm normas que proíbem a discriminação de pessoas LGBTQIA+ em suas Constituições ou leis estaduais. A população desses entes federados é composta por mais de 163,7 milhões de pessoas, segundo dados do censo do IBGE referentes ao ano de 2022 (2023).

Dos 7 estados da Federação sem leis estaduais antidiscriminatórias (Acre, Amapá, Bahia, Paraná, Pernambuco, Rondônia e Tocantins), apenas duas de suas capitais (Curitiba e Porto Velho) não têm leis municipais que proíbem a discriminação de pessoas LGBTQIA+. Salvador, Recife, Rio Branco e Macapá têm leis municipais que protegem a diversidade sexual e Palmas tem um dispositivo em sua lei orgânica que proíbe a discriminação de mulheres em razão da orientação sexual (o que deve, em razão do princípio constitucional da isonomia, ser aplicado a todas as pessoas). Essas capitais têm somadas uma população de 5 milhões de pessoas.

Portanto, ao menos 168,7 milhões de brasileiros vivem em estados ou capitais de estados com leis que proíbem expressamente a discriminação de pessoa LGBTQIA+, o que, em universo de 203 milhões de habitantes, representa 83% da população. Essa é uma estimativa bastante segura, embora não seja exaustiva e possa estar ligeiramente subestimada. Isto porque, em razão da dificuldade de acesso a dados digitalizados, confiáveis e atuais em todos os 5.568 munícipios brasileiros, esse número pode ter deixado de fora algumas cidades.

As tabelas abaixo detalham a identificação e cálculo desse conjunto de normas em seus referenciamentos espaciais e populacionais, com base nos dados do IBGE (2022):


Estados com Constituições estaduais e/ou leis estaduais expressamente proibindo discriminação de pessoas LGBTQIA+


Estados sem legislação antidiscriminatória cujas capitais têm legislação antidiscriminatória

Ou seja, ainda que não haja legislação federal expressa e sistemática desse direito antidiscriminatório, para a maioria esmagadora da população há sim leis de ampla exigibilidade que as protegem contra a discriminação LGBTfóbica, nos estados e municípios. Por isso é que se pode dizer que o direito antidiscriminatório legislado para pessoas LGBTQIA+ no Brasil existe, e que tem proporções muito significativas. Muito mais do que o debate jurídico atual no tema tem dado conta. E conhecido esse mapa nos cumpre, agora, situá-lo nos debates jurídicos para entender o que ele pode significar tanto institucionalmente quanto na vida concreta das pessoas LGBTQIA+.

3. A inserção e sentidos jurídicos da legislação no direito antidiscriminatório de pessoas LGBTQIA+: interdependência, exigibilidade e progressividade

Que sentidos jurídicos podem ser extraídos desse mapa normativo traçado? Mais do que isoladamente verificar, caso a caso, à luz de critérios elementares da teoria geral do direito sobre validade formal, territorial, aplicabilidade subjetiva, competências e força vinculante, o que queremos agora é propor um debate um pouco mais sistemático, que enxergue essas normas todas como um conjunto normativo de direito antidiscriminatório. Esse agrupamento é mais do que uma justaposição, uma soma simples de normas, mas uma tentativa de entender que se formou nas últimas décadas num país um campo jurídico próprio. E com isso queremos dizer da existência de um direito antidiscriminatório que protege pessoas LGBTQIA+ e que tem, além de ancoragens constitucionais e na normativa federal, uma capilaridade bastante expressiva nos estados e municípios.

Para isso, pensemos em três dimensões que nos ajudam a situar bem esse mapa dentro de suas potencialidades jurídicas: (i) sua interdependência, tanto interna quanto com outras esferas dos direitos fundamentais; (ii) a exigibilidade desse conjunto normativo; (iii) a impossibilidade jurídica de sua reversão, à luz da vedação ao retrocesso. Aí se coloca uma tentativa de compreender essas que são como dimensões espaço-temporais dessas normas no todo. A primeira dimensão tentar enxergar o conjunto em seu contexto, numa topografia jurídica: a correlação existente entre cada uma dessas muitas leis entre si, com normas hierarquicamente superiores e com outros conjuntos correlatos de proteção à pessoa. A segunda percebe esse conjunto em movimento, nas potencialidades de aplicação dessas normas, sua exigibilidade em caso de violações. A terceira dimensão visa compreender tudo isso no tempo, reclamando que a consolidação normativa do conjunto se coloca como juridicamente irreversível sob horizontes democráticos, apenas se admitindo sua expansão e nunca seu retrocesso.

A primeira dimensão quer pensar esses direitos a partir do conceito de interdependência. E tomamos, de partida, o conceito em acepções até mais amplas do que apenas sua formulação clássica na técnica jurídica dos direitos humanos. Queremos pensar a interdependência numa pressuposição elementar de que a vida, os sujeitos e os direitos se constituem nas relações concretas. Isso pode parecer uma obviedade, mas tem repercussões bem significativas no modo de ler os direitos. Nosso pressuposto, aqui, é que as pessoas todas, e também as LGBTQIA+, só podem ser compreendidas como pessoas de modo relacional. Não há indivíduo e direitos individuais anterior ou fora da relação. Todo e qualquer processo de conquista ou fruição de direitos se passa de modo intersubjetivo e na relação com o mundo ao redor. De forma material e simbólica, nos espaços concretos, no dia a dia, de forma cotidiana.

A doutrina dos direitos humanos sabe disso. Que para viver direitos humanos é preciso poder vivê-los de maneira integral, em muitas esferas, ao mesmo tempo. A literatura jurídica dos direitos humanos aponta essa ideia, a de interdependência, como uma característica básica dos próprios direitos humanos. A Declaração de Viena de 1993, um dos tratados contemporâneos mais importantes em matéria de direitos humanos, vai dizer em seu art. 5º que “todos os Direitos do homem são universais, indivisíveis, interdependentes e interrelacionados”. Direitos humanos, para a declaração de Viena, só podem ser entendidos em sua correlação, uns com os outros. O reconhecimento de um direito humano só tem sentido se consideradas as condicionantes estruturais que outros direitos, de natureza social e coletiva, podem garantir.

Aí é que entra nossa leitura da interdependência como atributo do mapa nacional de um direito antidiscriminatório legislado no país para pessoas LGBTQIA+. É preciso ler esse conjunto de forma interdependente (NICOLI, RAMOS, 2022). E não estamos aqui afirmando nada de propriamente novo. Os Princípios de Yogyakarta partem de um pressuposto parecido. Esses princípios consistem em um documento internacional sobre direitos humanos de pessoas LGBTQIA+ de 2006 que resultou de uma reunião internacional de grupos de direitos humanos na Indonésia. O ponto de partida desse documento histórico é, de certa maneira, uma formulação da interdependência dos direitos. O primeiro princípio é intitulado “direito ao gozo universal dos direitos humanos”. E diz: “Os seres humanos de todas as orientações sexuais e identidades de gênero têm o direito de desfrutar plenamente de todos os direitos humanos”. A partir daí, os demais princípios são desdobramentos dessas muitas faces dos direitos LGBTQIA+ em esferas da vida.

Para nós, no mapa descentralizado que desenhamos da legislação antidiscriminatória em gêneros e sexualidades não hegemônicas, despontam algumas conclusões afetas a essa ideia de interdependência: as pessoas LGBTQIA+ dependem desses direitos em seus espaços e relações, na interdependência de suas vidas em relações concretas. Para que, em verdade, possam ser pessoas LGBTQIA+ de modo livre e seguro. E os direitos que se reportam a essas relações, a despeito de produzidos em espaços federados distintos, se comunicam na base. Não há autonomias jurídico-políticas absolutas. Porque os fenômenos sociais que produzem esses direitos se comunicam. São, portanto, material e horizontalmente interdependentes, vez que tratam de temáticas típicas de proteção aos direitos humanos. E, como tais, são fenômenos que têm um fundo comum, como densificações normativas de mandamentos constitucionais e internacionais que os estruturam.

Esse conjunto interdependente de normas que protegem as pessoas LGBTQIA+ em face da discriminação é, ainda, amplamente exigível. A dimensão da exigibilidade, que abre diálogo com a reflexão contemporânea do caráter de direitos fundamentais dos direitos LGBTQIA+ (HOLZHACKER, 2014) e com sua exigibilidade geral e justiciabilidade (ABRAMOVICH, COURTIS, 2003; LINS, 2009). E essa exigibilidade vai se expressar de pelo menos duas grandes formas. Uma juridicamente mais direta, simples, que fala da própria obrigatoriedade dessas leis dentro de seu escopo territorial imediato, aplicável aos sujeitos por ela tocados dentro dos processos clássicos de distribuição de competências normativas. Se uma cidade tem proteção expressa contra a discriminação LGBTQIA+, alguém que pratica um ato desse tipo, nesse espaço territorial, está imediatamente submetido às sanções dessa norma.

Mas queremos propor um segundo modo de expressão dessa exigibilidade, que fala de uma compreensão desses conjuntos normativos em seu todo. Algo que incorpore esse grande número de normas estaduais e municipais aos sentidos mais amplos e estruturais dos mandamentos de proteção às pessoas LGBTQIA+ em face da discriminação. Em conexão direta e imediata com a força normativa dos mandamentos constitucionais da vedação à discriminação. Considerando que o Supremo Tribunal Federal, por sucessivas vezes, nos julgados afetos às temáticas das dissidências de gênero e sexualidade, reiterou a integração definitiva das pessoas LGBTQIA+ na cobertura constitucional antidiscriminatória (BRASIL, 2022), nos parece bastante adequado propor e elaborar a ideia de uma exigibilidade em bloco.

Nada, aliás, que fuja às tendências contemporâneas de integração de normas nos seus contextos mais amplos e nos sentidos principiológicos das normas de hierarquia superior. A teorização sobre o bloco de constitucionalidade (NORMANTON, 2021), o controle de convencionalidade (D’ÁVILA, CHEBAB, 2016) e a força normativa de instrumentos formalmente não cogentes no direito internacional dos direitos humanos, tanto de maneira geral (CHARLESWORTH, CHINKIN, 1993) quanto na temática da não discriminação (ZULOAGA, 2006; BROWN, 2010; MORAES, BRAGA, 2018) compõe o pano de fundo dessa proposição.

E, ainda que existam controvérsias e incertezas muito vivas quanto aos sentidos, alcances e limites dessas figuras jurídicas todas, nos parece muito razoável reclamar para o direito antidiscriminatório que proteja pessoas LGBTQIA+ no Brasil uma obrigatoriedade e exigibilidade ampla. Isso porque: (i) a ordem jurídica brasileira deve ser percebida no contexto do quadro global de proteção aos direitos humanos, que conta com um grande número de princípios na direção de proteção à pessoa em face da discriminação; (ii) o texto constitucional brasileiro é igualmente expresso ao vedar a discriminação (art. 3º, IV da Constituição de 1988); (iii) o Supremo Tribunal Federal densificou interpretativamente, de maneira absolutamente incontroversa e em muitas dimensões da vida, a inclusão das pessoas LGBTQIA+ no alcance das proteções constitucionais, seja em suas identidades, famílias, práticas ou proteção contra a violência; (iv) há um número muito expressivo de leis infraconstitucionais, especialmente nos estados e municípios, que dão corpo a um direito antidiscriminatório em várias temáticas, com dimensão legislativa também destacada; (v) essas normas são formalmente válidas na grande maioria do território nacional, com observância obrigatória para a quase totalidade de nossa população; (vi) essas normas têm, na reflexão jurídica dos direitos humanos, progressivamente sido percebida como direitos típicos de minorias, nas linhas de proteção fundamental à pessoa humana.

Além dos efeitos imediatos dessa exigibilidade do conjunto normativo de proteção às pessoas LGBTQIA+ em face da discriminação, coloca-se uma dimensão projetada no tempo que ganha, no cenário atual, uma importância ainda mais evidente. O direito da antidiscriminação não admite retrocessos. Firma-se, aqui, um certo efeito expansivo desse corpo de normas, inibitório de inciativas políticas e legislativas que pretendam romper com a lógica subjacente da antidiscriminação. Aqui, o horizonte é o da progressividade social e vedação ao retrocesso em matéria de direitos humanos, afirmados como princípios de força normativa, em seus sentidos mais gerais (QUEIROZ, 2006; MURADAS, 2010; PIMENTEL, 2017). Não que essas iniciativas discriminatórias deixarão de aparecer na arena política. No momento atual, aliás, o cenário é de proliferação de projetos de lei anti-LGBTQIA+, abertamente discriminatórios (AVELAR, 2023). Mas qualquer resultado com pretensões legislativas que eventualmente advenha desses movimentos deverá ser avaliado diante desse quadro estabelecido. E, a menos que se rompa com os fundamentos do Estado Democrático de Direito, deverão ser juridicamente rechaçados por representarem discriminação que se traduz em retrocesso inadmissível.

4. Conclusão: sobre como a dimensão legislada do direito antidiscriminatório para pessoas LGBTQIA+ no Brasil existe e esse não é o fim da história

A principal conclusão da investigação proposta nesse artigo, é certo, não poderia ser outra: o direito antidiscriminatório que protege pessoas LGBTQIA+ no Brasil existe e tem também uma sólida dimensão legislada. Mais de 83% (oitenta e três porcento) da população brasileira vive em estados e municípios nos quais há leis que protegem dimensões fundamentais da vida e das relações de pessoas LGBTQIA+ contra a expressão da discriminação LGBTfóbica. Leis que, por sua própria existência, são o testemunho da disputa sociopolítica ao redor das dissidências de gênero e sexualidade. Mas que fazem plasmar uma compreensão jurídica definitiva no sentido da proteção de minorias em face de forças conservadoras e discriminantes de ampla difusão. São leis em relação às quais, nesse quadro de tensões, talvez precisemos afirmar o óbvio: que têm força normativa, identificando a diversidade sexual e de gênero como bem jurídico a ser protegido, sob pena de sanções próprias, nas muitas esferas do direito que estão referenciadas aos muitos espaços concretos da vida e às situações em que as práticas discriminatórias podem se expressar. Nos espaços públicos, estabelecimentos privados, nas relações de convivência, na família, no trabalho, na escola, na prestação de serviços públicos, na expressão pública dos afetos, enfim, em muitos círculos há previsão legal específica a proteger pessoas LGBTQIA+ em face de tudo o que experimentam de violência e preconceito.

Outra conclusão central, aqui, é que esse conjunto normativo legislado do direito antidiscriminatório para pessoas LGBTQIA+ tem alta capilaridade nos estados e municípios, num conjunto muito grande de leis, que deve ser compreendido de modo interdependente, com operatividade jurídica própria, exigibilidade imediata e efeito inibidor de potenciais retrocessos na temática. Ou seja, numa certa visão holística dessa proteção, em leituras que percebam esse grande bloco legislativo nas suas conexões jurídicas, espaciais e temporais. Há um corpo legislado a ser reconhecido. E, sob o pano de fundo das diretivas internacionais de vedação à discriminação, do enquadramento constitucional nesta mesma direção, da confirmação das cortes superiores brasileiras, especialmente o STF, da aplicabilidade plena desse conjunto à proteção das pessoas LGBTQIA+, coloca-se esse direito antidiscriminatório para proteção de pessoas LGBTQIA+ como uma força jurídica a ser plenamente assimilada e cultivada dentro de práticas de salvaguarda de direitos entendidos como fundamentais. É um bloco de normas que existe agora, é exigível hoje, pode ser mobilizado juridicamente de maneira conjunta, e só admite expansões protetivas, nunca retrocessos.

Esta conclusão está, contudo, inserida em um mundo em que a discriminação LGBTfóbica segue faticamente com grande força. A luta absolutamente necessária por garantias jurídicas mais explícitas e sistemáticas na proteção de pessoas LGBTQIA+ de modo algum se encerra pelo conhecimento e manejo dessa dimensão legislada já existente. A ampliação da regulação federal, em um cenário legislativo muito difícil, segue sendo fundamental. Mas não há, aqui, um “vazio” jurídico, uma omissão normativa geral. Há um ponto de partida já solidificado, que não deve ser perdido de vista. Talvez essa luta mesma pela melhoria das garantias legisladas desse campo do direito ganhe na constatação de que há um esteio normativo já bastante forte.

E esse, claro, não é um final de história. Essa conclusão a respeito da existência de um direito legislado da antidiscriminação para proteção do gênero e sexualidade deve ser tomada em um processo articulado que se ocupe de compreender como esses direitos são ou não vividos. Nesse mencionado cenário de forças sociais, políticas e jurídicas confessadamente discriminatórias em face de pessoas LGBTQIA+, a linguagem dos direitos, sabemos, encontra muitas dificuldades. Há um conhecido caráter paradoxal dos direitos dessa natureza (BROWN, 2021; GOMES, FABRIS, 2021), diante de seus limites como o que se pode desejar e o que efetivamente se vive, em articulação com outras esferas estruturantes dos direitos fundamentais. Muitos deles tendem a alcançar de modo limitado a vida de pessoas LGBTQIA+ mais marginalizadas, situadas em linhas cruzadas de opressão, como as pessoas trans (SPADE, 2015). Mas, para nós, talvez por isso mesmo seja importante conhecer os instrumentos jurídicos existentes para, de modo situado, mobilizá-los nesses processos sociais.

A disputa, portanto, não deixa nunca de ser matéria constitutiva desses direitos. Num mundo de práticas ainda abertamente LGBTfóbicas, esse conjunto legislado de normas antidiscriminatórias se torna mais um elemento para que se possa, também juridicamente, reclamar a liberdade, igualdade, a dignidade como elementos vivos, experimentados concretamente por quem é lésbica, gay, travesti, transexual, bissexual, intersexo. Em todas as instâncias, públicas ou privadas. Em ocorrências policiais. Em ações judiciais para indenização por danos. Em denúncias por práticas discriminatórias em todos os espaços. Na exigência do direito de se casar, de constituir família, de ter ou não filhas e filhos, de usar o nome que queira, de ter sua identidade de gênero respeitada. De ter acesso ao trabalho, renda, saúde. De não sofrer, em resumo, discriminação por ser uma pessoa LGBTQIA+. Discriminação que, mais uma vez, não acaba na afirmação desse direito antidiscriminatório legislado. Mas certamente é afetada por ele. Porque as pessoas LGBTQIA+, em maior ou menor grau, passam a contar com um amparo normativo sólido e exigível para encarar as trincheiras cotidianas em face de quem a todo tempo quer manter a discriminação como fundamento da vida.

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  • ZULOAGA, Patricia Palacios. La no discriminación: estudio de la jurisprudencia del Comité de Derechos Humanos sobre la cláusula autónoma de no discriminación. Santiago: LOM Ediciones, 2006.
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    O artigo vai manejar um número enorme de projetos de lei, leis federais, estaduais e municipais. Faremos, quanto a esses documentos, um referenciamento completo e direito, da maneira o mais simplificada possível. Esse referenciamento, propositalmente, toma como pressuposto que estes documentos são matéria básica de trabalho da reflexão de juristas. Não faremos, portanto, remissões completas dentro das diretivas gerais de normalização propostas pela ABNT, por exemplo. A inclusão de remissões completas em notas de rodapé, no sistema autor-data ou mesmo nas referências bibliográficas nos parece desnecessária, diante do registro oficial na numeração desses projetos e dessas normas, todas acessíveis pelas plataformas virtuais dos legislativos e executivos em questão. A inclusão das referências detalhadas, dado justamente o volume de instrumentos normativos manejados, nos aparece como algo que prejudicaria a fluidez da leitura e a compreensão científica do todo.
  • 2
    A única exceção foi o PLC 122/2006 que chegou a ser aprovado pelo plenário da Câmara do Deputados, mas não avançou no Senado.
  • 3
    Outros projetos de lei do Congresso Nacional importantes para a comunidade LGBT: PEC 110/2011 de autoria da Senadora Marta Suplicy e outros para alterar o art. 7º da Constituição para “vedar discriminação de trabalhador em virtude de orientação sexual ou identidade de gênero”. Arquivado em 2018. PL 2777/2019 de autoria da deputada Talíria Petrone que propõe a “a necessidade de coleta, processamento de dados e formação de estatísticas sobre a população LGBT nos serviços de saúde, assistência social e segurança pública”. Em tramitação. PL 3741 proposto pelos deputados David Miranda, Fernanda Melchionna e Sâmia Bomfim para a criação do “Programa Escola sem Discriminação de educação para o combate à violência contra LGBTs voltado a professores de instituições públicas”. Em tramitação. PL 3774 da deputada Maria do Rosário para o estabelecimento de “regras e critérios para o registro de infrações penais para o registro de infrações penais e administrativas que possam ter sido motivadas por preconceito ou discriminação pelos órgãos de segurança pública e de saúde no território nacional”. Em tramitação. PL 96/2021 do deputado Alexandre Frota que propõe o estabelecimento de “notificação compulsória, no território nacional, no caso de violência contra transexuais, travestis, lésbicas, bissexuais e gays que forem atendidos em serviços de saúde públicos ou privados”. Ainda: criação do dia nacional da visibilidade lésbica (PL 4399/2020); isenção de taxas cartoriais para retificação do nome e gênero de pessoas transgênero, travesti, intersexual ou não-binária (PL 3667/2020).
  • 4
    Art. 2º Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social (Lei n. 11.340/2006, Lei Maria da Penha).
  • 5
    O texto exato era o seguinte: “Art. 223-C. A etnia, a idade, a nacionalidade, a honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, o gênero, a orientação sexual, a saúde, o lazer e a integridade física são os bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa natural” (Redação dada pela Medida Provisória nº 808, de 2017).
  • 6
    No estado de Goiás, a Lei n. 18.692 de 2014 proíbe expressamente a discriminação por orientação sexual, mas não prevê penalidade para sua prática.
  • 7
    As sanções previstas para servidor público ficam condicionada às regras do processo administrativo disciplinar conforme os estatutos dos servidores de cada estado ou município.
  • 8
    Amapá, Bahia, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro e Tocantins.
  • 9
    Acre, Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Pará, Paraná, Pernambuco, Rondônia e Tocantins.
  • 10
    Acre, Amapá, Bahia, Paraná, Pernambuco, Rondônia e Tocantins.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Out 2023
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2023

Histórico

  • Recebido
    19 Maio 2023
  • Aceito
    30 Jun 2023
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