Acessibilidade / Reportar erro

Direitos humanos e o sistema de justiça nos conflitos de terra na Amazônia ocidental

Human rights and the justice system in land conflicts in western Amazonia

Resumo

Os conflitos decorrentes de disputas judicializadas pela terra na Amazônia ocidental aumentaram consideravelmente nos últimos anos – sobretudo em estados como Rondônia, onde ocorre o maior número de mortes no campo no Brasil. Com a finalidade de compreender o cenário histórico-normativo do problema, analisaremos a atuação das instituições do sistema de justiça para avaliar sua participação na intensificação desses conflitos. Nossas conclusões demonstram que as violações de direitos humanos na luta pela terra na Amazônia tendem a aumentar, à medida que a complexidade da situação continuar sendo ignorada pelo Estado, em prejuízo de trabalhadores e pequenos agricultores vivendo permanentemente sob constante ameaça.

Palavras-chave:
Amazônia; Direitos Humanos; Conflitos de terra; Rondônia

Abstract

Land conflicts in western Amazonia have increased considerably in recent years - especially in states such as Rondônia, where the country's highest number of deaths occur in Brazil. To understand the historical-normative scenario of the problem, we will analyze the performance of the institutions of the justice system to evaluate their participation in the intensification of these conflicts. Our findings demonstrate that human rights violations in the struggle for land in the Amazon tend to increase as the complexity of the situation continues to be ignored by the State, to the detriment of workers and small farmers living permanently under constant threat.

Keywords:
Amazonia; Human rights; Land conflicts; Rondônia

Introdução: terra de muitos “ninguéns”

Fronteiras de desenvolvimento são muito atraentes quando ricas em recursos naturais e oferecem poucos riscos ( ALSTON; HARRIS; MUELLER, 2012 ALSTON, Lee; HARRIS, Edwyna; MUELLER, Bernardo. The Development of Property Rights on Frontiers: Endowments, Norms, and Politics. The Journal of Economic History, Vol. 72, No. 3 (September 2012). doi: 10.1017/S0022050712000356. 2012.
https://doi.org/10.1017/S002205071200035...
). Parte essencial da estadística, a avaliação geográfica e demográfica do território implica se apropriar da riqueza necessária para impor o poder perante pares internacionais e, evidentemente, sedimentar o controle interno.

Seguindo esse raciocínio, a Amazônia brasileira possui um papel particular no imaginário brasileiro. Desde as primeiras expedições portuguesas adentro do território do Guaporé e do Madeira, para a proteção das minas do Mato Grosso, ainda na primeira metade do século XVIII, até os grandes ciclos econômicos da borracha, que duraram até o fim da segunda guerra mundial, a Amazônia sempre foi tratada pelo poder soberano como fonte inesgotável de recursos à espera do melhor aproveitamento, em nome do interesse “nacional” ( TEIXEIRA, FONSECA, 1998 TEIXEIRA, Marco Antônio Domingues; FONSECA, Dante Ribeiro. História regional de Rondônia. Porto Velho: Rondoniana, 1998. ). As grandes usinas hidrelétricas do Rio Madeira, construídas à fórceps sob forte propaganda política do Programa de Aceleração do Crescimento, entre 2007 e 2014, foram apenas mais dois passos desse grande movimento de colonização exploratória que vem ocorrendo há três séculos.

Ocorre que nenhuma parte do território amazônico era desabitada antes ou durante os intervalos desses ciclos. Milhares de comunidades e centenas de povos indígenas, povos tradicionais e quilombolas sempre viveram de forma sustentável nos imensos territórios amazônicos. De extermínio em extermínio, tais ciclos desenvolvimentistas interferiram gravemente nos arranjos sociais, deslocando populações, alterando a socialização, destruindo culturas e gerando conflitualidade ( FERNANDES, 2005 FERNANDES, Bernardo Manciano. Questão Agrária: conflitualidade e desenvolvimento territorial. Texto apresentado em seminário no Lincoln Istitute of Land Policy e na Harvard University, em 2005. Disponível em: <http://www.geografia.fflch.usp.br/graduacao/apoio/Apoio/Apoio_Valeria/Pdf/Bernardo_QA.pdf>. Acesso em 01 de fevereiro de 2018.
http://www.geografia.fflch.usp.br/gradu...
). E diferentemente de outras fronteiras, a Amazônia ocidental, especialmente a região ao sul do Amazonas e ao Norte do Mato Grosso, foi colonizada em ondas financiadas e gerenciadas pelo governo central do país – desde a chamada de trabalhadores para a construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré, aos nordestinos trazidos para os seringais, os colonos sulistas e capixabas que reivindicavam a reforma agrária em suas origens e daí em diante 1 1 Não se pode desconsiderar a longevidade e complexidade da Amazônia, tampouco, o fato de que ela também foi disputada na época colonial por outros países e também em razão da Lei de Sesmarias (Lei 601 de 18 de setembro de 1850), a qual fez surgir a conflitualidade agrária, já que só poderia ter terra no Brasil quem tivesse dinheiro para adquiri-la e as posses existentes foram totalmente ignoradas. Mais especificamente sobre a gênese dos conflitos em Rondônia, imprescindível a leitura de Hervé Théry (2012) , que em sua obra Rondônia: mutações de um território federal na Amazônia brasileira identifica duas fases anteriores à década de 1970, ocorridas no séc. XVII e XVIII, por ele chamadas de antigas, que não são objeto de estudo deste trabalho. .

Essa história de intervenções coloniais gerou um enorme passivo histórico-cultural que é motivo de grandes conflitos atualmente. Nosso interesse neste trabalho é abordar outra faceta dessa história: a cada ciclo, uma nova estrutura normativa foi colocada em movimento, criando e destruindo direitos, redefinindo competências e instituições, alterando a natureza jurídica de bens públicos, transferindo a titularidade desses bens e dando origem a uma sobreposição de direitos quase incompreensível 2 2 Alston, Harris e Mueller distinguem, nos processos de colonização, as intervenções governamentais em fases onde o direito de fato (de facto rights) é superado por um direito legítimo (de jure rights), consolidando o processo. No caso de largas porções amazônicas essas fases sucederam direitos de jure sobre direitos de jure ( ALSTON; HARRIS; MUELLER, 2012 . p. 23). . O objetivo é analisar a forma como esse emaranhado normativo impacta os conflitos agrários na Amazônia ocidental, especialmente no caso de Rondônia, estado com o maior número de mortes no campo do país, e um dos lugares onde mais se mata no campo no mundo ( CPT, 2016 CPT. Conflitos no Campo – Brasil 2016 [Coordenação: Antônio Canuto, Cássia Regina da Silva Luz, Thiago Valentim Pinto Andrade - Goiânia]: CPT Nacional – Brasil, 2016. ; BBC, 2016 BBC, 2016. Reportagem: Pelo 5º ano, Brasil é líder em mortes em conflitos de terra; Rondônia é Estado mais violento no campo . Disponível em: <http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36580912>. Acesso em: 27 jan. de 2018.
http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36...
). Nosso argumento principal defende que falhas graves no sistema de justiça aprofundam e chegam mesmo a dar causa a muitos desses conflitos, embora, na origem, não se deva retirar o peso devido às causas político-econômicas do problema.

Para compreender melhor a natureza jurídica desses conflitos vamos analisar a seguir a ocupação territorial da Amazônia sob uma perspectiva legal e histórica (2). Na sequência, iremos descrever o cenário dos conflitos agrários em Rondônia (3) para, então, analisar a precariedade com que o sistema de justiça vem atuando nesses casos (4) – usaremos um exemplo recente em Rondônia cujos erros causaram impactos nos episódios de violência na chacina de Colniza, Mato Grosso, em 2017. Faremos um resumo do conjunto de ações e omissões do Estado que configuram o quadro de violações sistêmicas de direitos humanos de trabalhadores, camponeses, comunidades tradicionais, povos indígenas, quilombolas e afetam, evidentemente, a vida de todos os demais cidadãos do estado, em razão do acirramento da violência e da instabilidade jurídica (5). Nossas conclusões apontam a urgência na tomada de decisões e medidas graves para a diminuição do potencial desses conflitos, sob risco de enfrentarmos perdas ainda maiores (6). A primeira dessas medidas exige respeito incondicional ao direito das pessoas comuns que dependem da terra para viver de forma sustentável no ambiente de floresta tropical que ainda resta no estado. Sem que esse primeiro passo seja, finalmente, dado, nenhuma outra solução pode pacificar o campo e salvar o patrimônio histórico, cultural e biológico que pertence a todas as nações brasileiras.

Ocupação territorial da Amazônia e sobreposição normativa

A preocupação com o desenvolvimento econômico da Amazônia após o fim da Segunda Guerra Mundial manteve o padrão dos ciclos econômicos anteriores: vastos territórios que deveriam ser desbravados, à disposição das forças políticas dos centros decisórios do país, desconsiderando as populações nativas e as preocupações com as particularidades de suas reservas naturais e tradições culturais ( BECKER, 1982 BECKER, B. Geopolítica da Amazônia: a nova fronteira de recursos . Rio de Janeiro: Zahar, 1982. ; BECKER, 1998 BECKER, B. K. Amazônia. São Paulo: Editora Ática, 1998. ).

O primeiro estágio desse processo se deu com algumas concessões aos poderes políticos locais, por meio de uma estratégia que destinava percentual fixo dos recursos tributários da União para os estados então existentes. Esses recursos deveriam ser aplicados em estudos técnicos e decisões políticas cujo planejamento deveria levar em conta em problemas ambientais e definições sobre a ocupação territorial da região. O artigo 199 da Constituição Federal de 1946 determinava que, anualmente, seria reservada uma quantia não inferior a 3% da receita tributária da União para que durante ao menos 20 anos consecutivos fosse empreendido um programa de investimentos na Amazônia, por meio de um conjunto de iniciativas chamadas então de “Plano de Valorização Econômica da Amazônia” ( SANTOS, 2014 SANTOS, Alex Mota. Cartografias dos povos e das terras indígenas em Rondônia. Tese de doutorado. Universidade Federal do Paraná, 2014. ). Em 1947, foi criada a Comissão Parlamentar de Valorização da Amazônia, com a função de executar o dispositivo constitucional e de propor a forma da distribuição dos recursos para a região. Tal Comissão foi responsável pela elaboração do texto da lei federal 1.806, de 6 de janeiro de 1953, que em seu artigo 2º definia a região amazônica a partir dos limites geográficos dos estados do Pará e do Amazonas, pelos territórios federais do Acre, Amapá, Guaporé e Rio Branco e ainda, a parte do Estado de Mato Grosso a norte do paralelo de 16º, a do Estado de Goiás a norte do paralelo de 13º e a do Maranhão a oeste do meridiano de 44º.

Em 1966, já sob o governo ditatorial militar, o artigo 199 foi alterado, suprimindo o limite de tempo para a execução do respectivo plano (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 21, de 1966). Em 1º de fevereiro de 1966, em Macapá, o primeiro presidente durante a ditadura militar, Marechal Castelo Branco, anunciou o início da chamada “Operação da Amazônia”, a qual teria como propósito transformar a economia da Amazônia, fortalecer suas áreas de fronteiras e promover a integração do espaço amazônico no todo nacional 3 3 Conferir: Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia em http://www.sudam.gov.br/index.php/institucional?id=87 ; .

Entre 1966 e o fim dos anos 1970, o desenvolvimento da Amazônia não conseguiu cumprir a expectativa lançada com o artigo 7º da lei 1.806 de 1953, especialmente no que dizia respeito à distribuição geográfica de terras produtivas. O zoneamento ecológico da Amazônia já estava previsto na lei de 1953, mas somente com o Estatuto da Terra, de 1964, essa categoria jurídica ganhou definição mais nítida 4 4 Seção III do Estatuto da Terra, Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964. . A finalidade era a de elaborar estudos para planejamento da ocupação de áreas rurais para fins de colonização e reforma agrária sob a responsabilidade do então Instituto Brasileiro de Reforma Agrária.

O principal desdobramento desse interesse federal na ocupação das terras em Rondônia começaria a ganhar forma com o Plano de Integração Nacional (PIN), Decreto-lei n. 1.106 de junho de 1970, o qual objetivava financiar a infraestrutura nas regiões de atuação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) e da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM). Por meio desse mecanismo, e para viabilizar a exploração e colonização das áreas próximas das rodovias federais, o governo federal criou, pelo Decreto-lei n.1.110 de 9 de julho de 1970, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).

Assim, colocando em andamento a estratégia de integração anunciada por Castelo Branco, e para expandir a fronteira agrícola, sobretudo do café e do cacau, saturadas em estados como o Paraná e no Espírito Santo, o INCRA criou, entre 1970 e 1976, cinco Projetos Integrados de Colonização (PIC) e 2 Projeto de Assentamento Dirigido (PAD) em Rondônia (SANTOS, 2001, p. 131) – as sedes desses projetos se transformaram naquelas que hoje são as maiores cidades do interior do estado, ao longo da BR-364 ( PRIETO, 2017 PRIETO, Gustavo Francisco Teixeira. A aliança entre terra e capital na ditadura militar. Mercator, Fortaleza, v. 16, e16003, Fortaleza: 2017. , p. 11). Os Projetos Integrados de Colonização (PIC’s), os Projetos de Assentamento Dirigidos (PAD’s), os Projetos Fundiários (PF’s) e os Projetos de Assentamento Rápido (PAR’s) elaborados e implantados pelo INCRA cobriram quase que integralmente os 24.294.400.0000ha pertencentes a extensão geográfica de Rondônia ( MOSER, CUNHA, 2010 MOSER, Lilian Maria; CUNHA, Eliaquim Timotéo da. Os projetos de colonização em Rondônia. Revista Labirinto – Ano X, nº 14 – dezembro de 2010. , p. 144). Os lotes entregues pelo INCRA não podiam ser vendidos e, na grande maioria dos casos, os contratos possuíam cláusulas resolutivas que jamais foram cumpridas, de forma a legalizar a propriedade, em definitivo. Além disso, o INCRA desrespeitou territórios indígenas e de comunidades tradicionais, afetando drasticamente os modos de vida de pequenos camponeses e garimpeiros artesanais, sobrepondo as propriedades e comunidades de imigrantes nordestinos antigos, e de várias outras partes do país, que haviam se deslocado para a Amazônia durante os dois ciclos da borracha, gerando conflitos que levaram à extinção de comunidades e populações inteiras ( LE TOURNEAU, BURSZTYN, 2010 LE TOURNEAU, François-Michel; BURSZTYN, Marcel. Assentamentos rurais na Amazônia: contradições entre a política agrária e a política ambiental. Revista Ambiente & Sociedade, Campinas v. XIII, n. 1, p. 111-130, jan.-jun., 2010. , p. 114).

Apesar do esforço institucional divulgando como inovador esse modelo de colonização graves problemas impediram o êxito da iniciativa. A maior parte desses problemas tinha a ver com a dificuldade de infraestrutura para a correta utilização da terra, o abandono e a venda indevida dos lotes – o que gerou enorme concentração de terras nas mãos de empresas e especuladores do sul e sudeste do país ( MOSER, CUNHA, 2010 MOSER, Lilian Maria; CUNHA, Eliaquim Timotéo da. Os projetos de colonização em Rondônia. Revista Labirinto – Ano X, nº 14 – dezembro de 2010. , p. 146). No começo da década de 1980 os rumores de fracasso do processo de colonização da Amazônia começaram a se tornar destaque no cenário nacional, dando origem ao primeiro esforço planejado de desenvolvimento do ainda território federal de Rondônia, com a edição do Decreto nº 86.029 BRASIL. Senado Federal. Decreto n. 86.029, de 27 de Maio de 1981. Dispõe sobre a criação do Programa Integrado de Desenvolvimento do Noroeste do Brasil (POLONOROESTE). Disponível em: http://legis.senado.leg.br/legislacao/ListaTextoSigen.action?norma=508669&id=14246017&idBinario=15706262. Acessado em 26 de jan. de 2018.
http://legis.senado.leg.br/legislacao/L...
, de 27 de maio de 1981, que criou o Programa Integrado de Desenvolvimento do Noroeste do Brasil (POLONOROESTE), financiado pelo Banco Mundial, com a finalidade de ordenar a ocupação do solo e evitar o desmatamento (BRASIL, 1981; MARGULIS, 1991 MARGULIS, S. O desempenho do governo brasileiro, dos órgãos contratantes, e do Banco Mundial em relação à questão ambiental do programa Polonoroeste. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Brasília, 1991. ). Ainda em fins de 1981 foi criado o estado de Rondônia, sendo implantando em 4 de janeiro de 1982.

O POLONOROESTE compreendia a área de influência da ligação rodoviária Cuiabá - Porto Velho. Com a pavimentação da BR-364 e o aumento do fluxo migratório o efeito mais imediato foi a destruição predatória de vastas áreas de floresta ( LE TOURNEAU, BURSZTYN, 2010 LE TOURNEAU, François-Michel; BURSZTYN, Marcel. Assentamentos rurais na Amazônia: contradições entre a política agrária e a política ambiental. Revista Ambiente & Sociedade, Campinas v. XIII, n. 1, p. 111-130, jan.-jun., 2010. , p. 119). Os problemas ambientais causados pelo plano foram muitos, intensificando o desmatamento. Para lidar com mais esse problema, o governo federal editou o Decreto Nº 96.944, de 12 de outubro de 1988, criando o Programa de Defesa do Complexo de Ecossistemas da Amazônia Legal, também conhecido por “Programa Nossa Natureza”. A finalidade do Programa era (Art. 1º) a de estabelecer condições para a utilização e a preservação do meio ambiente e dos recursos naturais renováveis na Amazônia Legal, mediante a concentração de esforços de todos os órgãos governamentais e a cooperação dos demais segmentos da sociedade com atuação na preservação do meio ambiente ( BRASIL, 1988 BRASIL. Decreto Nº 96.944, de 12 de outubro de 1988 – cria o Programa de Defesa do Complexo de Ecossistemas da Amazônia Legal – “Programa Nossa Natureza”. Brasília, 1988. ).

O Programa “Nossa Natureza” chamou atenção para o problema da ordenação do uso do território na Amazônia. Com a finalidade de conter os problemas gerados durante as duas primeiras fases da colonização em Rondônia, o governo federal instituiu, no começo dos anos 1990, em parceria com o governo estadual, o Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia – PLANAFLORO ( NASCIMENTO, 2010 NASCIMENTO, Cláudia Pinheiro. O processo de ocupação e urbanização de Rondônia: uma análise das transformações sociais e espaciais. Revista de Geografia. Recife: UFPE – DCG/NAPA, v. 27, n. 2, mai/ago, 2010. , p. 66). Dentre os principais objetivos do PLANAFLORO estavam a reformulação das agências locais; conservar a biodiversidade rondoniense; proteção aos limites das áreas de reserva indígena; desenvolvimento, de modo integrado, da colonização agrícola sustentada e dos sistemas de manejo florestal; prioridade de investimentos em infraestrutura e serviços para melhorar os programas em áreas já ocupadas; adequação da rede institucional local ( NASCIMENTO, 2010 NASCIMENTO, Cláudia Pinheiro. O processo de ocupação e urbanização de Rondônia: uma análise das transformações sociais e espaciais. Revista de Geografia. Recife: UFPE – DCG/NAPA, v. 27, n. 2, mai/ago, 2010. , p. 67).

Todas essas ações, e ainda aquelas que incluiriam novos planos nacionais de ordenamento territorial, de proteção ambiental e de conservação da biodiversidade jamais foram corretamente harmonizadas com o interesse das comunidades locais, tradicionais, indígenas, camponeses e imigrantes. Entre 1964 e 1994 42.701 famílias foram assentadas em Rondônia. Para se ter uma ideia da importância desse movimento, no mesmo período o Pará – estado muito maior em dimensões territoriais – recebeu 43.851 famílias ( PACHECO, 2009 PACHECO, Pablo. Agrarian Reform in the Brazilian Amazon: Its Implications for Land Distribution and Deforestation. World Development Vol. 37, No. 8, pp. 1337–1347, 2009. , p. 1339). O resultado das medidas adotadas pela União sem o interesse de compreender melhor o cenário foi a intensificação dos problemas de sobreposição territorial que impactam, severamente, os conflitos fundiários na Amazônia.

“Sobreposição” é um conceito habitualmente utilizado em discussões e análises sobre conflito territorial (VAZ FILHO, 2003 VAZ FILHO, Florêncio Almeida. Os conflitos ligados à sobreposição entre terras indígenas e a resex Tapajós-Arapiuns no Pará. Revista Ruris. Vol. 7, pp 143-183, número 2, setembro, 2003. ; REZENDE, POSTIGO, 2003 REZENDE, Roberto Sanches; POSTIGO, Augusto. Reconhecimentos territoriais e desconhecimentos institucionais. Revista Ruris. Vol. 7, pp. 119-142., número 2, setembro, 2003. ). Nesses casos, quando há alterações substanciais na dinâmica de distribuição territorial entre grupos em disputa, formas de vida e identidades culturais muito diferentes entre si são forçadas a alterações profundas em sua existência como decorrência de políticas de reconhecimento que visam a garantia de direitos subjetivos econômicos, sociais ou culturais ou mesmo à preservação ambiental. Evidentemente, nem sempre a realidade jurídico-formal se adequa à realidade cultural, antropológica e cultural e as disputas envolvendo grupos e povos que demandam direitos territoriais resultam em danos graves aos seus perdedores ( GRABNER, 2013 GRABNER, Maria Luiza. Marcos Jurídicos das Unidades de Conservação e dos Territórios Étnicos. Workshop “Territórios Tradicionais e Unidades de Conservação: diálogos e perspectivas em debate” – VI Seminário Brasileiro sobre Áreas Protegidas e Inclusão Social. Belo Horizonte (UFMG), 17 de setembro de 2013. ). Dentre as categorias jurídicas protegidas pelo direito brasileiro envolvendo temas muito sensíveis à região amazônica encontramos os Espaços Territoriais Especialmente Protegidos (ETEP) 5 5 CF/88, art. 225. ; Áreas Protegidas (AP) 6 6 Convenção da Diversidade Biológica e o Plano Nacional de Áreas Protegidas-Decreto 5758/06. ; as unidades de Conservação 7 7 CF/88, art. 225, § 1º, inciso III; Lei 9.985/00. ; as Terras Indígenas (TI’s) 8 8 CF/88, art. 231 e 232; art. 13 e ss. da Convenção 169/OIT. ; as Terras Quilombolas 9 9 CF/88, art. 68 do ADCT/88 e art. 215 e 216; art. 13 e ss. da Convenção 169/OIT. e os Outros Territórios Tradicionais 10 10 Pescadores, Extrativistas, Ribeirinhos, Caiçaras, etc. CF., art. 215 e 216 da CF; art. 13 e ss. da Convenção 169/OIT. (IMAFLORA, 2017 IMAFLORA. Nota técnica sobre a malha fundiária do Brasil . http://www.imaflora.org/atlasagropecuario/ Acessado em 26 de maio de 2017.
http://www.imaflora.org/atlasagropecuar...
).

Há conflitos envolvendo a sobreposição territorial entre essas categorias em todo o país. Mas a maior parte das TI’s, por exemplo, concentra-se na Amazônia Legal: são 419 áreas, 115.342.101 hectares, representando 23% do território amazônico e 98.33% da extensão de todas as TI’s do país. Há aproximadamente 900.000 indígenas no Brasil. A maior parte dessa população distribui-se por milhares de aldeias, situadas no interior de 687 Terras Indígenas, representando cerca de 305 diferentes etnias e 274 diferentes. Além disso, há na Amazônia brasileira 77 referências de grupos indígenas isolados, sem contato permanente com a sociedade nacional. Em termos globais, mais de 45% do território amazônico é constituído por áreas de proteção ambiental, somando-se unidades de conservação, terras indígenas e quilombos (IMAFLORA, 2017 IMAFLORA. Nota técnica sobre a malha fundiária do Brasil . http://www.imaflora.org/atlasagropecuario/ Acessado em 26 de maio de 2017.
http://www.imaflora.org/atlasagropecuar...
; INCRA, 2017 INCRA. Painel de conflitos fundiários em Rondônia – SR/17 (documento). Gabinete da Superintendência do INCRA/RO, Porto Velho, 2017. ).

Conciliar essas categorias jurídicas numa realidade condizente não é fácil. Em Rondônia, conforme levantamento efetuado por Alex Mota dos Santos, dos 52 municípios 26 possuem parte de suas áreas ocupadas por terras indígenas, que juntas ocupam 49.967,01 km2, o que corresponde a 21,03% da área do estado. Além disso, existem no estado Unidades de Conservação de Proteção Integral e Uso Sustentável, federais e estaduais, que juntas ocupam aproximadamente 48.528,23 km2, o que corresponde a 20,43% do total do território ( SANTOS, 2014 SANTOS, Alex Mota. Cartografias dos povos e das terras indígenas em Rondônia. Tese de doutorado. Universidade Federal do Paraná, 2014. ).

No histórico normativo da ocupação de terras no estado de Rondônia é necessário considerar, portanto: as autorizações governamentais para a exploração dos seringais durante os ciclos da borracha, até o fim da segunda guerra mundial – autorizações que se transformaram em registros indevidos de terras públicas, griladas e revendidas, continuamente; a arrecadação de parte dessas terras de volta para a União nas constituições de 1946 e 1967; as autorizações para exploração de minérios e outros recursos, expedidos para grandes empresas privadas, algumas delas em atuação no estado até hoje, concedidas entre os anos 1960 e 1980 11 11 Segundo a historiadora Deise M. Meireles, até 1980 Rondônia experimentou sete ciclos econômicos: 1º - apresamento indígena; 2º - busca do ouro; 3º - as drogas do sertão; 4º - disputa de fronteiras estratégicas; 5º - a exploração da borracha; 6º - a exploração de cassiterita e 7º - colonização agrícola. (1983, p. 17; 18; 29; 83; 86). Citado por Valdir de Souza. Conferir: Souza, Valdir Aparecido de. Rondônia, uma memória em disputa. Tese (Doutorado). UNESP: Assis, 2011. ; a arrecadação compulsória e a concessão provisória dos títulos pelo INCRA, a partir dos anos 1970, e a consequente criação de polos agrícolas oficiais; a transferência de terras da União para a criação do estado, em 1981, e para a criação dos municípios, até 1996; as terras indígenas, existentes desde sempre, mas legalmente demarcadas apenas nas últimas décadas; os quilombos; as áreas de proteção ambiental, cujas alterações mais recentes no Código Florestal provocaram alterações significativas não só nos limites territoriais, mas no uso da terra e na própria possibilidade de existência de centenas de comunidades.

Ignorando esse emaranhado histórico-normativo, e contribuindo para impor novas ameaças ao cenário já bastante conturbado, em 2017 o governo federal aprovou a Lei n. 13.465, de 11 de julho de 2017, que impôs profundas modificações no processo de regularização fundiária de terras púbicas no país. Algumas dessas alterações, questionadas por entidades de luta pelo direito à terra, pelo Ministério Público Federal e outras instituições abrem espaço para novo ciclo de reconcentração, favorecendo a possibilidade de abrir para o mercado milhões de hectares que deveriam ser destinados à maior redistribuição equitativa possível entre pequenos e médios agricultores que, de fato, poderiam viver da sua produção (MPF, 2017).

Diante de tantas variáveis, as disputas judicias pela terra no campo, em sua enorme maioria, com veremos a seguir, em estados como Rondônia, destacam apenas a posse muito precariamente comprovada, sob regras ordinárias do direito civil, desconfigurando, no processo, a realidade que permeia a sobreposição normativa, histórica e cultural que compõe o mosaico de disputas em que pequenos agricultores e povos tradicionais sempre saem perdendo ( INCRA, 2016 INCRA. Proposta de Plano Especial para Ações de Reforma Agrária, para minimizar os conflitos agrários em Rondônia. SR-17/RO, Gabinete: Porto Velho, 2016. , p.5; CPT, 2016 CPT. Conflitos no Campo – Brasil 2016 [Coordenação: Antônio Canuto, Cássia Regina da Silva Luz, Thiago Valentim Pinto Andrade - Goiânia]: CPT Nacional – Brasil, 2016. ; COLETTI, 2005 COLETTI, C. A Trajetória política do MST: da crise da ditadura ao período neoliberal. 2005. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Campinas, 2005. ).

O cenário dos conflitos no campo em Rondônia

Desde 1972, de acordo com a Comissão Pastoral da Terra – CPT e do Mapa de Conflitos Fundiários do Incra, a Amazônia concentra o maior número de assassinatos no campo. Em 2016, segundo relatório da ONG Global Witness, En terreno peligroso , Rondônia figurou como o local onde o maior número de pessoas é assassinada no campo, em todo o mundo ( BBC, 2016 BBC, 2016. Reportagem: Pelo 5º ano, Brasil é líder em mortes em conflitos de terra; Rondônia é Estado mais violento no campo . Disponível em: <http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36580912>. Acesso em: 27 jan. de 2018.
http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36...
; GLOBAL WITNESS, 2016 GLOHBAL WITNESS. Pelo 5º ano, Brasil é líder em mortes em conflitos de terra; Rondônia é Estado mais violento no campo. BBC, 2016. Reportagem disponível em:<http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36580912>. Acesso em 28 fev. 2017.
http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36...
).

O relatório da ONG, fundamentado em pesquisa de mais de 185 assassinatos em 16 países apontou o Brasil, e em especial a Amazônia e o estado de Rondônia, como um lugar onde os crimes sofridos por pessoas que lutam pela terra não é sequer investigado e onde o direito fundamental à terra e moradia digna não é respeitado (GLOBAL WITNESS, 2016 GLOHBAL WITNESS. Pelo 5º ano, Brasil é líder em mortes em conflitos de terra; Rondônia é Estado mais violento no campo. BBC, 2016. Reportagem disponível em:<http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36580912>. Acesso em 28 fev. 2017.
http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36...
, p. 3). O relatório também aponta que há um ciclo de violência a cada assassinato que resulta na ameaça grave e, em muitos casos, no assassinato também de familiares de camponeses.

O papel do Estado e de seus agentes na construção desse cenário de violência e de violações sistêmicas de direitos humanos é tão complexo, quanto inequívoco. Não raro, agentes e órgãos do Estado são responsáveis diretos pela violência; certamente, por omissão, o Estado é o grande responsável por tantos e profundos conflitos agrários. Utilizamos o conceito de “Estado” aqui da forma mais ampla possível, englobando todos os poderes estatais, bem como organismos sociais que tenham incumbência de tratar da temática agrária e de direitos humanos.

Em Rondônia, a causa predominante de praticamente todos os focos de violência é o conjunto de problemas de regularização fundiária e a não consolidação de projetos de assentamento em terras públicas destinadas à reforma agrária. A exploração econômica irregular relacionada ao uso indevido da terra pública em larga escala e outros crimes decorrentes – como os crimes ambientais – somente se tornam tão expressivos por causa das incertezas e fragilidades dos esforços do Estado (União, Estados e Municípios) em fazer cumprir a legislação em vigor ( SANTOS, SOUZA, 2017 SANTOS, Layza Queiroz; SOUZA, Alice De Marchi P. de. Vidas em luta: criminalização e violência contra defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil . Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos. Curitiba: Terra de Direitos, 2017. ; CNDH, 2016 CNDH [Conselho Nacional de Direitos Humanos.]. Relatório sobre defensores de direitos humanos ameaçados no estado de Rondônia. Brasília, 2017. Disponível em: http://www.sdh.gov.br/sobre/participacao-social/cndh/relatorios/relatorio-sobre-defensores-de-direitos-humanos-ameacados-no-estado-de-rondonia; Acessado em 01 de fevereiro de 2018 (2016).
http://www.sdh.gov.br/sobre/participaca...
). É muito importante a compreensão deste cenário, pois, diferentemente de outras regiões brasileiras, onde os conflitos agrários são resultado da disputa por reforma agrária propriamente dita, com ocupações promovidas por movimentos sociais em fazendas que não cumprem a função social da terra, mas de propriedade de seus fazendeiros, em Rondônia a disputa sempre envolve a União, legítima proprietária das áreas ( SILVA, 2016 SILVA, Ricardo Gilson da Costa. Agronegócio e campesinato em Rondônia. Geografia Agrária no Brasil: Disputas, conflitos e alternativas territoriais. Jundiaí: Paco Editorial, 2016. ).

De um total de 113 milhões de hectares de glebas federais na Amazônia, há 55 milhões de hectares em situação indefinida ( RIBEIRO, SILVA, SANTOS, 2016 RIBEIRO, Alyson F. Alves; SILVA, Ricardo Gilson da C.; SANTOS, Josefa de Lisboa. Política de regularização fundiária em Rondônia: limitações do programa terra legal e expectativas socioterritoriais . Revista Confins – Revista Franco-Brasileira de Geografia, n. 29, 2016. , p. 18) – território equivalente ao do estado de Minas Gerais. Eles podem ser destinados a particulares ou a uso público, como assentamentos de reforma agrária, áreas urbanas, terras indígenas ou quilombolas e unidades de conservação.

Em Rondônia o problema é um pouco diferente do restante da Amazônia: muitos dos títulos das áreas de origem federal foram corretamente emitidos pelo INCRA na origem dos processos de colonização, mas a posse e a propriedade dessas terras não poderiam ter sido transferidas, como ocorreram em muitos casos 12 12 Os instrumentos utilizados pelo Incra para a colonização de terras no estado foram: Contrato de Alienação de Terras Públicas (CATP); Contrato de Concessão de Domínio de Terras Públicas (CCDTP); Contrato de Promessa de Compra e Venda (CPCV); Títulos Definitivos (TD) nos Projetos de Colonização Oficial ou Assentamentos e os demais instrumentos nas áreas dos Projetos Fundiários, como regularização fundiária. Esses instrumentos possuem cláusulas resolutivas que impõem obrigações que vão desde a obrigação de pagamento até a implementação de projetos de produção. A falta de comprovação ou mesmo descumprimento de alguma dessas cláusulas é o principal gerador da instabilidade documental desses imóveis. . Para corrigir e aprimorar a regularização fundiária na Amazônia legal a União criou em 2009 o Programa Terra Legal Amazônia (PTLA). O Programa Terra Legal assumiu inclusive a competência para decidir sobre os imóveis rurais licitados pelo INCRA nas décadas de 1970 e 80, cujos licitantes terão obrigatoriamente que provar o cumprimento das cláusulas resolutivas impostas em seus contratos.

O Estado de Rondônia possui um total de 16.369.615 hectares de terras públicas divididas em 92 glebas, tendo assim 64% de terras destináveis e 36% de áreas não destinadas (5.923.892 ha.) ( RIBEIRO, SILVA, SANTOS, 2016 RIBEIRO, Alyson F. Alves; SILVA, Ricardo Gilson da C.; SANTOS, Josefa de Lisboa. Política de regularização fundiária em Rondônia: limitações do programa terra legal e expectativas socioterritoriais . Revista Confins – Revista Franco-Brasileira de Geografia, n. 29, 2016. , p. 19). Ocorre que desde o início do programa o relacionamento do PTLA com o INCRA e com o público interessado sempre foi bastante irregular, gerando mais dúvidas do que soluções. A rigor, o Terra Legal serviu para retirar competências históricas concentradas no INCRA, sob a afirmação de agilizar a reforma agrária. Mas as dificuldades jurídicas envolvidas no processo de regularização dessas terras continuam sem solução. Atualmente, o programa está concluindo a fase de cadastramento dos imóveis rurais (CAR - Cadastro Ambiental Rural) por meio de um sistema nacional (SISCAR), para que, após, sejam tomadas as decisões sobre a concessão dos títulos. Das áreas cadastráveis em Rondônia, 8.433.868 hectares, foram inseridas no sistema 11.901.722 de hectares, de um total de 23.757.600 hectares de área total do estado. Em toda a Amazônia o número de propriedades em disputa supera, em muito, as previsões do governo federal. No Amazonas, essa proporção chegou a 29.146.486 hectares de áreas cadastradas, de um total de 6.733.961 áreas cadastráveis. Ou seja, os números atualizados do sistema apontam o crescimento desenfreado das expectativas de apropriação particular de terras públicas, anunciando novos conflitos e poucas perspectivas de solução (MMA, 2018).

Em 2015, o estado de Rondônia se tornou o recordista de mortes em conflitos no campo, com 20 mortes, superando o estado do Pará, com dimensões territoriais muito maiores. Em 2016, esse número subiu para 21 mortes. O alto número de mortes e de episódios de violência chamou a atenção nacional e internacional para os conflitos fundiários no estado ( CPT, 2016 CPT. Conflitos no Campo – Brasil 2016 [Coordenação: Antônio Canuto, Cássia Regina da Silva Luz, Thiago Valentim Pinto Andrade - Goiânia]: CPT Nacional – Brasil, 2016. ). Com o aumento das mortes no campo, o estado também assumiu a liderança nas estatísticas de mortes de defensores e defensoras de direitos humanos ( SANTOS, SOUZA, 2017 SANTOS, Layza Queiroz; SOUZA, Alice De Marchi P. de. Vidas em luta: criminalização e violência contra defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil . Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos. Curitiba: Terra de Direitos, 2017. , p, 24)

O histórico contemporâneo de mortes violentas no campo em Rondônia se acentuou com o massacre de Corumbiara, em 1996. Nos últimos anos, a expansão da fronteira agrícola – sobretudo da soja – e da atração de investimentos para o Estado chamou a atenção da especulação imobiliária, despertando novo ciclo de concentração de renda e de disputa por ativos fixos, como a própria terra.

Em 2017 havia em Rondônia, segundo dados do INCRA, 106 focos de conflito no campo, envolvendo terras em disputa. 22 dessas áreas foram classificadas como sendo de “alto risco” ( INCRA, 2017 INCRA. Painel de conflitos fundiários em Rondônia – SR/17 (documento). Gabinete da Superintendência do INCRA/RO, Porto Velho, 2017. ). A classificação mede o potencial para confrontos violentos ou define áreas onde já houve mortes ou atos de violência grave. Mais de 80 dessas áreas estão com as disputas judicializadas, independentemente dos processos administrativos em andamento no Incra ou no Terra Legal, e várias delas estão em situação de conflito de competência entre a justiça estadual e a justiça federal.

A ineficiência do Estado contribui de forma ampla e diversificada para o fomento da violência no campo, tornando a identificação das causas dos conflitos sempre muito difícil em cada episódio – isso porque cada episódio de violência está cercado por fatores múltiplos de influência que resultam na piora geral dos indicadores de paz no campo em Rondônia. Inegável, contudo, que a soma desses fatores não pode reverter em responsabilização da sociedade pelos problemas graves que estão impedindo que soluções definitivas possam ser aplicadas a essa situação.

Em 2015, um grupo de trabalho – GT/TERRAS –, composto por órgãos do estado e da sociedade civil, criado pela Mesa de Conflitos Agrários, mecanismo estadual de monitoramento dos conflitos no campo, demonstrou a enorme dificuldade do estado de Rondônia de realizar todos os procedimentos de investigação para apurar as causas e a autoria de cada homicídio ocorrido no campo – além da omissão do governo federal, cuja atuação nunca supera intervenções episódicas ( GT/TERRAS, 2015 GT/TERRAS – Grupo de Trabalho sobre Conflitos Agrários da Mesa de Conflitos Agrários de Rondônia. Relatório Parcial – 2015 . Rondônia, 2015. ). Em 2015, o GT/TERRAS apontava como preocupação constante dos relatórios de segurança a presença e atuação dos movimentos sociais na luta organizada pela terra em Rondônia. Mas os dados compilados pelo INCRA demonstravam que o fator de impacto da presença dos movimentos sociais no cenário global é baixo. Apenas 22 áreas, de um total, então, de 88, contavam com a atuação de movimentos sociais organizados; enquanto 66 áreas registravam a presença de grupos de camponeses independentes em busca de terras para subsistência. Mais da metade das áreas definidas pela INCRA como sendo áreas de “alto risco” não contavam com a presença de movimentos sociais ( GT/TERRAS, 2015 GT/TERRAS – Grupo de Trabalho sobre Conflitos Agrários da Mesa de Conflitos Agrários de Rondônia. Relatório Parcial – 2015 . Rondônia, 2015. , p. 6-7). Os números de mortos, por outro lado, revelam nitidamente que não existe “guerra” ou “terrorismo dos movimentos sociais” nesses conflitos; apenas para citar um exemplo, em 2016 a prisão de 11 policiais militares numa operação da Polícia Federal revelou a atuação de um grupo de extermínio que atuava no Vale do Jamari, região mais violenta do estado; o grupo é acusado de, pelo menos, 100 homicídios desde 2009 13 13 http://g1.globo.com/ro/rondonia/noticia/2016/07/onze-policiais-militares-sao-presos-durante-operacao-da-pf-de-rondonia.html . Em 19 de abril de 2017, 9 camponeses foram assassinados em Colniza, Mato Grosso, na gleba Taquaruçu do Norte. Um dos comandantes do massacre foi o ex-policial militar de Rondônia, Moisés Ferreira de Souza, recentemente condenado pelo assassinato de dois jovens sem-terra na Fazenda Tucumã, na região de Ariquemes, Rondônia, em mais um caso cujas proporções oferecem um testemunho da falência estatal para lidar com o conjunto de violações na luta pelo direito a terra na Amazônia 14 14 Colniza, no Mato Grosso, fica a menos de 300 quilômetros da cidade de Machadinho, na região de Ariquemes, RO. .

Justiça precária

O caso da Fazenda Tucumã é exemplar para ilustrar a natureza dos conflitos de terra na Amazônia ocidental e seus desdobramentos em razão de reiteradas falhas do sistema de justiça.

A Fazenda Tucumã fica localizada no Vale do Jamari, região de Rondônia com maior número de conflitos e com destaque no ranking da violência nacional no campo, situada entre os municípios de Ariquemes, Cujubim e Machadinho do Oeste. Em 2017 foi palco do assassinato de dois jovens após reintegração judicial de posse. Os fatos ganharam destaque em nível nacional e internacional, pois assim como em Corumbiara, no bojo de cumprimento de ordens de reintegração de posse, houve a participação de policiais militares e fazendeiros nos atos criminosos.

Como é frequente em casos semelhantes, a ordem de reintegração expedida pelo Judiciário não se deu em observância a todos os parâmetros constitucionais e internacionais sobre o tema da luta pela terra, pois deixou de considerar o fato como conflito de interesse coletivo. Não houve a solicitação para manifestação prévia do INCRA quanto ao seu interesse no caso (art.565 c/c 585, NCPC), não foi providenciado um local para alojamento adequado e seguro das pessoas despejadas ( UNITED NATIONS, 2014 UNITED NATIONS. Forced Evictions. Fact Sheet No. 25/Rev.1. Office of the High Commissioner for Human Rights. New York and Geneva, 2014. ), dentre outras situações que agravaram a disputa e que, consoante detalhado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ, 2015 STJ. RMS 48316 - 2015/0106718-5. Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=201501067185&dt_publicacao=16/10/2015. Acesso em 30 de janeiro de 2018.
https://ww2.stj.jus.br/processo/revista...
), devem ser previamente atendidas (CNDH, 2016 CNDH [Conselho Nacional de Direitos Humanos.]. Relatório sobre defensores de direitos humanos ameaçados no estado de Rondônia. Brasília, 2017. Disponível em: http://www.sdh.gov.br/sobre/participacao-social/cndh/relatorios/relatorio-sobre-defensores-de-direitos-humanos-ameacados-no-estado-de-rondonia; Acessado em 01 de fevereiro de 2018 (2016).
http://www.sdh.gov.br/sobre/participaca...
, p.22-24).

Na Fazenda Tucumã estavam acampadas dezenas de famílias que denominaram o acampamento de “Terra Nossa”. O assentamento era acompanhado pelo Incra e pelo programa Terra Legal há vários anos, pois, a área em disputa é da União. No entanto, a ordem judicial foi expedida sem que o requerente apresentasse prova dominial. Não havia correta delimitação da área no pedido e nem na decisão, tampouco foi juntado no processo qualquer documento apto a comprovar a existência dos próprios acampados, o número de pessoas e as corretas condições do local 15 15 Recomendamos a leitura do voto do Ministro Og Fernandes, o qual reconheceu os direitos humanos à integridade física, à segurança e à moradia e habitação de um grupo de pessoas que sofriam eminente cumprimento de ordem de reintegração de posse com acompanhamento da polícia militar. Nele, além de esclarecer os limites da atuação da polícia militar, como garantidor da segurança dos oficiais de justiça e da comunidade atingida, ainda destacou a necessidade de observância de normas internacionais, inclusive, da garantia de uma habitação sucedânea, tudo isso vencendo alegações de inadequação do procedimento e via utilizada para apresentação da ação. Essa decisão foi premiada pelo CNJ - Conselho Nacional da Justiça. (RMS 48316 - 2015/0106718-5, disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=201501067185&dt_publicacao=16/10/2015 . Acesso em 30 de janeiro de 2018. . A ausência da mínima identificação correta dos supostos réus, por si só, já seria o bastante para impor ao Judiciário mais cuidado para expedição de qualquer liminar 16 16 Informações extraídas dos autos do processo cível n.º 0000889-37.2015.8.22.00021-Ariquemes. (TJRO, 2017) – o que, de fato, não ocorreu.

Sem que qualquer dos réus pudesse se defender, foram feitos reiterados pedidos e deferidas três ordens de reintegração. Ainda que o autor tenha informado a persistência de invasores na área, não foi destacado pelo juízo a existência formal de conflito na luta pela posse da terra; contraditoriamente, o juízo reconheceu formalizada a citação, mesmo que as pessoas encontradas na área para assinar a ordem de despejo não constassem no polo passivo do processo. Além disso, o Ministério Público não foi intimado para atuar no caso antes do deferimento da liminar.

Em janeiro de 2016, uma das várias ordens de reintegração foi cumprida, com a saída pacífica dos camponeses acampados na fazenda. Dois dias depois, dentro do prazo acordado para a retirada dos bens dos acampados, 5 jovens foram autorizados a entrar na área. Enquanto retiravam seus pertences, foram atacados a tiros; três deles conseguiram escapar com vida. 2 foram mortos, Alysson Henrique de Sá Lopes, de 23 anos, e Ruan Lucas Hildebrandt, de 18 anos. O corpo de Alysson foi encontrado carbonizado dentro do carro em que os 5 jovens foram até a fazenda. O corpo de Ruan continua desaparecido (CNDH, 2016 CNDH [Conselho Nacional de Direitos Humanos.]. Relatório sobre defensores de direitos humanos ameaçados no estado de Rondônia. Brasília, 2017. Disponível em: http://www.sdh.gov.br/sobre/participacao-social/cndh/relatorios/relatorio-sobre-defensores-de-direitos-humanos-ameacados-no-estado-de-rondonia; Acessado em 01 de fevereiro de 2018 (2016).
http://www.sdh.gov.br/sobre/participaca...
, p. 32).

Um dos processos criminais apontou como autores dos homicídios o alegado proprietário e seu sócio, um capataz da fazenda, além de 2 (dois) policiais militares. Em setembro de 2017 apenas os policiais militares foram condenados pelos assassinatos. O capataz está foragido e o grileiro foi absolvido; o Ministério Público recorreu visando a nulidade da absolvição por contrariedade à prova dos autos. A indiferença da atuação judicial resta clara na análise do processo cível de reintegração de posse, pois um dos policiais militares executores da chacina foi admitido como procurador do fazendeiro e foi ele quem recebeu o primeiro mandado de reintegração de posse e acompanhou o oficial de justiça para cumprimento fazendo escolta armada e indicando área muito maior do que a deferida para a evicção – tudo foi registrado na certidão do oficial de justiça 17 17 A prática de utilizar a medida de reintegração forçada com auxílio da polícia militar para se apropriar de área muito maior do que a determinada pela justiça é bastante comum na região. Numa ação recente, denunciada na Mesa de Conflitos Agrários do Estado, em uma região do mesmo Vale do Jamari, no assentamento Canaã, dois oficiais de justiça chegaram a certificar no processo a impossibilidade de cumprimento da reintegração por falta do cumprimento de determinações legais e incertezas na definição da área exata a ser reintegrada. Por insistência na determinação do juízo, a ordem foi cumprida sobre uma área quase 10 vezes maior do que aquela em disputa no processo. O caso também se tratava de posse pacífica, sob controle do INCRA e judicializado na justiça federal. Isso não evitou a determinação judicial de reintegração forçada, com a completa destruição imediata de todos os bens das 84 famílias despejadas, incluindo casas, centro comunitário, igrejas e plantações ( RONDÔNIA, 2017 ). .

Durante as investigações dos homicídios, em 03 de fevereiro de 2016, um dos policiais militares que chegou a ser preso – com um verdadeiro arsenal de guerra, incluindo armas de uso exclusivo das forças armadas –, sargento da reserva de operações especiais, conseguiu fugir de dentro da viatura que o conduzia 18 18 http://www.ariquemes190.com.br/noticia.php?id=31864 . Meses mais tarde, ele seria um dos responsáveis pelo massacre de 9 camponeses em Colniza, Mato Grosso 19 19 https://g1.globo.com/ro/ariquemes-e-vale-do-jamari/noticia/ex-policial-suspeito-de-ajudar-matar-9-pessoas-no-mt-se-entrega-a-policia-de-ro.ghtml . As investigações apontam a atuação do ex-policial como parte de um dos muitos grupos armados que agem na região impondo táticas de terror e extermínio. Preso em maio de 2017, após a chacina de Colniza, o ex-sargento foi condenado pelo homicídio de Alysson no crime da Fazenda Tucumã em setembro de 2017. Como o corpo de Ruan nunca foi encontrado, nenhum dos envolvidos no episódio foi condenado por seu desaparecimento 20 20 https://g1.globo.com/ro/ariquemes-e-vale-do-jamari/noticia/acusados-de-matarem-e-queimarem-jovem-em-carro-sao-condenados-a-quase-100-anos-de-prisao-em-ro.ghtml .

Vários outros conflitos no Estado de Rondônia possuem a mesma dinâmica e resultado morte tal qual Corumbiara e Tucumã. Os conflitos agrários são mapeados e acompanhados pela Comissão Pastoral da Terra, pelo Incra, pelo Terra Legal, pelo Conselho Estadual de Direitos Humanos e por diversos outros organismos estatais e da sociedade civil; no entanto, as causas originárias não são enfrentadas pelo Estado brasileiro e no sistema de justiça a indiferença é nítida e permanece intocada.

De acordo com o último Caderno de Conflitos no Campo são 143 áreas de conflitos pela terra em Rondônia nas quais constam 6.954 famílias de campesinos – a maioria delas judicializadas como ações possessórias ( CPT, 2016 CPT. Conflitos no Campo – Brasil 2016 [Coordenação: Antônio Canuto, Cássia Regina da Silva Luz, Thiago Valentim Pinto Andrade - Goiânia]: CPT Nacional – Brasil, 2016. , p. 63-67).

O judiciário rondoniense é resistente em reconhecer conflitos agrários nos processos a ele submetidos; desde que o juízo agrário foi criado através da Lei Estadual 784, de 1998, apenas 17 (dezessete) processos foram reconhecidos pelo Tribunal de Justiça como sendo conflito fundiário – o primeiro só foi declarado em 2002 (TJRO, 2018 TJRO. Processo SEI n. 0001252-43.2017.8.22.8800. Consultado em 01 de fevereiro de 2018. , p. 9). O caso Tucumã não foi reconhecido como envolvendo questão agrária conflituosa, tampouco outros que ainda tramitam, e que já resultaram em mortes em razão da demanda por terras. Contrariando disposições da Constituição Federal, alterada pela Emenda Constitucional n. 45/2004, não existe vara especializada em Rondônia, agravando o reconhecimento judicial dos conflitos fundiários e dificultando sobremaneira a atuação do sistema de justiça sobre o tema.

Demonstração da desproporção numérica entre os dados do TJRO e da CPT (TJRO, 2018 TJRO. Processo SEI n. 0001252-43.2017.8.22.8800. Consultado em 01 de fevereiro de 2018. , p. 9)

TJRO CPT
2002 1 21
2003 1 22
2004 1 15
2005 0 25
2006 2 19
2007 3 26
2008 2 15
2009 0 24
2010 0 24
2011 0 52
2012 1 61
2013 0 40
2014 0 51
2015 1 78
2016 5 101

Como a situação não sofre grandes alterações, o número de mortos e desaparecidos deve continuar subindo. Desde 14 de dezembro de 2017 três lideranças de trabalhadores sem-terra, Flávio de Lima de Souza, Jairo Feitosa Pereira e Marinalva Silva de Souza, da ocupação “Comunidade Igarapé Araras” – oficialmente, pertencente ao município de Canutama, Amazonas, mas próximo do limite territorial de Porto Velho, Rondônia – desapareceram quando tiravam fotos da área para instrução de processo administrativo de regularização no INCRA. Os três já haviam sofrido várias ameaças por parte dos fazendeiros da localidade, grileiros que ocupam irregularmente terras públicas da União. Um dos trabalhadores, Flávio Lima de Souza, foi chefe do esquadrão brigadista do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) no Parque Nacional Mapinguari, situado entre os municípios de Canutama e Lábrea, no Amazonas, e Porto Velho, capital de Rondônia. Logo, conhecia profundamente a região. Até este momento, os três não foram encontrados. A Fazenda Shalom, localizada na área da Comunidade Igarapé, pertence a duas empresas do setor imobiliário e madeireiro de Rondônia, sediadas na cidade de Ariquemes, e essas empresas já haviam sido punidas pela justiça federal do Amazonas por grilagem de terras da União – sem que medidas mais duras tivessem sido tomadas para afastá-las da região e impor controle efetivo do poder de Estado para evitar novos crimes 21 21 http://amazoniareal.com.br/sumico-de-trabalhadores-no-sul-do-amazonas-pode-ter-relacao-com-disputa-de-terra-publica-com-empresa/ . Flávio, Jairo e Marinalva se juntam ao Ruan numa série estatística dramática que não para de subir em toda a Amazônia brasileira.

Violações sistêmicas e o papel do Estado

Desigualdades muito profundas no direito à terra implicam, comumente, violações graves do direito à integridade física como ferramenta para a consolidação de domínio e controle econômico e político ( LANDMAN, LARIZZA, 2009 LANDMAN, Todd; LARIZZA, Marco. Inequality and Human Rights: Who Controls What, When, and How. 53 International Studies Quarterly, 715, 2009. ). A incidência histórica e o crescimento acentuado nos últimos anos de casos gravíssimos em algumas regiões amazônicas ensejam a configuração de violações sistêmicas de direitos humanos, colocando sob julgamento o papel do Estado brasileiro. A configuração dessas violações deve questionar o poder legislativo, executivo e judiciário.

Como vimos anteriormente, a ocupação da Amazônia desde fins da década de 1960 ocorreu sem os mecanismos legais que pudessem oferecer garantias sólidas para evitar as incertezas e a insegurança jurídica que hoje fomentam a maioria dos conflitos. Planos desordenados de ocupação, sobreposições normativas mal planejadas e quase insolúveis e o predomínio de grupos políticos que jamais incentivaram a correta destinação de terras para a pacificação e desenvolvimento sustentável reforçam o horizonte de perspectivas negativas que dão causa às preocupações de ativistas e defensores de direitos humanos.

Os problemas relativos à segurança pública estão diretamente ligados à incerteza jurídica e à falta de solução para a inexistência de regularização fundiária. Mas, isso não significa que o poder executivo não tenha responsabilidades tanto pela fragilidade dos meios para manter a ordem e a paz no campo, quanto pela omissão diante das muitas e reiteradas provas de envolvimento direito de agentes da segurança pública nos crimes de conflitos de terras. As mais de 100 mortes atribuídas ao grupo de extermínio citado na seção 3, e as 9 mortes em Colniza, MT, com a participação do ex-policial de Rondônia, fugitivo dos homicídios na Fazenda Tucumã, são apenas fração da enorme quantidade de ocorrências relatadas.

Além da omissão na área da segurança pública, que deve ser atribuída aos governos estaduais, tanto quanto ao governo federal, não podemos deixar de apontar o sucateamento das instituições criadas para conduzir a solução do problema. Sem recursos e sem pessoal, instituições como o INCRA, a FUNAI e o próprio Terra Legal sofrem para conseguir resolver qualquer um dos casos sob suas competências ( GT/TERRAS, 2015 GT/TERRAS – Grupo de Trabalho sobre Conflitos Agrários da Mesa de Conflitos Agrários de Rondônia. Relatório Parcial – 2015 . Rondônia, 2015. , p. 6-7). Esse desaparelhamento funciona como incentivo para que grupos particulares, com grande poder econômico, assumam tarefas do Estado, controlando a segurança, a abertura de estradas, a própria demarcação de terras e mesmo a distribuição de alguns recursos entre comunidades quase isoladas. Ocorre, assim, conjugando atos omissivos e comissivos por parte do executivo e do legislativo um processo de progressiva colonização do espaço público pelo interesse corporativo privado, em associação, deveras criminosa, com agentes políticos diversos. Interessante notar que o próprio discurso de que movimentos sociais de luta pela terra são “terroristas”, “guerrilheiros” e grandes responsáveis pelos atos de violência nesses conflitos – algo amplamente questionável por dados sólidos – opera para facilitar a difusão de milícias e esquadrões da morte, sob a justificativa de proteção contra camponeses e trabalhadores sem-terra. Esses grupos armados passam a fazer parte da rotina da vida de pequenas cidades, mal atendidas pela força pública, e acabam servindo como mercado atraente para mercenários de toda a espécie.

No sistema de justiça, por fim, a soma de omissões com casos de ações diretas de violação surpreende negativamente. Profundas imperfeições institucionais funcionam como mecanismos de violações sistêmicas de direitos humanos. Um sistema de justiça fragmentado, em que cada ente atua isoladamente, e bem longe das melhores condições forja o ambiente ideal para a intensificação dos conflitos. Não há defensores públicos, estaduais e federais, para atender a demanda no estado de Rondônia – cenário que se repete no Amazonas, Pará e Mato Grosso. A atuação do Ministério Público depende da intimação do juízo, o que nem sempre ocorre, como no caso da Fazenda Tucumã. Em ações possessórias, por exemplo, mesmo quando é intimado, cabe ao membro responsável pelo caso avaliar se se trata de causa de interesse coletivo, em vez de processo ordinário de disputa particular entre posseiros precários. O acúmulo de trabalho, a falta de infraestrutura e pessoal e o próprio desconhecimento do cenário mais amplo desses conflitos acaba gerando desinteresse pela causa.

Mas, como os episódios mais graves de violência costumam ocorrer diante da eventual ou iminente reintegração em áreas públicas, cuja posse está em litígio, o papel do poder judiciário acaba sendo determinante.

Reintegration of possessions are an important part of rural conflicts because police eviction of squatters to implement the court's ruling is when violence frequently occurs. Many times, squatters leave peacefully when evicted (often to return later), but in other cases they resist. It is common for the farmer to hire additional hands to assist in the eviction, because the police are generally ill equipped and underpaid. Upon receiving a request for a reintegration of possession, a judge follows the procedure in the Civil Code that is the basis of Brazilian statutory law. Formally, a request for a reintegration of possession involves only the question of an individual' s property being taken by another; it is not seen as a question of land reform or of social justice ( ALSTON; LIBECAP; MUELLER, 1999 ALSTON, Lee J; LIBECAP, Gary D; MUELLER, Bernardo. Titles, Conflict, and Land Use: The Development of Property Rights and Land Reform on the Brazilian Amazon Frontier (Economics, Cognition, and Society). Michigan: Michigan University Press, 1999. , p. 72).

A evicção forçada em desrespeito às normas internacionais configura grave violação de direitos humanos e é um mecanismo responsável por inúmeros casos de violência institucional em todo o país (ONU, 2014). A situação amazônica é mais grave porque dificilmente os abusos comumente cometidos são fiscalizados, e raramente é possível remediar a situação.

Conclusão: terra, violência política e direitos humanos

A concentração de riquezas – incluídos aí a renda e a terra – impacta diretamente os indicadores de violações dos direitos humanos à integridade pessoal. A terra representa o mais importante dos ativos fixos que podem ser alvo de expropriação ou de demandas distributivas, em favorecimento das classes mais baixas, lembram Landmann e Larizza (2009, p. 719). E, justamente por esse fato, pela possibilidade de retomada de terras adquiridas de forma irregular, elites econômicas e políticas pressionam os mecanismos de repressão do Estado contra a redistribuição – aqui, no caso desse trabalho, as políticas de reforma agrária ( BOIX, 2003 BOIX, Carles. Democracy and Redistribution. Cambridge: Cambridge University Press, 2003. ). Em países menos desenvolvidos como o Brasil, mais do que o observado por Landmann e Larizza, não existe apenas cumplicidade estatal, mas amplo direcionamento das forças estatais para que uma eventual redistribuição no direito à terra se transforme num movimento de reconcentração, como aquele anunciado pela Lei n. 13.465/2017. Ainda pior, esse movimento na Amazônia tende a ser direcionado para acumulação de ativos econômicos nas mãos de agentes políticos, em relacionamento privado com o mercado. Com um índice de GINI de distribuição de terras em 0,872, o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo nessa área ( OXFAM, 2017 OXFAM (2017). Relatório “A distância que nos une – Um retrato das desigualdades brasileiras”. Oxfam, Brasil, setembro de 2017. Disponível em: https://www.oxfam.org.br/sites/default/files/arquivos/Relatorio_A_distancia_que_nos_une.pdf; Acessado em Acessado em 31 de janeiro de 2018.
https://www.oxfam.org.br/sites/default/...
, p. 32). Estimativas recentes apontam que 45% da área rural do Brasil pertence a apenas 1% do total de proprietários ( OXFAM, 2016 OXFAM (2018). Relatório “Terrenos da Desigualdade – Terra, agricultura e desigualdades no Brasil rural”. Oxfam, Brasil, Novembro de 2016. Disponível em: https://www.oxfam.org.br/sites/default/files/arquivos/relatorio-terrenos_desigualdade-brasil.pdf; Acessado em 31 de janeiro de 2018.
https://www.oxfam.org.br/sites/default/...
, p. 8).

De acordo com os estudos elaborados por Vanhanem VANHANEN, Tatu. The Prospects of Democracy. London: Routledge, 1997. , quanto maior for o percentual de propriedades familiares no território, maior será a distribuição de recursos e do poder econômico ligado às atividades produtivas, contrariando o discurso falsamente desenvolvimentista de que a expansão de uma monocultura forte enriquece uma região ou mesmo todo o país (1997, p. 47).

Tanto as desigualdades no direito à terra, quanto no direito à renda afetam significativamente a proteção dos direitos humanos ( MULLER, SELIGSON, MIDLARSKY, 1989 MULLER, Edward N.; SELIGSON, Mitchell A., MIDLARSKY, Manus I. Land Inequality and Political Violence. The American Political Science Review. Vol. 83, No. 2 (Jun., 1989), pp. 577-596, 1989. ). Além disso, existe uma relação empírica entre a desigualdade e ofensas graves contra os direitos de integridade pessoal (LANDMANN, 2016 LANDMAN, Todd. Rigorous morality: Norms, Values, and the Comparative Politics of Human Rights. Human Rights Quarterly, Volume 18, Number 1, February, pp. 1-20, 2016. ). De modo a diminuir a incidência desse tipo de violência não basta uma redistribuição como a que o Programa Terra Legal espera promover – em Rondônia, o discurso oficial aponta mais de 90 mil pequenas propriedades a serem regularizadas. É necessário criar as condições de infraestrutura e suporte econômico para que pequenos agricultores possam produzir e se manter e, além disso, evitar o assédio político-econômico do mercado e de outros agentes sociais. Isso porque há um vínculo inexorável entre direito à terra e capacidade de ação política. Ou seja, não basta a inclusão econômica, é necessário que haja a inclusão política de indivíduos e grupos sociais desfavorecidos para que possam participar dos processos decisórios que definem as políticas públicas e as estruturas normativas que definem as regras do jogo. Carles Boix, em Democracy and Redistribution afirma que a história da América do Sul (e da África) pode ser contada a partir da forma como as elites empregaram seus recursos políticos para determinar a extensão de seus direitos de propriedade e moldar a distribuição dos recursos econômicos em sua vantagem ( BOIX, 2003 BOIX, Carles. Democracy and Redistribution. Cambridge: Cambridge University Press, 2003. , p. 224). Acrescentamos que no caso de estados como Rondônia a manutenção do modus operandi do colonialismo depende não apenas da força política, mas de um arranjo normativo-institucional que torne quase ineficaz o esforço jurídico de luta pelo direito à terra. Colocar em questionamento o papel do direito e das instituições do sistema de justiça é fundamental para que essa luta prossiga.

  • 1
    Não se pode desconsiderar a longevidade e complexidade da Amazônia, tampouco, o fato de que ela também foi disputada na época colonial por outros países e também em razão da Lei de Sesmarias (Lei 601 de 18 de setembro de 1850), a qual fez surgir a conflitualidade agrária, já que só poderia ter terra no Brasil quem tivesse dinheiro para adquiri-la e as posses existentes foram totalmente ignoradas. Mais especificamente sobre a gênese dos conflitos em Rondônia, imprescindível a leitura de Hervé Théry (2012) THÉRY, Hervé, Rondônia mutações de um Território federal na Amazônia federal. Curitiba: SK Editora, 2012. , que em sua obra Rondônia: mutações de um território federal na Amazônia brasileira identifica duas fases anteriores à década de 1970, ocorridas no séc. XVII e XVIII, por ele chamadas de antigas, que não são objeto de estudo deste trabalho.
  • 2
    Alston, Harris e Mueller distinguem, nos processos de colonização, as intervenções governamentais em fases onde o direito de fato (de facto rights) é superado por um direito legítimo (de jure rights), consolidando o processo. No caso de largas porções amazônicas essas fases sucederam direitos de jure sobre direitos de jure ( ALSTON; HARRIS; MUELLER, 2012 ALSTON, Lee; HARRIS, Edwyna; MUELLER, Bernardo. The Development of Property Rights on Frontiers: Endowments, Norms, and Politics. The Journal of Economic History, Vol. 72, No. 3 (September 2012). doi: 10.1017/S0022050712000356. 2012.
    https://doi.org/10.1017/S002205071200035...
    . p. 23).
  • 3
    Conferir: Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia em http://www.sudam.gov.br/index.php/institucional?id=87 ;
  • 4
    Seção III do Estatuto da Terra, Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964.
  • 5
    CF/88, art. 225.
  • 6
    Convenção da Diversidade Biológica e o Plano Nacional de Áreas Protegidas-Decreto 5758/06.
  • 7
    CF/88, art. 225, § 1º, inciso III; Lei 9.985/00.
  • 8
    CF/88, art. 231 e 232; art. 13 e ss. da Convenção 169/OIT.
  • 9
    CF/88, art. 68 do ADCT/88 e art. 215 e 216; art. 13 e ss. da Convenção 169/OIT.
  • 10
    Pescadores, Extrativistas, Ribeirinhos, Caiçaras, etc. CF., art. 215 e 216 da CF; art. 13 e ss. da Convenção 169/OIT.
  • 11
    Segundo a historiadora Deise M. Meireles, até 1980 Rondônia experimentou sete ciclos econômicos: 1º - apresamento indígena; 2º - busca do ouro; 3º - as drogas do sertão; 4º - disputa de fronteiras estratégicas; 5º - a exploração da borracha; 6º - a exploração de cassiterita e 7º - colonização agrícola. (1983, p. 17; 18; 29; 83; 86). Citado por Valdir de Souza. Conferir: Souza, Valdir Aparecido de. Rondônia, uma memória em disputa. Tese (Doutorado). UNESP: Assis, 2011.
  • 12
    Os instrumentos utilizados pelo Incra para a colonização de terras no estado foram: Contrato de Alienação de Terras Públicas (CATP); Contrato de Concessão de Domínio de Terras Públicas (CCDTP); Contrato de Promessa de Compra e Venda (CPCV); Títulos Definitivos (TD) nos Projetos de Colonização Oficial ou Assentamentos e os demais instrumentos nas áreas dos Projetos Fundiários, como regularização fundiária. Esses instrumentos possuem cláusulas resolutivas que impõem obrigações que vão desde a obrigação de pagamento até a implementação de projetos de produção. A falta de comprovação ou mesmo descumprimento de alguma dessas cláusulas é o principal gerador da instabilidade documental desses imóveis.
  • 13
  • 14
    Colniza, no Mato Grosso, fica a menos de 300 quilômetros da cidade de Machadinho, na região de Ariquemes, RO.
  • 15
    Recomendamos a leitura do voto do Ministro Og Fernandes, o qual reconheceu os direitos humanos à integridade física, à segurança e à moradia e habitação de um grupo de pessoas que sofriam eminente cumprimento de ordem de reintegração de posse com acompanhamento da polícia militar. Nele, além de esclarecer os limites da atuação da polícia militar, como garantidor da segurança dos oficiais de justiça e da comunidade atingida, ainda destacou a necessidade de observância de normas internacionais, inclusive, da garantia de uma habitação sucedânea, tudo isso vencendo alegações de inadequação do procedimento e via utilizada para apresentação da ação. Essa decisão foi premiada pelo CNJ - Conselho Nacional da Justiça. (RMS 48316 - 2015/0106718-5, disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=201501067185&dt_publicacao=16/10/2015 . Acesso em 30 de janeiro de 2018.
  • 16
    Informações extraídas dos autos do processo cível n.º 0000889-37.2015.8.22.00021-Ariquemes RONDÔNIA. Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia . Processo cível n.º 0000889-37.2015.8.22.00021-1. Vara Cível da Comarca de Ariquemes. Disponível em: <https://www.tjro.jus.br>. Acesso em: 01 de fevereiro de 2018.
    https://www.tjro.jus.br ...
    .
  • 17
    A prática de utilizar a medida de reintegração forçada com auxílio da polícia militar para se apropriar de área muito maior do que a determinada pela justiça é bastante comum na região. Numa ação recente, denunciada na Mesa de Conflitos Agrários do Estado, em uma região do mesmo Vale do Jamari, no assentamento Canaã, dois oficiais de justiça chegaram a certificar no processo a impossibilidade de cumprimento da reintegração por falta do cumprimento de determinações legais e incertezas na definição da área exata a ser reintegrada. Por insistência na determinação do juízo, a ordem foi cumprida sobre uma área quase 10 vezes maior do que aquela em disputa no processo. O caso também se tratava de posse pacífica, sob controle do INCRA e judicializado na justiça federal. Isso não evitou a determinação judicial de reintegração forçada, com a completa destruição imediata de todos os bens das 84 famílias despejadas, incluindo casas, centro comunitário, igrejas e plantações ( RONDÔNIA, 2017 RONDÔNIA. Mesa de Conflitos Agrários. Ata de reunião: 31 de maio de 2017. Governo do Estado de Rondônia, 2017. ).
  • 18
  • 19
  • 20
  • 21

Referências bibliográficas

  • ALSTON, Lee J; LIBECAP, Gary D; MUELLER, Bernardo. Titles, Conflict, and Land Use: The Development of Property Rights and Land Reform on the Brazilian Amazon Frontier (Economics, Cognition, and Society). Michigan: Michigan University Press, 1999.
  • ALSTON, Lee; HARRIS, Edwyna; MUELLER, Bernardo. The Development of Property Rights on Frontiers: Endowments, Norms, and Politics The Journal of Economic History, Vol. 72, No. 3 (September 2012). doi: 10.1017/S0022050712000356. 2012.
    » https://doi.org/10.1017/S0022050712000356
  • BBC, 2016. Reportagem: Pelo 5º ano, Brasil é líder em mortes em conflitos de terra; Rondônia é Estado mais violento no campo . Disponível em: <http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36580912>. Acesso em: 27 jan. de 2018.
    » http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36580912
  • BECKER, B. Geopolítica da Amazônia: a nova fronteira de recursos . Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
  • BECKER, B. K. Amazônia São Paulo: Editora Ática, 1998.
  • BOIX, Carles. Democracy and Redistribution Cambridge: Cambridge University Press, 2003.
  • BOIX, Carles; STOKES, Susan. Endogenous Democratization World Politics 55 (4): 517–549, 2003.
  • BRASIL. Decreto Nº 96.944, de 12 de outubro de 1988 – cria o Programa de Defesa do Complexo de Ecossistemas da Amazônia Legal – “Programa Nossa Natureza”. Brasília, 1988.
  • BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Cadastro Ambiental Rural – Boletim Informativo, 31 de dezembro de 2017. Disponível em: http://www.florestal.gov.br/documentos/car/boletim-do-car/3022-boletim-sicar-junho-2017/file; Acessado em 01 de fevereiro de 2018.
    » http://www.florestal.gov.br/documentos/car/boletim-do-car/3022-boletim-sicar-junho-2017/file
  • BRASIL. Senado Federal. Decreto n. 86.029, de 27 de Maio de 1981 Dispõe sobre a criação do Programa Integrado de Desenvolvimento do Noroeste do Brasil (POLONOROESTE). Disponível em: http://legis.senado.leg.br/legislacao/ListaTextoSigen.action?norma=508669&id=14246017&idBinario=15706262. Acessado em 26 de jan. de 2018.
    » http://legis.senado.leg.br/legislacao/ListaTextoSigen.action?norma=508669&id=14246017&idBinario=15706262
  • CNDH [Conselho Nacional de Direitos Humanos.]. Relatório sobre defensores de direitos humanos ameaçados no estado de Rondônia. Brasília, 2017. Disponível em: http://www.sdh.gov.br/sobre/participacao-social/cndh/relatorios/relatorio-sobre-defensores-de-direitos-humanos-ameacados-no-estado-de-rondonia; Acessado em 01 de fevereiro de 2018 (2016).
    » http://www.sdh.gov.br/sobre/participacao-social/cndh/relatorios/relatorio-sobre-defensores-de-direitos-humanos-ameacados-no-estado-de-rondonia
  • COLETTI, C. A Trajetória política do MST: da crise da ditadura ao período neoliberal 2005. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Campinas, 2005.
  • CPT. Conflitos no Campo – Brasil 2016 [Coordenação: Antônio Canuto, Cássia Regina da Silva Luz, Thiago Valentim Pinto Andrade - Goiânia]: CPT Nacional – Brasil, 2016.
  • FERNANDES, Bernardo Manciano. Questão Agrária: conflitualidade e desenvolvimento territorial Texto apresentado em seminário no Lincoln Istitute of Land Policy e na Harvard University, em 2005. Disponível em: <http://www.geografia.fflch.usp.br/graduacao/apoio/Apoio/Apoio_Valeria/Pdf/Bernardo_QA.pdf>. Acesso em 01 de fevereiro de 2018.
    » http://www.geografia.fflch.usp.br/graduacao/apoio/Apoio/Apoio_Valeria/Pdf/Bernardo_QA.pdf
  • FERREIRA, Gustavo Henrique Cepolini. A colonização em Rondônia - lutas e perspectivas da agricultura camponesa Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 1, n. 1, p. 135-156, jan./jun. 2011.
  • GLOHBAL WITNESS. Pelo 5º ano, Brasil é líder em mortes em conflitos de terra; Rondônia é Estado mais violento no campo. BBC, 2016. Reportagem disponível em:<http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36580912>. Acesso em 28 fev. 2017.
    » http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36580912
  • GRABNER, Maria Luiza. Marcos Jurídicos das Unidades de Conservação e dos Territórios Étnicos Workshop “Territórios Tradicionais e Unidades de Conservação: diálogos e perspectivas em debate” – VI Seminário Brasileiro sobre Áreas Protegidas e Inclusão Social. Belo Horizonte (UFMG), 17 de setembro de 2013.
  • GT/TERRAS – Grupo de Trabalho sobre Conflitos Agrários da Mesa de Conflitos Agrários de Rondônia. Relatório Parcial – 2015 . Rondônia, 2015.
  • IMAFLORA. Nota técnica sobre a malha fundiária do Brasil . http://www.imaflora.org/atlasagropecuario/ Acessado em 26 de maio de 2017.
    » http://www.imaflora.org/atlasagropecuario/
  • INCRA. Painel de conflitos fundiários em Rondônia – SR/17 (documento). Gabinete da Superintendência do INCRA/RO, Porto Velho, 2017.
  • INCRA. Proposta de Plano Especial para Ações de Reforma Agrária, para minimizar os conflitos agrários em Rondônia SR-17/RO, Gabinete: Porto Velho, 2016.
  • IORIS, Antonio A R. The paradox of poverty in rich ecosystems: impoverishment and development in the Amazon of Brazil and Bolivia The Geographical Journal, Vol. 182, No. 2, June 2016, pp. 178–189. 2016.
  • LANDMAN, Todd. Rigorous morality: Norms, Values, and the Comparative Politics of Human Rights Human Rights Quarterly, Volume 18, Number 1, February, pp. 1-20, 2016.
  • LANDMAN, Todd; LARIZZA, Marco. Inequality and Human Rights: Who Controls What, When, and How 53 International Studies Quarterly, 715, 2009.
  • LE TOURNEAU, François-Michel; BURSZTYN, Marcel. Assentamentos rurais na Amazônia: contradições entre a política agrária e a política ambiental Revista Ambiente & Sociedade, Campinas v. XIII, n. 1, p. 111-130, jan.-jun., 2010.
  • MARGULIS, S. O desempenho do governo brasileiro, dos órgãos contratantes, e do Banco Mundial em relação à questão ambiental do programa Polonoroeste Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Brasília, 1991.
  • MOSER, Lilian Maria; CUNHA, Eliaquim Timotéo da. Os projetos de colonização em Rondônia Revista Labirinto – Ano X, nº 14 – dezembro de 2010.
  • MULLER, Edward N.; SELIGSON, Mitchell A., MIDLARSKY, Manus I. Land Inequality and Political Violence The American Political Science Review. Vol. 83, No. 2 (Jun., 1989), pp. 577-596, 1989.
  • NASCIMENTO, Cláudia Pinheiro. O processo de ocupação e urbanização de Rondônia: uma análise das transformações sociais e espaciais Revista de Geografia. Recife: UFPE – DCG/NAPA, v. 27, n. 2, mai/ago, 2010.
  • OXFAM (2017). Relatório “A distância que nos une – Um retrato das desigualdades brasileiras” Oxfam, Brasil, setembro de 2017. Disponível em: https://www.oxfam.org.br/sites/default/files/arquivos/Relatorio_A_distancia_que_nos_une.pdf; Acessado em Acessado em 31 de janeiro de 2018.
    » https://www.oxfam.org.br/sites/default/files/arquivos/Relatorio_A_distancia_que_nos_une.pdf
  • OXFAM (2018). Relatório “Terrenos da Desigualdade – Terra, agricultura e desigualdades no Brasil rural” Oxfam, Brasil, Novembro de 2016. Disponível em: https://www.oxfam.org.br/sites/default/files/arquivos/relatorio-terrenos_desigualdade-brasil.pdf; Acessado em 31 de janeiro de 2018.
    » https://www.oxfam.org.br/sites/default/files/arquivos/relatorio-terrenos_desigualdade-brasil.pdf
  • PACHECO, Pablo. Agrarian Reform in the Brazilian Amazon: Its Implications for Land Distribution and Deforestation World Development Vol. 37, No. 8, pp. 1337–1347, 2009.
  • PRIETO, Gustavo Francisco Teixeira. A aliança entre terra e capital na ditadura militar Mercator, Fortaleza, v. 16, e16003, Fortaleza: 2017.
  • REZENDE, Roberto Sanches; POSTIGO, Augusto. Reconhecimentos territoriais e desconhecimentos institucionais Revista Ruris. Vol. 7, pp. 119-142., número 2, setembro, 2003.
  • RIBEIRO, Alyson F. Alves; SILVA, Ricardo Gilson da C.; SANTOS, Josefa de Lisboa. Política de regularização fundiária em Rondônia: limitações do programa terra legal e expectativas socioterritoriais . Revista Confins – Revista Franco-Brasileira de Geografia, n. 29, 2016.
  • RONDÔNIA. Mesa de Conflitos Agrários Ata de reunião: 31 de maio de 2017. Governo do Estado de Rondônia, 2017.
  • RONDÔNIA. Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia . Processo cível n.º 0000889-37.2015.8.22.00021-1. Vara Cível da Comarca de Ariquemes. Disponível em: <https://www.tjro.jus.br>. Acesso em: 01 de fevereiro de 2018.
    » https://www.tjro.jus.br
  • SANTOS, Alex Mota. Cartografias dos povos e das terras indígenas em Rondônia. Tese de doutorado. Universidade Federal do Paraná, 2014.
  • SANTOS, Layza Queiroz; SOUZA, Alice De Marchi P. de. Vidas em luta: criminalização e violência contra defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil . Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos. Curitiba: Terra de Direitos, 2017.
  • SILVA, Ricardo Gilson da Costa. Agronegócio e campesinato em Rondônia. Geografia Agrária no Brasil: Disputas, conflitos e alternativas territoriais. Jundiaí: Paco Editorial, 2016.
  • SIMMONS, Cynthia S. The Political Economy of Land Conflict in the Eastern Brazilian Amazon Annals of the Association of American Geographers, 94(1), 2004, pp. 183–206, 2004.
  • STJ. RMS 48316 - 2015/0106718-5. Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=201501067185&dt_publicacao=16/10/2015. Acesso em 30 de janeiro de 2018.
    » https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=201501067185&dt_publicacao=16/10/2015
  • TEIXEIRA, Marco Antônio Domingues; FONSECA, Dante Ribeiro. História regional de Rondônia Porto Velho: Rondoniana, 1998.
  • THÉRY, Hervé, Rondônia mutações de um Território federal na Amazônia federal Curitiba: SK Editora, 2012.
  • TJRO. Processo SEI n. 0001252-43.2017.8.22.8800 Consultado em 01 de fevereiro de 2018.
  • UNITED NATIONS. Forced Evictions. Fact Sheet No. 25/Rev.1 Office of the High Commissioner for Human Rights. New York and Geneva, 2014.
  • VANHANEN, Tatu. The Prospects of Democracy London: Routledge, 1997.
  • VAZ FILHO, Florêncio Almeida. Os conflitos ligados à sobreposição entre terras indígenas e a resex Tapajós-Arapiuns no Pará. Revista Ruris. Vol. 7, pp 143-183, número 2, setembro, 2003.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar 2018

Histórico

  • Recebido
    31 Jan 2018
  • Aceito
    06 Fev 2018
Universidade do Estado do Rio de Janeiro Rua São Francisco Xavier, 524 - 7º Andar, CEP: 20.550-013, (21) 2334-0507 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: direitoepraxis@gmail.com