RESUMO
Objetivo:
apreender como ocorre o cuidado transicional da enfermeira ao idoso com marcapasso artificial.
Método:
pesquisa qualitativa, realizada em um hospital filantrópico, na cidade de Salvador, Bahia, Brasil. Participaram 14 enfermeiras atuantes nas unidades de internação cirúrgica e cardiológica. Os dados foram coletados entre agosto e novembro de 2020, por meio de entrevista semiestruturada, e analisados pelo referencial metodológico Discurso do Sujeito Coletivo e discutidos à luz da teoria das transições de Afaf Meleis.
Resultados:
foi identificado conhecimento insipiente das enfermeiras acerca do cuidado transicional. Observou-se que o relatório de alta de enfermagem constitui um instrumento facilitador para a transição do cuidado.
Considerações finais:
o estudo apontou que o cuidado transicional de enfermeiras ao idoso com marcapasso artificial não possui fundamentação teórica, relatando como prioridade o cuidado com a carteira de identificação do marcapasso e com a ferida operatória.
Descritores:
Cuidado Transicional; Enfermeiras e Enfermeiros; Idoso; Marca-Passo Artificial; Alta do Paciente
ABSTRACT
Objective:
to understand how the transitional care of nurses to olde adults with artificial pacemaker occurs.
Method:
a qualitative research, carried out in a philanthropic hospital in the city of Salvador, Bahia, Brazil. Fourteen nurses working in surgical and cardiac inpatient units participated. Data were collected between August and November 2020, through semi-structured interviews, and analyzed using the methodological framework Discourse of the Collective Subject and discussed in the light of Afaf Meleis’ theory of transitions.
Results:
nurses’ incipient knowledge about transitional care was identified. It was observed that the nursing discharge report is a facilitating instrument for transitional care.
Final considerations:
the study pointed out that the transitional care of nurses to older adults with artificial pacemakers does not have a theoretical foundation, reporting as a priority the care with the pacemaker identification card and with the surgical wound.
Descriptors:
Transitional care; Nurses; Aged; Pacemaker, Artificial; Patient Discharge
RESUMEN
Objetivo:
comprender cómo se produce el cuidado transitorio del enfermero al anciano con marcapasos artificial.
Método:
investigación cualitativa, realizada en un hospital filantrópico de la ciudad de Salvador, Bahía, Brasil. Participaron 14 enfermeros que laboran en las unidades de internación quirúrgica y cardíaca. Los datos fueron recolectados entre agosto y noviembre de 2020, a través de entrevistas semiestructuradas, y analizados utilizando el marco metodológico Discurso del Sujeto Colectivo y discutidos a la luz de la teoría de las transiciones de Afaf Meleis.
Resultados:
se identificó el conocimiento incipiente de las enfermeras sobre los cuidados transicionales. Se observó que el informe de alta de enfermería es un instrumento facilitador para la transición asistencial.
Consideraciones finales:
el estudio señaló que el cuidado transicional de enfermeras al anciano con marcapasos artificiales no tiene un fundamento teórico, reportando como prioridad el cuidado con la tarjeta de identificación del marcapasos y con la herida quirúrgica.
Descriptores:
Cuidado de Transición; Enfermeras y Enfermeros; Anciano; Marcapaso Artificial; Alta del Paciente
INTRODUÇÃO
Estudo do Ministério da Saúde indica que aproximadamente 33% das mortes são causadas por doenças cardiovasculares (DCV).Esses números se tornam ainda maiores se considerarmos a população idosa(11 Dutra DD, Duarte MCS, Albuquerque KF, Lima AS, Santos JS, Souto HC. Doenças cardiovasculares e fatores associados em adultos e idosos cadastrados em uma unidade básica de saúde. Rev Pesqui: Cuid Fundam. 2016;8(2):4501-09. https://doi.org/10.9789/2175-5361.2016.v8i2.4501-4509
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). Após os 60 anos, alterações das propriedades eletrofisiológicas são evidentes, aumentando a ocorrência de arritmias, disfunções sinusais, bloqueio atrioventriculares e maior incidência de implantação de marcapassos(22 Esquenazi D, Silva SRB, Guimaraes MAM. Aspectos Fisiológicos do envelhecimento humano e quedas em idosos. RHUPE. 2014;13(2):11-20. https://doi.org/10.12957/rhupe.2014.10124
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).
A estimulação artificial é padrão de atendimento em condições cardíacas diversas, com eficácia para melhorar a sobrevida(33 Haugaa KH, Potpara TS, Boveda S, Deharo J, Chen J, Dobreanu D. Patients’ knowledge and attitudes regarding living with implantable electronic devices: results of a multicentre, multinational patient survey conducted by the European Heart Rhythm Association. Europace. 2018;20(2):386–91. https://doi.org/10.1093/europace/eux365
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). Essa estimulação, além de salvar a vida, permite que os pacientes atinjam uma qualidade de vida (QV) compatível com a média da população(44 Mota WH. Estimulação cardíaca artificial e suas implicações na enfermagem. J Health Biol Sci. 2018;6(1):100-07. https://doi.org/10.12662/2317-3076jhbs.v6i1.1149.p100-107
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).
Os impactos do uso de marcapasso (MP) podem ser tanto de origem física quanto psicológica, requerendo a ressignificação da rotina e reorganização de ações e pensamentos. Dentre as mudanças de comportamento mais comuns que emergem esse processo, estão a resistência à implantação do M P, a desconfiança em relação à resolutividade, medo permanente da morte, ideia de um coração fraco que tornará a vida dependente de um aparelho, bem como busca de uma explicação para sua condição adversa de saúde, baixa autoestima e depressão(55 Bergmann ARN, Souza LV, Scorsolini-Comin, F, Santos MA. A vida por um fio: percepções sobre o implante de marcapasso cardíaco permanente. Rev Subj. 2016;16(1):131-43. https://doi.org/10.5020/23590777.16.1.131-143
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).
O implante de MP insere os indivíduos no contexto do cuidado hospitalar. Nessas circunstâncias, a pessoa idosa com limitações inerentes à senilidade passa a necessitar de um suporte da equipe de saúde, contemplando cuidados transicionais para atender à nova realidade. Esses cuidados são necessários, pois diminuem novas hospitalizações e otimizam o processo saúde-doença(66 Menezes TMO, Oliveira ALB, Santos LB. Cuidado de Transição Hospitalar a pessoa idosa: revisão integrativa. Rev Bras Enferm. 2019;72(Suppl 2):307-15. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0286
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).
O cuidado transicional se configura em ações que garantem a coordenação e continuidade da assistência a saúde, na transferência de pacientes entre diferentes serviços de saúde ou unidades de um mesmo local(77 Colleman EA, Boult C. American Geriatrics Society Health Care Systems Committee. Improving the quality of transitional care for persons with complex care needs. J Am Geriatr Soc. 2003;51(4):556-7. https://doi.org/10.1046/j.1532-5415.2003.51186.x
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). Ele tem sido destacado como uma das formas de superar a fragmentação da atenção e garantir a continuidade dos cuidados.
A alta hospitalar requer planejamento, preparação e educação em saúde do paciente e da família, principalmente de idosos e pessoas com doenças crônicas, os quais têm necessidades de saúde persistente e contínua. Contudo, as orientações de alta, por vezes, são realizadas de forma mecânica e apressadas, sem considerar as condições e necessidades de cada paciente, frequentemente fornecidas no momento da saída do hospital(88 Weber LAF, Lima MADS, Acosta AM, Marques GQ. Transição do cuidado do hospital para o domicílio: revisão integrativa. Cogitare Enferm. 2017;22(3):1-11. https://doi.org/10.5380/ce.v22i3.47615
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).
A insegurança e a dúvida permeiam a nova rotina desses idosos quanto à terapêutica, repouso e retorno de suas atividades habituais. Nesse contexto, as ações de enfermagem podem contribuir para minimizar esse revés.
O cuidado de enfermagem dispõe de mecanismos que viabilizam e garantem a qualidade da assistência ao paciente. Além disso, propicia melhora da comunicação entre equipe e paciente. Nesse sentido, a elaboração do plano de alta pela enfermeira deve ser iniciada durante a admissão hospitalar, haja vista que o processo de enfermagem não ocorre de forma linear e sim inter-relacionada.
A sistematização da assistência de enfermagem (SAE) é o método organizador do trabalho de enfermagem, operacionalizando o cuidado tanto no ambiente hospitalar quanto no domiciliar. Dentre as etapas da SAE, o planejamento se destaca como subsídio para a práxis de cuidados. Nesse contexto, salienta-se o plano de alta como dispositivo essencial à continuidade do cuidado em domicílio para promover a QV e prevenir reinternações(99 Nunes ECDA, Menezes NL. Sistematização da alta de enfermagem: uma análise fundamentada em Roy. Cogitare Enferm. 2016;21(2):01-09. https://doi.org/10.5380/ce.v21i2.45875
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). Nessa conjuntura, a teoria das transições de Afaf Meleis reitera a importância da integralidade do cuidado, haja vista as alterações sofridas pelos indivíduos na vida, saúde, relacionamento e ambiente no processo de transição(1010 Meleis AI. Theorical nursing: development e progress. 4. Ed. Philadelphia: Lippincott; 2007. 832p.).
O estudo justifica-se pela relevância clínica do implante de MP artificial para reabilitação e manutenção da QV dos indivíduos. Por conseguinte, os impactos no âmbito da saúde pública, refere-se ao índice de reinternações hospitalares ocasionadas por agudização de DCV prévias e os custos com a saúde.
Diante do exposto e levando em consideração a magnitude do implante de MP no contexto da longevidade, este trabalho contribuirá para ampliar pesquisas referentes a essa temática, subsidiar a assistência de enfermagem quanto ao uso de MP no cuidado hospital-domicílio, propiciando promoção e recuperação da saúde do indivíduo, objetivando a redução das taxas de reinternação. Na perspectiva acadêmica, observa-se a escassez de pesquisas em enfermagem acerca dessa temática, ressaltando a relevância do estudo. No Brasil, é insuficiente o avanço de investigações acerca dos cuidados transicionais(1111 Acosta AM, Câmara CE, Weber LAF, Fontenele RM. Atividade do enfermeiro na transição do cuidado: realidades e desafios. Rev Enferm UFPE. 2018;12(12):190-7. https://doi.org/10.5205/1981-8963-v12i12a231432p3190-3197-2018
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). Essa abordagem ainda é pouco discutida, principalmente no que tange o planejamento de alta hospital-domicílio, ocasionando fragmentação no cuidado(1212 Lima MADS, Magalhães AMM, Oelke ND, Marques GQ, Lorenzini E, Weber LAF, et al. Estratégias de transição de cuidados nos países latino-americanos: uma revisão integrativa. Rev Gaúcha Enferm. 2018;39:e20180119. https://doi.org/10.1590/1983-1447.2018.20180119
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).
OBJETIVO
Apreender como ocorre o cuidado transicional de enfermeiras ao idoso com marcapasso artificial.
MÉTODOS
Aspectos éticos
A pesquisa obedeceu aos preceitos éticos e legais no que se refere à Resolução 466/12 e suas complementares. O estudo garantiu o anonimato das participantes, utilizando codinomes de deusas gregas como forma de homenagear as enfermeiras pela força feminina, por serem consideradas mulheres poderosas, corajosas, com múltiplas motivações e habilidades, vinculadas ao amor, sabedoria e divindade.
Tipo de estudo
Pesquisa qualitativa, que ressalta a compreensão dos processos, não se detendo apenas aos resultados, incluindo a singularidade em um contexto histórico e social mais ampliado(1313 Minayo MCS, Guerriero ICZ. Reflexividade como éthos da pesquisa qualitativa. Ciênc Saúde Coletiva. 2014;19(4):1103-12. https://doi.org/10.1590/1413-81232014194.18912013
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), fundamentada na Teoria das Transições de Afaf Meleis(1010 Meleis AI. Theorical nursing: development e progress. 4. Ed. Philadelphia: Lippincott; 2007. 832p.),que denota a transição como alterações no estado de saúde do indivíduo, nas relações de papeis, expectativas ou habilidades. Compreende a transição como passagem de um estado, condição ou de um lugar para o outro, envolvendo um processo psicológico de adaptação a uma mudança que requer reorganização interior para adequar-se a novas circunstâncias. Essa teoria abrange três componentes: natureza das transições, condições para a transição e padrões de resposta, sendo uma transição saudável determinada pelos padrões de resposta por meio dos indicadores do processo e dos resultados(1414 Silva R, Carvalho A, Rebelo L, Pinho N, Barbosa L, Araújo, T, et al. Contributos do referencial teórico de Afaf Meleis para a enfermagem de reabilitação. Rev Investig Enferm [Internet]. 2019 [cited 2021 May 20];35-44. Available from: https://www.researchgate.net/publication/337313131_Contributos_do_referencial_teorico_de_Afaf_Meleis_para_a_Enfermagem_de_Reabilitacao
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). O estudo foi conduzido e estruturado com referência no COREQ (COnsolidated criteria for REporting Qualitative research)(1515 Tong A, Sainsbury P, Craig J. Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ): a 32-item checklist for interviews and focus groups. Int J Qual Health Care [Internet]. 2007 [cited 2020 Jul 01];19(6):349-57. Available from: https://academic.oup.com/intqhc/article/19/6/349/1791966
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).
Cenário do estudo
Estudo realizado em um hospital filantrópico de Salvador, Bahia, Brasil, reconhecido pelo ministério da saúde como um centro de alta complexidade, com referência em cardiologia além de outras especialidades, sendo o implante de MP um dos procedimentos realizado com regularidade. A pesquisa foi realizada nas unidades de internação que acolhem pacientes cirúrgicos e cardiológicos.
Fonte de dados
Os participantes da pesquisa consistiram em 14 enfermeiras, que prestam assistência nas unidades de internação especializadas em cardiologia e cirurgia. A escolha se fundamentou devido às enfermeiras admitirem os pacientes para o procedimento cirúrgico e fornecerem as orientações para alta hospitalar. Foram excluídas enfermeiras com mais de seis meses de experiência e com escala fixa no setor. Excluíram-se as que estavam afastadas do serviço por qualquer motivo no período da entrevista.
Coleta e organização de dados
A coleta ocorreu entre agosto e novembro de 2020 por meio de entrevista semiestruturada, utilizando questões fechadas, abarcando dados demográficos e sociais e três questões abertas de aproximação e investigação (O que você entende sobre cuidados de transição? Quando você inicia o planejamento de alta? Quais orientações de cuidados você fornece a pessoa idosa com MP cardíaco durante a internação para a transição hospital-domicílio?). Como forma de aprimorar a condução das entrevistas, antes de aplicar o instrumento às enfermeiras, foi realizado um teste com um grupo piloto e discutido com as autoras. As entrevistas foram conduzidas pela primeira autora e realizadas em salas privativas dentro de cada enfermaria, contando apenas com a presença da pesquisadora e da entrevistada individualmente, a fim de garantir o sigilo e privacidade das participantes, com duração que variou de cinco a 15 minutos. As participantes foram selecionadas por amostragem, de acordo a área de atuação e respectivas unidades que cuidam de pacientes no processo de implante de M P. As entrevistas foram realizadas face a face, não havendo recusa ou desistência em nenhum momento. Os dados foram gravados com auxilio de um gravador digital; após foram transcritos na íntegra.
Análise de dados
Os dados foram organizados ancorados no referencial metodológico do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC). Nesse contexto, as opiniões ou expressões individuais que apresentam sentidos semelhantes são agrupadas em categorias semânticas gerais, de modo a formar com conteúdos depoimento síntese, redigido na primeira pessoa do singular, como se tratasse de uma coletividade falando na pessoa de um indivíduo(1616 Lefreve F, Lefreve AMC. Discurso do sujeito coletivo: representações sociais e intervenções comunicativas. Texto Contexto Enferm. 2014;23(2):502-50. https://doi.org/10.1590/0104-07072014000000014
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).
A construção do DSC consiste na utilização de instrumentos como: expressões-chave (ECH), definidas como segmentos contínuos ou fragmentados, que têm por finalidade expor o conteúdo de uma resposta a uma questão de pesquisa, evidenciando a essência do depoimento que remete à ideia central. Ideias centrais (IC) sintetizam o sentido apresentado nas ECH(1717 Almeida GBS, Paz EPA, Silva GA. Representações sociais sobre hipertensão arterial e o cuidado: o discurso do sujeito coletivo. Acta Paul Enferm. 2011;24(4):459-65. https://doi.org/10.1590/S0103-21002011000400003
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). A análise de dados foi realizada por meio da identificação das opiniões das enfermeiras, com sentidos semelhantes caracterizando as IC e ECH. Esses dados foram agrupados dentro das categorias, conforme a similaridade, dando origem ao discurso coletivo.
No seguimento metodológico, a análise do material verbal inteirados pelas enfermeiras possibilitou extrair dos depoimentos as IC e ECH, viabilizando a composição do discurso-síntese ou DSC.
RESULTADOS
Fizeram parte do estudo 14 enfermeiras, todas do sexo feminino, e com média de idade de 37 anos. A maioria era solteira (n=11), com nível de escolaridade pós-graduação (n=13), tempo de formação de 10 anos acima (n=9), tempo de experiência na unidade com perfil cardiológico e cirúrgico acima de 05 anos (n=9).
Os discursos coletivos das enfermeiras no cuidado à pessoa idosa com MP cardíaco no processo transicional hospital-domicílio ressaltam a prioridade do cuidado na perspectiva dessas profissionais, evidenciando as fragilidades do planejamento do cuidado. Salientam-se fatores intervenientes que influenciam a dinâmica da transição do cuidado, potencializado pelo insipiente conhecimento das participantes sobre a abordagem. No entanto, ressalta-se a importância de um cuidado qualificado para atender às necessidades da pessoa idosa nesse contexto, haja vista a especificidade e importância do procedimento para manutenção e QV.
O Quadro 1 apresenta as IC dos discursos de enfermeiras sobre cuidado transicional à pessoa idosa com MP artificial.
Ideias centrais dos discursos de enfermeiras sobre cuidado transicional à pessoa idosa com marcapasso artificial, Salvador, Bahia, Brasil, 2020
IC- 1 Início do planejamento de alta
Os discursos evidenciam que a maioria das enfermeiras inicia o planejamento de alta hospitalar no momento da admissão e utilizam como instrumento um plano de alta multidisciplinar. Entretanto, afirmam que o tempo de permanência dos pacientes nessas unidades é curto entre a unidade de internação e o centro cirúrgico, propendendo na rapidez das orientações.
As orientações de alta são iniciadas desde a admissão, eu termino dando as orientações de cuidados de forma muito rápida, porque o tempo de internamento é muito curto. O paciente entra em um dia, implanta o MP, e sai no outro. Começo preparando-o desde a admissão. A colocação do MP é um procedimento rápido, então tem que ser iniciado desde a hora que ele chega. Quando eu vou coletar os dados dele, já vou passando alguma informação [...] quando ele chega, eu já oriento. Eu já planejo a alta dele. Ao paciente ser admitido, eu aplico o protocolo multiprofissional de alta do paciente. Então, a programação da gente se inicia desde quando ele entra no hospital, quando ele é admitido! O plano de cuidados é feito a partir do momento em que ele interna. Eu já inicio uma orientação sobre o que vai acontecer com ele. Normalmente, quando vai implantar o MP, não demora, é questão de 02 dias. Eu já planejo desde o início. (Artémis; Atena; Deméter; Héstia; Hemera; Tálassa; Tétis; Réia)
No entanto, apesar de a maioria das enfermeiras iniciar o planejamento de alta hospitalar no momento da admissão, há um considerável número de profissionais que realiza as orientações no pós-procedimento ou na iminência da alta hospitalar.
Quando o paciente retorna da cirurgia, eu faço o planejamento de alta, orientando em relação aos cuidados que ele vai ter com o MP. A teoria, às vezes, não condiz muito com a nossa prática, esse relatório é feito no dia da alta hospitalar. A estadia dele aqui não demora muito, no máximo um dia. Implanta o MP e próximo dia ele já sai. Então, na prática, eu costumo fazer essa orientação quando ele está saindo [...] quando ele recebe a alta. Eu oriento o paciente quando ele chega do centro cirúrgico [...] inicio o planejamento de alta desde o quando o paciente retorna da cirurgia, no pós-operatório imediato. Quando ele retorna, todos os cuidados que eu faço, deixo tanto a família quanto ele cientes. Eu já começo a atuar como alta mesmo. Ele geralmente recebe alta no outro dia. A partir do momento em que o médico informa que vai dar alta ao paciente, eu já faço o plano de alta. (Hera; Gaia; Nix; Febe; Mnemosine; Teia)
IC 2 Cuidado de continuidade
Os discursos das enfermeiras no tocante ao cuidado de transição desvelam que a maioria realiza esses cuidados de forma diminuta, não obstante apresente conhecimento técnico insuficiente acerca da temática. Nesse sentido, observa-se que as respostas inferem mais caráter dedutivo do que científico.
Eu entendo como o momento em que o paciente sai do hospital para casa. Aquela transição na qual ele vai deixar de ter os cuidados da equipe para realizar os cuidados sozinhos ou com a ajuda de algum familiar. É o cuidado que já teve início, o qual a gente vai dar continuidade e orientar para o pós, ou seja, em domicílio ou em asilo. Quando uma determinada pessoa está em uma situação e ela vai passar para outra que necessita de alguma orientação. São os cuidados que eu ensino ao paciente e a família para ele ter autonomia, para dar continuidade em casa. Eu acho que cuidados de transição são cuidados que envolvem tanto o pré, trans e pós procedimento. Cuidados prestados a partir do momento em que o paciente sai da unidade hospitalar e vai para casa. Transição, para mim, é isso, entre uma coisa e outra. [...] aquele cuidado que eu começo no hospital preparando o paciente e o familiar para o cuidado domiciliar. Entendo que sejam cuidados de continuidade. (Artemis; Atena; Deméter; Héstia; Gaia; Nix; Febe; Reia)
IC 3 Orientações de cuidado
Acerca das orientações de cuidado na internação para a transição hospital-domicílio, os discursos relatam que as orientações das enfermeiras consistem, predominantemente, em informações a respeito da carteira de identificação do MP, bem como no cuidado com ferida operatória. Encontram-se de forma muito remota orientações referentes a sinais de alerta sobre possíveis complicações, ressaltando, no discurso das enfermeiras, a prioridade do cuidado com a ferida operatória e uso da carteira de identificação de M P.
IC 3.1 Carteira de identificação do marcapasso
As orientações começam com a documentação, ele tem que manter o uso carteirinha. [...] eu sempre oriento manter a carteirinha como um documento, porque, na carteirinha, vão constar os dados referentes ao dispositivo que foi implantado. Geralmente, quando o paciente chega, a primeira coisa que eu faço é retirar o manual da carteirinha e entregar ao paciente ou ao familiar e peço para que leiam as instruções. Oriento sempre que ele for para ambientes que contêm portas giratórias, levar a identificação do cartão de MP. Eu entrego o cartão contendo todas as informações relacionadas ao marcapasso e esclareço que precisa ter cuidado com aqueles documentos. Peço para o paciente e o familiar lerem o manual e destacarem as informações que eles têm curiosidade, se pode usar celular, elevador, porta giratória. Andar sempre com a carteirinha de identificação do marcapasso, porque têm lugares que pode impedir dele entrar. (Artemis; Atena; Hera; Héstia; Gaia; Hemera; Tétis; Mnemosine; Teia; Reia)
IC 3.2 Ferida operatória
Oriento realizar o curativo. Geralmente, oriento tirar o curativo após 02 dias, lavar com água e sabão e secar com um pano limpo. Como é uma cirurgia simples, eu peço que ele mantenha o curativo até uns dois dias após a cirurgia, e depois pode deixar descoberto, se não tiver nenhum sinal de secreção. Pode tomar banho normal com água e sabão e enxugar direitinho. É uma lesão que geralmente é seca, não tem muitas complicações. Eu oriento que, se estiver sangrando, ainda lavar com água e sabão e manter coberta até parar de sangrar. É uma incisão cirúrgica, então, eu mantenho esse curativo coberto, mas deixo a orientação para no dia posterior, no momento do banho, fazer a retirada desse curativo, realizar lavagem do local com água e sabão. E, normalmente, forneço a clorexidina para depois ele aplicar no local. Observar sinais de infecção se está drenando secreção, se tem hiperemia, se vai perceber algum edema, equimose além do comum. A princípio, oriento fazer o curativo uma vez ao dia, manter curativo sempre seco, coberto nas primeiras 24h. (Artemis; Atena; Deméter; Hera; Héstia; Gaia; Nix, Hemera; Tálassa; Febe; Tétis)
Para além dos cuidados com a carteira do MP e a ferida operatória, identificam-se orientações a despeito de possíveis complicações pós-implante do MP.
Informo sobre sinais e sintomas que ele possa vir sentir e o que eles devem fazer caso aconteça. Se tiver algum sinal e sintoma fora do esperado, deve procurar o hospital. Oriento que, se sentir alguma coisa, sentir alguma fraqueza, tontura, ficar quietinho, não andar e chamar seu familiar [...]. O familiar já sabe que se ele sentir alguma coisa deve voltar para a emergência, porque está no pós-operatório, deve informar ao médico assistente que está tendo algum probleminha. Eu oriento a ele falar à família se sentir desconforto para ser encaminhado para o pronto atendimento, porque tem idoso que oculta. (Tétis; Mnemosine; Reia)
Considerando a abordagem teórica de Afaf Meleis, compete à enfermagem enquanto ciência atender aos múltiplos focos de interesse e intervir no processo, a fim de facilitar a transição das pessoas, família e comunidade através do cuidado centrado nas experiências em transição, tendo como resultado a saúde e bem-estar dos indivíduos(1414 Silva R, Carvalho A, Rebelo L, Pinho N, Barbosa L, Araújo, T, et al. Contributos do referencial teórico de Afaf Meleis para a enfermagem de reabilitação. Rev Investig Enferm [Internet]. 2019 [cited 2021 May 20];35-44. Available from: https://www.researchgate.net/publication/337313131_Contributos_do_referencial_teorico_de_Afaf_Meleis_para_a_Enfermagem_de_Reabilitacao
https://www.researchgate.net/publication...
). Por meio dos resultados deste estudo, observa-se a fragilidade na atuação das enfermeiras para abarcar os cuidados transicionais na sua totalidade, conforme postula essa teoria.
DISCUSSÃO
O estudo apresentado tem representatividade feminina, reafirmando o que as pesquisas salientam acerca das questões de gênero no âmbito da enfermagem. A equipe de enfermagem possui predominância feminina, composta por 84,6% de mulheres(1818 Conselho Federal de Enfermagem. Pesquisa inédita traça perfil de enfermagem [Internet]. COFEN; 2015[cited 2020 Jul 01]. Available from: http://www.cofen.gov.br/pesquisa-inedita-traca-perfil-da-enfermagem_31258.html
http://www.cofen.gov.br/pesquisa-inedita...
).
O discurso das enfermeiras sobre cuidado à pessoa idosa com MP artificial na transição hospital-domicílio desvela os aspectos relevantes dos cuidados transicionais nessa perspectiva, evidenciando algumas lacunas desses cuidados, corroborados na literatura como fragilidades nesse processo. Um dos fatores dificultadores para a adequação desses cuidados é a insipiência de estudos acerca da transição do cuidado e, por conseguinte, a insuficiência do conhecimento das enfermeiras sobre a temática observada nos discursos.
A aplicabilidade do cuidado transicional ainda é um processo em construção e adaptação em diversos países, com carência em investigação principalmente no Brasil(88 Weber LAF, Lima MADS, Acosta AM, Marques GQ. Transição do cuidado do hospital para o domicílio: revisão integrativa. Cogitare Enferm. 2017;22(3):1-11. https://doi.org/10.5380/ce.v22i3.47615
https://doi.org/10.5380/ce.v22i3.47615...
). A literatura evidencia o enfermeiro como profissional mais envolvido no cuidado transicional do hospital para o domicílio, no entanto, observa-se pouco conhecimento desse profissional sobre a temática e não reconhecimento da transição do cuidado como uma de suas atribuições(1111 Acosta AM, Câmara CE, Weber LAF, Fontenele RM. Atividade do enfermeiro na transição do cuidado: realidades e desafios. Rev Enferm UFPE. 2018;12(12):190-7. https://doi.org/10.5205/1981-8963-v12i12a231432p3190-3197-2018
https://doi.org/10.5205/1981-8963-v12i12...
).
Ancorado na teoria das transições de Afaf Meleis, a qual defende a “transição” como um conceito central na enfermagem e nessa perspectiva, salienta-se que a saúde e o bem-estar resultam da intervenção de enfermagem(1919 Ribeiro OMPL, Martins MMFPS, Tronchin DMR, Forte ECN. O olhar dos enfermeiros portugueses sobre os conceitos metaparadigmáticos de enfermagem. Texto Contexto Enferm. 2018;27(2):1-9. https://doi.org/10.1590/0104-070720180003970016
https://doi.org/10.1590/0104-07072018000...
), compreendendo a ineficiência dos cuidados de continuidade, haja vista a evidência do despreparo das enfermeiras no contexto da transição.
Estudo realizado com 40 pacientes transplantados no Brasil e Espanha que seguiam em acompanhamento ambulatorial demonstrou que uma transição qualificada requer um planejamento de alta precoce, realizado no momento da admissão. O planejamento de alta hospitalar consiste em orientações de enfermeiras sobre diversos aspectos dos cuidados a serem praticados no domicílio. Diante da amplitude desses cuidados, é necessário dar início antes da alta, com vistas a garantir que o usuário e o cuidador tenham tempo para assimilar as informações necessárias para continuidade em domicílio(2020 Nunes SS, Montesinos MJL, Pedroso VSM, Tolfo F, Bick MA, Siqueira HCH. Adesão às orientações do enfermeiro para cuidado domiciliar do transplantado de medula óssea na perspectiva ecossistêmica. Texto Contexto Enferm. 2020;29:e20180310. https://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2018-0310
https://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-20...
).
Embora, nos discursos, a maioria das enfermeiras relate que realize essa preparação na entrada dos pacientes, ainda se observa uma quantidade significativa de profissionais que não atuam do mesmo modo. Assim, essas orientações são passadas no pós-operatório imediato ou quando esses idosos estão saindo da unidade hospitalar. As orientações de alta realizadas pelas enfermeiras, em sua maioria, são efetuadas na iminência da alta hospitalar, sem considerar as condições e necessidades individuais do paciente e família, tornando difícil a compreensão e comprometimento dos cuidados(2121 Martins K P, Costa KNF, Oliveira DST. Atuação do enfermeiro no preparo para a alta hospitalar de pacientes cirúrgicos. Rev Pesqui: Cuid Fundam. 2015;7(1):1756-64. https://doi.org/10.9789/2175-5361.2015.v7i1.1756-1764
https://doi.org/10.9789/2175-5361.2015.v...
).
Para facilitar a gestão do cuidado, a enfermeira utiliza a SAE, e esta tem como uma das etapas o plano de alta, o qual fornece subsídios para qualificar a continuidade dos cuidados. A SAE contribui para mitigar complicações, elaborar um plano de cuidados, preparar a alta, além de promover a orientação do paciente e familiar para os cuidados domiciliares. Por meio do plano de alta, é possível facilitar a transição do paciente nos serviços de saúde e garantir a continuidade do cuidado(2222 Costa MFBNA, Ciosak SI, Andrade SR, Soares CF, Pérez EIB, Bernadino E. Continuidade do cuidado da alta hospitalar para atenção primária a saúde: a prática espanhola. Texto Contexto Enferm. 2020;29:e20180332. https://doi.org/10.1590/1980-265X-TCE-2018-0332
https://doi.org/10.1590/1980-265X-TCE-20...
).
O relatório de alta de enfermagem, atualmente também conhecido como relatório de cuidados continuados, é um documento facilitador no planejamento de alta, como mencionado pelas enfermeiras nos discursos. Esse relatório inclui os fundamentos do processo de enfermagem para admissão do paciente, garantindo a continuidade dos cuidados e contribuindo para o acompanhamento dos pacientes(2323 Seva-Llor AM, Montesinos MJL, Ortega CB, Cecagno D, Roche F P. Relatório de Enfermagem no hospital. Acta Paul Enferm. 2015;28(2):101-6. https://doi.org/10.1590/1982-0194201500018
https://doi.org/10.1590/1982-01942015000...
). Todavia, ressalta-se a importância da atuação da enfermeira para elucidação do relatório de alta ao paciente e familiar/cuidador quanto às técnicas, procedimentos e rede de apoio, com vistas a assegurar a continuidade desses cuidados em domicílio.
A teoria das transições de Meleis propõe as enfermeiras atuarem na prevenção de riscos, melhora do bem-estar, maximizar o funcionamento e reproduzir atividades de autocuidado. Nesse sentido, integra uma sequência linear de ações com avaliação, planejamento e implementação, abrangendo todo período de transição; desta forma, detecta precocemente dificuldades em pontos críticos do processo(2424 Costa LGF. Visitando a teoria das transições de Afaf Meleis como suporte teórico para o cuidado de enfermagem. Enferm Bras. 2016;15(3):137-45. https://doi.org/10.33233/eb.v15i3.181
https://doi.org/10.33233/eb.v15i3.181...
). Para implementar esse cuidado ideal, a enfermagem tem como interveniente a alta demanda laboral e consequente escassez de tempo.
Pacientes idosos submetidos a tratamento cirúrgico, como implante de MP cardíaco definitivo, requerem cuidados específicos no domicílio. A atenção dos profissionais deve estar centrada nos diversos aspectos que envolvem essa abordagem e que interferem na QV desses indivíduos, sejam físicos, sociais, emocionais, psicológicos ou espirituais. Aos pacientes com indicação de M P, diversos valores são assumidos partindo da percepção de um coração fraco, dependente do funcionamento de um aparelho para manutenção da vida(2525 Neves RRS, Silva IS. A qualidade de vida de pacientes com Marcapasso. In: Anais do VI SIMPAC, 2016; Viçosa-MG, Brasil. Univiçosa; 2016;8(1):50-4.). Esses indivíduos, geralmente, experienciam sentimentos de ansiedade, depressão e medo, com perspectivas negativas em relação ao futuro(2626 Alievi GJP, Roman EP, Lise AMR. Aspectos que envolvem a ansiedade em pacientes pré e pós-operatórios da cirurgia cardíaca: as eventuais complicações e o prognóstico clínico em uma abordagem teórica. Rev Thêma Sci[Internet]. 2017[cited 2020 Dec 10];7(2):197-208. Available from: http://www.themaetscientia.fag.edu.br/index.php/RTES/article/view/770
http://www.themaetscientia.fag.edu.br/in...
).
Os cuidados e orientações ao paciente com MP definitivo são específicos e facilitam a aceitação e adaptação do novo estilo de vida. Desse modo, a enfermeira atua fundamentalmente, uma vez que está em contato contínuo com esses indivíduos, assumindo papel de educador em saúde, com vistas a fornecer orientações necessárias, capacitando a realização do autocuidado e enfrentamento das dificuldades em curto e longo prazo, contribuindo para a independência, autonomia e melhora da QV(2727 Santos JEM, Brasil VV, Moraes KL, Cordeiro JABL, Oliveira GF, Bernardes C, et al. Legibilidade de prospecto facilitador e letramento em saúde de indivíduos com marcapasso. Rev Bras Enferm. 2017;70(3):661-7. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0336
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0...
). Todavia, neste estudo, nota-se que as enfermeiras entrevistadas se atêm a cuidados relacionados à carteira de identificação de MP e à loja do MP, sem considerar os outros aspectos, também relevantes, para a recuperação e reabilitação.
Outro aspecto importante a ser considerado pelas enfermeiras se refere às orientações sobre possíveis complicações decorrentes do implante de MP na pessoa idosa no pós-operatório no domicílio. O pós-operatório compreende um período delicado para paciente e a família, uma vez que envolve aspectos psicológicos, emocionais e físicos que influenciam a recuperação. Nessa fase, a orientação em saúde deve ser utilizada a fim de desenvolver a independência do paciente durante a recuperação pós-cirúrgica e proporcionar conhecimentos que permitam a identificação precoce de sinais e sintomas de possíveis complicações(2828 Santos FDRP, Silva JO, Nunes SFL, Pascoal LM, Lima PM. Relação entre orientação em saúde e complicações no pós-operatório de cirurgias torácicas e abdominais altas. Rev Pesqui: Cuid Fundam. 2020;12:253-7. https://doi.org/10.9789/2175-5361.rpcfo.v12.8321
https://doi.org/10.9789/2175-5361.rpcfo....
). As entrevistadas desta pesquisa pouco mencionaram orientações acerca das complicações, além da falta de esclarecimento sobre como conduzir o retorno desses pacientes e a quem contatar em caso de necessidade.
Diante da complexidade das cirurgias cardiovasculares, existem altas taxas de readmissão hospitalar. Dessa forma, o cuidado transicional se torna essencial e exige planejamento e educação em saúde para assegurar a assistência domiciliar. Nesse contexto, a enfermeira atua na coordenação e execução dos cuidados transicionais hospital-domicílio(2929 Santos TL, Laprano MGG, Conceição A P. Orientações de alta hospitalar para o desempenho do autocuidado após a cirurgia cardíaca: revisão integrativa. Rev Baiana Enferm. 2020;34:e35284. https://doi.org/10.18471/rbe.v34.35284
https://doi.org/10.18471/rbe.v34.35284...
).
A teoria de Meleis reitera o papel das enfermeiras como principais cuidadoras de clientes e familiares em processo de transição. Nesse sentido, são quem prepara os pacientes para as transições iminentes, facilitando o aprendizado de novas habilidades relacionadas às experiências de saúde e doença(3030 Meleis AI, Sawyer LM, Im EO, Messias DKH, Schumacher K. Experiencing transitions: an Emerging Middle Range Theory. ANS. 2000;23(1):12-28. https://doi.org/10.1097/00012272-200009000-00006
https://doi.org/10.1097/00012272-2000090...
).
As orientações de cuidados à pessoa idosa com MP aludidas pelas enfermeiras neste estudo não abarcam informações acerca do dispositivo cardíaco eletrônico implantável (DCEI) e isso reflete a falta de conhecimento das enfermeiras sobre o funcionamento e tecnologias que envolvem o M P. A prática clínica evidencia o desconhecimento dos pacientes e profissionais acerca da segurança e dos recursos envolvidos na tecnologia dos DCEI(3131 Vianna MS, Silqueira SMF, Luz AR, Ignácio FL, Correa AR, Mattos SS. Plano de orientações a pacientes após o implante de dispositivos cardíacos eletrônicos implantáveis. Relampa [Internet]. 2014[cited 2020 Dec 5];27(1):27-33. Available from: https://jca.emnuvens.com.br/jca/article/view/2442.
https://jca.emnuvens.com.br/jca/article/...
). De acordo com a literatura, compete à enfermeira compreender o funcionamento do dispositivo, identificar traçados eletrocardiográficos, o processo fisiopatológico da doença, bem como ter conhecimento técnico abrangente(3232 Vieira TC, Simonetti SH, Kobayashi RM. Validação das competências do enfermeiro nos cuidados com portadores de marca-passo. Nursing[Internet]. 2019[cited 2020 Nov 5];22(255):3095-3100. Available from: https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/biblio-1025985
https://pesquisa.bvsalud.org/portal/reso...
).
As enfermeiras reportam, neste estudo, o excesso de demanda associado ao curto período de permanência desses pacientes nas unidades de internação como obstáculos na transição desses cuidados, uma vez que as informações são transmitidas com celeridade. Em sua rotina, a enfermeira possui pouca disponibilidade para orientar o paciente e sua família em tempo hábil, antecedente à alta hospitalar(3333 Coli, M; Zani, AV. Validação de um plano de alta de enfermagem para gestantes e puérperas de alto risco. Rev Min Enferm. 2016;20: e934. https://doi.org/10.5935/1415-2762.20160004
https://doi.org/10.5935/1415-2762.201600...
). As orientações de alta são restritas, realizadas, em sua maioria, por médicos e enfermeiros, em tempo reduzido sem considerar a completude das necessidades do paciente(3434 Fontana G, Chesani FH, Nalin F. Percepções dos profissionais da saúde sobre o processo de alta hospitalar. UNIFEBE[Internet]. 2017 [cited 2021 Jan 20];1(21). Available from: https://periodicos.unifebe.edu.br/index.php/revistaeletronicadaunifebe/article/view/491
https://periodicos.unifebe.edu.br/index....
).
A teoria das transições de Meleis ressalta a importância das estratégias utilizadas pelo enfermeiro no contexto da pessoa idosa, tendo em vista o aumento desta população, objetivando cuidar e apoiar esses indivíduos a alcançar uma vida saudável(3535 Meleis AI. Trangenstein PA. Facilitating Transitions: redefinition of the Nursing Mission. In: Transitions Theory: Middle-Range and Situation-Specific Theories in Nursing Research and Practice. New York: Springer Publishing Company; 2010.).
Em face dessa realidade, o cuidado da enfermeira ao idoso com MP cardíaco requer conhecimento abrangente e habilidades específicas que subsidiem a preparação desse paciente para a prática segura do autocuidado em domicílio, reduzindo as taxas de readmissão hospitalar. O cuidado ao paciente submetido à cirurgia cardíaca exige do enfermeiro intensificação de conhecimentos e cuidados fundamentados nas necessidades técnico-científicas, cirúrgicas, emocionais e psicossociais, viabilizando a qualidade do período pós-operatório(3636 Santos APA, Laus AM, Camelo SHH. O trabalho da enfermagem no pós-operatório de cirurgia cardíaca: uma revisão integrativa. ABCS Health Sci. 2015;40(1):45-52. https://doi.org/10.7322/abcshs.v40i1.703
https://doi.org/10.7322/abcshs.v40i1.703...
). Nessa perspectiva, a enfermeira intervém favorecendo a educação em saúde do paciente e cuidador, contribuindo para sua recuperação(3737 Malheiro IC, Carmo TG, Cavalcante ACD, Flores PVP. Intervenções de enfermagem no pós-operatório de cirurgia cardíaca. Res Soc Dev. 2020;9(7):1-18. https://doi.org/10.33448/rsd-v9i7.4080
https://doi.org/10.33448/rsd-v9i7.4080...
). A atenção holística que abrange os aspectos biopsicossocioespirituais ainda é um processo em desenvolvimento no âmbito da enfermagem brasileira, principalmente no tocante do implante de M P, devido ao curto período de permanência hospitalar. Entretanto, sabe-se que é possível iniciar esses cuidados precocemente estendendo para acompanhamento pós-alta, como já ocorre em outros países. Diante do exposto, a teoria das transições de Afaf Meleis coaduna para a fundamentação desse estudo, dado que a pessoa idosa, quando submetida a um implante de MP artificial, permeia por fases distintas de perdas, benefícios e adaptação do paciente e família, denotando mudanças no estado de saúde e a preparação antecipada facilita a experiência da transição.
Limitações do estudo
Considerando que o estudo foi desenvolvido nas unidades de internação que acolhem pacientes cirúrgicos e cardiológicos de hospital filantrópico de Salvador, Bahia, Brasil, impossibilita generalizar os resultados para todas as enfermeiras. No entanto, este estudo pode ser replicado em outros grupos de enfermeiras que vivenciam dinâmicas similares à dos participantes desta pesquisa, possibilitando a discussão das informações, bem como a melhoria do serviço e qualidade da assistência.
Contribuições para a área da enfermagem e da saúde
Os resultados desta pesquisa contribuem para ampliar o conhecimento de enfermeiras no que tange o cuidado transicional ao idoso ao apontar lacunas que precisam ser sanadas e/ ou minimizadas, a fim de promover cuidados específicos para este público por meio de ações futuras que auxiliem na operacionalização da SAE no que concerne aos cuidados transicionais. Além disso, espera-se que os resultados apresentados subsidiem novas produções científicas apoiadas em tecnologias voltadas para a promoção do cuidado transicional de enfermeiras ao idoso com MP artificial.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo apontou que as enfermeiras envolvidas no cuidado transicional ao idoso com MP artificial exercem esse cuidado sem fundamentação teórica, não considerando alguns aspectos que compõem a integralidade dos indivíduos; assim, ressaltam tecnicamente os cuidados direcionados ao dispositivo cardíaco, como o uso da carteira de identificação do MP e a ferida operatória. Além disso, a rapidez nas orientações, justificada pela alta demanda da prática e tempo de permanência desses pacientes nas unidades, constitui uma das fragilidades para o cuidado transicional, haja vista a importância da completude das orientações a fim de assegurar a continuidade da assistência.
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Editado por
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
26 Nov 2021 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
-
Recebido
14 Mar 2021 -
Aceito
26 Jun 2021