RESUMO
Objetivo: Construir e validar conteúdo de um instrumento para realização de auditoria clínica de prontuários; realizar pré-teste.
Métodos: Estudo metodológico, realizado de maio/2020 a maio/2021 em três etapas: 1) construção do instrumento por levantamento bibliográfico e benchmarking; 2) validação de conteúdo pela técnica Delphi; 3) aplicação do instrumento e análise descritiva em uma amostra de 200 prontuários.
Resultados: Construiu-se um instrumento com 11 domínios contendo subitens que caracterizam a qualidade da assistência. Para chegar ao índice de validade de conteúdo superior a 0,90, foram necessárias duas etapas da técnica Delphi. Para cada domínio, atribuiu-se uma escala graduada com valor numérico de 1 a 4 pontos, refletindo a qualidade do preenchimento. O tempo médio de aplicação foi de 35 minutos por prontuário.
Conclusões: O instrumento construído demonstrou-se viável para embasar a auditoria clínica na identificação do nível de excelência ou oportunidades de melhoria em processos assistenciais.
Descritores: Segurança do Paciente; Prontuários; Estudos de Validação; Gestão da Qualidade; Auditoria Clínica
ABSTRACT
Objective: To build and validate the content of an instrument to conduct medical record audits; to conduct a pre-test.
Methods: Methodological study conducted from May/2020 to May/2021 in three stages: 1) development of the instrument by bibliographic survey and benchmarking; 2) content validation using the Delphi technique; 3) application of the instrument and descriptive analysis in a sample of 200 medical records.
Results: An instrument was constructed with 11 domains containing sub-items that characterize the quality of care. Two stages of the Delphi technique were necessary to reach a content validity index higher than 0.90. For each domain, a graduated scale with a numerical value from 1 to 4 points was attributed, reflecting the quality of its completion. The average time of application was 35 minutes per record.
Conclusions: The tool proved to be viable to support clinical audits to identify the level of excellence and reveal opportunities for improvement in care processes.
Descriptors: Patient Safety; Medical Records; Validation Study; Total Quality Management; Clinical Audit
RESUMEN
Objetivo: Construir y validar contenido de un instrumento para realización de auditoría clínica de prontuarios; realizar pre-test.
Métodos: Estudio metodológico, realizado de mayo/2020 a mayo/2021 en tres etapas: 1) construcción del instrumento por análisis bibliográfico y benchmarking; 2) validación de contenido por la técnica Delphi; 3) aplicación del instrumento y análisis descriptivo en una muestra de 200 prontuarios.
Resultados: Construido un instrumento con 11 dominios conteniendo subitems que caracterizan la calidad de la asistencia. Para llegar al índice de validez de contenido superior a 0,90, fueron necesarias dos etapas de la técnica Delphi. Para cada dominio, atribuido una escala graduada con valor numérico de 1 a 4 puntos, reflejando la calidad del relleno. El tiempo mediano de aplicación fue de 35 minutos por prontuario.
Conclusiones: El instrumento construido se demostró viable para basar la auditoría clínica en la identificación del nivel de excelencia o oportunidades de mejoría en procesos asistenciales.
Descriptores: Seguridad del Paciente; Registros Médicos; Estudio de Validación; Gestión de la Calidad Total; Auditoría Clínica
INTRODUÇÃO
A acreditação hospitalar é um processo de padronização voluntário, constante e reservado de avaliação dos recursos de instituições de saúde para garantir a excelência da assistência por meio de padrões previamente aceitos(1). Durante esse processo, o prontuário do paciente é um dos documentos inexoráveis à avaliação, pois tem importância quando analisado e auditado, por evidenciar processos assistenciais relacionados à segurança ao paciente, efetivos no processo da gestão da qualidade(2).
O prontuário do paciente é uma documentação clínica essencial no percurso diagnóstico e terapêutico do paciente, a fim de facilitar a prestação e a continuidade do cuidado seguro; promove uma comunicação estruturada e eficaz entre os membros da equipe multidisciplinar, assegurando a qualidade do atendimento e apoiando a melhoria dos processos, além de servir como um meio de pesquisa(3-4).
Dessa forma, os prontuários devem refletir a qualidade dos cuidados prestados enquanto instrumentos que devem ser auditados para coletar e corrigir desperdícios, irregularidades, negligências e omissões(5). Além disso, sua gestão adequada com a manutenção de registros precisos e abrangentes torna-se cada vez mais importante para a administração hospitalar e demandas judiciais, bem como na avaliação do grau de excelência da instituição(6-7).
Nesse contexto, a auditoria clínica é considerada um programa de melhoria contínua, que envolve a coleta de informações nos prontuários dos pacientes e beira-leito, podendo ser de forma prospectiva e/ou retrospectiva por meio de várias etapas cíclicas(5). Enquanto ferramenta da Governança Clínica, tem a potencialidade de promover a mudança e melhoria da qualidade dentro das organizações de saúde, por ser um método robusto e que abrange a avaliação da prática clínica multidisciplinar(8-9).
Segundo a definição do NHS (National Healthcare Service), a Governança Clínica representa um modelo de melhoria contínua da qualidade dos serviços e manutenção da excelência no atendimento ao paciente. Os sete pilares da Governança Clínica são: Educação; Auditoria clínica; Eficácia/efetividade clínica; Gerenciamento de riscos; Pesquisa e desenvolvimento; Experiência do paciente; Transparência(10-11).
Sendo assim, a auditoria clínica é um pilar da Governança Clínica que visa avaliar e melhorar o desempenho clínico em relação aos padrões previamente estabelecidos, resultando no refinamento da prática clínica(11).
A auditoria clínica de prontuários possibilita identificar problemas, definir critérios de avaliação, realizar coleta e análise de dados, implantar mudanças e finalizar com a reauditoria do processo crítico, dentre os processos assistenciais(11).
Atrelado a isso, a auditoria clínica contribui para a eficácia/efetividade clínica, outro pilar da Governança Clínica. Diante do cenário atual, o foco das instituições de saúde tem sido buscar um equilíbrio entre os valores clínicos e os valores econômicos, ou seja, reduzir os custos e, ao mesmo tempo, aprimorar a qualidade e a segurança do atendimento(8).
Desse modo, a efetividade clínica é definida como a aplicação dos melhores conhecimentos, obtidos com base em evidências científicas, experiência clínica dos profissionais e nas preferências do paciente, visando alcançar a excelência dos processos e resultados(10). Para isso, é preciso aplicar a prática de auditoria clínica com a intenção de verificar a implementação das medidas e padrões que são estabelecidos pela instituição(10).
Ao se verificar se a assistência prestada está de acordo com o critério que a padroniza, se os processos de trabalho estão em conformidade com o que é preconizado, a auditoria clínica permite o desenvolvimento da educação contínua com a equipe, a fim de garantir uma redução de custos no que envolve o cuidado e a prestação de um cuidado de excelência livre de danos(9).
Enquanto parte integrante do sistema de gestão da qualidade, que é uma atividade coordenada, voltada à gestão de processos para atingir excelência no atendimento da demanda dos pacientes, a auditoria clínica prioriza os critérios de grande volume, grande risco, alto custo e, quando pertinente, o envolvimento do paciente na avaliação da assistência prestada, com o foco no desenvolvimento de um ambiente cultural de melhoria da eficácia clínica, otimizando os resultados em saúde(11). Destaca se que a auditoria e o feedback são reconhecidos como estratégicos na melhoria do desempenho e apoio da segurança do paciente nas instituições de saúde(7).
Uma das prioridades da auditoria clínica são as Unidades de Terapia Intensiva (UTI), ressaltadas como unidades com alta complexidade de estrutura e atendimento, uma vez que lidam com pacientes criticamente debilitados demandando atendimento especializado e contínuo; logo, elas têm maior risco de eventos adversos(12-13). Tais eventos ocorrem devido a fatores técnicos, humanos e institucionais e merecem uma atenção prioritária na análise, pois os pacientes em estado grave apresentam particularidades que os tornam mais susceptíveis a eventos fatais(12-13).
Em vista disso, destaca-se a importância de realizar a auditoria clínica em unidades de atendimento intensivo, no intuito de avaliar a prática clínica da equipe multidisciplinar e oferecer aos gestores e profissionais de saúde uma análise do desempenho clínico, da eficiência e eficácia clínica dos processos padronizados pela organização de saúde(6).
Enquanto lacuna quando o assunto é a auditoria clínica, é realçada a inexistência de instrumentos de medida que auxiliem essa prática(14). A construção de ferramentas de medição válidas para verificar a adequação do conhecimento e dos processos assistenciais é um grande passo para garantir uma assistência de excelência nas instituições de saúde(15). Para tanto, é fundamental o processo de construção e validação do conteúdo do instrumento, a fim de que cada item de avaliação seja relevante, abrangente e representativo em relação ao que se deseja avaliar(15).
Dessa forma, a construção e validação de conteúdo de uma ferramenta para realização da auditoria clínica são fundamentais, facilitando o processo de análise dos prontuários nas organizações de saúde. Com isso, melhora-se a qualidade dos processos e auxilia-se na criação de planos de ação que busquem barreiras para evitar a recorrência de falhas, promovendo a cultura de segurança do paciente e o fortalecimento dos programas de melhoria contínua da instituição.
OBJETIVO
Construir e validar o conteúdo de um instrumento para realização de auditoria clínica de prontuários; realizar seu pré-teste.
MÉTODOS
Aspectos éticos
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade onde foi realizado o estudo.
Desenho, local do estudo e período
Estudo metodológico, realizado em três fases, de maio de 2020 a maio de 2021:
-
Construção do instrumento, de maio a setembro de 2020;
-
Validação de conteúdo com a participação de experts, de janeiro a março de 2021;
-
Aplicação em uma amostra de 200 prontuários, de abril a maio de 2021.
Protocolo do estudo
Construção do instrumento
Para a construção, consideraram-se os critérios propostos por Pasquali: clareza, simplicidade e relevância(16-17). Foi levada em conta, também, a dimensionalidade do construto para avaliar a estrutura interna e a semântica do instrumento, a fim de definir se ele apresenta um único componente ou componentes diferentes e independentes de estudo(18).
Com base no que foi descrito acima, a construção do instrumento foi realizada por meio de um levantamento bibliográfico e um benchmarking sobre a temática em questão. O benchmarking é uma técnica que procura melhores práticas no mercado: consiste em aprender com outras organizações, buscando processos mais eficientes e ideias inovadoras para que as instituições obtenham um melhor desempenho das suas atividades(19).
Sendo assim, o benchmarking que embasou a construção do instrumento foi realizado previamente ao início do estudo, por experiência de sua pesquisadora principal, a qual possui cinco anos de experiência na Gestão da Qualidade. Esta é uma área responsável em controlar os processos e as atividades dentro das instituições de saúde. Tem por meta principal implantar as boas práticas assistenciais para melhorar os resultados da prática clínica(8), em organizações do estado de São Paulo que possuíam comissões de revisão de prontuários ativas e selos de acreditação hospitalar, conferindo uma alta confiabilidade e excelência no cuidado prestado. Ademais possuem informações imprescindíveis para a auditoria clínica.
Na construção do instrumento, foram propostos domínios e itens de avaliação relacionados aos processos assistenciais de excelência e às metas de segurança do paciente em pacientes críticos. Essas escolhas foram subsidiadas sob referenciais teóricos relacionados à governança clínica, segurança do paciente e cuidados intensivos(7-10,12-13).
A indicação de utilização do instrumento construído é para avaliar a qualidade do cuidado prestado mediante uma análise retrospectiva. Com isso, pode ser aplicado todos os profissionais de saúde que façam parte da comissão de revisão de prontuário e/ou do núcleo de segurança do paciente da instituição.
Validação do conteúdo
Na validação de conteúdo, procedeu-se à técnica Delphi com os profissionais convidados a atuar como especialistas para verificar sua concordância sobre a composição do instrumento de auditoria clínica em prontuários.
A técnica Delphi consiste em um método sistematizado de abordagem ampla e enriquecedora, na captação de ideias e conhecimentos, útil para obter consenso de especialistas sobre um tema definido, por meio de validações articuladas em fases(20). É um método acessível, pois permite a participação de especialistas ainda que distantes fisicamente(20). Essa técnica é realizada com base em fases consecutivas para a obtenção de concordância sobre o conteúdo do instrumento; e foi viabilizada por correio eletrônico com a apresentação do estudo e solicitação de julgamento do conteúdo do instrumento quanto à clareza e pertinência na redação de cada item(20).
Como critério de inclusão no painel da técnica Delphi, considerou-se: ter experiência em processos gerenciais e segurança do paciente; ser membro ou ter sido membro da comissão de revisão de prontuários; ser pesquisador com experiência na validação de instrumentos de medida. O tempo de experiência profissional inferior a seis meses foi o único critério de exclusão.
A identificação dos especialistas ocorreu por conveniência dos pesquisadores, mediante a identificação em rede social de negócios e participação em órgãos de avaliação de qualidade e segurança do paciente que preenchessem os critérios de inclusão para o estudo. Os especialistas foram contatados por meio de grupos de aplicativo de mensagens instantâneas e rede social de negócios.
A composição do grupo de especialistas foi de acordo com referências de validação de conteúdo e técnica Delphi(20-21); dessa forma, foram identificados sete juízes que atendiam aos critérios de inclusão para participar do julgamento do instrumento. A quantidade de especialistas variou no decorrer das duas etapas, sendo que dois deles estiveram apenas na primeira ou na segunda fase, totalizando a participação de nove especialistas. A categoria profissional do grupo de especialistas contemplou profissionais de nível superior (administração e enfermagem) nas mesmas áreas de atuação: segurança do paciente, atividades gerenciais, participação em comissão de prontuários e gestão da qualidade em saúde.
Após identificação e contato inicial por aplicativo e rede social, os especialistas receberam um e-mail com a explicação sobre os objetivos do estudo e importância de sua participação de acordo com sua experiência e atuação profissional. No e-mail, foram enviadas instruções para eles julgassem a relevância e a pertinência do instrumento e dos conceitos envolvidos. Depois de aceitarem participar, foram enviados os questionários, via Google Forms, analisados anonimamente(21).
A técnica Delphi foi realizada, em duas etapas, para alcançar o consenso dos especialistas. Após o recebimento do instrumento da primeira fase, foi realizada uma análise preliminar para determinar a sua composição e a validade de seus itens. Com base nessa análise, uma segunda versão foi elaborada, com as modificações sugeridas pelos especialistas da primeira fase. Foi enviado um novo e-mail a todos os que participaram da primeira fase, com a nova versão, um resumo da fase anterior e instruções para o julgamento do conteúdo com vistas a evitar o desvio dos pontos centrais do instrumento.
Procedimento de coleta de dados
O procedimento de coleta de dados se deu em uma instituição privada do interior do estado de São Paulo, de pequeno porte, com demanda de pacientes clínicos e cirúrgicos, na Unidade Cardiológica de Terapia Intensiva.
Tal unidade conta com 12 leitos de internação e tem como prioridade de atendimento os pacientes no pós-operatório de procedimentos intervencionistas realizados na hemodinâmica. As principais especialidades atendidas na instituição são: cardiovascular, neurologia, arritmologia e ortopedia (esta última, realizada no Centro Cirúrgico). Além disso, a instituição é referência para pacientes clínicos de outras instituições da região.
O pré-teste foi executado com base em uma amostra 200 prontuários do ano de 2020 e 2021. A escolha desses prontuários seguiu os critérios de elegibilidade, sendo: pacientes com tempo de internação > 3 dias; pacientes que passaram por diferentes linhas de cuidado (Emergência; Unidade de Terapia Intensiva; Centro Cirúrgico; Unidades de Internação); pacientes ≥ 60 anos com múltiplas comorbidades; e pacientes eleitos para os protocolos gerenciados (sepse, dor torácica, AVC e/ou cuidados paliativos). Em razão do período pandêmico no qual foi realizado o pré-teste do instrumento, foram analisados por conveniência os prontuários disponibilizados pela Comissão de Prontuários da instituição de estudo. O cálculo amostral seguiu recomendação do profissional estatístico, que orientou usar entre cinco e dez avaliações por item.
Um termo de responsabilidade foi encaminhado à instituição para apreciação e autorização quanto ao pré-teste do instrumento, construído para proceder à consulta dos prontuários. A aplicação do instrumento foi efetuada pela pesquisadora principal do estudo, que compõe a comissão de revisão de prontuários na instituição em questão. O banco de dados está disponível através do seguinte link: https://doi.org/10.25824/redu/PTAPUA
Análise dos resultados e estatística
Além de julgar a concordância sobre os domínios e itens do instrumento, foi avaliado o Índice de Validade de Conteúdo (IVC), em que os especialistas atribuíram a cada item uma das quatro opções:
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Não relevante ou não apresenta clareza para auditoria de prontuário;
-
Precisa de grande revisão para ser relevante ou apresentar clareza para auditoria de prontuário;
-
Precisa de pequena revisão para ser relevante ou apresentar clareza para auditoria de prontuário;
-
Relevante e representativo para auditoria de prontuário.
Para o cálculo do IVC de cada item, foi considerado o número total de opções “3” ou “4” atribuído pelos especialistas, dividido pelo número total de respostas; e foram considerados válidos os itens com IVC superiores a 0,90(21).
Para a análise do pré-teste, empregou-se a estatística descritiva, que consiste em um meio de organizar e resumir as características principais observadas em um conjunto de dados, permitindo ao pesquisador melhor compreensão dos dados estudados(22).
RESULTADOS
A construção inicial do instrumento foi composta por 11 domínios, em que cada um possuía subitens que caracterizavam a qualidade da assistência prestada pela equipe multidisciplinar.
Para chegar ao índice de validade de conteúdo acima de 0,90 em todos subitens dos domínios, foram necessárias duas etapas da técnica Delphi, apresentadas na Tabela 1. Na primeira fase, os juízes contribuíram com sugestões para maior clareza dos domínios “Infecções Relacionadas ao Uso de Dispositivos”, “Riscos Assistenciais Gerenciados”, “Ações da Equipe Multidisciplinar” e “Cultura de Segurança”.
Índice de Validade de Conteúdo, nas duas fases da técnica Delphi (n = 7), Campinas, São Paulo, Brasil, 2021
Com base nas sugestões, nova versão dos domínios e itens foi apresentada na segunda fase da técnica Delphi, para a validação do conteúdo.
Após a validação do conteúdo e versão final do instrumento “Auditoria Clínica de Prontuários”, foram auditados 200 prontuários. O tempo de avaliação de cada um deles variou entre 30 e 40 minutos. O pré-teste do instrumento está apresentado por domínio avaliado nas Tabelas 2, 3 e 4.
Pré-teste do instrumento, análise de prontuários quanto a Identificação do Paciente, Comunicação Efetiva, Segurança na Prescrição, Uso e Administração de Medicamentos e Cirurgia Segura, Campinas, São Paulo, Brasil, 2021
Pré-teste do instrumento, análise de prontuários quanto a Medidas de Prevenção de Infecções Relacionadas ao Uso de Dispositivos, Riscos Assistenciais Gerenciados, Protocolos Gerenciados, Campinas, São Paulo, Brasil, 2021
Pré-teste do instrumento, análise de prontuários quanto a Procedimentos Médicos, Procedimentos de Enfermagem, Ações da Equipe Multidisciplinar e Cultura de Segurança, Campinas, São Paulo, Brasil, 2021
Na Tabela 2, estão apresentados os dados de análise de prontuários quanto a Identificação do Paciente, Comunicação Efetiva, Segurança na Prescrição, Uso e Administração de Medicamentos. A Tabela 3 traz os dados extraídos referentes a Infecções Relacionadas ao Uso de Dispositivos, Riscos Assistenciais, Protocolos Gerenciados e Procedimentos Médicos. Na Tabela 4, constam os dados extraídos com a utilização do instrumento na análise de prontuários relacionados a Procedimentos Médicos, Procedimentos de Enfermagem, Ações da Equipe multidisciplinar e Cultura de Segurança.
DISCUSSÃO
A elaboração e validação do conteúdo de um instrumento para auditoria clínica foi uma trajetória desafiadora na qual se buscou contribuir com a prática clínica e científica, disponibilizando um instrumento inovador que possibilitasse tornar tangível e mensurável a qualidade/segurança registrada em prontuários. Para isso, foi necessário se embasar em referências sobre a construção e validação de instrumentos(1-2,15,21) bem como contar com o conhecimento e experiência de profissionais envolvidos na auditoria de prontuários e em gestão da qualidade em saúde.
No processo de construção do instrumento, a utilização do benchmarking também foi uma estratégia para permitir o uso do instrumento em diferentes instituições públicas e privadas, uma vez que o benchmarking possibilita a melhoria contínua para aperfeiçoar o desempenho dos processos-chave das instituições(19).
Dentre os critérios necessários para se construir um bom instrumento de medida, destacam-se a objetividade e a clareza, ou seja, frases longas e cheia de detalhes podem proporcionar uma leitura cansativa e dispersa(23). Sendo assim, levando em conta o processo de auditoria clínica, para padronizar e objetivar a avaliação dos prontuários, as considerações dos especialistas nas duas fases da técnica Delphi viabilizaram reformulações nos domínios e itens do instrumento validado para analisar a conformidade dos registros nos prontuários(20).
A validação de conteúdo é a primeira etapa da construção de instrumentos de medida; e ter alcançado IVC superior 0,9 para todos os itens do instrumento indica ótimo nível de validade de conteúdo no que se refere à clareza, legibilidade, relevância e pertinência de cada item avaliado(15).
O processo de validação de conteúdo também envolve a abrangência do instrumento(16-17,20). Dessa forma, a aplicação do instrumento construído deverá ser priorizada na auditoria clínica dos prontuários de pacientes crônicos, ou criticamente enfermos, pela composição dos itens construídos e por envolver potencialidades na gestão de processos, recursos financeiros e humanos inerentes à complexidade do cuidado desse perfil de pacientes(24-26).
No pré-teste do instrumento, após a finalização da validação de conteúdo, o tempo de aplicação médio de 35 minutos por prontuário demonstrou a factibilidade da ferramenta no processo de auditoria clínica(7,15-20).
O processo de validação de um instrumento deve ser contínuo, logo a avaliação da validade quanto ao aspecto do constructo e da confiabilidade e no tocante ao aspecto de homogeneidade e equivalência deverá ser realizada nas instituições que o adotarem(15). Neste estudo, surgiram limitações importantes, como o fato de não ter sido possível realizar a confiabilidade interavaliadores. Essa limitação se deu pela coleta de dados ter ocorrido durante a estruturação de distanciamento social, para conter a disseminação do SARS-CoV-2, quando o Comitê de Ética não aprovou o protocolo inicial do estudo para a coleta de dados simultaneamente por dois pesquisadores.
Além disso, a possibilidade de aplicação do instrumento em diferentes instituições não foi autorizada, devido à situação pandêmica do período de coleta de dados. Isso impediu a realização de uma análise fatorial exploratória e análise da confiabilidade quanto ao aspecto da consistência interna por meio do alfa de Cronbach(27).
Destaca-se que, no pré-teste, foi possível vivenciar a importância da auditoria clínica na análise dos processos de cuidar, viabilizando o discernimento de processos eletivos de melhoria dos processos consolidados, ou seja, houve a percepção de que o instrumento foi adequado na avaliação da maturidade dos processos assistenciais.
Com isso, recomenda-se a utilização do instrumento validado neste estudo para padronizar a auditoria dos prontuários, de forma que os hospitais estabeleçam um método de melhoria contínua para diagnosticar quais são seus processos mais bem definidos, maduros e organizados, visando à excelência no atendimento. Sendo assim, a aplicação dele poderá contribuir desde a percepção da qualidade e segurança por equipe multidisciplinar até mesmo com o processo de acreditação hospitalar, que pressupõe a implantação de boas práticas assistenciais com base na gestão da qualidade e mudanças estruturais(28-30).
Agregar referenciais teóricos, conhecimento de profissionais experts e benchmarking na construção e validação do conteúdo do instrumento de auditoria clínica construído neste estudo permitiu disponibilizar uma ferramenta para que as instituições hospitalares padronizem a avaliação de prontuários e, assim, analisem processos e práticas interdisciplinares que garantam a qualidade do atendimento de maneira comprometida com a melhoria contínua.
Limitações do estudo
Como limitação do estudo, ressalta-se que, devido ao período pandêmico de coleta de dados, não foi autorizada a realização da análise da confiabilidade interavaliador do instrumento de auditoria clínica, o que é recomendado antes de sua implementação.
Contribuições para a área da enfermagem, saúde ou política pública
A contribuição deste estudo com a construção e validação de conteúdo de um instrumento para auditoria clínica vai otimizar o gerenciamento do processo de trabalho no que diz respeito à segurança do paciente e qualidade de atendimento para pacientes graves/críticos, pois essa clientela necessita de cuidados complexos e está exposta ao maior número de riscos assistenciais. Portanto, ter uma ferramenta que oriente a busca ativa de processos que precisam ser aperfeiçoados é de grande importância no processo de trabalho da gestão da qualidade e do núcleo de segurança do paciente, os quais, juntos, têm um único objetivo: desenvolver boas práticas para prestar um cuidado de excelência livre de danos.
A auditoria clínica, por meio do instrumento validado neste estudo, possibilita embasar treinamentos e planos de ações nos processos que precisam ser melhorados e, assim, proporciona um programa de melhoria contínua dentro das instituições de saúde, objetivando a redução de eventos adversos evitáveis, o cuidado centrado e uma boa experiência do paciente.
CONCLUSÕES
O estudo permitiu construir e validar o conteúdo de um instrumento para realização de auditoria clínica de prontuários. Todos seus itens apresentaram IVC superiores a 0,9, o que denota uma adequada validação de conteúdo.
A participação de especialistas envolvidos com gestão da qualidade em saúde no processo de validação de conteúdo potencializou a composição do instrumento de auditoria clínica em 11 domínios e 52 itens de avaliação.
O pré-teste do instrumento de auditoria clínica em 200 prontuários com tempo médio de aplicação de 35 minutos por prontuário denota a factibilidade dessa ferramenta no cotidiano de trabalho.
Sendo assim, recomenda-se a utilização do instrumento para avaliar a maturidade dos processos assistenciais e para estabelecer os programas de melhoria contínua nas instituições de saúde.
AGRADECIMENTO
Ao Programa de Pós Graduação em Enfermagem da Universidade Estadual de Campinas.
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Editado por
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EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa
-
EDITOR ASSOCIADO: Mitzy Danski
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
09 Out 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
-
Recebido
04 Jul 2022 -
Aceito
10 Mar 2023