Open-access Segurança do paciente na formação de técnicos de enfermagem

RESUMO

Objetivos:   analisar os conteúdos sobre segurança do paciente na formação de técnicos de enfermagem.

Métodos:   estudo documental, realizado em três cursos técnicos de enfermagem de uma universidade pública do Nordeste brasileiro, com base no The Multi-professional Patient Safety Curriculum Guide, publicado pela Organização Mundial da Saúde.

Resultados:   constatou-se que, das 26 disciplinas em cada curso, os termos rastreadores encontraram-se em 22 disciplinas nos Cursos A/C; 23 no Curso B. Os tópicos do guia com maior quantidade de termos foram: Melhora na segurança da medicação, com 85 termos (22,6%); e Prevenção e controle da infecção, com 75 termos (20%). Os conteúdos não expressam a integralidade do ensino de segurança do paciente; algumas disciplinas tinham esse enfoque, enquanto outras, não.

Conclusões:   os documentos revelaram lacunas quanto aos conteúdos relacionados à segurança do paciente e demonstraram que são abordados apenas nos ementários e planos de disciplina.

Descritores: Técnicos de Enfermagem; Segurança do Paciente; Educação em Enfermagem; Educação Técnica em Enfermagem; Currículo

ABSTRACT

Objectives:   to analyze the contents on patient safety in the training of nursing technicians.

Methods:   a documentary study, conducted in three technical nursing courses at a public university in northeastern Brazil, based on the Multi-Professional Patient Safety Curriculum Guide, published by the World Health Organization.

Results:   we found that, of the 26 subjects in each course, the tracking terms were found in 22 subjects in the A/C courses, 23 in the B course. The topics of the guide with the highest number of terms were the improvement in medication safety, with 85 terms (22.6%), and Infection prevention and control, with 75 terms (20%). The contents do not express the comprehensiveness of patient safety education; some subjects had this focus, while others did not.

Conclusions:   the documents revealed gaps in the contents related to patient safety and demonstrated that they are addressed only in the course syllabus and discipline plans.

Descriptors: Nursing Technicians; Patient Safety; Nursing Education; Nursing Technical Education; Curriculum

RESUMEN

Objetivos:   analizar contenidos sobre seguridad del paciente en la formación de técnicos de enfermería.

Métodos:   estudio documental, realizado en tres cursos técnicos de enfermería de universidad pública del Nordeste brasileño, basado en The Multi-professional Patient Safety Curriculum Guide, publicado por la Organización Mundial de la Salud.

Resultados:   constató que, de las 26 asignaturas en cada curso, los términos rastreadores encontraron en 22 asignaturas en los Cursos A/C; 23 en el Curso B. Tópicos del guión con mayor cantidad de términos fueron: Mejora en la seguridad de la medicación, con 85 términos (22,6%); y Prevención y control de la infección, con 75 términos (20%). Los contenidos no expresan la integralidad de educación de seguridad del paciente; algunas asignaturas tenían eso enfoque, mientras otras no.

Conclusiones:   documentos revelaron lagunas cuanto a los contenidos relacionados a la seguridad del paciente y demostraron que son abordados apenas en los sumarios y planes de asignatura.

Descriptores: Enfermeros no Diplomados; Seguridad del Paciente; Educación en Enfermería; Graduación en Auxiliar de Enfermería; Curriculum

INTRODUÇÃO

Os profissionais de saúde possuem responsabilidades na realização de procedimentos no cuidado ao paciente, visto que qualquer erro pode prolongar o tempo de hospitalização ou causar danos irreversíveis. Dado preocupante, levantado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), estima que 4% a 16% dos pacientes hospitalizados em países desenvolvidos estejam sujeitos a erros. Na tentativa de reduzir esses índices, em 2004, a OMS criou a World Alliance for Patient Safety, atualmente denominada de Patient Safety Program, que estabeleceu propostas aos profissionais de saúde, para poderem reduzir risco de danos a um mínimo aceitável(1-2).

No contexto brasileiro, o Ministério da Saúde publicou a Portaria nº 529, em 1º de abril de 2013, que instituiu o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP), com objetivo de prestar assistência qualificada nos diversos níveis de atenção à saúde. Uma das estratégias de implementação dessa Portaria visa incluir o tema “segurança do paciente” nos currículos de profissionais de saúde de nível técnico, superior e pós-graduação, entretanto não apresenta detalhes ou estratégias de como operacionalizar essa inclusão(3).

Considerando essa preocupação, a Organização Mundial da Saúde desenvolveu o The Multiprofessional Patient Safety Curriculum Guide, guia de cunho multiprofissional que dispõe de estratégias para inserir o tema de segurança do paciente nas propostas pedagógicas das instituições de ensino. Nesse guia, estão as informações que servem de delineamento para os docentes, a fim de que possam reformular a proposta curricular dos cursos(4).

A literatura aponta a necessidade de incluir o tema “cultura de segurança do paciente” nos currículos dos cursos da saúde, em especial da enfermagem, todavia essas publicações dizem respeito aos cursos de nível superior: Enfermagem, Medicina, Fisioterapia, Farmácia, Fonoaudiologia e Odontologia(5-8).

Estudo transversal realizado com practical nurses no Canadá evidenciou a necessidade de educação voltada à segurança do paciente para profissionais desse nível(9). No entanto, as publicações que tratam dessa questão e se direcionam aos profissionais de nível médio, especificamente aos técnicos em enfermagem, são escassas, de modo que é ausente a discussão relativa ao problema nesse nível de ensino.

Tal problemática merece destaque devido à evidência de que a equipe de enfermagem é, majoritariamente, constituída de técnicos e auxiliares de enfermagem (77%), os quais estão na assistência direta aos pacientes e, portanto, possuem responsabilidade pela qualidade na saúde(10). Desse modo, os técnicos de enfermagem são protagonistas nas ações que favorecem a segurança do paciente, em decorrência da participação fundamental e ininterrupta nos processos de cuidado(11).

Por essa razão, emergiu a seguinte questão norteadora: “Como é abordada a segurança do paciente na formação de técnicos de enfermagem?” A realização do estudo sobre o ensino da segurança do paciente para essa categoria profissional é justificada pela possibilidade de elencar lacunas no processo de formação; também, considera-se que o profissional técnico de enfermagem, além de ter habilidade técnica, precisa dispor do referencial técnico e cientifico em benefício das boas práticas assistenciais com a finalidade de reduzir eventos adversos(11).

OBJETIVOS

Analisar os conteúdos sobre segurança do paciente na formação de técnicos de enfermagem.

MÉTODOS

Aspectos éticos

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição proponente, sendo observados os princípios e postulados éticos, em consonância com a Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) n. 466/2012. Neste estudo, os cursos foram identificados pelas letras A, B e C, para manter anonimato e sigilo referentes à identidade das instituições.

Desenho, período e local do estudo

Estudo documental, realizado no período de janeiro a junho de 2019, em três cursos técnicos de enfermagem vinculados a uma universidade pública da Região Nordeste do Brasil. Para isso, elaborouse um protocolo de pesquisa documental, pautando-se em referencial(12) composto pelas seguintes estratégias: leitura dos documentos dos cursos; pesquisa dos termos rastreadores; correlação dos termos identificados nos documentos com os 11 tópicos do guia da OMS The Multi-professional Patient Safety Curriculum Guide; averiguação da presença ou ausência dos termos rastreadores nos documentos analisados; e síntese interpretativa.

População ou amostra; critérios de inclusão e exclusão

Constituíram a população deste estudo os seguintes documentos: Projeto Pedagógico (PP), Matriz Curricular, Ementários e Planos de Disciplinas. Por meio de termos rastreadores, buscaram-se menções ao tema “segurança do paciente” nessas documentações para composição da amostra deste estudo.

A fim de selecionar os documentos, efetuou-se análise criteriosa dos itens para garantir pesquisa, autenticidade e confiabilidade, ou seja, para apresentar informações na pesquisa que representassem a realidade dos sujeitos referente ao objeto de análise.

Protocolo do estudo

A busca do material de coleta foi realizada diretamente na coordenação dos cursos, por solicitação formal, em ofício às instituições de ensino. Os PPs foram encontrados no site da instituição de ensino responsável pelos colégios; e os planos de disciplina e ementários foram obtidos nas coordenações dos cursos.

A coleta dos conteúdos de segurança do paciente ocorreu por meio da identificação de termos rastreadores contidos nos documentos e foi balizada por uma lista de verificação, traduzida e validada em conteúdo por educadores e pesquisadores da área da saúde(12), à luz do referencial teórico disposto no The Multi-professional Patient Safety Curriculum Guide (4), com adequação e pertinência dos termos, conteúdos e termos rastreadores. Esses termos foram agregados para cada um dos 11 tópicos desse guia, totalizando 153 termos rastreadores - prováveis temas abordados no ensino da segurança do paciente(5).

Para consecução dessa fase, seguiu-se a mesma estratégia proposta pela autora da lista de verificação(12), em que, inicialmente, se realizou leitura detalhada do conteúdo dos documentos selecionados, com propósito de identificar os termos rastreadores.

Análise dos resultados e estatística

Para análise do material, elaborou-se uma ficha de modo a especificar o tipo de documento analisado e o resultado encontrado. Caso o documento estivesse disponível no formato .doc, era acessado por meio do Microsoft Word(®) ; e, no caso de Portable Document Format (PDF), por meio do Adobe Acrobat(®) . Aplicou-se a ferramenta de busca “Localizar” para os 153 termos rastreadores e respectivas variações, como grafia no singular e plural, palavras compostas com busca conjugada(12).

Já no programa Microsoft Excel(®) , realizou-se a organização manual, seguida de digitação por dupla entrada. Depois, os dados foram exportados para o software estatístico Statistical Package for the Social Sciences - SPSS, for Windows (versão 21.0). Realizou-se estatística descritiva, com frequência relativa e absoluta dos termos. Os resultados foram discutidos com base no The Multi-professional Patient Safety Curriculum Guide, publicado pela Organização Mundial da Saúde(4), em 2011, enfatizando os 11 tópicos do guia.

RESULTADOS

Após a busca dos termos rastreadores, encontraram-se menções ao tema “segurança do paciente” especificamente nos Ementários e Planos de disciplinas. A análise indicou que a temática não foi contemplada como uma competência a ser desenvolvida nos Projetos Pedagógicos e nas Matrizes Curriculares dos três cursos avaliados.

A Tabela 1 apresenta a distribuição de frequências absolutas e relativas identificadas nos documentos dos cursos técnicos de enfermagem analisados. De modo geral, das 26 disciplinas em cada curso, os termos rastreadores foram encontrados em 22 disciplinas nos Cursos A/C; e em 23 disciplinas no Curso B. Quanto à distribuição, os tópicos que apresentaram maior quantidade de termos nos três cursos foram o de número 11 (Melhora na segurança da medicação), com 85 termos (22,6%) no total; e o de número 9 (Prevenção e controle da infecção), com 75 termos (20%) nos três cursos.

Tabela 1
Frequências absolutas e relativas dos 11 tópicos do Guia Curricular da Organização Mundial da Saúde (2011) sobre segurança do paciente, nas disciplinas dos cursos técnicos de enfermagem

Das 26 disciplinas analisadas no Curso A, as de Anatomia e Fisiologia Humana, Primeiros Socorros, Noções de Pesquisa, Português Técnico não possuíram qualquer menção ao tema “segurança do paciente”. Observou-se que, dos 11 tópicos do The Multi-professional Patient Safety Curriculum Guide, os tópicos 9 (Prevenção e controle da infecção) e 11 (Melhora na segurança da medicação) foram os mais difundidos nas disciplinas. O tópico 5 (Aprendendo com os erros para evitar danos) foi o único a não ser contemplado nas disciplinas, conforme Quadro 1.

Quadro 1
Caracterização do conteúdo "segurança do paciente" nas disciplinas do Curso A

Das 26 disciplinas analisadas no Curso B, as de Primeiros Socorros, Português Técnico e Noções de Pesquisa e Enfermagem não possuíram qualquer menção ao tema “segurança do paciente”. As demais disciplinas apresentaram maior destaque voltado para melhora na segurança da medicação e compreensão e gestão de riscos clínicos. A maioria dos tópicos do guia foram contemplados, entretanto os de número 5 (Aprendendo com os erros para evitar danos) e 7 (Utilização de métodos de melhoria da qualidade para melhorar a assistência) foram citados apenas uma vez. Os tópicos mais citados foram 11 (Melhora na segurança da medicação) e 6 (Compreensão e gestão de riscos clínicos), conforme Quadro 2.

Quadro 2
Caracterização do conteúdo "segurança do paciente" nas disciplinas do Curso B

Das 26 disciplinas analisadas no Curso C, as de Anatomia e Fisiologia Humana, Português Técnico, Noções de Pesquisa, Saúde do Adulto II e Primeiros Socorros não possuíram qualquer menção ao tema “segurança do paciente”. O tópico 7 (Utilização de métodos de melhoria da qualidade para melhorar a assistência) foi citado duas vezes dentre as disciplinas do Curso C. Os mais referidos foram: 9 (Prevenção e controle de infecção) e 11 (Segurança do paciente e procedimentos invasivos). O tópico 5 (Aprendendo com os erros para evitar danos) não foi referenciado nas disciplinas desse curso (Quadro 3).

Quadro 3
Caracterização do conteúdo "segurança do paciente" nas disciplinas do Curso C

DISCUSSÃO

Os dados mostraram que a segurança do paciente ainda não foi incorporada integralmente à formação dos técnicos de enfermagem, em especial pela ausência da temática nos PPs e Matrizes Curriculares, identificada nos três cursos avaliados. Considera-se que a segurança do paciente é um tema transversal que deve perpassar por toda a formação dos profissionais de enfermagem(13), e a sua não abordagem nos PPs compromete o aprofundamento conceitual dessa temática, fazendo com que cada disciplina/docente valorize apenas os aspectos que julgue específicos para a formação que quer ofertar(8).

Mesmo nos documentos em que se identificou a abordagem da segurança do paciente (Ementários e Planos de disciplinas), a formação de técnicos de enfermagem revelou-se de modo indireto e fragmentado. Portanto, os resultados demonstraram que essa temática não é abordada de forma explícita nos documentos, na amplitude e profundidade devidas, ou seja, os termos rastreadores remetem apenas indiretamente ao tema.

Tendo em vista o impacto nas discussões mundiais, sobretudo nas duas últimas décadas, a segurança do paciente se manifesta discretamente nos currículos de saúde, necessitando de atenção quanto à formação desses profissionais(14-17). Essa deficiência constitui incompatibilidade no que se refere aos princípios de construção curricular e, até mesmo, do que está descrito no código de ética dos profissionais de enfermagem(18).

O modo implícito, fragmentado e a limitada referência à segurança do paciente nos documentos averiguados poderá, assim, comprometer o perfil profissional dos discentes, haja vista ser imprescindível que os currículos assegurem as condições adequadas para alcançar os padrões de desempenho clínico(4,16,19). Esses aspectos são necessários para a formação dos técnicos de enfermagem, de modo a priorizar o cuidado da forma mais segura possível.

Sendo assim, essa insuficiência não é aceitável, visto que, atualmente, o Sistema Único de Saúde (SUS) encontra-se norteado pelo documento de referência do Programa Nacional de Segurança do Paciente, embasado no Guia Curricular de Segurança do Paciente, sobre o dever de formar profissionais de saúde sensíveis a esse tópico(3).

Os 11 tópicos do Guia Curricular da OMS obtiveram representações heterogêneas nos cursos, destacando-se os itens relacionados aos aspectos clínicos e técnicos, concernentes aos tópicos “Controle da infecção” e “Segurança na administração de medicamentos”. Os termos relacionados à gestão e aos erros obtiveram os menores percentuais, demonstrando lacuna quanto a esses aspectos tão importantes para assegurar a qualidade e segurança na assistência.

Verifica-se que a formação técnica de enfermagem no Brasil tem apresentado fragilidades, tanto nos aspectos específicos relativos à segurança do paciente quanto no âmbito geral. Como evidência disso, num estudo realizado em instituições públicas e privadas dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo que ofertam o curso técnico de enfermagem, evidenciou-se que a formação desse profissional possui direcionamento tecnicista, distanciando-se do princípio da humanização no cuidado(20). Nessa perspectiva, nota-se que o ensino técnico em enfermagem tem voltado sua atenção basicamente ao preparo dos egressos para realização de procedimentos técnicos(21).

Quanto à caracterização do conteúdo de segurança do paciente nas disciplinas de cada curso, os achados demostraram convergências de disciplinas nas quais os termos não foram registrados. As disciplinas Primeiros Socorros, Noções de Pesquisa, Português Técnico não obtiveram referência a um termo rastreador nos três cursos técnicos, já Anatomia e Fisiologia Humana não obteve termo rastreador nos cursos A e C. Por sua vez, Saúde do Adulto II não obteve referência no Curso C.

O fato de não encontrar termos rastreadores nas disciplinas Noções de Pesquisa e Português Técnico pode ser esperado em virtude das especificidades destas e por serem introdutórias. No entanto, no que concerne às disciplinas Primeiros Socorros e Saúde do Adulto II, a ausência de termos rastreadores sobre segurança do paciente revelou a necessidade de revisão e inserção de tópicos do tema nessas ementas, de modo mais urgente e efetivo, uma vez que estas trabalham aspectos relativos ao cuidado direto com pacientes, na perspectiva de manutenção da vida e minimização de complicações(22). Ademais, enfatiza-se que o tema “segurança do paciente” deve ser transversal nos currículos dos profissionais da saúde, ou seja, para tanto, todas as disciplinas deveriam abordar a temática(23).

Considerando os documentos examinados (Tabela 1) no tocante à identificação dos termos em correlação com os 11 tópicos recomendados pelo Guia Curricular da OMS, evidenciou-se nos Cursos A e C que os itens 9 e 11 (“Prevenção e controle da infecção” e “Melhora na segurança da medicação”, respectivamente) foram os mais difundidos nas disciplinas. O tópico 5 (Aprendendo com os erros para evitar danos) não foi contemplado nas disciplinas dos Cursos A e C. Diante desses achados, infere-se que a identificação em maior frequência dos itens sobre “prevenção e controle de infecção” e “segurança medicamentosa” se deve ao fato de serem temas que fazem parte das atividades com as quais os técnicos de enfermagem estão diretamente envolvidos e para as quais devem receber formação(7,24-26).

Em contrapartida, o fato de o tópico do aprendizado com erros não ter sido referenciado pelos cursos citados pode ter consequências na forma como técnicos de enfermagem encaram os erros, analisam eventos adversos e classificam os tipos de erros, o que pode contribuir para perpetrar a cultura de segurança do paciente punitiva. Portanto, há de se pensar em englobar tal item na formação desses futuros profissionais(13,27-28).

Esses dados corroboram achados de pesquisa realizada com objetivo de estudar os currículos de quatro cursos da área da saúde da Universidade Federal de São Paulo, para identificar convergências e divergências referentes ao conteúdo sobre segurança do paciente. Nesse estudo, o tópico mais explorado foi “Prevenção e controle da infecção”, presente em 37 (15,4%) unidades curriculares, para o total de 240. Além disso, os termos rastreadores relacionados ao quinto tópico, “Aprendendo com os erros para evitar danos”, também não foram identificados nos PPs analisados(12).

Quanto ao Curso B, o tópico mais citado foi o 11 (Melhora na segurança da medicação), com 27 (19,4%) referências. O tópico 5 (Aprendendo com os erros para evitar danos) foi tratado uma vez, obtendo o menor índice quando comparado com os demais tópicos no curso. Evidencia-se aspecto positivo no que diz respeito ao quantitativo prevalente do tópico 11, no PP avaliado. Tal recorrência é fundamental, já que o técnico de enfermagem, em especial, é a categoria profissional com maior envolvimento na manipulação no processo de administração de medicamentos, portanto apresenta maior possibilidade de atuação na prevenção de complicações(29).

Por outro lado, a identificação insuficiente do quinto tópico traz mais uma vez a reflexão sobre a importância de inserção da aprendizagem baseada em erros para promoção de cultura efetiva de segurança, de modo que os profissionais tenham consciência acerca do papel que desempenham para redução de danos(30).

O resultado encontrado na análise desse tópico é preocupante, pois não houve alusão aos componentes essenciais para o reconhecimento de erros. Desse modo, é preciso que tais conteúdos sejam mais bem difundidos e trabalhados de forma efetiva nos cursos analisados, para que os discentes possam ter, na formação, visão clara do componente sistêmico dos erros e sejam capazes de preveni-los; e, se porventura, ocorrerem, que sejam aptos a utilizá-los como aprendizado para evitar situações prejudiciais no futuro. Logo, como esse aspecto apresentou fragilidade, deve ser explorado por docentes e discentes.

Limitações do estudo

O estudo apresentou limitação quanto à amostra, pois incluíram-se fontes documentais referentes aos cursos técnicos de enfermagem de apenas uma instituição de ensino. Portanto, é necessária a realização de futuros trabalhos que englobem análise de documentos de instituições de ensino com outras características, além de estudos com fontes documentais de instituições que têm esse conteúdo previsto na formação dos técnicos de enfermagem.

Contribuições para a Área

A temática explorada nesta pesquisa é recente, por isso são poucos os estudos divulgados sobre discentes de cursos técnicos de enfermagem e segurança do paciente. Assim, o conhecimento produzido neste trabalho pode contribuir para a formação de futuros técnicos de enfermagem, tornando-os promotores da cultura de segurança. Ademais, esta pesquisa pode encorajar discussões sobre o ensino da segurança do paciente, subsidiando a reflexão e o planejamento do ensino técnico de enfermagem e a construção de habilidades essenciais para o cuidado seguro e de qualidade.

CONCLUSÕES

A análise dos documentos revelou lacunas na formação dos técnicos de enfermagem quanto aos conteúdos relacionados à segurança do paciente; ademais, evidenciou abordagem implícita, pontual e desarticulada. Por isso, notou-se a necessidade de transversalidade do tema, assim como articulação dos saberes, principalmente no que se refere ao ensino, pesquisa e extensão.

Logo, abordagem interdisciplinar no curso técnico em enfermagem pode minimizar as fragilidades e dificuldades na formação referentes à segurança do paciente. Dessa forma, pode-se contribuir na formação de profissionais sensíveis e conscientes acerca do tema apresentado, o que terá reflexo direto na qualidade da assistência prestada.

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Editado por

  • EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
  • EDITOR ASSOCIADO: Ana Fátima Fernandes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Set 2021
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    22 Jan 2021
  • Aceito
    03 Maio 2021
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