RESUMO
Objetivo:
Compreender como os trabalhadores de enfermagem percebem o cuidado ao idoso portador de hipertensão arterial sistêmica (HAS) no âmbito da Estratégia Saúde da Família.
Método:
Estudo descritivo, de natureza qualitativa, realizado no município de Natal/RN, com 20 trabalhadores de enfermagem que prestam assistência a idosos portadores de HAS. Os dados foram obtidos através de entrevista semiestruturada e tratados pela Análise Temática. Estão fundamentados no suporte teórico da integralidade, com auxílio do software Atlas.ti 7.0.
Resultados:
Foram identificados como elementos que favorecem o cuidado: territorialização, parcerias, proatividade dos profissionais e vínculo do usuário com a equipe. Entre os que dificultam o cuidado: assistência centrada na doença, formação acadêmica pautada no modelo biomédico, inexistência de intersetorialidade e descontinuidade do cuidado na rede assistencial.
Considerações Finais:
Os trabalhadores de enfermagem percebem que as instituições de saúde carecem de práticas articuladas e inovadoras que incorporem novos paradigmas com foco na integralidade do cuidado.
Descritores:
Atenção Primária à Saúde; Serviços de Saúde para Idosos; Doença Crônica; Assistência à Saúde; Enfermeiras de Saúde da Família
ABSTRACT
Objective:
To understand how nursing workers perceive care of hypertension (HBP) in older adult within the scope of the Family Health Strategy.
Method:
A qualitative descriptive study carried out in the city of Natal/RN, with 20 nursing workers providing care to older adults with HBP. The data were obtained through a semi-structured interview and analysed by the Thematic Analysis, based on the theoretical support of the integrality, using Atlas.ti 7.0 software.
Results:
The elements found as facilitators were: territorialization, partnerships, professional proactivity and the user’s bond with the team. Among those found as barriers were: disease-centered care; academic education based on the biomedical model; lack of inter-sectorality and discontinuity of care in the care network.
Final considerations:
Nursing workers perceive that health institutions lack articulated and innovative practices that incorporate new paradigms focused on integrality of care.
Descriptors:
Primary Health Care; Health Services for the Aged; Chronic Disease; Delivery of Health Care; Family Nurse Practitioners
RESUMEN
Objetivo:
Comprender la percepción que los profesionales de enfermería tienen sobre la atención de los adultos mayores con hipertensión arterial sistémica (HTA) en el ámbito de la Estrategia de Salud Familiar.
Método:
Se trata de un estudio descriptivo y cualitativo llevado a cabo en la ciudad de Natal, Rio Grande del Norte, con 20 enfermeros que atienden a personas mayores con HTA. Los datos se obtuvieron mediante entrevistas semiestructuradas y fueron tratados mediante Análisis Temático, basado en el soporte teórico de la integridad, con la ayuda del software Atlas.ti 7.0.
Resultados:
Se identificaron como favorecedores de la atención los siguientes elementos: territorialización, alianzas, proactividad de los profesionales y vinculación del usuario con el equipo y entre los entorpecedores: atención centrada en la enfermedad, formación académica basada en el modelo biomédico, ausencia de intersectorialidad y discontinuidad de la atención en la red asistencial.
Consideraciones Finales:
Los trabajadores de enfermería perciben que las instituciones de salud carecen de prácticas articuladas e innovadoras que puedan incorporar nuevos paradigmas centrados en la integralidad de la atención.
Descriptores:
Atención Primaria de la Salud; Servicios de Salud para Adultos Mayores; Enfermedades Crónicas; Atención a la Salud; Enfermeros de Salud Familiar
INTRODUÇÃO
A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é importante fator de risco cardiovascular modificável, sendo considerado um dos mais importantes problemas de saúde pública. Doença que surge, principalmente, na meia-idade e na chegada à velhice, a HAS está em geral associada à interação de fatores genéticos e estilo de vida (11 Prince MJ, Wu F, Guo Y, Gutierrez Robledo LM, O'Donnell M, Sullivan R, et al. The burden of disease in older people and implications for health policy and practice. Lancet [Internet]. 2015[cited 2017 Dec 03];385(9967):549-62. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25468153
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).
No Brasil, estima-se que a prevalência de HAS em idosos supere os 50%, taxa também elevada no contexto internacional (22 Mendes G, Moraes C, Gomes L. Prevalência de hipertensão arterial sistêmica em idosos no Brasil entre 2006 e 2010. Rev Bras Med Fam Comunidade[Internet]. 2014[cited 2017 Dec 03];9(32):273-8. Available from: https://rbmfc.org.br/rbmfc/article/view/795
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). Nos Estados Unidos, cerca de 30% da população adulta total é acometida por HAS, enquanto que nos indivíduos com 60 anos ou mais esse percentual salta para 65%. Devido a sua alta prevalência e sua relação causal com todas as doenças cardiovasculares, a HAS é o principal fator de risco para mortalidade em todo o mundo (33 Nwankwo T, Yoon SS, Burt V, Gu Q. Hypertension among adults in the United States: National Health and Nutrition Examination Survey, 2011-2012. NCHS Data Brief[Internet]. 2013[cited 2017 Dec 03];(133):1-8. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24171916
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2417...
).
Os idosos portadores de HAS enfrentam problemas multidimensionais que lhes afetam a saúde e, consequentemente, a sua qualidade de vida. Nessa perspectiva, é fundamental que os profissionais de saúde assumam o compromisso de oferecer à população idosa portadora de HAS uma atenção que priorize aspectos favorecedores de um processo adaptativo individual na prevenção e no controle de doenças crônicas inerentes ao envelhecimento. Dessa forma, a atenção aos idosos configura-se em grande desafio, exigindo abordagem global, interdisciplinar e multiprofissional que contribua para que, apesar das progressivas limitações que possam acometê-los, seja possível descobrir estratégias para envelhecer com elevado nível de qualidade (44 Ferreira FPC, Bansi LO, Paschoal SMP. Serviços de atenção ao idoso e estratégias de cuidado domiciliares e institucionais. Rev Bras Geriatr Gerontol[Internet]. 2014 [cited 2017 Jan 20];17(4):911-26. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbgg/v17n4/1809-9823-rbgg-17-04-00911.pdf
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).
Uma boa assistência à saúde pressupõe confiança e vínculo do paciente com o profissional de saúde, construído no acolhimento e em todo o processo de cuidar. Esse gerenciamento deve ser iniciado na porta de entrada e acompanhar o paciente durante toda a sua trajetória pelo sistema de saúde ao longo do envelhecimento (55 Taddeo PS, Gomes KWL, Caprara A, Gomes AMA, Oliveira GC, Moreira TMM. Acesso, prática educativa e empoderamento de paciente em condições crônicas. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2012 [cited 2017 Jan 21];17(11):2923-30. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232012001100009
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).
No cuidado à pessoa idosa portadora de HAS, a ênfase na promoção da saúde recai na busca por modificar seu estilo de vida, adequando as possibilidades do idoso portador dessa doença com a realidade de sua vivência, a transformação dos processos individuais e ou coletivos, e a tomada de decisão para que sejam desenvolvidas ações predominantemente favoráveis à qualidade de vida. Assim, as relações entre profissionais e idosos com essa enfermidade demandam renovadas ferramentas e exercícios de criatividade no seu processo educativo. De modo geral, os idosos em condições crônicas requerem cuidado distinto, envolvendo um leque de ações diversificadas e de longa duração (66 Trentini M, Paim L, Guerreiro D. Condições crônicas e cuidados inovadores em saúde. São Paulo: Editora Atheneu; 2014.).
No entanto, no cotidiano das unidades de saúde observam-se poucas ou quase nenhuma oferta de ações que promovam a saúde do idoso portador de HAS. Na maioria das vezes, os idosos são rotulados com o nome de sua patologia e apenas são assistidos se desenvolverem HAS ou diabetes ou outra doença relacionada que se encaixe no rol das atividades sempre voltadas a tratar a doença já instalada, sem focar na prevenção do adoecimento (77 Guimarães ML. O cuidado ao idoso em saúde coletiva um desafio e um novo cenário de prática. In: Sousa MCM, Horta NC. Enfermagem em saúde coletiva teoria e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2013.).
O núcleo central da atenção à saúde do idoso portador de HAS deve ser a atenção primária, por meio da Estratégia Saúde da Família (ESF), que constitui uma das portas de entrada no Sistema Único de Saúde (SUS). Nesse nível de atenção, é possível monitorar suas condições de saúde e detectar precocemente os agravos. Assim, a abordagem ao idoso portador de HAS impõe novos paradigmas assistenciais, tendo como elemento fundamental a ênfase na capacidade funcional, o que torna imperiosa a formação de profissionais de saúde conscientes do novo cenário demográfico e epidemiológico do país (88 Coelho Filho JM. Saúde do Idoso. In: Rouquayrol MZ, Gurgel M. Epidemiologia & Saúde. Rio de Janeiro: MedBook; 2013.).
Estudos realizados no campo do cuidado ao idoso portador de HAS demonstram que tal prática vem sendo estruturada de acordo com as demandas que emergem no cotidiano dessa população, embora a assistência ainda esteja centrada no aspecto curativo, priorizando o controle da medicação e o tratamento. Essas pesquisas também indicam a necessidade de estruturar o processo de trabalho na ESF, de forma a combinar atividades programáticas e projetos terapêuticos individualizados, intervenções que promovem a saúde reduzindo riscos e, ao mesmo tempo, aumentando o grau de autonomia dos idosos com essa doença, para que saibam conviver com suas limitações e incapacidades (44 Ferreira FPC, Bansi LO, Paschoal SMP. Serviços de atenção ao idoso e estratégias de cuidado domiciliares e institucionais. Rev Bras Geriatr Gerontol[Internet]. 2014 [cited 2017 Jan 20];17(4):911-26. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbgg/v17n4/1809-9823-rbgg-17-04-00911.pdf
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-55 Taddeo PS, Gomes KWL, Caprara A, Gomes AMA, Oliveira GC, Moreira TMM. Acesso, prática educativa e empoderamento de paciente em condições crônicas. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2012 [cited 2017 Jan 21];17(11):2923-30. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232012001100009
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,99 Martins AB, D'Avila OP, Hilgert JB, Hugo FN. Atenção Primária a Saúde voltada as necessidades dos idosos: da teoria à prática. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2014[cited 2017 Oct 23];19(8):3403-16.Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n8/1413-8123-csc-19-08-03403.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n8/1413-...
10 Mallmann DG, Galindo Neto NM, Sousa JC, Vasconcelos EMR. Educação em saúde como principal alternativa para promover a saúde do idoso. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2015[cited 2017 Oct 23];20(6):1763-72. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n6/1413-8123-csc-20-06-1763.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n6/1413-...
-1111 Janini JP, Bessler D, Vargas AB. Educação em saúde e promoção da saúde: impacto na qualidade de vida do idoso. Saúde Debate[Internet]. 2015[cited 2017 Oct 23];39(105):480-90. Available from: http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v39n105/0103-1104-sdeb-39-105-00480.pdf
http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v39n105/01...
).
Nesse sentido, acredita-se que o estudo sobre a maneira como os trabalhadores de enfermagem percebem o idoso portador de HAS na ESF poderá fornecer contextualização sobre o campo da saúde, despertando olhares para aspectos afetivos, simbólicos e subjetivos, contribuindo para uma prática profissional voltada para a educação e a promoção da saúde ao torná-la mais compatível com as ações do cuidado e com as demandas específicas desse grupo etário. Espera-se também, com este trabalho, contribuir para a reorientação da saúde ao idoso portador de HAS no âmbito da Atenção Primária à Saúde (APS), incentivando novas pesquisas na área.
Assim, o presente estudo justifica-se pela necessidade de se conhecerem as percepções dos trabalhadores de enfermagem sobre o cuidado ao idoso portador de HAS na ESF. Nesse sentido, as singularidades destacadas pelos entrevistados na presente pesquisa poderão revelar um universo rico de possibilidades para compreender como é desenvolvido esse cuidado no território da ESF investigado, essencial para ampliar as discussões do tema em outros cenários no Brasil, com vistas ao aprimoramento de políticas públicas em saúde do idoso.
Diante do exposto, tem-se a seguinte questão norteadora: Quais as percepções dos trabalhadores de enfermagem sobre o cuidado ao idoso portador de HAS na ESF?
OBJETIVO
Compreender como os trabalhadores de enfermagem percebem o cuidado ao idoso portador de HAS no âmbito da ESF.
MÉTODO
Aspectos éticos
Por se tratar de investigação envolvendo seres humanos, o projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), pelo Parecer nº 551.146 e CAAE nº 25702013.3.0000. 0121. Antes de iniciar a coleta de dados, os participantes do estudo foram esclarecidos acerca do objetivo da pesquisa e leram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), que foi por eles assinado, manifestando sua anuência em participar, para que finalmente a pesquisa fosse iniciada.
O trabalho de campo foi conduzido pela pesquisadora discente do doutorado do presente estudo. Foram elucidados o compromisso e a responsabilidade da pesquisadora por preservar a identidade dos participantes e a confidencialidade das informações. Os entrevistados foram informados também sobre como a pesquisa seria conduzida, sobre os princípios éticos que seriam seguidos durante a entrevista, como: apresentação; explicação dos motivos da pesquisa; importância de assegurar o anonimato, sigilo das respostas, enfatizando que os participantes seriam livres para interromper e pedir esclarecimentos, além de poder também, se desejassem, deixar a pesquisa a qualquer momento sem nenhum prejuízo.
Tipo de estudo
Trata-se de um estudo descritivo, de natureza qualitativa.
Local do estudo
O município de Natal/RN está dividido administrativamente em cinco Distritos Sanitários (Norte 1, Norte 2, Sul, Leste e Oeste), com áreas de abrangência definidas. Cada distrito tem sua sede gerencial e é responsável pela vigilância e acompanhamento do desempenho da atenção prestada pelas equipes de saúde aos usuários da sua área. O local escolhido para realizar o estudo foi o Distrito Sanitário Oeste do município de Natal/RN, que mantém 12 Unidades Saúde da Família (USF), uma policlínica, duas clínicas especializadas em saúde mental, dois Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), CAPS I e CAPS II, com atendimento diurno (segunda a sexta) de adultos com transtornos mentais, um Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), duas unidades mistas e um pronto atendimento infantil.
Fonte de dados
No período de coleta de dados, estavam cadastrados 230 profissionais de enfermagem na ESF do Distrito Sanitário Oeste do município de Natal, Nordeste do Brasil. Participaram da pesquisa 20 trabalhadores de enfermagem do Distrito Sanitário Oeste do município de Natal, RN.Ressalta-se que para a seleção do número de participantes do presente estudo levou-se em consideração a saturação das falas.
Período do estudo
Os dados foram coletados no período de março a julho de 2014 por meio de uma entrevista semiestruturada com cada um dos participantes individualmente.
Critérios de inclusão e exclusão
Foram delimitados os seguintes critérios de inclusão: ser profissional de enfermagem e atuar há mais de um ano na ESF. Já os de exclusão foram: profissionais afastados por licença médica, licença maternidade e em férias. A entrevista semiestruturada foi conduzida por um único investigador,no local de trabalho, em sala reservada, com duração média de 30 minutos, previamente agendada com os trabalhadores de enfermagem das Unidades Saúde da Família (USF) conforme a disponibilidade. As falas dos entrevistados foram registradas em gravador de áudio digital.
Procedimentos metodológicos
Os dados foram analisados por meio da técnica de Análise de conteúdo, na modalidade Temática (1212 Bardin L. Analise de Conteúdo. 7ª ed. São Paulo: edições 70; 2011., com auxílio do software ATLAS.ti versão 7.0. O programa permite indexar dados não numéricos e teorizar sobre eles, facilitando a análise qualitativa. No processo de análise, foram seguidos os seguintes passos: leitura e releitura das entrevistas, seleção e codificação do conteúdo e agrupamento dos códigos semelhantes em categorias. A Análise Temática é definida como conjunto de técnicas de análise de comunicação com vistas a obter, por procedimentos sistemáticos e descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam inferir conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) dessas mensagens. A organização do conteúdo compreende as seguintes fases: codificação dos dados; categorização dos dados; e interação dos núcleos temáticos (1212 Bardin L. Analise de Conteúdo. 7ª ed. São Paulo: edições 70; 2011.). A análise teve início com a leitura e releitura das entrevistas já transcritas em texto, buscando compreender como os trabalhadores de enfermagem percebem o cuidado ao idoso portador de HAS no âmbito da ESF.
Referencial teórico-metodológico
O suporte teórico usado foi a integralidade, princípio constitucional e doutrinário de sustentação do SUS, considerada o maior desafio para gestores e profissionais de saúde. Pensar em integralidade é pensar em cuidado integral, da promoção da saúde à cura e à reabilitação (1313 Antunes MJM, Guedes MVC. Integralidade nos Processos Assistenciais na Atenção Básica. In: Garcia TR, Egry EY, organizadores. Integralidade da atenção no SUS e Sistematização da Assistência de Enfermagem. Porto Alegre: Artmed; 2010. p.19-28.). Assim, a organização do SUS deve responsabilizar-se pela continuidade do cuidado considerando as necessidades gerais das pessoas como um todo, não se limitando ao tratamento e ou à prevenção de suas complicações. Novas necessidades surgem na vida adulta, e as contingências desse viver resultam em novas necessidades para serem reconhecidas, gerenciadas e atendidas pelos profissionais de saúde. O olhar da integralidade nos convida a pensar em quão complexo é o cuidado à saúde e quão difícil é atingir esse ideal.
RESULTADOS
Participaram do estudo 20 mulheres que trabalham nas Unidades de Saúde da Família do Município de Natal, no Distrito Sanitário Oeste, onde realizavam parcerias na integração do ensino e serviço nos estágios curriculares da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Encontravam-se na faixa etária entre 40 e 49 anos de idade, tinham curso superior (45,4%) e nível médio (54,6%) e trabalhavam no setor em média há 12 anos.
Na modalidade temática, a análise de conteúdo das entrevistas possibilitou definir a Unidade Temática Central intitulada “percepções sobre a assistência à saúde do idoso portador de HAS na ESF transmitidas pelos trabalhadores de enfermagem”, a partir da qual emergiram,do próprio discurso das entrevistadas, as categorias Elementos que favorecem o cuidado ao idoso portador de HAS e Processos que dificultam o cuidado à saúde do idoso portador de HAS. Da primeira,se originaram três subcategorias: 1) O contexto territorial; 2) Parcerias e proatividade dos profissionais no cuidado aos idosos; 3) O vínculo do usuário com a equipe. Da segunda categoria, emergiram as seguintes subcategorias: 1) Assistência centrada na doença; 2) Formação acadêmica pautada no modelo biomédico; 3) Inexistência de Intersetorialidade; 4) Descontinuidade do cuidado na rede assistencial.
Em busca de núcleos de sentido para obter as categorias e subcategorias empíricas, foi elaborado o corpus de análise ao final de cada transcrição das entrevistas. Para tanto, a transcrição das falas foi lida e relida de forma exaustiva e em seguida analisada cada uma, norteando-se pelo objeto de estudo.
O contexto territorial
Para avaliar a situação de saúde no território, espaço vivo onde reside a comunidade que está em movimento e transformação permanentes, é importante que a Equipe de Saúde da Família faça seu monitoramento, acompanhando as ações e os resultados de sua prática sobre a situação de saúde da população, sobretudo dos idosos portadores de HAS, como relata a seguinte participante:
Eu acho que, enquanto enfermeira responsável por aquele território onde eu trabalho, eu tenho que acompanhar o idoso portador de hipertensão arterial sistêmica, saber como ele está sendo tratado, como está sendo acompanhado, se ele está sendo medicado, como está a alimentação dele; são esses acompanhamentos que a gente faz no dia a dia no território [...] nesse território é possível criar vínculo e afeto com esse idoso. (P16)
O agente de saúde é uma peça importantíssima, porque é ele que identifica o idoso portador de hipertensão arterial sistêmica no território; ele conhece não só o paciente, mas também a família, a história da família e como vivem esses idosos, seus costumes, suas crenças; então se cria um vínculo que facilita o cuidado[...] com o tempo se cria uma relação de confiança [...] tanto esse idoso quanto o trabalhador passam a ser responsáveis pelo cuidado. (P17)
Nesse contexto, essas falas permitem que os trabalhadores de enfermagem conheçam a subjetividade dos sujeitos, favorecendo lhes perceber elementos importantes presentes nas crenças, atitudes, valores e informações, segundo experiências subjetivas da comunicação entre esses sujeitos. Nessa perspectiva, as percepções constituem uma realidade à qual é atribuído um valor de forma a preservar a construção social da vivência em torno do controle da HAS da pessoa idosa na ESF.
Parcerias e proatividade dos profissionais no cuidado aos idosos
Os relatos a seguir evidenciam como uma organização simbólica sobre a qual são desenvolvidas as diferentes práticas e relações sociais no controle da HAS da pessoa idosa, pelos trabalhadores de enfermagem, instituição e comunidade, representa uma produção subjetiva.
Aqui na unidade de saúde, com os programas que tem,... os trabalhos manuais, as festas trimestrais; quando eles completam ano, a gente junta janeiro, fevereiro, março e faz essa festa. Tem a festa de carnaval, tem a programação. E o que a gente faz? Fazemos parcerias [...] Pedimos pra cada servidor adotar um idoso portador de hipertensão arterial sistêmica e a gente sai pedindo dinheiro, dois, três reais, sai aqui na comunidade e pede. O cuidado de enfermagem é isso, a gente vai além, temos que ser proativos. (P19)
A gente acostumou aqui a trabalhar com doações pra fazer bazar; tem uma tesoureira, às vezes a gente arrecada quinhentos, seiscentos reais, e esse dinheiro é usado para o lanche dos idosos portadores de hipertensão arterial sistêmica [...] temos que ser proativos. (P19)
Na parte social é onde a gente pode ir, a gente trabalha com o Centro de Reabilitação e Assistência Social e dessa forma, a gente consegue fazer o trabalho com parcerias. A gente chama a família do idoso portador de hipertensão arterial sistêmica, a gente conversa. Tem uma parceria com alguns supermercados e a gente distribui, quinzenalmente ou mensalmente, pra cada família dessas muito carentes, um sacolão. (P19)
Nesse sentido, sabe-se que a criação de espaços saudáveis nas comunidades, nos territórios e nas famílias depende dos projetos e das ações voltados para promover a saúde. Entende-se que a promoção da saúde é uma estratégia de articulação transversal que confere visibilidade aos fatores que colocam a saúde da população em risco e às diferenças entre necessidades, territórios e culturas presentes no nosso país, visando à criação de mecanismos que reduzam as situações de vulnerabilidade, defendendo a equidade e incorporando a participação e o controle social na gestão das políticas públicas.
Convêm salientar que o modo de viver dos idosos portadores de HAS é influenciado por suas concepções de vida, crenças, valores e conhecimentos, variáveis integrantes da cultura familiar ou coletiva à qual pertencem. Em tal cenário há confluência de múltiplos atores sociais, sendo relevante destacar a relação de diálogo entre profissionais, idosos, famílias e comunidade, encorajando-os a desenvolver potencialidades, estimulando, assessorando-os a conviver bem com sua condição crônica; integrando-os como sujeitos políticos e sociais, atuando de forma proativa na elaboração e na participação de estratégias que visam a condições de vida e de saúde mais satisfatórias, buscando parcerias e ações intersetoriais para melhorar a situação de saúde, educação, habitação, renda e lazer, entre outros.
Vínculo do usuário com a equipe
O serviço de saúde deve organizar-se para assumir sua função central de acolher, escutar e oferecer uma resposta positiva, capaz de resolver problemas de saúde e ou de minorar danos e sofrimentos, ou ainda se responsabilizar pela resposta, mesmo que ela seja ofertada em outros pontos de atenção da rede.
A proximidade e a capacidade de acolhimento, vinculação e responsabilização são fundamentais para consolidar a atenção básica como contato e porta de entrada preferencial da rede de atenção. Esses conteúdos corroboram os depoimentos dos trabalhadores de enfermagem do estudo quando afirmavam, em suas falas, a corresponsabilidade firmada pelos membros da equipe da ESF com os idosos portadores de HAS de suas áreas adscritas:
Estratégia Saúde da Família veio nesse sentido, de criar o vínculo, de formar os elos de responsabilidade e corresponsabilidade, tanto da equipe para a comunidade quanto da comunidade para a equipe e isso se aplica aos idosos portadores de hipertensão arterial sistêmica [...] a enfermagem se aproxima muito do idoso e ainda mais se ele tem alguma doença crônica [...] a escuta e o acolhimento ao idoso portador de HAS é muito importante para criar vínculo e ajudar ele na adesão ao tratamento [...] com o vínculo fica mais fácil desenvolver um acompanhamento individualizado. (P15)
O agente de saúde também é muito importante, porque a gente cobra e eles trazem os idosos portadores de hipertensão arterial sistêmica. São os agentes que possuem maior vínculo com a comunidade [...] com a formação do vínculo se consegue promover um cuidado mais integral [...] nas reuniões sempre estamos frisando que nós temos essa responsabilidade social com eles, ninguém pode fazer vista grossa, porque também somos responsáveis pelo cuidado dos idosos portadores de HAS. (P21)
Assistência centrada na doença
Nessa subcategoria, os trabalhadores de enfermagem destacaram que percebiam a importância de prestar cuidado integral aos idosos portadores de HAS, embora reforçassem o olhar sobre as dimensões biológicas, reconhecendo a necessidade de ampliar as dimensões sociais, culturais, psicológicas e ambientais dos serviços ofertados, como mostram os depoimentos a seguir:
Na promoção à saúde dos idosos portadores de hipertensão arterial sistêmica, era pra ter lazer. Eles ficam sentados na cadeira de dia e de noite, não têm lazer, não têm atividades. Aqui a gente não oferece isso para eles, só para aqueles que podem andar, podem se movimentar; mas para aqueles que não podem não existe alternativa [...] como não temos alternativas, o cuidado se resume apenas a transcrição de receitas médicas e verificação da pressão arterial sistêmica, ou seja, o foco é somente a doença. (P22)
Se você precisa fazer um passeio para os idosos portadores de hipertensão arterial sistêmica, tem que ir atrás do carro; se a entrada é paga, você que tem que ir atrás pra conseguir isenção desse pagamento; se você quer oferecer um lanche, você que tem que trazer esse lanche, tirar do seu dinheiro, do seu salário pra fazer um lanche [...] a gente acaba se limitando a tratar a doença e esquece outros aspectos importantes. (P5)
Formação acadêmica pautada no modelo biomédico
Ao falar de suas percepções sobre sua prática com o idoso portador de HAS, os trabalhadores de enfermagem do estudo fizeram uma crítica ao modelo biomédico.
Então, o médico dá aquela receita para o idoso portador de HAS receber três meses a medicação nas farmácias populares. E isso também o distancia da unidade de saúde, porque ele se cadastra na farmácia para pegar essa medicação e com isso não participa das outras atividades ofertadas na unidade. Assim, a assistência se resume à vinda ao médico para buscar a receita a cada três meses. Ainda seguimos o modelo biomédico, dificultando a compreensão do processo de adoecimento do indivíduo [...] muitos da enfermagem não consideram a concepção da atenção integral à saúde. (P16)
Com relação à assistência ao idoso portador de HAS, é mais curativa, a gente sabe que os pacientes vêm aqui para o médico; eles recebem receita, mas... eu acho que é muito em cima do problema que o paciente traz. A culpa é da nossa formação que foi toda centrada no modelo biomédico [...] a busca pelo atendimento integral do idoso portador de HAS exige o rompimento do modelo biomédico [...] quando sua formação não é biologista, você consegue integrar ao cuidado do idoso portador de HAS, seus familiares e cuidadores e no enfrentamento de outras situações como a perda da capacidade funcional e até o luto. (P5)
Isso não é culpa da gente não, é culpa da academia, é culpa do Ministério da Saúde, que sempre foca nas doenças. Na faculdade nunca estudei nada sobre geriatria e gerontologia [...] aspectos sociais, econômicos e subjetivos da determinação do processo de saúde-doença não são investigados quando sua formação é biologista. Os profissionais aqui ainda são muito biologistas. A experiência com o idoso portador de HAS aqui na área em que eu atuo é bem preocupante, temos alguns com dependência funcional já muito avançada, porque normalmente encontramos alguns que vivem sós ou que os parentes não têm tempo pra cuidar. (P4)
Inexistência de Intersetorialidade
Os resultados a seguir demonstram as percepções dos trabalhadores de enfermagem que consideraram a rede de saúde desarticulada. Eventos aqui elencados e que constituíram essa categoria demonstram as dificuldades do idoso portador de HAS no uso do serviço público de saúde, quando busca suporte ao tratamento da doença crônica na rede de atenção à saúde.
Quando você pensa na questão das dificuldades do idoso portador de HAS, sem riscos cardiovasculares, esse é mais fácil da gente ficar controlando. No entanto, quando ele precisa de atendimento com especialistas, isso quebra um pouco [...] falta articulação entre os diferentes serviços e ações relacionados ao cuidado do idoso portador de HAS [...] também observo a inexistência de ações integradas no cuidado do idoso portador de HAS [...] a falta de estratégias para resolução dos problemas dos idosos portadores de HAS de forma criativa e de forma intersetorial são entraves para a assistência. (P6)
Na prática eu não vejo a adoção de políticas de saúde pública integradas, apoiadas em ações intersetoriais [...] falta integração entre diferentes áreas e diferentes profissionais da ESF no cuidado ao idoso portador de HAS. Muitas vezes a gente se depara com situações em que não pode dar um direcionamento. Quando, por exemplo, o idoso portador de hipertensão arterial sistêmica não conseguiu agendar ou realizar uma consulta de média ou de alta complexidade e aí muitas vezes passa meses ou anos sem conseguir e podendo sofrer até uma complicação porque não foi dada a ele a garantia de atendimento da média e alta complexidade, o que foge à nossa capacidade de atenção na unidade básica [...]ações intersetoriais como aumento dos níveis de atividade física de idosos portadores de HAS são fundamentais, mas não temos tempo para isso. (P15)
Assim, verificou-se que os idosos portadores de HAS e com maiores necessidades de cuidados de saúde buscam atendimento em outros serviços de referência da atenção básica. No entanto, estes não se encontram preparados para prestar atendimento adequado a essa população por falta de uma rede articulada que dê prosseguimento ao cuidado em outra esfera do sistema.
Segundo a percepção dos trabalhadores de enfermagem, a morosidade do atendimento do serviço público na média e alta complexidade poderá agravar o problema de saúde do usuário. A situação fica ainda mais difícil quando se trata de agendar consulta com médicos especialistas, pois, dependendo da especialidade, geralmente o usuário espera um longo período para ser atendido.
Descontinuidade do cuidado na rede assistencial
Na percepção dos trabalhadores de enfermagem, evidencia-se a preocupação com a interrupção do acompanhamento ao idoso portador de HAS por uma equipe de saúde ou por algum profissional que a compõe, seja esse realizado de forma individual na Unidade Básica de Saúde (UBS), em reuniões com grupo de idosos portadores de HÁS ou através de visitas domiciliares à família. Além de prejudicar a relação de vínculo e confiança estabelecida pela equipe com esse idoso e sua família, a mudança do profissional pode ainda trazer o problema da descontinuidade do tratamento. Tal situação prejudica o atendimento ao idoso portador de HAS, como revela o depoimento a seguir:
A falta do profissional médico na nossa realidade é complicado! Os outros profissionais nem tanto, mas há muita rotatividade de médico. Eu vejo isso como uma coisa negativa para o cuidado ao idoso portador de hipertensão arterial sistêmica, pois ocorre a quebra das atividades em andamento. Aqui, quando o médico está conhecendo aquela comunidade, é o tempo de ir embora e vir outro. (P16)
A manutenção da capacidade funcional do idoso portador de HAS também constitui um desafio para os serviços de saúde e seus profissionais. Nesse contexto, a diversidade dos processos na APS e a real inclusão da saúde desse idoso exigem reestruturação da rede de atenção à saúde.
E saindo da unidade de saúde para outros setores dentro da secretaria também é difícil [...] a assistência ainda se encontra segmentada e desarticulada [...] o cuidado não é interligado a uma rede de serviços mais complexos. É difícil você encaminhar os idosos portadores de HAS para um geriatra, é difícil transporte desse paciente, porque ele não tem carro, o serviço não tem carro; antes até tinha pra fazer fisioterapia, mas hoje a gente não tem mais [...] ainda existem muitas barreiras entre os diferentes níveis de atenção. (P16)
A referência e contra referência não funciona. Você tem um idoso portador de hipertensão arterial sistêmica que precisa de uma avaliação hoje, e um mês depois ele não foi avaliado; e um paciente que necessita de avaliação vascular não pode esperar um mês; ele vai agravar e vai ser ocultado, porque não foi garantida a ele a rede articulada e foge à nossa competência, tanto técnica quanto de base local [...] a ausência de uma rede de atenção integral à saúde da pessoa idosa é o maior desafio no cuidado do idoso portador de HAS [...] a rede é desorganizada, faltam serviços de apoio, falta uma integração dos serviços, os serviços especializados são insuficientes . (P15)
DISCUSSÃO
A territorialização é um dos pressupostos básicos do trabalho na ESF, que possibilita reconhecer as condições de vida e a situação de saúde da população de uma área de abrangência, bem como os riscos coletivos e as potencialidades dos territórios. A dimensão “responsabilidade sanitária” diz respeito ao papel que as equipes devem assumir em seu território de atuação, no tocante às questões ambientais, epidemiológicas, culturais e socioeconômicas, contribuindo, por meio de ações em saúde, para reduzir riscos e vulnerabilidades (1414 Pasternak S. Habitação e saúde. Estud Av[Internet]. 2016 [cited 2017 Mar 22];3(86):51-66. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ea/v30n86/0103-4014-ea-30-86-00051.pdf
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).
No presente estudo, o território constitui-se como um espaço para construção de vínculo, afetividade e confiança entre o idoso portador de HAS e os trabalhadores de enfermagem (1515 Simões WMB, Moreira MS. A importância dos atributos: acolhimento, vínculo e longitudinalidade na construção da função de referência em saúde mental na atenção primária à saúde. Enferm Rev[Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 10];16(3):223-39. Available from: http://periodicos.pucminas.br/index.php/enfermagemrevista/article/view/12894
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, permitindo aprofundar o processo de corresponsabilização pela saúde construído ao longo do tempo, além de carregar em si um potencial terapêutico.
Nesse território, o enfermeiro pode qualificar o cuidado ao idoso portador de HAS no âmbito da ESF, realizando ações que favoreçam o cuidado integral, tais como: promoção à saúde (ações educativas com ênfase em mudanças do estilo de vida, redução dos fatores de risco e produção de material educativo); treinamento de profissionais; encaminhamento a outros profissionais, quando indicado; vigilância, informação, avaliação e monitoramento da HAS e seus fatores de risco, indispensáveis para a organização da resposta dos serviços, de forma integrada aos sistemas de informações em saúde, adotando-se indicadores mensuráveis e específicos; ações assistenciais individuais e em grupos operativos; avaliação multidimensional de capacidade funcional, saúde física, função cognitiva, estado emocional e condições socioambientais; elaboração e implementação de planos de cuidado, participação em projetos de pesquisa e gerenciamento de programas de controle de HAS (1616 Pessoa VM, Rigotto RM, Carneiro FF, Teixeira ACA. Sentidos e métodos de territorialização na atenção primária à saúde. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 25];18(8):2253-62. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n8/09.pdf
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).
As parcerias e a proatividade dos trabalhadores de enfermagem também foram percebidas no presente estudo como elementos que favorecem o cuidado aos idosos portadores de HAS na ESF. O cenário do trabalho contemporâneo tem se revelado cada vez mais exigente, estimulando um padrão profissional por um trabalhador cada vez mais qualificado, proativo e empreendedor (1717 Porto AR, Dall'Agnol CM. Analysis of nursing proactivity in a public university hospital. Acta Paul Enferm [Internet]. 2016 [cited 2018 May 14];29(5):603-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ape/v29n5/en_1982-0194-ape-29-05-0603.pdf
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).
Na seara da enfermagem, tal perspectiva não é diferente, emergindo a necessidade de que os trabalhadores de enfermagem vislumbrem uma assistência diferenciada, qualificada, com vistas às melhores práticas de cuidado, o que remete a reflexão crítica acerca das ações que desenvolve, bem como a respeito de suas finalidades e de como essas ações podem ser aprimoradas. Dada as especificidades nas práticas de cuidado aos idosos no âmbito da ESF espera-se dos trabalhadores de enfermagem a identificação de suas necessidades de saúde, de maneira a contribuir com a preservação da capacidade funcional da pessoa idosa, inovando e implementado o seu fazer (1717 Porto AR, Dall'Agnol CM. Analysis of nursing proactivity in a public university hospital. Acta Paul Enferm [Internet]. 2016 [cited 2018 May 14];29(5):603-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ape/v29n5/en_1982-0194-ape-29-05-0603.pdf
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).
O agir proativo dos trabalhadores de enfermagem foi visto como oportunidade de ir além da doença e de valorizar queixas e aspectos subjetivos dos idosos portadores de HAS, demonstrando preocupação com a efetividade do cuidado e das ações desenvolvidas. Nessa perspectiva, enfatiza-se a relevância das ações que abarcam as múltiplas dimensões do cuidado, bem como a importância de estratégias que considerem a multi e a interdisciplinaridade, e a não fragmentação dos processos, com vistas à melhoria contínua das práticas (1818 Teixeira C, Silva CCS, Bernardes GS, Sá NPP, Prado OS. O vínculo entre usuários e equipes em duas unidades de saúde da família em um município do Estado do Rio de Janeiro. Rev APS [Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 10];16(4):444-54. Available from: https://aps.ufjf.emnuvens.com.br/aps/article/view/1725/768
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).
A promoção da saúde apresenta-se como ferramenta fundamental para o cuidado ao idoso portador de HAS. Deve sustentar-se no cuidado integral que promova o desenvolvimento da autonomia e do autocuidado, o envelhecimento ativo, minimizando os fatores de risco e possíveis complicações da HAS (1919 Baratieri T, Mandu ENT, Marcon SS. Compreensão de enfermeiros sobre vinculo e longitudinalidade do cuidado na estratégia saúde da família. Cienc Enferm[Internet]. 2012 [cited 2017 Dec 10];18(2):11-22.Available from: http://dx.doi.org/10.4067/S0717-95532012000200002
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). Mas para alcançar êxito na prevenção e no controle da HAS, é necessário desenvolver colaboração fora do setor saúde através do estabelecimento de parcerias. Nesse sentido, o enfermeiro deve procurar estimular os idosos, por meio dos representantes da comunidade e da sociedade civil, a desenvolver atividades comunitárias. A criação de Ligas e Associações de Portadores de HAS, em parceria com a ESF, são exemplos de estratégias que pode aumentar a adesão do paciente ao tratamento instituído.
Ademais, o cuidado integral ao idoso portador de HAS deve abranger todos os níveis de atuação, articulando ações da linha do cuidado no campo da macro e da micropolítica. No campo da macropolítica, situam-se ações regulatórias, articulações intersetoriais e organização da rede de serviços e do sistema de saúde (fortalecimento das equipes multidisciplinares), bem como apoio aos sistemas de decisão (guidelines baseados em evidências, treinamento dos profissionais) e ao sistema de informação clínico. No campo da micropolítica, atuação da equipe na linha do cuidado e vinculação e responsabilização, com acompanhamento longitudinal e a produção da autonomia do usuário (66 Trentini M, Paim L, Guerreiro D. Condições crônicas e cuidados inovadores em saúde. São Paulo: Editora Atheneu; 2014.-77 Guimarães ML. O cuidado ao idoso em saúde coletiva um desafio e um novo cenário de prática. In: Sousa MCM, Horta NC. Enfermagem em saúde coletiva teoria e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2013.).
No campo da promoção da saúde, a ideia de construir ambientes mais saudáveis no espaço familiar, envolvem, além da tecnologia médica, o reconhecimento das potencialidades terapêuticas presentes nas próprias relações familiares e redes sociais parceiras existentes na comunidade, como vizinhos, colegas de trabalho, grupos religiosos, grupos de autoajuda e tantos outros (1616 Pessoa VM, Rigotto RM, Carneiro FF, Teixeira ACA. Sentidos e métodos de territorialização na atenção primária à saúde. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 25];18(8):2253-62. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n8/09.pdf
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).
Ademais, as dificuldades de saúde dos idosos portadores de HAS requerem do modelo de cuidado um olhar direcionado a esse grupo etário, mais eficiente e eficaz para desenvolver ações que envolvam todos os níveis da atenção e ainda manter um fluxo bem desenhado de ações de educação, promoção da saúde, retardamento de doenças e debilidades, e redução de iniquidades de saúde (2020 Veras RP. Prevenção de doenças em idosos: os equívocos dos atuais modelos. Cad Saúde Pública[Internet]. 2012 [cited 2017 Dec 06];28(10):1834-40. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v28n10/03.pdf
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).
Outro elemento desvelado no estudo como essencial para o cuidado ao idoso portador de HAS na ESF foi o vínculo do usuário com a equipe. Trata-se de um elemento fundamental no sentimento de amparo e segurança frente às necessidades de saúde. Ao vislumbrar mudanças no modelo de atenção à saúde, o Ministério da Saúde propõe a ESF e define para o seu direcionamento o estabelecimento de vínculos e a criação de laços de compromissos e de responsabilidades entre população e profissionais de saúde (2121 Valcarenghi RV, Lourenço LFL, Siewert JS, Alvarez AM. Nursing scientific production on health promotion, chronic condition, and aging. Rev Bras Enferm[Internet]. 2015 [cited 2017 Apr 25];68(4):618-25. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v68n4/en_0034-7167-reben-68-04-0705.pdf
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).
O presente estudo evidenciou a existência de aproximação entre usuário e trabalhadores de enfermagem, envolvendo afetividade, ajuda, respeito, confiança e corresponsabilidade. Já rotatividade do profissional médico foi apontada como motivo para quebrar esse vínculo construído nos encontros entre profissional e usuário, prejudicando a continuidade das atividades iniciadas e terapêuticas instituídas, corroborando com o resultado de outros estudos (44 Ferreira FPC, Bansi LO, Paschoal SMP. Serviços de atenção ao idoso e estratégias de cuidado domiciliares e institucionais. Rev Bras Geriatr Gerontol[Internet]. 2014 [cited 2017 Jan 20];17(4):911-26. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbgg/v17n4/1809-9823-rbgg-17-04-00911.pdf
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,99 Martins AB, D'Avila OP, Hilgert JB, Hugo FN. Atenção Primária a Saúde voltada as necessidades dos idosos: da teoria à prática. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2014[cited 2017 Oct 23];19(8):3403-16.Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n8/1413-8123-csc-19-08-03403.pdf
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,1515 Simões WMB, Moreira MS. A importância dos atributos: acolhimento, vínculo e longitudinalidade na construção da função de referência em saúde mental na atenção primária à saúde. Enferm Rev[Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 10];16(3):223-39. Available from: http://periodicos.pucminas.br/index.php/enfermagemrevista/article/view/12894
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,1818 Teixeira C, Silva CCS, Bernardes GS, Sá NPP, Prado OS. O vínculo entre usuários e equipes em duas unidades de saúde da família em um município do Estado do Rio de Janeiro. Rev APS [Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 10];16(4):444-54. Available from: https://aps.ufjf.emnuvens.com.br/aps/article/view/1725/768
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). Frente a isso, é possível discorrer que a ocorrência do vínculo é capaz de ampliar a eficácia das ações de saúde e favorecer a participação e envolvimento dos sujeitos na prestação de cuidado. Uma vez que a equipe e a população mantêm estreitas relações e contato continuado no interior do serviço e fora dele, o vínculo se consolida mais facilmente, propiciando identificar as necessidades e respostas mais apropriadas (2222 Seixas CT, Merhy EE, Baduy RS, Slomp Jr H. La integralidad desde la perspectiva del cuidado em salud: una experiência del Sistema Único de Salud en Brasil. Salud colect[Internet]. 2016[cited 2017 Sep 30];12(1):113-23. Available from: https://www.scielosp.org/pdf/scol/2016.v12n1/113-123/es
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).
Nesse sentido, a vinculação estabelecida entre trabalhadores de enfermagem da ESF e o idoso portador de HAS fortalece a confiança nos serviços. E essa relação é fundamental para ampliar a qualidade da assistência, pois, entre outros fatores, ela influencia diretamente a adesão do indivíduo ao tratamento da HAS, fazendo com que, a partir daí, ele acredite nas orientações recebidas e tome os cuidados necessários para controlar a doença (1717 Porto AR, Dall'Agnol CM. Analysis of nursing proactivity in a public university hospital. Acta Paul Enferm [Internet]. 2016 [cited 2018 May 14];29(5):603-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ape/v29n5/en_1982-0194-ape-29-05-0603.pdf
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).
A escuta qualificada no acolhimento é imprescindível para o estabelecimento do vínculo, é compreendida como um dos pilares da ação terapêutica, fundamental para uma assistência com vistas à integralidade (1818 Teixeira C, Silva CCS, Bernardes GS, Sá NPP, Prado OS. O vínculo entre usuários e equipes em duas unidades de saúde da família em um município do Estado do Rio de Janeiro. Rev APS [Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 10];16(4):444-54. Available from: https://aps.ufjf.emnuvens.com.br/aps/article/view/1725/768
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). A recomendação é que haja um acompanhamento individualizado dos idosos portadores de HAS, compreendendo que o contexto de cada um e a forma como vivem com a doença se constituem em elementos essenciais para o cuidado que tem a intenção de manter os níveis pressóricos sob controle e promover qualidade de vida a eles (1919 Baratieri T, Mandu ENT, Marcon SS. Compreensão de enfermeiros sobre vinculo e longitudinalidade do cuidado na estratégia saúde da família. Cienc Enferm[Internet]. 2012 [cited 2017 Dec 10];18(2):11-22.Available from: http://dx.doi.org/10.4067/S0717-95532012000200002
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).
Neste sentido, mesmo que as contribuições da ESF para a efetiva mudança de modelo de atenção ainda não tenham acontecido da forma esperada, é possível constatar mudanças concretas nas relações, uma vez que os profissionais passam a compreender o usuário na sua integralidade, no seu contexto familiar e social e em diferentes situações vividas no cotidiano, distintamente das demais modalidades de atenção que coexistem no sistema de saúde (1515 Simões WMB, Moreira MS. A importância dos atributos: acolhimento, vínculo e longitudinalidade na construção da função de referência em saúde mental na atenção primária à saúde. Enferm Rev[Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 10];16(3):223-39. Available from: http://periodicos.pucminas.br/index.php/enfermagemrevista/article/view/12894
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).
A formação acadêmica pautada no modelo biomédico ficou caracterizada na fala dos trabalhadores de enfermagem, como elemento que dificulta o cuidado ao portador de HAS. Situação semelhante, também foi encontrada em outros estudos realizados na ESF, mostrando que essa situação se repete em diferentes locais da realidade brasileira (2323 Andrade RS, Caldas LBSN, Falcao MLP, Goes PSA. Processo de trabalho em Unidade de Saúde da Família e a educação permanente. Trab Educ Saúde[Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 11];14(2):505-21. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tes/v14n2/1678-1007-tes-1981-7746-sip00108.pdf
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24 Fertonani HP, Pires DEP, Biff D, Scherer MDA. The health care model: concepts and challenges for primary health care in Brazil. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2015 [cited 2017 Oct 25];20(6):1869-78. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n6/en_1413-8123-csc-20-06-1869.pdf
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-2525 Yoshida VC, Andrade MGG. O cuidado à saúde na perspectiva de trabalhadores homens portadores de doenças crônicas. Interface (Botucatu) [Internet].2016 [cited 2017 Dec 05];20(58):597-610. Available from: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=180146193007
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).
A formação profissional alicerçada no paradigma biomédico se relaciona a uma forma de pensar conjugada à prática cartesiana: conhecem apenas como possibilidade viável a prática medicamentosa do corpo (44 Ferreira FPC, Bansi LO, Paschoal SMP. Serviços de atenção ao idoso e estratégias de cuidado domiciliares e institucionais. Rev Bras Geriatr Gerontol[Internet]. 2014 [cited 2017 Jan 20];17(4):911-26. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbgg/v17n4/1809-9823-rbgg-17-04-00911.pdf
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). Todavia, a assistência à saúde da pessoa idosa portadora de HAS precisa ser pautada na sua totalidade biopsicossocial e na preservação de sua funcionalidade (77 Guimarães ML. O cuidado ao idoso em saúde coletiva um desafio e um novo cenário de prática. In: Sousa MCM, Horta NC. Enfermagem em saúde coletiva teoria e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2013.). Nessa perspectiva, tratar significa cuidar e dialogar, e não apenas medicar, nem o excesso de intervencionismo sobre os corpos através de exames. Para tanto, é necessário, por parte do profissional de saúde, além do preparo técnico-científico, o humanístico, com a valorização da dimensão subjetiva da saúde dos usuários (2626 Conte M, Cruz CW, Silva CG, Castilhos NRM, Nicolella ADR. Convergence and Non-Convergence: stories of elderly who have attempted suicide and the Integrated Care System in Porto Alegre/RS, Brazil. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2015 [cited 2017 Dec 02];20(6):1741-9. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26060952
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).
Os profissionais formados com base no modelo biomédico apresentam dificuldades para compreender o processo de adoecimento do indivíduo, porque, na sua atuação profissional, não consideram a concepção da Atenção Integral à Saúde (2323 Andrade RS, Caldas LBSN, Falcao MLP, Goes PSA. Processo de trabalho em Unidade de Saúde da Família e a educação permanente. Trab Educ Saúde[Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 11];14(2):505-21. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tes/v14n2/1678-1007-tes-1981-7746-sip00108.pdf
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).
Esse sistema de saúde fragmentado é típico de um modelo de atenção à saúde voltado para o atendimento das condições agudas, o que se configura numa contradição da saúde brasileira, por apresentar um quadro de doenças crônicas. Esse impasse está intimamente relacionado à hegemonia histórica do chamado modelo médico assistencial ou biomédico, caracterizado pela concepção biológica e mecanicista do corpo. Segundo essa concepção, a saúde é compreendida como a ausência de doença, valorizando apenas a abordagem tecnicista da assistência à saúde, cujos atendimentos são predominantemente curativos (2222 Seixas CT, Merhy EE, Baduy RS, Slomp Jr H. La integralidad desde la perspectiva del cuidado em salud: una experiência del Sistema Único de Salud en Brasil. Salud colect[Internet]. 2016[cited 2017 Sep 30];12(1):113-23. Available from: https://www.scielosp.org/pdf/scol/2016.v12n1/113-123/es
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).
Para reverter esse modelo, o sistema e os serviços de saúde devem investir em tecnologias leves do tipo relacionais, focalizadas no usuário e em suas necessidades (2323 Andrade RS, Caldas LBSN, Falcao MLP, Goes PSA. Processo de trabalho em Unidade de Saúde da Família e a educação permanente. Trab Educ Saúde[Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 11];14(2):505-21. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tes/v14n2/1678-1007-tes-1981-7746-sip00108.pdf
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). Autores explicam a importância de intervenções contínuas de promoção da saúde, prevenção de riscos para o controle das doenças crônicas, principalmente HAS e diabetes, e do fortalecimento do vínculo por meio da comunicação eficaz para obter conhecimentos acerca da realidade desses grupos populacionais (2424 Fertonani HP, Pires DEP, Biff D, Scherer MDA. The health care model: concepts and challenges for primary health care in Brazil. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2015 [cited 2017 Oct 25];20(6):1869-78. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n6/en_1413-8123-csc-20-06-1869.pdf
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).
A ESF propõe um trabalho com intervenções coletivas alicerçadas no acolhimento, vínculo e integralidade, com a demanda por meio de uma relação dialógica pautada no reconhecimento do usuário como um ser histórico, com vivências e experiências que podem contribuir para mudanças no contexto da saúde. Desse modo, os princípios e diretrizes dessa estratégia pressupõem o desenvolvimento de práticas coletivas que, na essência, são práticas privilegiadas porque propõem um cuidado diferenciado, integral e interativo que se caracteriza por potentes “espaços” geradores de autonomia no processo de trabalho (2222 Seixas CT, Merhy EE, Baduy RS, Slomp Jr H. La integralidad desde la perspectiva del cuidado em salud: una experiência del Sistema Único de Salud en Brasil. Salud colect[Internet]. 2016[cited 2017 Sep 30];12(1):113-23. Available from: https://www.scielosp.org/pdf/scol/2016.v12n1/113-123/es
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23 Andrade RS, Caldas LBSN, Falcao MLP, Goes PSA. Processo de trabalho em Unidade de Saúde da Família e a educação permanente. Trab Educ Saúde[Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 11];14(2):505-21. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tes/v14n2/1678-1007-tes-1981-7746-sip00108.pdf
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24 Fertonani HP, Pires DEP, Biff D, Scherer MDA. The health care model: concepts and challenges for primary health care in Brazil. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2015 [cited 2017 Oct 25];20(6):1869-78. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n6/en_1413-8123-csc-20-06-1869.pdf
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-2525 Yoshida VC, Andrade MGG. O cuidado à saúde na perspectiva de trabalhadores homens portadores de doenças crônicas. Interface (Botucatu) [Internet].2016 [cited 2017 Dec 05];20(58):597-610. Available from: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=180146193007
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).
É importante destacar que a mudança em busca da integralidade exige o rompimento do modelo biomédico através de políticas de priorização da Saúde da Família, de mudança na formação de recursos humanos (66 Trentini M, Paim L, Guerreiro D. Condições crônicas e cuidados inovadores em saúde. São Paulo: Editora Atheneu; 2014.). Ademais, a população idosa apresenta alterações fisiológicas e patologias que cursam com crescente dependência. Do ponto de vista teórico, tal fato demanda aprofundamento de conceitos, tais como níveis de prevenção, paliativismo, suporte e apoio social. Na prática, aos profissionais de enfermagem cabem trabalhar com pessoas idosas, suas famílias/cuidadores, enfrentando juntos situações de perda da capacidade funcional e morte (2727 Pinheiro GML, Alvarez AM, Pires DEP. A configuração do trabalho da enfermeira na atenção ao idoso na Estratégia de Saúde da Família. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2012 [cited 2017 Dec 05];17(8):2105-15. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v17n8/21.pdf
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).
Conceitos específicos da gerontologia, como síndromes geriátricas, reabilitação, fragilidade, independência (capacidade de executar tarefas sem ajuda) e autonomia (capacidade de autodeterminação), não constam habitualmente nos conteúdos da graduação, mas são operacionais para a proposição de condutas adequadas (2828 Neves RG, Duro SMS, Flores TR, Nunes BP, Costa CS, Wendt A, et al. Atenção oferecida aos idosos portadores de hipertensão: pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Cad Saúde Pública[Internet]. 2017[cited 2017 Oct 23];33(7):e00189915. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v33n7/1678-4464-csp-33-07-e00189915.pdf
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). Intervenções baseadas em tal moldura extrapolam o modelo biomédico hegemônico. Enfocando a doença, o modelo biomédico secundariza aspectos sociais, econômicos e subjetivos na determinação do processo de saúde-doença e caracteriza-se pelo reducionismo, ao tratar fenômenos complexos como princípios primários simples, e pelo dualismo mente-corpo (2929 Jardim LMSSV, Jardim TV, Souza WKSB, Pimenta CD, Sousa ALL, Jardim PCBV. Tratamento multiprofissional da hipertensão arterial sistêmica em pacientes muito idosos. Arq Bras Cardiol [Internet]. 2017 [cited 2017 Oct 23];108(1):53-9. Available from: http://dx.doi.org/10.5935/abc.20160196
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).
Nas falas dos entrevistados, a assistência centrada na doença também foi mencionada como entrave para a assistência ao idoso portador de HAS. Em contrapartida, para superá-la, a literatura aponta como estratégia a atenção centrada no paciente como um novo método clínico que apresenta dois componentes principais: um deles se refere ao cuidado da pessoa, identificando suas ideias e emoções a respeito do adoecer e a resposta a elas; e o segundo se relaciona à identificação de objetivos comuns entre profissionais de saúde e pacientes sobre a doença e sua abordagem, compartilhando decisões e responsabilidades (3030 Malta DC, Morais Neto OL, Silva Jr JB. Presentation of the strategic action plan for coping with chronic diseases in Brazil from 2011 to 2022. Epidemiol Serv Saúde [Internet]. 2011[cited 2017 Oct 22];20(4):425-38. Available from: http://scielo.iec.gov.br/pdf/ess/v20n4/v20n4a02.pdf
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).
As vantagens da atenção centrada no paciente em relação ao modelo biomédico tradicional, centrada na doença, são muitas, incluindo maior satisfação do paciente, maior adesão ao tratamento e melhor resposta à terapêutica, maior satisfação do profissional de saúde, menor número de processos por erros, maior eficiência do cuidado, reduzindo o número de exames complementares e de encaminhamentos a especialistas, com consequente queda de custos para o sistema de saúde e para o paciente (3030 Malta DC, Morais Neto OL, Silva Jr JB. Presentation of the strategic action plan for coping with chronic diseases in Brazil from 2011 to 2022. Epidemiol Serv Saúde [Internet]. 2011[cited 2017 Oct 22];20(4):425-38. Available from: http://scielo.iec.gov.br/pdf/ess/v20n4/v20n4a02.pdf
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).
Com vistas à manutenção da funcionalidade dos idosos portadores de HAS, é imprescindível otimizar o manejo das condições crônicas a partir de estratégias multidimensionais ancoradas no conceito de integralidade de atenção à saúde e dos referenciais teóricos relacionados ao cuidado centrado na pessoa (3131 Agreli HF, Peduzzi M, Silva MC. Patient centred care in interprofessional collaborative practice. Interface (Botucatu) [Internet]. 2016[cited 2017 Dec 02];20(59):905-16. Available from: http://www.scielo.br/pdf/icse/v20n59/en_1807-5762-icse-1807-576220150511.pdf
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, o que nem sempre é observado. Estudos ainda evidenciam uma prática assistencial voltada a responder às condições e aos eventos decorrentes de agudizações de condições crônicas, de forma fragmentada, episódica e reativa (44 Ferreira FPC, Bansi LO, Paschoal SMP. Serviços de atenção ao idoso e estratégias de cuidado domiciliares e institucionais. Rev Bras Geriatr Gerontol[Internet]. 2014 [cited 2017 Jan 20];17(4):911-26. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbgg/v17n4/1809-9823-rbgg-17-04-00911.pdf
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,99 Martins AB, D'Avila OP, Hilgert JB, Hugo FN. Atenção Primária a Saúde voltada as necessidades dos idosos: da teoria à prática. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2014[cited 2017 Oct 23];19(8):3403-16.Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n8/1413-8123-csc-19-08-03403.pdf
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,1515 Simões WMB, Moreira MS. A importância dos atributos: acolhimento, vínculo e longitudinalidade na construção da função de referência em saúde mental na atenção primária à saúde. Enferm Rev[Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 10];16(3):223-39. Available from: http://periodicos.pucminas.br/index.php/enfermagemrevista/article/view/12894
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, tornando-se entraves na consolidação da qualidade dos cuidados prestados, sobretudo na Atenção Básica (3232 Rodrigues LBB, Silva PCS, Peruhype RC, Palha PF, Popolin MP, Crispim JA, et al. Primary Health Care in the coordination of health care networks: an integrative review. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2014 [cited 2017 Dec 02];19(2):343-52. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n2/1413-8123-csc-19-02-00343.pdf
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).
No presente estudo identificou-se por meio das falas, dificuldades dos trabalhadores de enfermagem em garantir um cuidado centrado na pessoa, expresso por possíveis dificuldades em incorporar na prática aspectos não clínicos do cuidado crônico, como a implementação do autocuidado apoiado. No entanto o cuidado centrado na pessoa é um dos elementos-chave para garantir alta qualidade do cuidado, sendo considerado pela Organização Pan-Americana de Saúde uma estratégia fundamental e inovadora na assistência a pessoas com problemas crônicos de saúde, pois uma vez diagnosticada a condição crônica, como a hipertensão arterial, a pessoa necessitará lidar diariamente com essa enfermidade e, consequentemente, o autocuidado será uma tarefa para toda a vida desse indivíduo, incluindo familiares (77 Guimarães ML. O cuidado ao idoso em saúde coletiva um desafio e um novo cenário de prática. In: Sousa MCM, Horta NC. Enfermagem em saúde coletiva teoria e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2013.).
Nesse sentido, os trabalhadores de enfermagem da ESF devem perceber que o seu papel no cuidado integral ao idoso portador de HAS vai muito além da troca de receitas e de orientações sobre os cuidados com a alimentação, ambiente, e pressão arterial. Eles devem buscar uma avaliação global desse indivíduo, e, a partir daí, fornecer os cuidados e encaminhamentos necessários. Entretanto, esse cuidado ampliado só é possível com capacitações na área geronto-geriátrica (2121 Valcarenghi RV, Lourenço LFL, Siewert JS, Alvarez AM. Nursing scientific production on health promotion, chronic condition, and aging. Rev Bras Enferm[Internet]. 2015 [cited 2017 Apr 25];68(4):618-25. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v68n4/en_0034-7167-reben-68-04-0705.pdf
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).
Sobre essa dificuldade em prestar uma assistência integral ao idoso portador de HAS, eles também reportam, como fator influente, o conhecimento ainda incipiente da graduação. Os gestores devem atentar para a necessidade expressa pelos trabalhadores de enfermagem de serem capacitados para outras áreas assistenciais, ampliando para além da saúde da mulher e saúde da criança, que são áreas de atuação importante na ESF, mas, não abrangem a assistência na totalidade, já que a estratégia visa o cuidado da família como um todo (2424 Fertonani HP, Pires DEP, Biff D, Scherer MDA. The health care model: concepts and challenges for primary health care in Brazil. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2015 [cited 2017 Oct 25];20(6):1869-78. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n6/en_1413-8123-csc-20-06-1869.pdf
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).
Dessa forma, fica evidente a necessidade dos gestores refletirem e otimizarem a operacionalização das políticas públicas de saúde voltadas para a pessoa idosa, programando e realizando treinamentos direcionados e específicos para o cuidado na terceira idade e ampliando os recursos financeiros a fim de melhorar as ações nessa área (2727 Pinheiro GML, Alvarez AM, Pires DEP. A configuração do trabalho da enfermeira na atenção ao idoso na Estratégia de Saúde da Família. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2012 [cited 2017 Dec 05];17(8):2105-15. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v17n8/21.pdf
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).
Além de promover um maior conhecimento sobre a saúde da pessoa idosa, as capacitações são ferramentas úteis para a mudança do perfil de idosos atendidos pela ESF, na medida em que estimulam nova visão dos profissionais sobre o que vem a ser o cuidado ao ser-idoso (3030 Malta DC, Morais Neto OL, Silva Jr JB. Presentation of the strategic action plan for coping with chronic diseases in Brazil from 2011 to 2022. Epidemiol Serv Saúde [Internet]. 2011[cited 2017 Oct 22];20(4):425-38. Available from: http://scielo.iec.gov.br/pdf/ess/v20n4/v20n4a02.pdf
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).
Ademais, outro aspecto abordado nos depoimentos dos entrevistados como entrave para o cuidado do idoso portador de HAS foi a inexistência de intersetorialidade. Esta se refere à articulação entre os diversos serviços e ações relacionados à atenção em saúde de forma que, independentemente do local onde sejam prestados, estejam sincronizados e voltados para alcançar um objetivo comum a todos. Além disso, fundamenta-se na existência de ações integradas entre prestadores de serviços de diferentes níveis ou no interior de um mesmo nível, como no caso da atenção básica, de modo que distintas intervenções sejam percebidas e vividas pelo usuário de forma contínua, adequadas às suas necessidades de atenção em saúde e compatíveis com suas expectativas pessoais (3232 Rodrigues LBB, Silva PCS, Peruhype RC, Palha PF, Popolin MP, Crispim JA, et al. Primary Health Care in the coordination of health care networks: an integrative review. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2014 [cited 2017 Dec 02];19(2):343-52. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n2/1413-8123-csc-19-02-00343.pdf
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).
A abordagem aos formuladores de políticas públicas implicaria a adoção e formulação de políticas e ações de saúde pública abrangentes e integradas, apoiadas em ações intersetoriais, levando em conta os vários ciclos da vida, as condições e necessidades locais (55 Taddeo PS, Gomes KWL, Caprara A, Gomes AMA, Oliveira GC, Moreira TMM. Acesso, prática educativa e empoderamento de paciente em condições crônicas. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2012 [cited 2017 Jan 21];17(11):2923-30. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232012001100009
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).
É importante avançar nas ações intersetoriais, de forma a mobilizar e tornar o tema de enfrentamento da HAS aos processos de organização dos serviços, e da saúde de modo geral. Os desafios e limites relacionados às atividades intersetoriais que buscam o avanço no cumprimento das metas do Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas não Transmissíveis no Brasil, 2011-2022, serão minimizados com o envolvimento conjunto da sociedade civil, entidades da saúde, universidades, Conselhos de Saúde, ONG e usuários do SUS. A participação da sociedade civil é vital para que essa agenda se torne prioritária (66 Trentini M, Paim L, Guerreiro D. Condições crônicas e cuidados inovadores em saúde. São Paulo: Editora Atheneu; 2014.).
Tomemos, como exemplo, a redução do sedentarismo na população idosa, que necessita de medidas essenciais para o aumento dos níveis de atividade física, como: a criação de espaços públicos adequados e seguros, a organização do espaço urbano quanto às possibilidades de deslocamento a pé e/ou em bicicletas, investindo em segurança pública, iluminação, dentre outros aspectos do planejamento urbano. Desta forma, desloca-se do foco exclusivo no desejo e decisão individuais de envolver-se em práticas corporais para a análise das condições que facilitam ou não a eleição de um modo de viver mais ou menos sedentário (55 Taddeo PS, Gomes KWL, Caprara A, Gomes AMA, Oliveira GC, Moreira TMM. Acesso, prática educativa e empoderamento de paciente em condições crônicas. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2012 [cited 2017 Jan 21];17(11):2923-30. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232012001100009
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).
Da mesma forma, o acesso à alimentação implica não somente escolhas individuais, mas, fundamentalmente, políticas públicas integradas, desde: ações educativas; incentivo à produção, distribuição e comercialização de alimentos adequados; legislação oportuna quanto aos teores de sal, açúcar, gorduras trans; informações nutricionais em produtos industrializados; regulação do conteúdo das propagandas (99 Martins AB, D'Avila OP, Hilgert JB, Hugo FN. Atenção Primária a Saúde voltada as necessidades dos idosos: da teoria à prática. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2014[cited 2017 Oct 23];19(8):3403-16.Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n8/1413-8123-csc-19-08-03403.pdf
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).
Autor aponta que a integração entre diferentes áreas e a abordagem de problemas de forma criativa para o cuidado integral ao idoso portador de HAS por meio de ações intersetoriais, demanda mudanças individuais, institucionais e ações intersetoriais. Descreve ainda alguns obstáculos que essa construção tão ambiciosa enfrenta (2323 Andrade RS, Caldas LBSN, Falcao MLP, Goes PSA. Processo de trabalho em Unidade de Saúde da Família e a educação permanente. Trab Educ Saúde[Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 11];14(2):505-21. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tes/v14n2/1678-1007-tes-1981-7746-sip00108.pdf
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). O arcabouço das Instituições de Ensino Superior (IES), organizado em faculdades e departamentos que eventualmente não se comunicam, pode impedir o desenvolvimento de cultura acadêmica que desenvolva e compartilhe o trabalho de forma intersetorial e interdisciplinar (1515 Simões WMB, Moreira MS. A importância dos atributos: acolhimento, vínculo e longitudinalidade na construção da função de referência em saúde mental na atenção primária à saúde. Enferm Rev[Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 10];16(3):223-39. Available from: http://periodicos.pucminas.br/index.php/enfermagemrevista/article/view/12894
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).
Além disso, a formalização das profissões implica em reivindicações de saberes e competências exclusivos, às quais é atribuído um mandato social para realização de tarefas específicas, controle de recursos e responsabilidade legal, cristalizando a divisão social e técnica do trabalho (1919 Baratieri T, Mandu ENT, Marcon SS. Compreensão de enfermeiros sobre vinculo e longitudinalidade do cuidado na estratégia saúde da família. Cienc Enferm[Internet]. 2012 [cited 2017 Dec 10];18(2):11-22.Available from: http://dx.doi.org/10.4067/S0717-95532012000200002
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).
Por fim, a descontinuidade do cuidado na rede assistencial também foi identificada entre os trabalhadores de enfermagem como um elemento que dificulta a assistência ao idoso portador de HAS no âmbito da ESF. Embora este serviço tenha contribuído com o acesso da população, especialmente àqueles com maior carência socioeconômica, revela-se, por outro lado, que o eixo relacionado à equidade de acesso a toda tecnologia disponível para melhoria das condições de vida e saúde ainda se constitui em utopia, uma vez que se encontra segmentado e desarticulado no âmbito interno do sistema público e da cadeia organizativa do sistema como um todo (99 Martins AB, D'Avila OP, Hilgert JB, Hugo FN. Atenção Primária a Saúde voltada as necessidades dos idosos: da teoria à prática. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2014[cited 2017 Oct 23];19(8):3403-16.Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n8/1413-8123-csc-19-08-03403.pdf
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).
A este respeito, deve-se considerar que a ESF no cuidado ao idoso portador de HAS deve ser incorporada a uma rede de serviços mais complexos, pois, de forma isolada, é incapaz de responder às necessidades de saúde desses usuários (1515 Simões WMB, Moreira MS. A importância dos atributos: acolhimento, vínculo e longitudinalidade na construção da função de referência em saúde mental na atenção primária à saúde. Enferm Rev[Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 10];16(3):223-39. Available from: http://periodicos.pucminas.br/index.php/enfermagemrevista/article/view/12894
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). Nesse sentido, torna-se necessário eliminar as barreiras entre os diferentes níveis de atenção, ligados por estratégias de gestão, financiamento e informação em integração funcional, orientada por um sistema ágil e flexível, capaz de decisões e responsabilidades compartilhadas (1616 Pessoa VM, Rigotto RM, Carneiro FF, Teixeira ACA. Sentidos e métodos de territorialização na atenção primária à saúde. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 25];18(8):2253-62. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v18n8/09.pdf
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).
Apesar da ESF ter como objetivo reorientar o sistema de saúde a partir da atenção básica não significa atribuí-la toda a responsabilidade e encargos que cabem aos três níveis de atenção. Nesse sentido, o investimento no desenvolvimento de novas competências para os profissionais da equipe básica não irá substituir as ações que devem ser desempenhadas no nível do ambulatório de especialidades, dos laboratórios e centros de diagnóstico, e dos hospitais gerais e especializados (1818 Teixeira C, Silva CCS, Bernardes GS, Sá NPP, Prado OS. O vínculo entre usuários e equipes em duas unidades de saúde da família em um município do Estado do Rio de Janeiro. Rev APS [Internet]. 2013 [cited 2017 Apr 10];16(4):444-54. Available from: https://aps.ufjf.emnuvens.com.br/aps/article/view/1725/768
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).
A construção de uma rede de atenção integral à saúde da pessoa idosa portadora de doença crônica não transmissível é o maior desafio, por sua natureza complexa. Demanda a oferta de diversos tipos de serviços, que necessitam de fontes de financiamento, às vezes distintos, que devem ser estruturadas de forma regionalizada, integrada, com o objetivo de garantir a longitudinalidade da atenção (99 Martins AB, D'Avila OP, Hilgert JB, Hugo FN. Atenção Primária a Saúde voltada as necessidades dos idosos: da teoria à prática. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2014[cited 2017 Oct 23];19(8):3403-16.Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n8/1413-8123-csc-19-08-03403.pdf
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). A falta de serviços com objetivos distintos como reabilitação, cuidado de enfermagem, cuidado paliativo, cuidado para portadores de incapacidade física e/ou mental fragmenta dificulta uma assistência longitudinal e cuidadora (44 Ferreira FPC, Bansi LO, Paschoal SMP. Serviços de atenção ao idoso e estratégias de cuidado domiciliares e institucionais. Rev Bras Geriatr Gerontol[Internet]. 2014 [cited 2017 Jan 20];17(4):911-26. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbgg/v17n4/1809-9823-rbgg-17-04-00911.pdf
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).
Ademais, a presença do usuário idoso portador de HAS em uma rede de atenção requer diálogo entre os diferentes serviços de saúde e níveis assistenciais. Daí a importância da capacitação, estabelecimento de mecanismos de referência e contra referência, adaptação de instrumentos de identificação de risco de fragilidade e incapacidade funcional (dentro de cada nível assistencial, com ênfase na atenção básica). Cada um dos serviços e níveis assistenciais deve ter claro, tanto para si como para a comunidade, seu espectro de ação (99 Martins AB, D'Avila OP, Hilgert JB, Hugo FN. Atenção Primária a Saúde voltada as necessidades dos idosos: da teoria à prática. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2014[cited 2017 Oct 23];19(8):3403-16.Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n8/1413-8123-csc-19-08-03403.pdf
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). Assim, ficaria mais definido o papel da ESF na prevenção primária e secundária, educação e promoção de saúde, identificação do idoso de risco de fragilização ou perda funcional, o acompanhamento dos idosos acamados ou incapacitados de se locomoverem (2020 Veras RP. Prevenção de doenças em idosos: os equívocos dos atuais modelos. Cad Saúde Pública[Internet]. 2012 [cited 2017 Dec 06];28(10):1834-40. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v28n10/03.pdf
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).
A desorganização da rede, a falta de estruturas de apoio, a falta de integração dos serviços existentes e a insuficiente oferta de serviços especializados (como centros-dia ou hospitais-dia, unidades de média e longa permanência com cuidado específico para idosos comprometidos física ou mentalmente, unidades de cuidados paliativos) e de suporte e apoio às famílias e cuidadores ainda incapacitam o SUS para prestar uma atenção integral à saúde da pessoa idosa (2222 Seixas CT, Merhy EE, Baduy RS, Slomp Jr H. La integralidad desde la perspectiva del cuidado em salud: una experiência del Sistema Único de Salud en Brasil. Salud colect[Internet]. 2016[cited 2017 Sep 30];12(1):113-23. Available from: https://www.scielosp.org/pdf/scol/2016.v12n1/113-123/es
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). O contexto atual, no entanto, já apresenta a expansão do acesso a serviços de saúde, cabendo agora debater a importância social dada ao idoso no Brasil, a qual gera vontade política para desenvolver os necessários equipamentos no sistema, de forma a permitir um trabalho resolutivo e gratificante de profissionais capacitados para tal (2424 Fertonani HP, Pires DEP, Biff D, Scherer MDA. The health care model: concepts and challenges for primary health care in Brazil. Ciênc Saúde Coletiva[Internet]. 2015 [cited 2017 Oct 25];20(6):1869-78. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n6/en_1413-8123-csc-20-06-1869.pdf
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).
Mediante os achados, é importante destacar o importante papel dos trabalhadores de enfermagem no cuidado aos idosos portadores de HAS enquanto agentes propulsores de mudanças. Sua essência “o cuidado” proporciona espaços de encontro intersubjetivo entre o profissional e a pessoa que vivencia uma condição crônica de saúde tão necessários para o desenvolvimento de atitudes/mudanças de comportamento. Trata-se de um processo lento e dificultoso para as pessoas com condições crônicas, na medida em que envolve repensar toda a rotina e adaptar o projeto de vida.
Nesse sentido, a atuação do enfermeiro tem grande potencial para agir segundo os pressupostos dos cuidados crônicos, seja na consulta de enfermagem, seja em atividades educativas individuais ou coletivas, até mesmo em ações de mobilização na comunidade. Isso será alcançado a partir de uma assimilação crítico-reflexiva de conhecimentos que possibilite a conscientização da nova condição de saúde, de forma autônoma. Nesse contexto, a enfermagem é capaz de resgatar a intersubjetividade, envolvendo reflexão e ação, o que permite ao outro problematizar sua situação cuja liberdade vai preenchendo o espaço antes habitado por sua dependência e dessa forma descobre como participar na transformação do seu mundo em prol da saúde integral do ser humano.
Limitações do estudo
O estudo apresentou como limitação o fato de ter sido realizado em apenas um único Distrito Sanitário, o que não significa que a realidade encontrada seja a mesma nos outros Distritos do município investigado.
Contribuições do estudo para a área da saúde
Assim, reitera-se que é muito importante a Enfermagem identificar e compreender as relações entre as diferentes necessidades básicas dos idosos portadores de HAS e o que é cuidado fundamental para esse grupo. A avaliação de clientes com essa enfermidade envolve aspectos complexos e variados. O importante é identificar os aspectos positivos, as limitações e os aspectos subjetivos que interferem no autocuidado, de modo que resultem em cuidados fundamentais de enfermagem para o idoso portador de HAS. Além disso, espera-se que o presente estudo contribua no campo da saúde pelo seu caráter interdisciplinar, considerando a necessidade de serem conhecidas dimensões subjetivas sobre saúde e sobre o processo de envelhecimento, contextualizadas socialmente. Acredita-se que uma das contribuições desta pesquisa seja provocar a reflexão sobre os serviços de saúde ofertados ao idoso em condições crônicas e que gestores locais e trabalhadores da Atenção Primária à Saúde possam implantar sua prática assistencial para beneficiar a pessoa idosa portadora de HAS assistido na ESF.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo procurou conhecer como os trabalhadores de enfermagem percebem o cuidado prestado à saúde do idoso portador de HAS no âmbito da ESF. Foram observados conteúdos e elementos favoráveis e desfavoráveis à oferta de serviços de saúde ao idoso portador de HAS, os quais demonstram a necessidade de ampliar essa oferta na perspectiva de um cuidar mais integral. Em seus relatos, os trabalhadores fizeram referência a múltiplos elementos que configuram tal cenário de serviços ofertados a esse segmento etário, de natureza biológica, política e sociocultural; e apontaram elementos determinantes dessa assistência, como: territorialização, parcerias, vínculo do usuário com a equipe, foco da assistência centrado na doença, formação acadêmica pautada no modelo biomédico, inexistência de intersetorialidade e descontinuidade do cuidado na rede assistencial.
As limitações dos profissionais da ESF no cuidado ao idoso portador de HAS poderiam ser minimizadas por meio de: planejamento estratégico em saúde e com melhor qualificação profissional no atendimento a essa população que envelhece, sendo necessário melhor acompanhamento dos idosos em condições crônicas e um sistema de saúde com ênfase no atendimento personalizado a essa clientela, tendo em vista suas especificidades; e, finalmente, assistência que se comprometa com a melhoria de sua qualidade de vida, autonomia e independência.
No tocante à formação do profissional de saúde, os trabalhadores de enfermagem revelaram perceber no ensino da graduação certa deficiência na abordagem da temática envelhecimento, ficando esses profissionais sem a conscientização sobre tal problema. Nesse sentido, fica clara a necessidade de maiores investimentos na formação dos profissionais integrantes da ESF na área de gerontologia, sendo imprescindível a educação permanente em saúde agregada ao desenvolvimento individual e institucional.
REFERENCES
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
05 Dez 2019 -
Data do Fascículo
Nov 2019
Histórico
-
Recebido
11 Mar 2017 -
Aceito
29 Jul 2018