RESUMO
Objetivo: Identificar necessidades de aprendizagem de enfermeiros sobre acolhimento com classificação de risco da demanda espontânea na Atenção Primária à Saúde (APS).
Método: Estudo qualitativo realizado com 15 enfermeiros da Atenção Primária à Saúde por meio de observação participante, aplicação de instrumento semiestruturado, grupo focal e análise de conteúdo temática.
Resultados: 80% dos enfermeiros nunca utilizaram o protocolo de classificação de risco na Atenção Primária à Saúde. Foram evidenciadas lacunas de conhecimento que envolvem os aspectos clínicos do cuidado; a gestão do protocolo e o papel do enfermeiro; e as contradições históricas, estruturais e culturais do modelo de cuidado. C
onsiderações finais: O reconhecimento das necessidades de aprendizagem dos enfermeiros atuantes na Atenção Primária à Saúde implica construção ou aprimoramento de saberes para desenvolver junto com a equipe de saúde a classificação de risco da demanda espontânea, o que requer a mudança na formação e a continuidade de sua qualificação no/para o trabalho.
Descritores: Aprendizagem; Acolhimento; Atenção Primária à Saúde; Humanização da Assistência; Educação em Enfermagem
ABSTRACT
Objective: Identify nurse’s learning needs to be related to the reception with risk classification of spontaneous demand in Primary Health Care.
Method: Quality study including 15 nurses from Primary Health Care through participatory observation, application of semi-structured instrument, focus group, and of thematic content analysis.
Results: 80% of nurses never used the risk classification protocol in Primary Health Care. Knowledge gaps involving clinical aspects of care; protocol management, and the nurse’s role; and the historic, structural and cultural contradictions of the care model were confirmed.
Final considerations: The recognition of learning needs for nurses that work in Primary Health Care implies in the construction or improvement of knowledge in order to develop, along with the health team, a risk classification of spontaneous demand, which requires a change in the education and continuity of their qualification for work and at work.
Descriptors: Learning; Health Services Accessibility; Primary Health Care; Quality Assurance, Health Care; Education, Nursing
RESUMEN
Objetivo: Identificar necesidades de aprendizaje de enfermeros sobre recepción con clasificación de riesgo de la demanda espontanea en la Atención Primaria de Salud.
Método: Estudio cualitativo realizado con 15 enfermeros de la Atención Primaria de Salud por medio de observación participante, aplicación de instrumento semiestructurado, equipo focal y análisis de contenido temático.
Resultados: 80% de los enfermeros nunca utilizaron el protocolo de clasificación de riesgo en la Atención Primaria de Salud. Evidenciadas lagunas de conocimiento que envuelven los aspectos clínicos del cuidado; la gestión del protocolo y el papel del enfermero; y las contradicciones históricas, estructurales y culturales del modelo de cuidado.
Consideraciones finales: El reconocimiento de necesidades de aprendizaje de los enfermeros actuantes en la Atención Primaria de Salud implica construcción o perfeccionamiento de saberes para desarrollar junto al equipo de salud la clasificación de riesgo de la demanda espontanea, el que requerir el cambio en la formación y la continuidad de su calificación en/para el trabajo.
Descriptores: Aprendizaje; Recepción; Atención Primaria de Salud; Humanización de la Asistencia; Educación en Enfermería
INTRODUÇÃO
A Política Nacional de Humanização (PNH) da Atenção e Gestão do Sistema Único de Saúde - Humaniza SUS é um dos caminhos que contribui para o preparo dos trabalhadores(1), a exemplo do Projeto de Qualificação das Práticas de Cuidado, denominado Projeto AcolheSUS, agindo nas portas de entrada do SUS(2); seu planejamento está fundamentado nos seguintes eixos: a gestão e organização do cuidado, o acolhimento com classificação e avaliação de risco e vulnerabilidades, a ambiência e a qualificação profissional(1,3). A PNH também traz uma nova forma de pensar a saúde(4) com o objetivo de qualificar o acesso e as práticas de cuidado por meio da implantação/implementação da diretriz “Acolhimento nos serviços de saúde”, cujas ideias inovadoras reduzem as barreiras de acesso à Atenção Primária à Saúde (APS)(1).
Este estudo tem como foco o acolhimento que deve ser realizado pelos trabalhadores das Unidades Básicas de Saúde (UBS), para assegurar o atendimento por prioridades quando se realiza a avaliação de vulnerabilidade, gravidade e risco. Para tanto, a PNH recomenda a utilização do Acolhimento com Classificação de Risco (ACCR), pelo Sistema de Manchester, cujo propósito é ordenar os atendimentos conforme potencial de risco, agravos à saúde ou grau de sofrimento, priorizando os casos de maior gravidade(5-7). Inicia-se com a identificação da queixa principal manifestada ou relatada pelos usuários e/ou acompanhantes, com base no risco clínico, ou seja, propõe-se a direcionar a realização da anamnese e do exame físico ante os sinais e sintomas expressos, com determinação da prioridade de atendimento em função das condições relacionadas às complicações e ao risco de morte(8).
Essa classificação é dividida em pelo menos quatro cores, que indicam tempos máximos para o primeiro atendimento: vermelha (atendimentos emergenciais), amarelo (atendimentos urgentes), verde (atendimentos pouco urgentes) e azul (atendimentos não urgentes)(5). Em síntese, o ACCR representa um dispositivo tecnológico relacional de intervenção para potencializar a reorganização do atendimento e implementar a produção de saúde em Redes de Atenção à Saúde (RAS) na APS. Sua meta é disponibilizar um atendimento ágil, de acordo com o risco e necessidades dos usuários(5,9-10). A utilização do Sistema de Manchester nas UBSs e nas Estratégias Saúde da Família (ESF), consideradas portas de entrada do SUS, pode ser ajustada a esse nível de atenção e ao contexto local(11). Dentro da ESF, vale ressaltar que a literatura aponta a segurança como parâmetro para definição das prioridades clínicas utilizando diferentes fluxogramas de classificação(12-13).
A operacionalização do ACCR depende da construção de saberes clínicos, epidemiológicos e da subjetividade, mediante o olhar por parte da equipe multiprofissional sobre riscos e vulnerabilidades (11). Nessa dimensão, destaca-se a atuação do enfermeiro, que é considerado um profissional indicado para avaliar e classificar a gravidade dos que procuram os serviços de saúde(13-14). Para tanto, sua atuação na APS vem exigindo um processo de qualificação contínua, ou seja, a necessidade de apropriar-se de conteúdos sobre sua prática clínica, gerencial e educativa em seu cotidiano(15). No entanto, observa-se que os enfermeiros têm dificuldade para implementar o ACCR.
Nesse sentido, questiona-se: Para os enfermeiros que atuam na APS, quais são as necessidades de aprendizagem relativas ao ACCR da demanda espontânea? A fim de responder tal questão, uma revisão de literatura realizada na Biblioteca Virtual de Saúde, com os descritores e estratégia de busca “Acolhimento AND Classificação AND Atenção Primária à Saúde”, identificou 114 estudos e, após aplicação dos critérios de inclusão (artigos disponíveis na íntegra, desenvolvidos no Brasil, em português e nos últimos dez anos), selecionaram-se 30 estudos. Destes, somente três(16-18) abordavam o trabalho do enfermeiro brasileiro no ACCR no âmbito da APS e reportaram as percepções dos enfermeiros sobre o ACCR evidenciando as dificuldades estruturais e administrativas para sua operacionalização. O primeiro estudo, com 16 enfermeiros de UBS do Vale do Itajaí (SC), apontou que o acolher se resume na recepção do usuário e que o enfermeiro realiza o acolhimento com dificuldade devido ao excesso de atribuições e à insegurança para tomar decisões, além do estigma da população médica(16). O segundo, também com 16 membros da equipe de saúde de uma UBS do Paraná, incluindo enfermeiros, analisou que há falta de apoio da coordenação e de estrutura física adequada para o ACCR, bem como conhecimento insuficiente sobre o tema(17). O terceiro, realizado com enfermeiros numa UBS de Belo Horizonte (MG), mostrou a necessidade de articulação teoriaprática sobre o ACCR(18). De fato, essas pesquisas reconhecem as lacunas do ACCR na APS e a falta de capacitação dos enfermeiros(16-18), ainda que de forma genérica possivelmente relacionemse aos processos de aprendizagem com o/no trabalho. Nessa busca, não foram encontrados estudos que abordassem claramente as necessidades de aprendizagem do enfermeiro para realizar o ACCR na demanda espontânea. Portanto, este estudo justifica-se diante da lacuna no conhecimento científico, pois, embora o tema seja pesquisado, observa-se que as necessidades de aprendizagem não foram exploradas.
OBJETIVO
Identificar as necessidades de aprendizagem de enfermeiros sobre acolhimento com classificação de risco da demanda espontânea na Atenção Primária à Saúde.
MÉTODOS
Aspectos éticos
Pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo; trata-se de recorte da dissertação de mestrado intitulada “Acolhimento com classificação de risco da demanda espontânea: as necessidades de aprendizagem de enfermeiros da Atenção Primária à Saúde”(19).
Tipo de estudo
O estudo caracteriza-se pela abordagem qualitativa, com triangulação de técnicas de coleta de dados(20) e análise de conteúdo temática(21).
Cenário do estudo
O campo de estudo foi o Núcleo de Educação Permanente e Humanização (NEPH) do Departamento Regional de Saúde XIII - Ribeirão Preto, composto por 26 municípios, com uma agenda mensal de reuniões, 38 interlocutores por ocasião da coleta de dados (21 enfermeiros, 2 agentes comunitários de saúde, 2 psicólogos, 3 assistentes sociais, 2 jornalistas, 2 professores universitários, 3 alunos de graduação em Enfermagem, 2 alunos de mestrado, 1 administrador de empresa). Sua constituição atual permanece inalterada, com exceção dos alunos: dois do curso de graduação, um do curso de mestrado e um do curso de doutorado. O NEPH constitui-se num espaço coletivo estratégico que discute a Humanização, a Educação Permanente em Saúde (EPS), além de questões que envolvem a gestão para o enfrentamento de problemas locais e regionais, com foco na formação dos trabalhadores.
Fonte de dados
Intencionalmente, foram incluídos neste estudo enfermeiros que atuam há pelo menos seis meses na APS e são interlocutores de seus municípios no NEPH. Dos 21 enfermeiros, 3 foram excluídos porque eram recém-chegados ao NEPH, ou seja, atuavam há menos de seis meses como interlocutores. Dos 18 enfermeiros convidados para participar da pesquisa, 15 aceitaram.
Coleta e organização dos dados
A coleta de dados foi realizada pela pesquisadora principal no período de junho/2016 a agosto/2017, em três etapas, as quais foram desenvolvidas nas reuniões do NEPH. A primeira etapa foi realizada durante a reunião; as etapas 2 e 3 ocorreram após o encerramento da pauta do dia.
Na primeira, houve observação participante em 12 reuniões do NEPH entre junho de 2016 e maio de 2017, para reconhecimento do cenário de pesquisa, aproximação dos participantes à pesquisadora bem como da pesquisadora às inquietações e problemas concernentes ao ACCR, que foram registrados em diário de campo e subsidiaram a construção do questionário semiestruturado com dez questões relativas ao processo de trabalho do enfermeiro na APS e ao ACCR; esse questionário foi validado em forma e conteúdo por cinco especialistas.
Na segunda, deu-se a aplicação de questionário semiestruturado em junho de 2017, acerca do Sistema de Manchester de Classificação de Risco, para identificar o conhecimento individual sobre AACR: conhecimento e utilização na prática profissional do enfermeiro; exemplos de sinais de alerta que causavam dificuldades na classificação por cor; procedimentos e orientações adotados; entendimentos individuais quanto às necessidades de novas aprendizagens sobre o tema. Ocorreu a caracterização do perfil do grupo estudado (seis questões).
E, finalmente, na última etapa, foi realizado um dia de grupo focal (GF) em agosto de 2017, para compreender coletivamente as lacunas de conhecimento sobre AACR, norteado pela seguinte questão: Quais são as necessidades de aprendizagem para o enfermeiro desenvolver o ACCR na APS? O GF, com duração de uma hora e cinco minutos, foi audiogravado e transcrito. Coordenado pela pesquisadora principal, contou com o apoio da orientadora do projeto e de uma aluna de iniciação científica, responsável pelas anotações relativas às características relevantes do grupo. Um guia, com casos levantados sobre ACCR durante as reuniões, serviu de estímulo inicial para as discussões —por exemplo, a busca espontânea da UBS por mulheres com sintomas de infecção urinária. Reuniões preparatórias entre a pesquisadora principal e orientadora antecederam a realização do GF, com cujo desenvolvimento as pesquisadoras têm experiência.
Foi utilizado o Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ) como critério para descrição do método na pesquisa qualitativa.
Análise dos dados
No tratamento dos dados, procedeu-se à análise de conteúdo de Bardin(21), modalidade temática com: a) organização da análise – pré-análise baseada na leitura flutuante do material; b) codificação – seleção dos documentos e marcação da essência das mensagens mediante recorte do texto em unidades comparáveis; c) categorização, após estudo aprofundado do conjunto de informações; d) tratamento dos resultados – inferência e interpretação dos resultados, o que permitiu identificar as unidades de significação ao captar os sentidos das comunicações, segmentos de conteúdo, ou seja, unidades-base. Apoiando-se nesse processo, o material empírico proveniente do questionário e do GF foi agrupado por semelhanças e diferenças, possibilitando a emersão das seguintes categorias temáticas: a necessidade de articulação do conhecimento teórico e prático sobre AACR; a necessidade de compreender a inserção e a gestão do ACCR na APS e o papel do enfermeiro; a necessidade de compreender as contradições que permeiam a construção do modelo de atenção do SUS.
A letra E seguida de algarismos arábicos identificou os trechos que se originaram dos questionários, enquanto as letras GF, aqueles do grupo focal. Por fim, a discussão dos resultados foi fundamentada nos marcos legais brasileiros das Políticas de Saúde e da Educação, mais especificamente na PNH com foco para o ACCR na APS; e nas Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Graduação em Enfermagem (DCENF), uma vez que estas concentram os princípios norteadores da formação para o processo de trabalho do enfermeiro no SUS.
RESULTADOS
Perfil dos participantes
Os participantes da pesquisa foram 15 enfermeiras (os), 13 (86,7%) do sexo feminino, com média de 39 anos de idade. A média de tempo de atuação na enfermagem foi de 12 anos, 12 (80%) trabalhavam exclusivamente na APS, 2 (13,3%) atuavam na APS e em hospital, e 1 atuava na APS e na educação, como docente de curso para a formação do técnico em enfermagem. Além disso, 11 (73,3%) já trabalharam anteriormente no pronto atendimento, 12 (80,0%) conheciam o protocolo de Manchester, porém relataram nunca o terem utilizado.
A necessidade de articulação do conhecimento teórico e prático sobre Acolhimento com Classificação de Risco na Atenção Primária à Saúde
Esta categoria reúne as carências individuais do enfermeiro/participante sobre a necessidade de compreensão do protocolo do ACCR e sobre a falta de articulação do conhecimento prévio para um julgamento clínico competente durante ACCR da demanda espontânea. Tal necessidade se estende à gestão da equipe de saúde na implantação do protocolo:
Necessito aprender todo o processo relacionado ao acolhimento. Nunca trabalhei com isso, e pelo pouco que sei, tenho muitas dificuldades em implementar na unidade. (E6)
Como realizar a estratificação de risco adequadamente e como organizar a equipe da unidade de saúde... (E7)
As limitações de aprendizagens mais frequentes declaradas pelos participantes, que envolvem os sinais de alerta e geram inseguranças no ACCR na cor vermelha, foram as seguintes: dor torácica de início súbito (< 1 hora) em hipertensos, diabéticos e cardiopatas; dor de cabeça ou tontura, alteração de sinais vitais; perda de força, movimento ou sensibilidade de parte do corpo e crise convulsiva. Na cor amarela, foram os casos de gestantes com qualquer sintoma e febre (temperatura axilar de 39 ºC); na cor verde, as situações que envolvem dor crônica; finalmente, na cor azul, problemas ou queixas que se prologam por mais de 15 dias:
Gestante com qualquer sintoma [...] dependendo da situação, fico na dúvida se não é vermelho, como por exemplo quando alega hemorragia. (E11)
Dor crônica com piora recente, fica a dúvida no amarelo porque muitas vezes os pacientes não relatam realmente a necessidade que está passando. (E11)
Identificar se a falta de movimento etc. são sequelas de alguma ocorrência prévia ou se trata de uma situação clínica atual. (E12)
A necessidade de compreender a gestão do Acolhimento com Classificação de Risco na Atenção Primária à Saúde e o papel do enfermeiro
A necessidade de compreender a gestão do ACCR na APS e sua função na RAS se somam às dúvidas e inseguranças a respeito do papel do enfermeiro, quando ele conta sobre as atividades que realiza no cotidiano e sobre os conflitos vivenciados mais particularmente com o médico nesse contexto. Por conseguinte, a lacuna de conhecimento acerca do Sistema de Triagem de Manchester na APS causa a desconfiança e o medo de que as ações programáticas já desenvolvidas nas UBSs e ESFs possam ser descaracterizadas ao absorverem o atendimento da demanda espontânea:
[...] a gestão cobrava da gente uma adequação do nosso fluxo de trabalho, os profissionais não estavam aguentando, porque havia briga entre os profissionais, eu vou no médico bonzinho, ele aceita, o ruinzinho ele não aceita, cai tudo em cima da enfermagem [...]. (GF)
[...] se a gente não tiver o trabalho em equipe, e nós não temos [...] um protocolo, ele só vai dar certo se a gente utilizá-lo adequadamente. (GF)
No município, os enfermeiros [...] têm muita ação administrativa, [...] e adoram ações pontuais, fazer curativo, fazer consulta de pré-natal, puericultura. Passou dessas questões, a gente se “engastalha”. (GF)
Como conciliar as ações programáticas com a classificação de risco dos casos agudos, sem permitir que o acolhimento dos casos agudos transforme a UBS e a ESF num PA [Pronto Atendimento]? (GF)
[...] e o meu medo é transformar a UBS num grande PA [...], não vai ser mudança de modelo, vai ser mudança de endereço, PA na AB [Atenção Básica] [...]. (GF)
[...] quando a gente coloca essa palavra AB na frente, tem a integralidade do paciente, por isso que penso que é um pouco mais complexo, que classificar na tal cor... a gente tem o contexto. (GF)
A necessidade de compreender as contradições que permeiam a construção do modelo de atenção do SUS
A necessidade de compreender os limites históricos e culturais e de avançar na mudança do processo de trabalho no modelo de atenção do SUS e implantação do ACCR deriva da reflexão que os profissionais realizam sobre a realidade, da autoconsciência do conflito que vivenciam no modelo centrado exclusivamente na decisão do médico, com a participação direta do enfermeiro para perpetuá-lo:
[...] Por mais que a gente queira, por mais que a gente fale, por mais que a gente tenha unidades que trabalhe de uma forma diferenciada [...] o modelo de assistência que a gente oferta, ele é ainda um modelo de assistência centrada no profissional médico, na “consultação”, nas especialidades, na urgência e emergência. (GF)
[...] o cotidiano gira em torno do horário que o médico estará na unidade, em tudo o que acontece na unidade vai depender da disponibilidade dele, ou seja, a equipe, ela funciona em função ainda de uma pessoa de referência e não com a necessidade de fato da população. (GF)
[...] o que eu acho que falta é a mudança no modelo da assistência [...] porque a gente ainda teima em trabalhar no modelo médico centrado [...] nesses 20 anos, eu ajudei a educar a população a procurar o médico e procurar o PA. (GF)
DISCUSSÃO
Esta pesquisa identificou as necessidades de aprendizagem sobre o ACCR da demanda espontânea por enfermeiros que atuam na APS, tanto aquelas de ordem individual como as coletivas, que têm origem em lacunas de conhecimento sobre: os aspectos clínicos que envolvem a tomada de decisão no ACCR; a gestão do protocolo na APS e o papel do enfermeiro e da equipe no processo de trabalho neste contexto; e as contradições históricas, estruturais e culturais do modelo de cuidado proposto pelo SUS.
Os enfermeiros participantes da pesquisa tiveram um tempo médio de atividade na APS de 12 anos, número semelhante ao de um estudo que analisou a percepção dos enfermeiros acerca do acolhimento nas UBSs(22). Essa informação denota que esses enfermeiros interlocutores do NEPH podem ter conhecimento suficiente sobre as demandas de seu território e das problemáticas que envolvem a gestão nesse nível de atenção, além de reconhecerem as possíveis fragilidades e potenciais da equipe de saúde(15). Em síntese, o perfil dos participantes deste estudo legitima as necessidades de aprendizagem que foram levantadas, porque eles vivenciam as problemáticas de seu município de forma direta na APS e, ao mesmo tempo, compartilham de um espaço de reflexão que permite o aprofundamento da crítica e troca de experiências(22).
A grande maioria dos participantes atuou em PA antes da APS; e, embora conheçam o protocolo de Manchester, 80% relataram nunca o terem utilizado na sua prática profissional. Essa informação corrobora os resultados de um estudo que revelou a dificuldade de articulação teórico-prática na formação do enfermeiro, cujo ensino se mantém numa lógica fragmentada entre o pensar e o fazer, distanciado das proposições das DCNs para os cursos de Enfermagem, ou seja, estes se pautam na criticidade e cientificidade para um agir reflexivo e consciente(23).
Interpretamos que a primeira categoria temática — assim como as demais deste estudo, que serão discutidas na sequência — envolve pressupostos que norteiam tanto a formação do enfermeiro generalista na graduação quanto a continuidade de sua qualificação no/para o trabalho. Nomeadamente, é necessário o desenvolvimento de competências cognitivas, procedimentais e de natureza ética e social, na perspectiva da multidimensionalidade e indivisibilidade do ser humano na saúde, compatíveis com as DCNs e com as principais demandas assistenciais da Atenção Primária à Saúde(24-25).
Os resultados apontam que os enfermeiros apresentam dificuldades em compreender o ACCR na APS. Estudo que analisou 246 currículos de cursos de graduação em Enfermagem da América Latina identificou 25 que incluem a APS na sua estrutura, sendo que os conteúdos menos enfatizados foram aqueles envolvendo as competências na tomada de decisão complexa, na prática baseada em evidências e na compreensão do contexto do cuidado(26). Outro estudo analisou a estrutura curricular de 94 cursos brasileiros de graduação e observou que se centram majoritariamente em disciplinas dos ciclos básicos e profissionalizante, desarticuladas dos princípios do SUS, embora os Projetos Políticos Pedagógicos (PPP) assumam ter orientação pedagógica integrada e descrever o desenvolvimento curricular por meio de eixos/núcleos temáticos, além de prezar pelos campos da prática nas UBSs e ESFs(27). Outro ponto é a persistência de um processo de aprendizagem desprovido de significado, de reflexão, de autonomia, consequente da desassociação do conhecimento, da recepção de informações e memorização sem a sua devida contextualização e problematização. Trata-se de uma aprendizagem mecânica, que se reproduz nos espaços de trabalho e dificulta o julgamento clínico e a tomada de decisão, os quais dependem do pensamento crítico(28-29).
Nesta pesquisa, o enfermeiro demonstra comprometimento e responsabilidade com a unidade e procura ser resolutivo, mas percebe que não é competente para tomar determinadas decisões que poderão acarretar riscos aos desfechos clínicos dos usuários da APS. Para certas ações, há lacunas de conhecimento que ratificam os estudos supracitados quando se reflete sobre as implicações de uma formação não alinhada às proposições das DCNs.
Na formação clínica do enfermeiro, ACCR na APS deveria ocupar uma posição central(30-31) para que, de fato, o cuidado atendesse de forma integral às necessidades de saúde-doença do indivíduo(32-33). Esse acolhimento tem seu alicerce científico na consulta de enfermagem, primeira etapa do Processo de Enfermagem (PE), momento em que o profissional se aproxima do indivíduo, ouve suas demandas, avalia as condições de saúde biopsicossociais e espirituais e, por fim, planeja o cuidado necessário(34).
Porém, quando os participantes apontaram os principais sinais de alerta que geram dificuldades no momento da classificação, demonstraram despreparo clínico para uma tomada de decisão. Essas limitações podem acarretar diversos prejuízos no acolhimento, pois há o risco de o profissional ficar apenas na queixa-conduta, sem a devida reflexão ampliada da clínica para o cuidado integral, na valorização do trabalho da equipe multiprofissional e interdisciplinar apoiado na RAS(34).
Por isso, usar corretamente o protocolo é fundamental para realizar uma escuta qualificada e não haver insatisfação nem abreviação da autonomia dos usuários(35). Igualmente essenciais são a anamnese com o exame físico no PE, imprescindíveis no processo de trabalho do enfermeiro para a implementação do ACCR, porque buscam: identificar sinais e sintomas, procurando por anormalidades que podem sugerir problemas no processo de saúde e doença; e planejar uma assistência não só curativa, mas também preventiva(34).
Como parte dos enfermeiros deste estudo desconhece o protocolo do ACCR, entende-se que possa haver uma dificuldade em organizar o processo de trabalho em face da demanda espontânea e ainda apresentar resolutividade diante das situações, considerando a integralidade do cuidado na APS(36). Ou seja, os resultados apontam a necessidade de compreender a gestão do ACCR na APS e essencialmente o papel do enfermeiro nesse contexto; e confirmam o descompasso que há entre a publicação de uma política de saúde, sua disseminação e incorporação nas unidades de saúde.
Evidencia-se aqui a necessidade do enfermeiro de aprender sobre a organização do fluxo da unidade de saúde tendo presente as demandas inesperadas, que ocorrem e são inerentes à própria vida, assim como de liderar o envolvimento da equipe no ACCR com o protocolo de Manchester. Isso significa desenvolver habilidades para reconhecimento de sinais e sintomas que permitam fundamentar as ações da equipe e oferecer um suporte científico para suas possíveis decisões, bem como fortalecer o comprometimento ético e social, porque isso constrói um processo de trabalho consciente e coletivo baseado nos princípios que sustentam o cuidado em rede(6,28-29).
Organizar-se na perspectiva do acolhimento dos usuários exige reflexão da equipe sobre o atendimento às necessidades de saúde da comunidade, ou seja, perfil do usuário e características do território. É importante criar ações para que a equipe discuta a maneira como cada profissional participará do acolhimento, envolvendo usuários, trabalhadores e gestores, pois o acolhimento não se dá com base em um ator isolado(35).
As situações imprevistas requerem certa organização da unidade e do processo de trabalho da equipe, tanto para compreendê-las quanto para intervir sobre elas. Nesses casos, os trabalhadores encarregados de escutar demandas que surgem espontaneamente (sem agendamento prévio) devem ter: capacidade de analisá-las (identificando riscos e analisando vulnerabilidade); clareza das ofertas de cuidado existentes na UBS; possibilidade de diálogo com outros colegas; algum grau de resolutividade; e respaldo para acionar as ofertas de cuidado em tempos e modos que considerem a necessidade das pessoas(14).
As lacunas de conhecimento sobre a gestão do ACCR explicitam a necessidade do enfermeiro da APS de compreender suas atribuições nesse contexto e os aspectos éticos e legais que norteiam a profissão, considerada um campo amplo e em processo de qualificação, tanto na prática clínica quanto na atuação educativa individual e coletiva ou mesmo na atuação gerencial(15). Legalmente, para a operacionalização da Política Nacional da Atenção Básica (PNAB), segundo a Portaria 2.436/2017 do Ministério da Saúde, são atribuições específicas do enfermeiro realizar e/ou supervisionar acolhimento com escuta qualificada e classificação de risco, de acordo com protocolos estabelecidos; realizar estratificação de risco e elaborar plano de cuidados para as pessoas que possuem condições crônicas no território, junto com os demais membros da equipe; implementar e manter atualizados rotinas, protocolos e fluxos relacionados a sua área de competência na UBS(36).
Tais atribuições ampliam a autonomia do enfermeiro ao desenvolver uma prática clínica que pressupõe a integralidade do cuidado às famílias e comunidades em todo seu ciclo vital. Isso implica que o enfermeiro tenha domínio de diversas habilidades, tais como: gerenciamento do seu processo de trabalho, raciocínio clínico e abstrato, planejamento, comunicação, administração do tempo, conhecimento técnico-científico da área (saúde da criança, saúde da mulher, doenças infectocontagiosas, gestação, imunização, saúde mental, cuidado com lesões de pele, hipertensão, diabetes, entre muitas outras)(22,37-38).
O acolhimento à população na APS pelo enfermeiro tem uma ação facilitadora e mais resolutiva da assistência em saúde ao priorizar os atendimentos a eventos agudos, também preconizados pela PNH, na “Cartilha de Acolhimento com Avaliação e Classificação de Risco”, publicada pelo Ministério da Saúde. Tais atribuições têm apoio legal também na Lei do Exercício Profissional da Enfermagem. Estudo que descreveu a implantação de projeto de acolhimento com classificação de risco numa UBS em Brasília apontou um aumento de 193,7% nas consultas de enfermagem de pacientes classificados pela cor verde, que apresentavam afecções agudas, porém sem risco iminente de agravamento de condição, após o treinamento do protocolo proposto pelo MS(1).
Hodiernamente, os enfermeiros deste estudo assumem que a gestão da unidade e ações pontuais são suas atribuições e que têm dificuldade de avançar nos propósitos da APS. Ao utilizar o termo “engastalhar”, um deles revela que está preso a um processo no qual são pouco discutidas as atribuições e responsabilidades listadas acima; e, de forma equivocada, os profissionais em questão compreendem que os programas de prevenção de doenças e promoção da saúde não devem ser sobrepujados pela demanda espontânea na UBS ou ESF, porque isso irá transformar o local em um PA. Não obstante, o valor que os participantes deste estudo atribuem à integralidade do cuidado não se articula aos atributos da APS e ao conhecimento das ações que os operacionalizam nas unidades de saúde(33). Com razão, valorizam o cuidado humanizado, porém desprovido de fundamentação.
Um estudo quantitativo que avaliou a efetivação dos atributos da APS, na perspectiva de profissionais e usuários, apontou que os melhores resultados foram para o primeiro contato e a integralidade, o que confirma a legitimação gradual da APS como serviço de porta de entrada acessível na RAS, com escopo diversificado de ações, ainda que insuficientes. Os atributos com pior avaliação foram: a longitudinalidade, com baixa continuidade e qualidade da relação profissionalpaciente; e a coordenação, por dificuldades de acesso às consultas especializadas e insuficientes registros compartilhados(39).
Apesar dos avanços, a APS como porta de entrada ainda concentra contradições no seu fluxo, que se evidenciam no confronto entre as demandas individuais e os serviços oferecidos, no grau de resolubilidade, nas relações interpessoais e na densidade tecnológica. Por outro lado, a busca pelo PA representa a possibilidade de realização imediata de consultas, procedimentos, exames complementares, aquisição de medicamentos e internação, se necessário(40-42).
Essas contradições também foram encontradas neste estudo, quando os enfermeiros demonstraram preocupação com o fluxo da unidade na implementação do ACCR e ausência de conhecimento sobre como operacionalizar o princípio da integralidade do cuidado na demanda espontânea. Tal fato ocorre porque o atendimento de situações agudas está arraigado à dinâmica da queixa-conduta, que poderia desconstruir ações legitimadas de cunho preventivo na unidade de saúde de seu território. Porém, são essas situações que poderão balizar e qualificar os avanços da assistência nas UBSs e ESFs, como no caso de pessoas com diabetes e hipertensão arterial, além de antecipar a possibilidade de intervenção em surtos que tenham relevância epidemiológica(43).
A necessidade de avançar na compreensão e operacionalização do fluxo da demanda espontânea está atrelada à necessidade de reconhecer os limites históricos e culturais no processo de mudança do modelo de atenção do SUS(44). Isso porque as demandas ainda são centradas no modelo curativista e centralizadas no profissional médico e, para a população, o acesso ao sistema de saúde é sinônimo de acesso ao profissional médico(11). Esta pesquisa reafirma tal prática, quando os participantes reconhecem que a consulta médica ainda é o centro do processo de trabalho na maioria dos municípios, situação que se perpetua com a participação direta do enfermeiro visto que a demanda espontânea tornou-se uma negociação dependente da compreensão do médico sobre o ACCR. Essa realidade gera falta de autonomia e insegurança na equipe de saúde, já que o atendimento clínico se resume apenas a uma categoria profissional. Além disso, este estudo referenda o posicionamento de que as cotas de consultas limitadas geram diversos desconfortos e a falta de garantia de acesso ao atendimento, o que contraria o princípio da equidade, o qual consiste em atender diferentemente os desiguais de acordo com cada necessidade durante o acolhimento(45).
Nessa perspectiva, é importante priorizar o atendimento de alguns casos, com o intuito de não manter a pessoa em sofrimento em espera por muito tempo(45). Tais dificuldades podem ser enfrentadas por meio da valorização da competência clínica do enfermeiro, da implantação da gestão participativa que envolve colegiados locais, qualificação dos profissionais no seu trabalho mediante educação permanente e manutenção de proporções adequadas de população adscrita por equipe(45-46). Entretanto, as barreiras gerenciais são relatadas, na literatura, como a escassez de recursos humanos com sobrecarga de trabalho dos profissionais da equipe e até mesmo na capacitação para ACCR(43).
Em tal contexto, essas barreiras também potencializam o modelo de atenção tradicional, de modo que impossibilitam maior autonomia da equipe de enfermagem: fazem persistir a lógica clínica curativista, médico-centrada, independentemente da inserção ou não de um protocolo como o ACCR. As perspectivas apontadas corroboram outra problemática indicada pelos participantes, a desvalorização da APS, ou seja, quando a população não consegue atendimento prontamente, procuram um atendimento mais rápido e “facilitado”, como o dos serviços de PA ou da farmácia. Tais fatos convergem com os achados de outro estudo no qual os usuários de saúde procuram o PA como fonte regular de cuidados e apontam falhas no acesso e acolhimento de serviços no nível primário(47).
Apesar dos avanços da política de saúde no Brasil quanto aos resultados sanitários positivos com a expansão de programas específicos e serviços públicos, observa-se que limites históricoestruturais e a marcante estratificação social em um Estado capitalista, em que vigora as leis de mercado, retardam ou embargam as transformações necessárias à consolidação de um modelo de assistência pautado nos princípios doutrinários do SUS(48). Surpreendentemente, os participantes deste estudo percebem a necessidade de mudança de modelo, o que significa compreender o contexto da democracia brasileira e o valor atribuído à saúde no macro/micropolítica nacional, regional e municipal.
Por fim, todas as necessidades apontadas implicam o planejamento de ações educativas que são preconizadas pela Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS) e pela PNH(49). Tais ações devem funcionar no cotidiano da APS, uma vez que toda e qualquer demanda por mudanças e adaptações de políticas e programas de saúde dependem da formação prévia do profissional e de uma reflexão continuada dos atos produzidos(1).
Limitações do estudo
Considera-se como limitação a percepção do objeto do estudo unicamente pelo olhar dos enfermeiros. Há que se desenvolver pesquisas incluindo toda a equipe de saúde da APS, a fim de evidenciar as implicações do Protocolo de ACCR no cotidiano da unidade de saúde.
Contribuições para a área da enfermagem e saúde pública
Este estudo, ao buscar compreender as lacunas de conhecimento sobre o ACCR do enfermeiro que atua na APS, sinaliza a necessidade de rever a formação desse profissional para o aprimoramento de competências assistências e gerenciais, tanto na graduação quanto no trabalho, uma vez que as necessidades de aprendizagem levantadas envolvem maior eficiência no desenvolvimento da SAE e na gestão do processo de trabalho no SUS.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao final desta pesquisa, conclui-se que as lacunas de conhecimento expostas mediante a compreensão das necessidades de aprendizagem sobre o ACCR por parte de enfermeiros que atuam na APS envolvem os conhecimentos relacionados: à prática clínica, à PNH, à gestão na atenção básica, ao modelo de saúde preconizado pelo SUS e ao próprio papel do enfermeiro nesse contexto. As necessidades de aprendizagem emersas nos resultados desta pesquisa descortinam mais uma vez o paradoxo das mudanças historicamente construídas no contexto do SUS que ainda são permeadas pelas práticas arraigadas do modelo centrado no médico. Foram identificadas ambiguidades que circundam o ACCR na APS, como se a estratégia fosse engessar toda a prática assistencial que caracteriza este nível de atenção e interromper as atividades já rotineiras. Também se constatou a demanda dos participantes pelo conhecimento teórico-prático sobre o protocolo de Manchester para avançar na implantação do ACCR da demanda espontânea, sem desconsiderar as demais políticas e o próprio contexto da APS. Vale ressaltar que, muito além da assistência direta aos usuários e ao ACCR, cabe ao profissional enfermeiro fortalecer-se dentro de suas competências, atividades de gestão e educação de profissionais e comunidade, colocando em prática uma gama de interfaces que compõem o cuidado. Lacunas na formação profissional quanto a esses aspectos acabam se refletindo em dificuldades na prática dos enfermeiros quando inseridos no mercado, subtilizando suas capacidades gerenciais e de tomada de decisão. Por fim, destaca-se a importância da EPS dentro das unidades de saúde para o fortalecimento da prática do ACCR e do SUS. Este trabalho apontou questões que poderão servir de subsídios para reflexão sobre a organização das práticas assistenciais nos serviços de saúde.
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FOMENTOEsta pesquisa foi financiada pelo projeto UNIVERSAL/CNPq.
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Editado por
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EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa
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EDITOR ASSOCIADO: Hugo Fernandes
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
28 Maio 2021 -
Data do Fascículo
2021
Histórico
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Recebido
20 Abr 2020 -
Aceito
01 Nov 2020