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Construindo saberes e práticas em saúde mental

RESENHA

Construindo saberes e práticas em saúde mental

Maria Lucinete Fortunato

Historiadora, Professora Doutora do Departamento de Ciências Sociais do Centro de Formação de Professores da Universidade Federal de Campina Grande -PB (UFCG)

OLIVEIRA, FRANCISCA BEZERRA DE. CONSTRUINDO SABERES E PRÁTICAS EM SAÚDE MENTAL. JOÃO PESSOA: EDITORA UNIVERSITÁRIA/UFPB, 2002. 233 p.

Este foi o problema que quis indicar. Não foi intimidar os espiritos mostrando-lhes a enorme quantidade de saberes diversos necessários para se conhecer o conhecimento. Foi fazer compreender que conhecer é uma aventura incerta, frágil, dificil, trágica.

Morin

A autora do livro é professora do Centro de Formação de Professores da Universidade Federal de Campina Grande -PB, com formação em Enfermagem, Mestra em Enfermagem Psiquiátrica pela Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio de Janeiro e Doutora em Enfermagem pela Universidade de São Paulo. É pesquisadora do CNPq, Líder do Grupo Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas em Educação, Linguagem e Práticas Sociais e Assessora de Pós-Graduação e Pesquisa do CFP/UFCG.

Considero que a escolha do objeto de estudo "Centros de atenção psicossocial do Ceará" com destaque para a reforma psiquiátrica feita por Oliveira foi muito feliz por se tratar de um tema atual, complexo, polêmico e instigante, inscrevendo-se em uma ordem de preocupações interdisciplinares. Realizado na interface de várias ciências humanas, este estudo, resultado de sua Tese de Doutorado, alça vôos mais longínquos e advoga uma ética compreendida como tudo aquilo que se refere ao belo, ao estético, ao digno e ao moralmente adequado. Advoga uma ética comprometida com anseios mais dignos e justos para a condição humana.

A autora desenvolve um estudo que objetiva descrever e refletir sobre o processo de construção dos Centros de Atenção Psicossocial -CAPS do estado do Ceará, priorizando as estratégias de construção destes serviços, tentando apreender como os profissionais constroem suas práticas, desenvolvem os projetos terapêuticos, estabelecem relações com os usuários, os familiares e com a comunidade.

Além disso, procura dar ênfase à compreensão da prática da enfermeira nos CAPS como forma de contribuir para a discussão sobre o modo de inserção das enfermeiras em instituições que são norteadas pelos princípios da reforma psiquiátrica, inauguradas a partir da ruptura epistemológica proposta pela desinstitucionalização.

Este estudo seguiu um horizonte diverso onde se move o objetivismo empirista o qual postula que o objeto impõese ao sujeito e o relativismo subjetivista que acredita ser o sujeito inventor da realidade. A autora adotou a posição de que a realidade é socialmente construída e o conhecimento nunca esgota o pensado, pois a realidade é mais rica que a construção que dela fazemos e o acesso à realidade é sempre mediado pela participação do sujeito como construtor do conhecimento, levando a sugerir que não é próprio da ciência refletir o real, mas traduzi-lo em conhecimento que se constitui historicamente, que pode e deve ser questionado. Adotar esta postura, implica conceber a ciência como parte integrante e dependente de um contexto cultural, social e histórico no seio da qual se desenvolve.

A partir de questionamentos sobre os saberes e as práticas em saúde mental, o livro procura explorar as multipossibilidades de atenção em saúde mental, a necessidade da interdisciplinaridade, a abertura de novas potencialidades, a construção de novas subjetividades e de novas formas no cuidar das pessoas com sofrimento psicossocial.

Defende que essas práticas devem se constituir em atividades humanas criadoras, afetivas e compartilhadas, configurando-se como atividades de desconstrução/construção de conceitos sobre a loucura, deformas como lidar com o sofrimento psíquico, de papéis que se expressam no cotidiano institucional, no diálogo e no confronto entre as práticas sociais.

Considero, portanto, um livro bem escrito, que estimula o leitor, historicisa e contextualiza o processo de reforma psiquiátrica e de desinstitucionalização, tendo como fundamentação teórica autores como Foucault, Caltel, Birman, Morin, Prigogine, e outros, demonstrando que a verdade na ciência é algo difícil de ser alcançado e provisório, que o processo de produção do conhecimento, por vezes, exige um pluralismo metodológico que combine o uso articulado de várias técnicas de investigação.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jun 2014
  • Data do Fascículo
    Dez 2002
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