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SALÁRIO REAL E CONFLITO DISTRIBUTIVO NA ECONOMIA BRASILEIRA DE 2010 A 2019

REAL WAGE AND DISTRIBUTIVE CONFLICT OF BRAZILIAN ECONOMY FROM 2010 TO 2019

RESUMO:

O objetivo deste trabalho é analisar a dinâmica de conflito distributivo na economia brasileira de 2010 a 2019. Essa análise parte do entendimento de que são dois os processos de precificação dos produtos vigentes em uma economia aberta: um processo doméstico e outro que segue um valor internacional de referência. A partir da montagem de índices de preço das exportações brasileiras e mundiais foi possível fazer essa separação entre preço doméstico e internacional e analisar o comportamento das variáveis distributivas. O estudo do período 2010-2019 é dividido em dois subperíodos. No primeiro, 2010-2014, a taxa de inflação da economia brasileira é um pouco mais elevada, mas isso não impede o crescimento do salário real; o custo unitário do trabalho sobe e as margens de lucro se reduzem. No segundo, 2015-2019, a inflação apresenta certa desaceleração, enquanto o salário real sofre queda relevante, em especial nos setores com preço internacional. O custo unitário do trabalho e as margens de lucro decrescem nos setores com preço internacional e apresentam estabilidade nos setores com preço doméstico.

PALAVRAS-CHAVE:
Conflito distributivo; Salário real; Margens de lucro; Sistemas de contas nacionais; Análise multissetorial

ABSTRACT:

This work analyzes the evolution of distributive conflict in the Brazilian economy from 2010 to 2019, based on the understanding that in an open economy, there are two price-setting methods: one that follows domestic pricing and another following international reference values. To do so, we calculated the price index for Brazilian and global exports and classified sectors according to the price-setting method employed (into domestically-priced and internationally-priced sectors). Then we analyzed the behavior of their respective distributive variables. Divided into two phases, the analysis period covers 2010-2014 when the inflation rate is slightly higher but doesn’t prevent real wage and unit labor growth and profit margins decrease, and 2014-2019, when the inflation rate decreases simultaneously to a fall in real wages, unit labor cost, and profit margins of internationally-priced sectors.

KEYWORDS:
Nominal wages; Money prices; Real wage; Profit margins; National accounts system; Multisector approach

INTRODUÇÃO

Este trabalho parte do entendimento de que em uma economia de mercado existem dois processos de formação de preço dos bens, um seguindo um valor internacional de referência, como as commodities, e outro com precificação doméstica. Para o primeiro caso, os preços dependem da taxa nominal de câmbio e das cotações internacionais, e, portanto, a evolução dos custos de produção determina a evolução das margens de lucro. Para os bens com precificação interna, a evolução dos custos determina a evolução do preço de produção.

No período estudado, o comportamento da economia brasileira foi heterogêneo. De 2010 a 2014, o país passou por uma desaceleração do crescimento comparada à segunda metade da década anterior, porém com taxas ainda positivas e com taxa de desemprego baixa. Em 2015 e 2016, o produto interno bruto acumula uma queda da ordem de 7%, e nos anos seguintes o crescimento médio de 1,5% não permitiu que o nível de renda retornasse ao patamar de 2014. Nesse período, a taxa de desemprego subiu, a taxa de câmbio se desvalorizou um pouco mais rápido, a cotação internacional das commodities suavizou seu comportamento e o arranjo de política econômica foi alterado. A taxa de inflação, que ficou em volta de 8% nos primeiros quatro anos, se mantém nesse patamar em 2015 e 2016 e cai nos anos seguintes. Nesse período, a trajetória do salário real também foi heterogênea. Ele sobe nos primeiros três anos, cai no quarto, tem leve alta no quinto e cai fortemente nos anos seguintes.

Ao trabalharmos com a separação entre os setores que apresentam preço doméstico e internacional, notamos novos e relevantes elementos associados à dinâmica inflacionária, às margens de lucro e ao salário real, uma vez que o conflito distributivo se expressa por meio da dinâmica de preços e salários. Este trabalho busca, então, trazer elementos da perspectiva multissetorial para discutir a evolução do conflito distributivo no Brasil nesse período. Adicionalmente, contribui ao utilizar uma base de dados integrada, que é o Sistema de Contas Nacionais (SCN), disponibilizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Este trabalho usa a chamada Referência 2010, novo marco metodológico que se inicia justamente no referido ano.

O trabalho está estruturado em seis seções, começando com esta introdução. A segunda seção faz a revisão da literatura teórica dos dois processos de formação de preço considerados, ao passo que a seção seguinte trata da dinâmica do conflito distributivo em economias abertas. A quarta seção trata da metodologia para a caracterização dos setores em preços internacionais e preços domésticos e do cálculo das variáveis-chave da análise. A seção seguinte abre com uma breve caracterização da economia brasileira no período e, em seguida, analisa o conflito distributivo no Brasil a partir dos resultados encontrados. A última seção traz as principais conclusões do trabalho.

1. A DETERMINAÇÃO DO PREÇO DE PRODUÇÃO

Como discutido por Aukrust ( 1977Aukrust, O. Inflation in the open economy: A Norwegian model. Oslo: Artikler, 1977. ), Frisch ( 1977Frisch, H. The Scandinavian model of inflation: a generalization and empirical evidence. Atlantic Economic Journal, v. 5, n. 3, p. 1-14, 1977. ) e Edgren et al . ( 1969Edgren, G. et al. Growth and the distribution of income. The Swedish Journal of Economics, v. 71, n. 3, p. 133-160, 1969. ), podem-se distinguir dois processos de precificação em uma economia aberta. O primeiro está relacionado com os bens que seguem um valor internacional de referência, dependendo, portanto, “do preço dos próprios bens em moeda de referência internacional e da taxa nominal de câmbio” (Gomes; Freitas, 2021aGomes, L. S.; Freitas, F. Salário real e conflito distributivo na economia brasileira de 2000 a 2014. Revista de Análise Econômica, v. 39, n. 78, p. 107-132, 2021a. , p. 109). O segundo está associado aos bens que seguem um processo interno de formação de preço e dependem dos custos de produção e do mark-up, como abaixo:

\begin{equation}P_{t} = \ \mu_{t}.C_{t}\qquad{(1)}\end{equation}

Em ( 1 ), P é o preço, μ, o mark-up ; C, o custo unitário; e o subscrito t denota o período corrente.

Os preços são formados por meio de um mark-up sobre os custos unitários, o qual reflete características setoriais e da própria concorrência capitalista. O custo de produção depende da despesa em insumos (consumo intermediário) com formação doméstica de preço (a.P), da despesa com insumos com preço internacional (m.e.P*) 1 1 Nesse caso, (a) se refere ao coeficiente técnico do consumo intermediário doméstico que determina o custo do consumo intermediário dos bens com preço doméstico com o preço dos insumos com preço interno. Já o coeficiente técnico do consumo intermediário dos bens com preço internacional determina o custo do consumo intermediário importado, com a taxa nominal de câmbio (e) e o preço internacional (P*). e do custo unitário do trabalho, isto é, do salário nominal (w) e da produtividade (b). Assim:

\begin{equation}C = \left\lbrack (a.P + m.e.P^{*})(1 + T) \right\rbrack + \left\lbrack \frac{w(1 + t_{w})}{b} \right\rbrack\qquad{(2)}\end{equation}

Mais um fator de custo são os impostos sobre produtos (T). A tributação sobre a folha salarial (t w ) compõe o custo unitário do trabalho. Assim, definem o preço de produção os seguintes elementos: tributação, margens de lucro, produtividade do trabalho, salário nominal, taxa de câmbio e cotação internacional das commodities. Podemos fazer uma modificação na expressão que denota o custo de produção para facilitar a compreensão do modelo:

\begin{equation}C = \tau.\lbrack\left( a.P + m.e.P^{*} \right) + \left( \frac{w}{b} \right)\rbrack\qquad{(3)}\end{equation}

\begin{equation}\tau = 1 + \left\lbrack \frac{\left( a.P + m.e.P^{*} \right)}{\left( a.P + m.e.P^{*} \right) + \left( \frac{w}{b} \right)}.T + \ \frac{\left( \frac{w}{b} \right)}{\left( a.P + m.e.P^{*} \right) + \left( \frac{w}{b} \right)}.t_{w} \right\rbrack\ \qquad{(4)}\end{equation}

A variável τ é como um mark-up associado ao impacto que a tributação sobre o consumo intermediário e sobre o custo do trabalho exercem sobre os custos. Uma alteração na tributação modifica os custos unitários. A equação 5 mostra que o crescimento do mark-up ( \begin{equation}g_{\mu}\end{equation} ) e os custos de produção (g c ) determinam a taxa de inflação para os bens com precificação doméstica ( \begin{equation}\pi^{D}\end{equation} ).

\begin{equation}\left( 1 + \pi^{D} \right).P_{t - 1} = \left( 1 + g_{\mu} \right).\ \mu_{t - 1}.\ \left( 1 + \ g_{c} \right).\ C_{t - 1}\qquad{(5)}\end{equation}

Supondo que os coeficientes relacionados ao consumo intermediário dos bens com preço doméstico (a) e dos bens com preço internacional (m) não se alteram, podemos, a partir de ( 6 ), deduzir a taxa de variação dos custos aproximadamente como:

\begin{equation}g_{C_{t}} = g_{\tau_{t}} + \sigma_{a}.\pi_{t}^{D} + \sigma_{m}.\left( g_{e_{t}} + \ \pi_{t}^{*} \right) + \sigma_{w}.\left( g_{w_{t}\ } - \ g_{b_{t}} \right)\qquad{(6)}\end{equation}

Em ( 6 ), σ m se refere à participação do consumo intermediário de bens com preço internacional (em moeda doméstica) no custo no período anterior; σ a e σ w referem-se à participação, no custo no período anterior, do consumo intermediário de bens com preço doméstico e do custo unitário do trabalho, respectivamente; \begin{equation}\pi^{*}\end{equation} corresponde à taxa de inflação do consumo intermediário dos bens com preço internacional (em moeda estrangeira); ao passo que g i representa a taxa de crescimento da variável i (taxa nominal de câmbio, salário nominal e produtividade do trabalho).

Os preços constituem um mark-up sobre os custos unitários de produção, logo:

\begin{equation}\pi_{t}^{D} = {\ g}_{\mu_{t}}{\ + \ g}_{\tau_{t}} + \ \sigma_{a}.\pi_{t}^{D} + \ \sigma_{m}.\left( g_{e_{t}} + \ \pi_{t}^{*} \right) + \ \sigma_{w}.\left( g_{w_{t}\ } - \ g_{b_{t}} \right)\qquad{(7)}\end{equation}

No caso dos bens que obedecem a uma lógica doméstica de formação de preço, a evolução dos custos como preço em moeda doméstica dos bens que seguem um preço internacional, do custo unitário do trabalho, impostos sobre produtos e do mark-up setorial determinam o comportamento dos preços.

O segundo conjunto de bens são os que seguem um valor mundial de referência, como notadamente é o caso das commodities.

O preço dessas mercadorias depende da técnica dominante, dos salários e da taxa de juros, expresso em moeda de circulação internacional (dólar), nos países que produzem esses produtos usando a técnica dominante. A cotação no mercado doméstico depende da taxa nominal de câmbio (e) e do preço praticado no mercado internacional (P*). Nesse caso, o preço que exerce o poder de gravitação é o preço que vigora no mercado mundial, em unidades do padrão monetário doméstico

(Gomes; Freitas, 2021aGomes, L. S.; Freitas, F. Salário real e conflito distributivo na economia brasileira de 2000 a 2014. Revista de Análise Econômica, v. 39, n. 78, p. 107-132, 2021a. , p. 107).

Vale destacar que os produtores locais também praticam o preço mundial convertido para o padrão monetário interno. Caso praticassem preço superior, teriam que competir com uma oferta infinitamente elástica; e caso praticassem preço inferior, desperdiçariam rentabilidade, pois poderiam vender mais caro para uma demanda também infinitamente elástica. Portanto, quando um produto apresenta a característica de seguir um valor mundial de referência, o preço no mercado interno, ao menos no longo prazo, depende da cotação internacional e da taxa nominal de câmbio.

Seguir um valor mundial de referência faz dos produtores domésticos agentes tomadores de preço, tornando o mark-up ( \begin{equation}\mu_{t}^{I}\end{equation} ) endógeno. A precificação não consiste na fixação de um mark-up sobre os custos de produção, o mark-up é fruto da discrepância entre os custos de produção e os preços internacionais em moeda local.

\begin{equation}P_{t} = e_{t}.P_{t}^{*} = \mu_{t}^{I}.C_{t}\qquad{(8)}\end{equation}

\begin{equation}\mu_{t}^{I} = \frac{e_{t}.P_{t}^{*}\ }{C_{t}}\qquad{(9)}\end{equation}

Se a cotação internacional e a taxa de câmbio forem suficientemente favoráveis para cobrir os custos de produção e o requisito mínimo de rentabilidade, ou seja, o preço de mercado superar o preço de oferta, há competitividade para produzir e vender no mercado interno e internacional. As importações podem suprir eventuais excessos de demanda. Mesmo que a economia seja grande e sua oferta ou demanda sejam capazes de afetar as cotações internacionais, 2 2 Para uma problematização dessa caracterização da demanda e oferta mundiais dentro da abordagem do excedente, ver Machado ( 2017 ). ainda assim segue válida a proposição de que a cotação internacional e o preço no mercado interno convergem.

Podemos, portanto, concluir que para os bens com preço internacional a evolução dos custos de produção não dita a evolução do preço final, mas sim a evolução das margens de lucro. Podemos, assim, expressar as variações nas margens de lucro dos setores com preço internacional como:

\begin{gathered}g_{\mu_{t}^{I}} =\ g_{e_{t}}+\ \pi_{t}^{*}-{\ g}_{C_{t}}\\g_{\mu_{t}^{I}} =\ g_{e_{t}}+\ \pi_{t}^{*}-\left[g_{\tau_{t}}+\ \sigma_{a}.\pi_{t}^{D}+\ \sigma_{m}.\left(g_{e_{t}}+\ \pi_{t}^{*}\right)+\ \sigma_{w}.\left(g_{w_{t}}-\ g_{b_{t}}\right)\right]\\g_{\mu^{I}}=\ \left(1-\sigma_{m}\right).\left(g_{e_{t}}+\ \pi_{t}^{*}\right)-g_{\tau_{t}}-\ \sigma_{a}.\pi_{t}^{D}-\ \sigma_{w}.\left(g_{w_{t}}-\ g_{b_{t}}\right)\qquad{(10)}\end{gathered}

Quando bens com preço internacional em moeda doméstica encarecem, emergem duas consequências: o aumento dos custos de produção e a elevação da receita. Dado que a produção depende da aquisição de insumos com preço internacional, a desvalorização cambial e/ou o aumento da cotação internacional aumentam o custo de produção. Todavia, como podemos observar pela equação 10 , a receita se eleva mais do que aumentam os custos de produção, uma vez que σ m é menor do que uma unidade. A majoração do preço em moeda doméstica dos bens que são precificados internacionalmente, embora pressione o custo de produção, apresenta como resultado a expansão das margens de lucro.

2. OS DETERMINANTES DO CONFLITO DISTRIBUTIVO

A concorrência, dentro da abordagem clássica do excedente, é compreendida a partir do processo de migração do capital (Ciccone, 2011Ciccone, R. Capacity utilization, mobility of capital and the classical process of gravitation. In: Ciccone, R.; Gehke, C.; Mongiovi, G. (Orgs.). Sraffa and Modern Economics. London: Routledge, 2011. p. 76-86. ). Sempre que um setor apresenta rentabilidade maior (menor) que a normal, há incentivo para a entrada (saída) de capital. A taxa de juros de longo prazo é a referência para os requisitos mínimos de rentabilidade, uma vez que os títulos públicos são os ativos de menor risco do sistema econômico (Pivetti, 2007Pivetti, M. Distribution, inflation and policy analysis. Review of Political Economy, v. 19, n. 2, p. 243-247, 2007. ). Para poder competir com eles, os demais ativos precisam compensar seu maior risco, oferecendo maior rentabilidade. Portanto, a taxa normal de lucro é definida como a taxa nominal de juros mais as características setores de “ risk and trouble ”, conforme chamadas por David Ricardo.

A Autoridade Monetária fixa a taxa de curto prazo e, assim, condiciona a trajetória da taxa de longo prazo (com o prêmio de risco correspondente).

As taxas de longo prazo refletiriam assim a percepção dos agentes econômicos sobre a trajetória da taxa de juros determinada pelo Banco Central do Brasil (BCB). Os agentes econômicos tentam antecipar os movimentos da taxa básica de acordo com as expectativas que formulam acerca da economia, além disso, se ajustam, mais cedo ou mais tarde, aos seus movimentos não esperados, corrigindo eventuais erros de expectativa 3 3 Para maior compreensão do tema, ver Lavoie ( 2001 ) e Pivetti ( 2001 ).

(Bastos; Braga, 2010Bastos, C. P.; Braga, J. Conflito distributivo e inflação no Brasil: Uma aplicação ao período recente. In: Vianna, S. T. W.; Bruno, M. A. P.; Modenesi, A. M. (Orgs.). Macroeconomia para o desenvolvimento: crescimento, estabilidade e emprego. Rio de Janeiro: IPEA, 2010. p. 119-156. , p. 126).

Nos setores com preço doméstico, o mark-up incidente sobre os custos variáveis unitários leva em consideração o capital imobilizado em ativos fixos e o grau de utilização esperado, de modo a cobrir os custos fixos e permitir uma rentabilidade compatível com a taxa normal de lucro.

Mediante um choque de custos, a magnitude do repasse dos novos custos para o preço final é condicionada pelo comportamento da taxa de juros e seus impactos sobre os mark-ups (Pivetti, 2007Pivetti, M. Distribution, inflation and policy analysis. Review of Political Economy, v. 19, n. 2, p. 243-247, 2007. ). Se a autoridade monetária elevar a taxa de juros nominal, por exemplo, para sustentar determinado nível de taxa real, o choque de custos é repassado aos preços mediante a elevação das margens nominais, preservando a rentabilidade real. A proteção ao retorno real do capital é entendida por Martinez e Braga ( 2012Martinez, T.; Braga, J. Crescimento liderado pelos salários, política monetária e inflação no Brasil. In: ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO KENEYSIANA BRASILEIRA, 5., 2012, São Paulo. Anais […]. São Paulo: FGV, 2012. ) como uma indexação. 4 4 Para uma discussão empírica do repasse dos custos aos preços na economia brasileira, ver Pimentel e Modenesi ( 2023 ).

Uma importante discussão sobre as características desse mark-up é se ele é nominal ou real. Embora o segundo corresponda ao primeiro deflacionado, as consequências em termos de disputa distributiva são distintas, como expõem Bastos ( 2001Bastos, C. P. Inflação e estabilização. In: Fiori, L.; Medeiros, C. A. (Orgs.). Polarização mundial e crescimento. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001. p. 201-241. ) e Serrano ( 2010Serrano, F. O conflito distributivo e a teoria da inflação inercial. Revista de Economia Contemporânea, v. 14, n. 2, p. 395-420, 2010. ).

Podemos chamar de custo histórico o custo defasado, ou seja, aquele com base nos preços (e produtividade) do período anterior. Sobre os custos históricos, as firmas fixam um mark-up que permita cobrir os custos de reposição (custos do período corrente) e obter determinada rentabilidade.

A questão que liga essas duas variáveis no processo de formação de preços é que a remuneração recebida com a venda da produção de uma firma, cujo preço é determinado pelos custos históricos e mark-up nominal, deve ser capaz de cobrir o valor dos insumos a custo de reposição, para que a firma continue a sua produção nos períodos seguintes, ou alternativamente, alcance o valor do mark-up real desejado

(Bastos, 2001Bastos, C. P. Inflação e estabilização. In: Fiori, L.; Medeiros, C. A. (Orgs.). Polarização mundial e crescimento. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001. p. 201-241. , p. 222).

Quando o mark-up nominal é exógeno, determinado pela magnitude da taxa de juros de longo prazo, por exemplo, uma vez que os custos históricos e de reposição podem diferir, a rentabilidade real é endógena, ou, em outras palavras, depende da evolução dos custos, como o salarial. Um mark-up sobre o custo histórico que projete a evolução dos custos para o período corrente de modo a alcançar certa rentabilidade real só irá produzir a rentabilidade real desejada se os agentes acertarem a expectativa sobre o comportamento dos custos. Esse mark-up sobre o custo histórico é nominal.

Conforme explica Bastos ( 2001Bastos, C. P. Inflação e estabilização. In: Fiori, L.; Medeiros, C. A. (Orgs.). Polarização mundial e crescimento. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001. p. 201-241. ), há autores que entendem que o mark-up deve ser real, ou seja, incidente sobre os custos de reposição, que são, basicamente, um mark-up nominal perfeitamente indexado, de modo que choques de custo são sempre integralmente repassados aos preços e a rentabilidade real está assegurada. Podemos dizer nesse caso que o mark-up real é exógeno.

Quando o mark-up real é exógeno, não importa qual a evolução dos custos, o retorno real está garantido. Independentemente de a barganha salarial ser mais ou menos bem-sucedida, como as margens são perfeitamente indexadas, o preço sobe o necessário para neutralizar o impacto do reajuste salarial sobre a rentabilidade real. Não haveria, assim, razão para que o detentor do capital se opusesse à concessão de reajustes salariais, ou até mesmo para os trabalhadores solicitassem esses reajustes, uma vez que o impacto sobre o salário real seria neutralizado com a respectiva majoração de preços.

Todavia, quando o mark-up nominal que é exógeno, os custos de produção evoluem de maneira a afetar a rentabilidade real e a distribuição de renda. A concessão de reajuste salarial no período corrente mais elevada do que o previsto comprime a rentabilidade real, uma vez que o preço foi projetado para um comportamento mais suave do custo unitário do trabalho. Alternativamente, conceder reajustes menores do que o projetado permite rentabilidade real mais alta. Ou seja, há conflito distributivo entre o rendimento do trabalho e do capital, pois quanto maior o primeiro, menor o segundo, e vice-versa. A distribuição de renda é consequência do mark-up real resultante da dinâmica de preços e salários. 5 5 É essa dinâmica das variáveis reais que será analisada mais à frente. Por isso, apesar da caracterização feita sobre o processo de precificação compatível com conflito distributivo fazer referência ao custo histórico e ao mark-up nominal ( \begin{equation}P_{t} = \ \mu_{t}^{N}.C_{t - 1}\end{equation}Pt=μtN.Ct−1 ), o modelo teórico exposto na seção anterior trabalhou com custo de reposição e mark-up real ( \begin{equation}P_{t} = \mu_{t}.C_{t}\end{equation}Pt=μt.Ct ), pois a distribuição de renda será consequência do comportamento das variáveis distributivas no período corrente.

A partir do proposto por Pivetti ( 2007Pivetti, M. Distribution, inflation and policy analysis. Review of Political Economy, v. 19, n. 2, p. 243-247, 2007. ), a taxa nominal de juros baliza a rentabilidade normal do sistema de preços e o mark-up de cada setor de atividade. Se a Autoridade Monetária persegue uma estabilidade para a taxa real de juros, o mark-up nominal tendencialmente se ajusta para preservar a rentabilidade real de referência do sistema de preços. A evolução do retorno real do capital, respeitando as respectivas defasagens, acompanha a evolução da taxa real de juros.

Para o caso dos bens com preço internacional, também é possível trabalhar com a interação proposta por Pivetti ( 2007Pivetti, M. Distribution, inflation and policy analysis. Review of Political Economy, v. 19, n. 2, p. 243-247, 2007. ), embora parcialmente modificada. Como dito acima, o preço dessas mercadorias é fruto não apenas dos salários e da taxa de juros (e, dessa forma, do lucro), expressos em moeda de circulação internacional, como também da técnica dominante nos países que a utilizam. A taxa normal de lucro é o requisito mínimo de rentabilidade para viabilizar a produção no mercado interno. Como o preço de mercado é determinado pela cotação internacional e pela taxa nominal de câmbio (eP * ), ele pode superar o preço de produção doméstico (custo de produção acrescido da rentabilidade normal). Bastos e Braga ( 2010Bastos, C. P.; Braga, J. Conflito distributivo e inflação no Brasil: Uma aplicação ao período recente. In: Vianna, S. T. W.; Bruno, M. A. P.; Modenesi, A. M. (Orgs.). Macroeconomia para o desenvolvimento: crescimento, estabilidade e emprego. Rio de Janeiro: IPEA, 2010. p. 119-156. , p. 35) nomeiam essa renda adicional de renda diferencial e afirmam que o “[…] último componente dos preços básicos são as commodities, ou, pensando em termos de variáveis distributivas, as rendas a serem pagas aos proprietários de terras e minas”.

Como fica evidente a partir das equações ( 8 ) e ( 9 ), o mark-up não depende da taxa de lucro normal, mas sim da taxa nominal de câmbio e da cotação internacional. A taxa de lucro de referência determina se a produção doméstica apresenta viabilidade econômica, e, apresentando, define a ordem de grandeza da renda diferencial.

Como nesse setor os capitalistas são tomadores de preços, quanto maior (menor) o crescimento dos salários, menor (maior) o retorno do capital. Não faria sentido trabalhar com o conceito de mark-up nominal perfeitamente indexado. A indexação que vigora é a do preço de mercado em relação à cotação internacional e à taxa de câmbio.

Podemos, então, concluir que as variáveis distributivas chaves são: salário real, produtividade do trabalho, taxa de câmbio, cotação internacional das commodities, taxa de lucro real e renda diferencial.

Em uma estrutura como a proposta por Pivetti ( 2007Pivetti, M. Distribution, inflation and policy analysis. Review of Political Economy, v. 19, n. 2, p. 243-247, 2007. ), em que a taxa de juros de longo prazo determina, acrescida dos elementos setoriais de risco, a taxa de lucro, é a evolução dessa variável, da taxa nominal de câmbio, da produtividade do trabalho e do preço das commodities que dita a evolução do salário real

(Gomes; Freitas, 2021aGomes, L. S.; Freitas, F. Salário real e conflito distributivo na economia brasileira de 2000 a 2014. Revista de Análise Econômica, v. 39, n. 78, p. 107-132, 2021a. , p. 117).

A presença de dois processos de formação de preço no sistema econômico possibilita disputas distributivas dentro do rendimento do trabalho e do capital. Uma taxa real de juros mais elevada reduz a rentabilidade de setores com preço internacional, seja pelo encarecimento do custo do capital, seja pelo maior custo dos insumos com preço doméstico, provocado por margens de lucro mais elevadas.

A disputa dentro do rendimento do trabalho se dá pelo encarecimento da cesta de consumo dos assalariados dos setores com preço internacional toda vez que os assalariados dos setores com preço doméstico conseguem reajustes salariais. Ocorre também a partir de determinada trajetória para a taxa de câmbio. Uma valorização cambial, por exemplo, pode pressionar a remuneração ou comprometer o emprego em setores com preço internacional, enquanto provoca elevação do salário real dos setores com preço doméstico, por meio do barateamento da parcela da cesta de consumo sob influência da taxa de câmbio. O efeito sobre o salário real médio e sobre o conflito distributivo como um todo depende da parcela da cesta de consumo e da força de trabalho em cada setor, sujeito ao impacto que essa trajetória possa ter sobre a força de trabalho no geral, como uma taxa de desemprego elevada que comprometa o poder de barganha nos dois segmentos.

Por fim, vale dizer que, se do ponto de vista do produtor o que importa é o custo salarial, portanto a produtividade, os salários e os encargos sociais que incidem sobre a folha de pagamento, compondo o custo unitário do trabalho (CUT), para os trabalhadores a variável relevante é o salário auferido. Assim, em nosso exercício empírico, as contribuições sociais imputadas se incluem no cálculo do CUT e não são consideradas no cálculo do salário real. Para avaliarmos o comportamento dos salários nominais, foram usadas as informações disponíveis nas Contas Nacionais (SCN-IBGE). A massa salarial foi dividida pelo pessoal ocupado, fornecendo o salário médio de cada atividade.

Adicionalmente, a mudança de preços relativos afeta a dinâmica de conflito. Para os assalariados, o índice de preço relevante é o índice de preço de sua cesta de consumo (P c ), enquanto para os empresários o índice de preço relevante é o associado à correção de preço dos bens finais que produzem (P). Vamos supor que a produtividade está estável e que a meta dos assalariados é apenas manter seu poder de compra. Se o preço de sua cesta de consumo cresce menos do que o nível geral de preços, o reajuste pleiteado pelos trabalhadores é menor do que a correção de preço da receita das empresas, o que não pressiona as margens de lucro. Todavia, se o nível geral de preços cresce menos que o preço da cesta de consumo, o reajuste pleiteado pressiona as margens e há um acirramento do conflito.

Podemos representar essa questão como:

\begin{equation}\frac{W}{P_{c}} = \ \frac{W}{P}.\frac{P}{P_{c}}\qquad{(11)}\end{equation}

Cabe ressaltar que \begin{equation}\frac{W}{P}\end{equation} é o salário nominal médio, dividido pelo nível de preço de cada atividade. Difere do custo unitário do trabalho, que engloba não somente as contribuições patronais sobre a folha, mas também toda massa salarial dividida pelo valor bruto da produção.

Portanto, a evolução do índice de preço do valor bruto da produção (VBP) comparativamente à cesta de consumo dos assalariados é uma variável relevante para o conflito distributivo. Para qualquer meta de reajuste salarial, quando \begin{equation}\frac{P}{P_{c}}\end{equation} sobe (se reduz), o conflito distributivo é atenuado (aguçado).

3. ASPECTOS METODOLÓGICOS DA SEPARAÇÃO DOS BENS EM PREÇO DOMÉSTICO E PREÇO INTERNACIONAL

Esta seção busca descrever a metodologia aplicada para podermos seguir com a análise proposta e distinguir as atividades com base em características comuns de formação de preço, isto é, determinar quais bens obedecem a um valor de referência internacional (e.P*) e quais seguem uma precificação doméstica e o posterior cálculo das variáveis distributivas.

Para implementar as classificações, foram coletados os dados de exportações mundiais e brasileiras disponíveis na plataforma do Banco Mundial de 1997 até 2019 (The World Bank, 2021 The World Bank. Comtrade. World Integrated Trade Solution (WITS). Exportações brasileiras, exportações mundais, 1997-2019. [S.l.]: World Bank, 2021. Disponível em https://wits.worldbank.org/WITS/WITS/Restricted/Login.aspx . Acesso em: 3 jul. 2021.
https://wits.worldbank.org/WITS/WITS/Res...
). Considerando que os dados foram extraídos seguindo a classificação de seis dígitos (HS6), para viabilizar a leitura e a análise seguindo a estrutura do Sistema de Contas Nacionais (SCN), eles foram agregados utilizando um tradutor HS6xSCN elaborado pelo Grupo de Indústria e Competitividade, do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (GIC/IE-UFRJ, 2021). A agregação permitiu passar de mais de 5000 produtos na classificação HS6 para 84 produtos SCN. Como estão disponíveis em valor e por peso, os dados permitem o cálculo do preço por kg.

Para avaliar a evolução do preço dos produtos foram montados índices de preço do tipo Paasche. 6 6 Inspirado no exercício realizado por Guimarães et al. ( 1997 ). Optou-se por abranger uma série mais longa do que os anos 2010-2019, a fim de observar se há ou não uma tendência de longo prazo para o preço das exportações brasileiras comparativamente às exportações mundiais. Para cada código HS6 foram retiradas as duas taxas de crescimento mais agudas e substituídas pela média da série, com o objetivo de prevenir outliers . Os 84 produtos SCN constituem, cada um, uma cesta de bens, sendo que a participação de cada é definida pela parcela dos produtos HS6 sobre o produto resultante da agregação, ou seja, sobre sua respectiva cesta.

Por exemplo, tomemos três índices de preços referentes aos produtos 1, 2 e 3 na classificação HS6, agregados para o produto A do SCN. O peso dos produtos 1, 2 e 3, em valor são respectivamente 20%, 30% e 50% do produto A no referido ano (Índice Paasche). A partir disso, é possível montar um índice de preço para a evolução de preço do produto A, por meio da participação dos produtos 1, 2 e 3 e da evolução dos seus preços no decorrer do período analisado.

Para as duas séries foi usada a participação das exportações brasileiras na agregação dos produtos HS6 em SCN, uma vez que usar ponderações diferentes para cada uma poderia afetar o índice de preço médio ponderado para cada produto SCN pelo efeito composição, o que seria contra produtivo diante do objetivo de comparar estritamente a trajetória dos preços.

Vamos novamente ilustrar com um exemplo. Suponhamos que os produtos 1 e 2 correspondam a, respectivamente, 40% e 60% do produto A SCN. Se o produto 1 tem uma variação de preço de 10% e o segundo tem uma variação nula, temos uma taxa média ponderada de 4%. Se ocorresse exatamente a mesma trajetória para as exportações mundiais e a participação na cesta (em valor) fosse 70% e 30%, teríamos uma taxa média de 7% ao ano. Mesmo a trajetória das séries originais sendo a mesma e reforçando uma convergência, o efeito composição faria aparentar uma trajetória mais dissonante 7 7 Na verdade, foi feito um pequeno ajuste na participação das exportações mundiais. Como existe um problema de diferença da quantidade de registro nas duas séries, alguns produtos HS6 das exportações mundiais eram zero, mas para o Brasil não. Forçar um índice nulo para qualquer participação não nula puxaria inadequadamente o índice médio ponderado para baixo. Portanto, essa parcela fruto da diferença da quantidade de registro foi redistribuída para que a parcela original com dados registrados totalizasse 100%. Para os casos em que havia registro internacional, mas não brasileiro, foi atribuído peso nulo ao produto HS6, por ele não fazer parte da cesta brasileira. . Assim, duas séries com 84 índices de preço cada foram construídas, sendo uma relativa às exportações mundiais e outra compreendendo as exportações brasileiras de 1998 até 2019. Posteriormente, os 84 produtos SCN foram analisados graficamente comparando a evolução da taxa de inflação anual das exportações mundiais com a mesma série referente às exportações brasileiras, e identificados 45 produtos com preços internacionais.

A base de dados disponibiliza informação de valor adicionado por setor, e não com base na classificação por produto. Assim, a partir da classificação dos 128 produtos foi feita uma classificação para as 67 atividades. Para isso calculou-se a participação de cada produto sobre o total produzido da atividade de 2010 a 2019, e então foi contabilizada a média. Assim, foi possível visualizar a característica de formação de preço para cada atividade, ou seja, quais apresentavam preço doméstico e quais apresentavam preço internacional. As atividades em que mais de 50% da produção estava concentrada em produtos seguindo o preço internacional foram classificadas como setores com preço internacional, 8 8 Das atividades classificadas como preço internacional, foi a de “Fabricação e refino de açúcar” que apresentou a participação mais baixa, com 64,4% do VBP constituído de produtos com preço internacional. e os demais como setores com preço doméstico. 9 9 Ou sequer existe algum produto no mercado internacional que possa ser considerado análogo ao do mercado doméstico, como acontece para alguns serviços. Foi usada, ainda, uma terceira classificação, para os serviços prestados pelo setor público (“Educação Pública”, “Saúde Pública” e “Administração Pública e Seguridade Social”). Esse grupo tem como característica o fato de o bem (no caso, um serviço) não ser adquirido pelos consumidores (o serviço é prestado aos cidadãos) mediante pagamento, ou seja, o bem não apresenta preço monetário. Assim, foram retirados da análise da dinâmica inflacionária e conflito distributivo.

O total da economia foi calculado considerando a soma dos dois primeiros grupos como 100% da economia brasileira. Dos 64 setores de atividade remanescentes das Contas Nacionais, 22 entraram na classificação como setores com preço internacional, a saber: “Agricultura, inclusive o apoio à agricultura e a pós-colheita”; “Extração de petróleo e gás, inclusive as atividades de apoio”; “Extração de minério de ferro, inclusive beneficiamentos e a aglomeração”; “Extração de minerais metálicos não-ferrosos, inclusive beneficiamentos”; “Abate e produtos de carne, inclusive os produtos do laticínio e da pesca”; “Fabricação e refino de açúcar”; “Outros produtos alimentares”; “Fabricação de produtos do fumo”; “Fabricação de produtos têxteis”, “Confecção de artefatos do vestuário e acessórios”, “Fabricação de calçados e de artefatos de couro”; “Fabricação de celulose, papel e produtos de papel”; “Fabricação de químicos orgânicos e inorgânicos, resinas e elastômeros”; “Fabricação de defensivos, desinfetantes, tintas e químicos diversos”; “Fabricação de produtos de limpeza, cosméticos/perfumaria e higiene pessoal”; “Fabricação de produtos de borracha e de material plástico”; “Produção de ferro-gusa/ferroligas, siderurgia e tubos de aço sem costura”; “Fabricação de produtos de metal, exceto máquinas e equipamentos”; “Fabricação de máquinas e equipamentos elétricos”; “Fabricação de automóveis, caminhões e ônibus, exceto peças”; “Fabricação de peças e acessórios para veículos automotores”; e “Edição e edição integrada à impressão”. 10 10 Em função de a análise ter se concentrado no comportamento do preço das exportações brasileiras vis-à-vis às exportações mundiais, é possível que o esforço tenha sido mais bem-sucedido em definir os bens exportáveis do que os bens com preço internacional.

A partir da classificação por processo de precificação foram calculadas as variáveis-chave, isto é, custo unitário do trabalho, salário real médio, excedente operacional bruto, valor da produção e assim por diante para cada categoria.

4. A ECONOMIA BRASILEIRA E A EVOLUÇÃO DO CONFLITO DISTRIBUTIVO DE 2010 A 2019

Esta seção busca caracterizar brevemente o comportamento da economia brasileira no período estudado e, em seguida, analisar o conflito distributivo a partir da classificação adotada e dos resultados encontrados.

O período compreendido entre 2010 e 2019 é bastante heterogêneo para a economia brasileira. O primeiro triênio marca uma fase de desaceleração do crescimento econômico em relação à década anterior, porém de crescimento ainda positivo. Em 2014, a economia brasileira apresenta uma taxa de crescimento praticamente nula, e nos dois anos seguintes apresenta uma queda acumulada de mais de 7%. O triênio seguinte registra o modesto crescimento médio de 1,5%.

O período também é heterogêneo quando analisamos o arranjo de política econômica. De 2011 a 2014 houve certa flexibilização da política monetária, com intuito de induzir desvalorizações cambiais e uma tentativa de elevar o investimento privado e a competitividade da economia brasileira por meio de isenções fiscais, principalmente para os setores exportadores. Também são contidos alguns preços administrados, como tarifas de ônibus municipal e de energia elétrica. A partir de 2015, inicia-se um processo de ajuste fiscal e liberação dos preços represados (Prates; Fritz; Paula, 2017Prates, D.; Fritz, B.; Paula, L. F. Uma avaliação das políticas desenvolvimentistas nos governos do PT. Cadernos do Desenvolvimento, v. 12, p. 187-215, 2017. ; Summa; Serrano, 2018Summa, R.; Serrano, F. Conflito distributivo e o fim da breve Era de Ouro da economia brasileira. Novos Estudos Cebrap, v. 37, p. 175-189, 2018. ). O processo de reformas se intensifica nos anos seguintes, com a aprovação da Emenda Constitucional referente ao Teto dos Gastos Públicos 11 11 A chamada PEC do Teto limitou o crescimento das despesas à inflação observado do ano anterior, mantendo, portanto, a despesa real do Governo Federal estável no patamar de 2016. A regra nasceu com prazo de dez anos, podendo ser prorrogada por mais dez. e a Lei da Terceirização. 12 12 Para uma discussão sobre o impacto da reforma trabalhista sobre o mercado de trabalho, ver Serra, Bottega e Sanches ( 2022 AJUSTAR2021).

Além da liberação de preços administrados importantes, 2015 também marca importante desvalorização da taxa nominal de câmbio, superior a 40%, e uma queda do preço das commodities no mercado internacional. Assim, no quadriênio 2011-2014, a taxa nominal de câmbio 13 13 Como as Contas Nacionais trabalham com índice de preço média anual, conforme explicado acima, a taxa de câmbio utilizada foi a taxa média anual. se desvaloriza em média 7,5% ao ano, sofre um grande salto em 2015 e mantém uma trajetória suave de desvalorização na média dos anos seguintes. No período 2015-2019, a taxa média de desvalorização foi da ordem de 11% ao ano. Já o preço das commodities sobe bastante em 2011, e depois mantém certa estabilidade até 2014, cai sensivelmente em 2015 e, posteriormente, gravita ao redor desse novo patamar nos anos seguintes (UNCTAD, 2020 United Nations Conference On Trade And Development. Free market commodity price index – March 2019. Geneva: UNCTAD, 2020. Disponível em https://unctad.org/en/Pages/Publications/Commodity-Price-Bulletin.aspx . Acesso em: 10 fev. 2020.
https://unctad.org/en/Pages/Publications...
).

A análise 14 14 Os dados foram calculados somente após a agregação das atividades nos dois subgrupos. Os bens com preço internacional respondiam a 27,3% e 25,5% do VBP nos anos base 2010 e 2014, respectivamente. Os bens com preços domésticos, por sua vez, respondiam a 72,7% e 74,5% do VBP em 2010 e 2014, respectivamente. do período 2011-2019 15 15 Diferentemente dos índices de preços tradicionais, calculados primeiro mensalmente e depois anualmente, nas contas nacionais vigora o conceito de preço médio (anual). Em vista disso, como não há estimativa dentro da base 2010 para o ano de 2009, não é possível comparar o preço médio de 2009 com o preço médio de 2010 e calcular a taxa de inflação para 2010, o que pode ser feito apenas a partir de 2011. Podemos ainda registrar outras diferenças metodológicas em relação ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), também produzido pelo IBGE, como classificação distinta no processo de agregação e o fato de aqui estarmos analisando a variação de preço do VBP a preço básico enquanto o IPCA busca analisar a cesta de consumo das famílias a preço de consumidor, o que seria mais próximo ao vetor de consumo das Contas Nacionais. O IPCA médio para os anos 2011-2014 foi de 6,2% ao ano, e no quinquênio 2015-2019 de 5,6% ao ano. foi, portanto, dividida em duas fases, seguindo a análise sobre o processo inflacionário e o conflito distributivo brasileiro a partir da Abordagem do Excedente, presente em Gomes e Freitas ( 2020Gomes, L. S; Freitas, F. A dinâmica inflacionária no Brasil de 2010 a 2017: Uma abordagem multissetorial. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 48., 2020. Anais […]. Niterói: ANPEC, 2020. ), Summa ( 2015Summa, R. Mercado de trabalho e evolução dos salários no Brasil. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 42, p. 10, 2015. ), Summa e Braga ( 2013Summa, R.; Braga, J. Taxa de juros, taxa de câmbio e inflação no período do sistema de metas de inflação no Brasil. In: Correa, V. P. (Org.). Padrão de acumulação e desenvolvimento brasileiro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2013. p. 1-248. , 2016Summa, R.; Braga, J. Estimação de um modelo desagregado de inflação de custo para o Brasil. Ensaios FEE, v. 37, p. 399-430, 2016 ) e Summa e Serrano ( 2015Summa, R.; Serrano, F. Aggregate demand and the slowdown of Brazilian economic growth in 2011-2014. Nova Economia, v. 25, número especial, p. 803-833, 2015. , 2017Summa, R.; Serrano, F. Distribution and conflict inflation in Brazil under inflation targeting, 1999-2014. Review of Radical Political Economics, v. 49, n. 2, p. 48-78, 2017. , 2018Summa, R.; Serrano, F. Conflito distributivo e o fim da breve Era de Ouro da economia brasileira. Novos Estudos Cebrap, v. 37, p. 175-189, 2018. ).

A primeira fase vai de 2011 até 2014 e é caracterizada por moderada desvalorização cambial, baixa taxa de desemprego, inflação salarial, em especial no setor de serviços, crescimento do salário real e uma política mais ativa de contenção do preço dos bens monitorados (Summa, 2015Summa, R. Mercado de trabalho e evolução dos salários no Brasil. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 42, p. 10, 2015. ).

A segunda fase, 2015-2019, caracteriza-se pelo desempenho macroeconômico ruim, liberação de tarifas represadas, ajuste fiscal contínuo e reformas institucionais market friendly , como Teto de Gastos e Terceirização. Nesse período, a taxa de desemprego cresce consideravelmente e a taxa nominal de câmbio se desvaloriza um pouco mais rápido.

Tabela 1
- Taxas médias de inflação por subperíodo

Como podemos ver a partir da Tabela 1 , a inflação média, medida pelo valor da produção (VBP) da economia brasileira, foi de 8% ao ano (a.a.) no primeiro quadriênio, fruto de uma taxa de 8,7% para os setores com preço internacional e 7,8% para os setores com preço doméstico.

O segundo subperíodo apresenta taxa de inflação menor para os dois grupos, com desinflação um pouco maior para os setores com preço internacional. Mesmo com a desvalorização cambial mais rápida, a queda das cotações internacionais permitiu uma variação de preço menor em moeda doméstica.

Na análise anual dos dados fica claro que os choques cambial e de tarifas mantiveram a inflação nos anos de 2015 e 2016 em patamar próximo ao quadriênio anterior. A taxa de inflação é de fato mais baixa a partir de 2017 (ver Gomes; Freitas, 2020Gomes, L. S; Freitas, F. A dinâmica inflacionária no Brasil de 2010 a 2017: Uma abordagem multissetorial. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 48., 2020. Anais […]. Niterói: ANPEC, 2020. ).

A Tabela 2 apresenta a participação da folha salarial (contribuições sociais inclusas), das margens de lucro, do rendimento misto e dos impostos livres de subsídios, bem como sua evolução no período 2010-2014.

Tabela 2
- Taxas médias de crescimento e valores de referência, 2010-2014

Pode-se observar que o custo unitário do trabalho (CUT), as margens de lucro e o rendimento misto responderam por uma parcela menor do VBP no setor com preço internacional do que no setor com preço doméstico. Já os impostos livres de subsídios representaram parcela semelhante do VBP para os dois grupos.

No primeiro quadriênio, o CUT aumentou para os dois setores, com elevação mais acentuada nos setores com preço doméstico. Nesse período, a inflação mais alta para os preços internacionais amenizou o crescimento do CUT, uma vez que contribuiu para maior crescimento do denominador (valor da produção).

Nesse período, as margens de lucro 16 16 Excedente operacional bruto (EOB) dividido pelo valor bruto da produção (VBP). caíram nos dois setores, com queda mais acentuada para o grupo com preço doméstico. Novamente, a maior inflação para as atividades que seguem um valor mundial de referência amenizou a queda, uma vez que permitiu repasse maior da elevação do custo de produção ao preço do bem final.

O rendimento misto respondeu por parcela bem mais significativa do VBP nos setores com preço doméstico (6,4%) do que nos setores com preço internacional (3,7%). Podemos observar uma trajetória distinta para os dois segmentos. Enquanto ele cai levemente para os setores com preço determinado no mercado interno, cresce razoavelmente para os setores com preço internacional. Os demais impostos livres de subsídios apresentam duas características: decresceram a taxas díspares e corresponderam à parcela pequena do valor produzido.

A Tabela 3 ilustra a evolução do poder de compra do salário. 17 17 Em 2010, ano base para o primeiro subperíodo, os setores com preço internacional respondiam por 17% do emprego, e os setores com preço doméstico por 83%. O salário nominal médio (contribuições patronais excluídas) cresceu um pouco acima de 10% a.a. para os dois setores, ou seja, acima da inflação de cada atividade. Por isso, podemos observar, comparando a evolução do salário nominal vis-à-vis o índice de preço do VBP ( \begin{equation}\frac{W}{P}\end{equation} ), que a dinâmica salarial foi um fator de custo e de acirramento distributivo relevante nos dois grupos.

Tabela 3
- Taxas médias de crescimento, 2010-2014

Notamos que a correção do preço final mais acentuada para os setores com preço internacional de fato amenizou a pressão dos salários sobre os custos e ajuda a explicar o menor crescimento do CUT, observado na Tabela 2 . Esse comportamento mais favorável do preço do produto final amenizou o conflito distributivo nos setores com preço internacional, expresso na mudança de preços relativos (P/Pc). Para os setores com preço doméstico, a evolução dos preços relativos exerceu papel praticamente nulo na dinâmica de conflito.

Para a economia brasileira no geral, temos que o crescimento relevante do salário nominal pressionou o custo de produção, elevando o CUT. O crescimento de 8% do preço do bem final foi inferior ao crescimento salarial ( \begin{equation}\frac{W}{P}\end{equation} aumentou). A mudança de preços relativos (P/Pc) foi virtualmente nula e não amenizou o conflito distributivo. Do lado do rendimento do trabalho, o crescimento do salário nominal mais rápido do que do preço da cesta de consumo (Pc) permitiu crescimento relevante dos salários reais superior a 2% a.a. 18 18 Analisando a série anual, vale frisar que esse período foi marcado por crescimento anual cada vez menor do salário nominal e real, culminando em uma taxa negativa de variação para o salário real em 2014.

Analisando a Tabela 4 , vemos que podemos manter as observações gerais para o ano base 2014 comparativamente a 2010. Margens de lucro, CUT e rendimento misto são fração maior do VBP nos setores com preço doméstico do que nos setores com preço internacional, e os demais impostos livres de subsídios representam parcela pequena do valor da produção.

Tabela 4
- Taxas médias de crescimento e valores de referência, 2014-2019

De 2015 a 2019, o CUT modificou sua trajetória. Apresentou virtual estabilidade para as atividades com preço doméstico e queda acentuada para os setores com preço internacional. As margens de lucro apresentaram resultado semelhante, isto é, virtual estabilidade para os setores com preço doméstico e queda relevante para os setores seguindo valores internacionais. 19 19 Vale registrar que a aparente contradição das margens de lucro e do CUT terem caído foi consequência, primeiramente, do aumento da participação do consumo intermediário no VBP, e essa mudança, por sua vez, é, ao menos parcialmente, explicada pelo aumento de participação do consumo intermediário importado. Adicionalmente, há crescimento dos demais impostos livres de subsídios.

A correção menor do preço do bem final para o segundo grupo é uma variável importante para explicar por que, mesmo com crescimento menor do custo de produção, 20 20 Ver Gomes e Freitas ( 2021b ) para entender a evolução das margens de lucro nos setores com preço internacional. as margens de lucro tiveram resultados tão distintos. Isso vale tanto para a comparação entre os setores, com queda maior para o segundo grupo, como para a comparação com o período anterior, 21 21 Esse resultado associado à comparação temporal é compatível com o observado em Gomes e Freitas ( 2021b ). que havia apresentado queda pequena. Vale frisar que a desvalorização cambial um pouco mais rápida não foi capaz de modificar esse resultado, dado o comportamento das cotações internacionais (ver UNCTAD, 2020 United Nations Conference On Trade And Development. Free market commodity price index – March 2019. Geneva: UNCTAD, 2020. Disponível em https://unctad.org/en/Pages/Publications/Commodity-Price-Bulletin.aspx . Acesso em: 10 fev. 2020.
https://unctad.org/en/Pages/Publications...
).

A Tabela 5 mostra que o comportamento do salário nominal 22 22 Em 2014, ano base para o segundo subperíodo, os setores com preço internacional respondiam por 15,6% do emprego, e os setores com preço doméstico por 84,4%. foi substancialmente distinto em 2015-2019 comparativamente a 2011-2014, tanto pela expressiva desaceleração, como pela heterogeneidade entre os dois segmentos. A forte desaceleração o fez crescer menos que o preço da cesta de consumo dos assalariados, reduzindo o salário real, em especial no setor com preço internacional, que apresentou queda superior a 2,5% ao ano. A evolução dos preços relativos (P/Pc) acirrou o conflito nesse setor, reduzindo a margem para barganha salarial em contexto de desemprego elevado. Vale registrar que a queda de poder de compra no segundo grupo foi suficientemente forte para sobrepor os ganhos obtidos no período anterior. Em outras palavras, o salário real médio em 2019, no setor com preço internacional, foi inferior ao de 2010. No setor com preço doméstico, apesar da queda em 2015-2019, os ganhos obtidos nos anos anteriores não foram integralmente revertidos.

Tabela 5
- Taxas médias de crescimento, 2014-2019

A evolução de \begin{equation}\frac{W}{P}\end{equation} é oposta à observada antes. Ela se reduz nos dois grupos e mais intensamente nos setores com preço internacional. Em 2011-2014, ela havia crescido menos para esse grupo devido à correção mais elevada para o preço final; agora, ela decai mais rapidamente, fruto do menor crescimento dos salários nominais.

Para a economia brasileira como um todo, notamos que a piora das condições associadas ao mercado de trabalho altera completamente a dinâmica salarial. O salário nominal médio cresce menos da metade de antes, e o salário real (médio) cai 1,3% ao ano. A evolução dos preços relativos não amenizou o conflito distributivo, e o crescimento do preço do produto final mais rápido que dos salários contribuiu para reduzir o CUT. Mesmo assim, devido ao comportamento desfavorável das cotações internacionais, as margens de lucro caem, puxadas pelos setores com preço internacional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A economia brasileira viveu fases bem diferentes no período 2011-2014 comparativamente ao período 2015-2019. Essa heterogeneidade se manifestou na evolução do conflito distributivo.

Nos anos 2011-2014, a taxa de desemprego baixa permitiu o crescimento rápido dos salários nominais, que por consequência elevaram tanto o salário real quanto o custo unitário do trabalho. O crescimento do salário real foi homogêneo nos dois segmentos. A correção maior do preço final dos setores com preço internacional, por sua vez, permitiu que a elevação do CUT fosse mais moderada nesse grupo, assim como amenizou a queda das margens de lucro em um quadro de desvalorização cambial moderada e elevação das cotações internacionais das commodities. Para os setores com preço doméstico, o CUT cresceu mais rápido e as margens de lucro tiveram queda mais acentuada.

Nos anos 2015-2019, a taxa de desemprego elevada modificou a dinâmica do mercado de trabalho. O salário nominal cresceu apenas metade do que havia crescido antes nos setores com preço doméstico, e um terço nos setores com preço internacional. Esse quadro resulta em queda do salário real, mesmo com a cesta de consumo dos assalariados encarecendo mais devagar. Essa queda é mais acentuada nos setores com preço internacional, nos quais a queda chega a superar o crescimento acumulado da fase anterior, ou seja, o salário real médio de 2019 foi inferior ao de 2010. As margens de lucro e o CUT apresentam virtual estabilidade para os setores com preço doméstico e queda para os setores com preço internacional. Em um quadro de menor crescimento do custo salarial e desvalorização cambial mais acentuada, esse resultado é consequência da queda das cotações internacionais.

Para o agregado da economia brasileira, o período 2011-2014 é marcado pelo crescimento do CUT, dos salários reais e da queda das margens de lucro. Enquanto em 2015-2019 temos tanto queda dos salários reais quanto do custo unitário do trabalho. As margens de lucro voltam a cair, puxadas pelo desempenho do setor com preço internacional.

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    » https://madeusp.com.br/publicacoes/artigos/a-reforma-trabalhista-de-2017-efeito-taxa-desemprego-brasil/
  • Serrano, F. O conflito distributivo e a teoria da inflação inercial. Revista de Economia Contemporânea, v. 14, n. 2, p. 395-420, 2010.
  • Summa, R. Mercado de trabalho e evolução dos salários no Brasil. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 42, p. 10, 2015.
  • Summa, R.; Braga, J. Estimação de um modelo desagregado de inflação de custo para o Brasil. Ensaios FEE, v. 37, p. 399-430, 2016
  • Summa, R.; Braga, J. Taxa de juros, taxa de câmbio e inflação no período do sistema de metas de inflação no Brasil. In: Correa, V. P. (Org.). Padrão de acumulação e desenvolvimento brasileiro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2013. p. 1-248.
  • Summa, R.; Serrano, F. Aggregate demand and the slowdown of Brazilian economic growth in 2011-2014. Nova Economia, v. 25, número especial, p. 803-833, 2015.
  • Summa, R.; Serrano, F. Conflito distributivo e o fim da breve Era de Ouro da economia brasileira. Novos Estudos Cebrap, v. 37, p. 175-189, 2018.
  • Summa, R.; Serrano, F. Distribution and conflict inflation in Brazil under inflation targeting, 1999-2014. Review of Radical Political Economics, v. 49, n. 2, p. 48-78, 2017.
  • The World Bank. Comtrade. World Integrated Trade Solution (WITS). Exportações brasileiras, exportações mundais, 1997-2019. [S.l.]: World Bank, 2021. Disponível em https://wits.worldbank.org/WITS/WITS/Restricted/Login.aspx . Acesso em: 3 jul. 2021.
    » https://wits.worldbank.org/WITS/WITS/Restricted/Login.aspx
  • United Nations Conference On Trade And Development. Free market commodity price index – March 2019. Geneva: UNCTAD, 2020. Disponível em https://unctad.org/en/Pages/Publications/Commodity-Price-Bulletin.aspx . Acesso em: 10 fev. 2020.
    » https://unctad.org/en/Pages/Publications/Commodity-Price-Bulletin.aspx
  • 1
    Nesse caso, (a) se refere ao coeficiente técnico do consumo intermediário doméstico que determina o custo do consumo intermediário dos bens com preço doméstico com o preço dos insumos com preço interno. Já o coeficiente técnico do consumo intermediário dos bens com preço internacional determina o custo do consumo intermediário importado, com a taxa nominal de câmbio (e) e o preço internacional (P*).
  • 2
    Para uma problematização dessa caracterização da demanda e oferta mundiais dentro da abordagem do excedente, ver Machado ( 2017Machado, P. A relação salário-câmbio, distribuição de renda e preços relativos. 2017. Dissertação (Mestrado em Economia) – Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017. ).
  • 3
    Para maior compreensão do tema, ver Lavoie ( 2001Lavoie, M. The reflux mechanism and the open economy. In: Rochon, L.; Vernengo, M. (Orgs.). Credit, interest rates and open economy: Essays on horizontalism. Cheltenham: Edward Elgar, 2001. p .215-241. ) e Pivetti ( 2001Pivetti, M. Monetary endogeneity and non-neutrality: A Sraffian perspective. In: Rochon, L.; Vernengo, M (Orgs.). Credit, interest rates and open economy: Essays on horizontalism. Cheltenham: Edward Elgar, 2001. p. 104-119. ).
  • 4
    Para uma discussão empírica do repasse dos custos aos preços na economia brasileira, ver Pimentel e Modenesi ( 2023Pimentel, D.; Modenesi, A. M. Transmissão assimétrica de choques de custos: uma análise SVAR para o Brasil durante as metas de inflação (1999-2016). Revista de Economia Contemporânea, v. 27, p.1-33, 2023. ).
  • 5
    É essa dinâmica das variáveis reais que será analisada mais à frente. Por isso, apesar da caracterização feita sobre o processo de precificação compatível com conflito distributivo fazer referência ao custo histórico e ao mark-up nominal ( \begin{equation}P_{t} = \ \mu_{t}^{N}.C_{t - 1}\end{equation} ), o modelo teórico exposto na seção anterior trabalhou com custo de reposição e mark-up real ( \begin{equation}P_{t} = \mu_{t}.C_{t}\end{equation} ), pois a distribuição de renda será consequência do comportamento das variáveis distributivas no período corrente.
  • 6
    Inspirado no exercício realizado por Guimarães et al. ( 1997 Guimarães, E. A. et al. Índices de preço e quantum das exportações brasileiras. Texto para Discussão, Funcex, n. 121, 1997. Disponível em: https://www.funcex.org.br/publicacoes/tds/TDFUNCEX121.pdf .
    https://www.funcex.org.br/publicacoes/td...
    ).
  • 7
    Na verdade, foi feito um pequeno ajuste na participação das exportações mundiais. Como existe um problema de diferença da quantidade de registro nas duas séries, alguns produtos HS6 das exportações mundiais eram zero, mas para o Brasil não. Forçar um índice nulo para qualquer participação não nula puxaria inadequadamente o índice médio ponderado para baixo. Portanto, essa parcela fruto da diferença da quantidade de registro foi redistribuída para que a parcela original com dados registrados totalizasse 100%. Para os casos em que havia registro internacional, mas não brasileiro, foi atribuído peso nulo ao produto HS6, por ele não fazer parte da cesta brasileira.
  • 8
    Das atividades classificadas como preço internacional, foi a de “Fabricação e refino de açúcar” que apresentou a participação mais baixa, com 64,4% do VBP constituído de produtos com preço internacional.
  • 9
    Ou sequer existe algum produto no mercado internacional que possa ser considerado análogo ao do mercado doméstico, como acontece para alguns serviços.
  • 10
    Em função de a análise ter se concentrado no comportamento do preço das exportações brasileiras vis-à-vis às exportações mundiais, é possível que o esforço tenha sido mais bem-sucedido em definir os bens exportáveis do que os bens com preço internacional.
  • 11
    A chamada PEC do Teto limitou o crescimento das despesas à inflação observado do ano anterior, mantendo, portanto, a despesa real do Governo Federal estável no patamar de 2016. A regra nasceu com prazo de dez anos, podendo ser prorrogada por mais dez.
  • 12
    Para uma discussão sobre o impacto da reforma trabalhista sobre o mercado de trabalho, ver Serra, Bottega e Sanches ( 2022 Serra, G. P.; Bottega, A.; Sanches, M. S. NPE 21: A reforma trabalhista de 2017 teve efeito sobre a taxa de desemprego no Brasil? Uma análise dos primeiros anos de vigência da Lei nº 13.467/2017. Nota de Política Econômica, Made - FEA/USP, nº 21, 17 maio 2022. Disponível em: https://madeusp.com.br/publicacoes/artigos/a-reforma-trabalhista-de-2017-efeito-taxa-desemprego-brasil/ . Acesso em: 4 mar. 2024.
    https://madeusp.com.br/publicacoes/artig...
    AJUSTAR2021).
  • 13
    Como as Contas Nacionais trabalham com índice de preço média anual, conforme explicado acima, a taxa de câmbio utilizada foi a taxa média anual.
  • 14
    Os dados foram calculados somente após a agregação das atividades nos dois subgrupos. Os bens com preço internacional respondiam a 27,3% e 25,5% do VBP nos anos base 2010 e 2014, respectivamente. Os bens com preços domésticos, por sua vez, respondiam a 72,7% e 74,5% do VBP em 2010 e 2014, respectivamente.
  • 15
    Diferentemente dos índices de preços tradicionais, calculados primeiro mensalmente e depois anualmente, nas contas nacionais vigora o conceito de preço médio (anual). Em vista disso, como não há estimativa dentro da base 2010 para o ano de 2009, não é possível comparar o preço médio de 2009 com o preço médio de 2010 e calcular a taxa de inflação para 2010, o que pode ser feito apenas a partir de 2011. Podemos ainda registrar outras diferenças metodológicas em relação ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), também produzido pelo IBGE, como classificação distinta no processo de agregação e o fato de aqui estarmos analisando a variação de preço do VBP a preço básico enquanto o IPCA busca analisar a cesta de consumo das famílias a preço de consumidor, o que seria mais próximo ao vetor de consumo das Contas Nacionais. O IPCA médio para os anos 2011-2014 foi de 6,2% ao ano, e no quinquênio 2015-2019 de 5,6% ao ano.
  • 16
    Excedente operacional bruto (EOB) dividido pelo valor bruto da produção (VBP).
  • 17
    Em 2010, ano base para o primeiro subperíodo, os setores com preço internacional respondiam por 17% do emprego, e os setores com preço doméstico por 83%.
  • 18
    Analisando a série anual, vale frisar que esse período foi marcado por crescimento anual cada vez menor do salário nominal e real, culminando em uma taxa negativa de variação para o salário real em 2014.
  • 19
    Vale registrar que a aparente contradição das margens de lucro e do CUT terem caído foi consequência, primeiramente, do aumento da participação do consumo intermediário no VBP, e essa mudança, por sua vez, é, ao menos parcialmente, explicada pelo aumento de participação do consumo intermediário importado. Adicionalmente, há crescimento dos demais impostos livres de subsídios.
  • 20
    Ver Gomes e Freitas ( 2021bGomes, L. S.; Freitas, F. A evolução das margens de lucro dos setores com preço internacional: um exercício de decomposição estrutural. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA INDUSTRIAL E INOVAÇÃO, 5., 2021b. Anais […]. Belo Horizonte: ABEIN, 2021. ) para entender a evolução das margens de lucro nos setores com preço internacional.
  • 21
    Esse resultado associado à comparação temporal é compatível com o observado em Gomes e Freitas ( 2021bGomes, L. S.; Freitas, F. A evolução das margens de lucro dos setores com preço internacional: um exercício de decomposição estrutural. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA INDUSTRIAL E INOVAÇÃO, 5., 2021b. Anais […]. Belo Horizonte: ABEIN, 2021. ).
  • 22
    Em 2014, ano base para o segundo subperíodo, os setores com preço internacional respondiam por 15,6% do emprego, e os setores com preço doméstico por 84,4%.
  • CLASSIFICAÇÃO JEL: E31.
  • JEL CODES: E31.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    21 Fev 2022
  • Aceito
    17 Nov 2023
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