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INCOMPATIBILIDADE ESCOLARIDADE-OCUPAÇÃO NO BRASIL: INCIDÊNCIA DE SOBRE-EDUCAÇÃO DE MÃO DE OBRA OU ESCASSEZ DE EMPREGOS QUALIFICADOS?

EDUCATION-JOB MISMATCH IN BRAZIL: INCIDENCE OF OVER-EDUCATION OF LABOR OR SCARCITY OF QUALIFIED JOBS

RESUMO

O mercado de trabalho brasileiro passou por mudanças significativas nas últimas décadas, dentre as quais o aumento de trabalhadores com educação superior. Entretanto, existe um desequilíbrio causado pela sobre-educação, ocasionando ineficiência, queda de produtividade, baixos salários e insatisfação com empregos não compatíveis. O objetivo deste artigo é explicar se, no Brasil, a sobre-educação é provocada por fatores de oferta de mão de obra ou demanda de emprego. Usando como base um painel de microdados oriundo da Relação Anual de Informações Sociais no período 2010 a 2019, foram analisadas variáveis micro e macroeconômicas e estimado o modelo de efeito aleatório e erros padrão robusto de Newey-West, agrupados para as 27 unidades federativas. Os resultados encontrados apontam que a sobre-educação é causada tanto pelo aumento de trabalhadores com ensino superior, quanto pelo baixo crescimento da demanda por empregos qualificados. Conclui-se que o Brasil deve adotar políticas visando melhorar a qualificação dos trabalhadores e melhorar a qualidade de ensino, criando condições econômicas para que o crescimento da demanda por empregos qualificados esteja diretamente correlacionado à oferta de trabalhadores qualificados e, assim, o mercado alcance um melhor resultado na alocação dos trabalhadores.

PALAVRAS-CHAVE
Mercado de trabalho; Sobre-educação; RAIS; Efeito aleatório

ABSTRACT

The Brazilian labor market has significantly changed in recent decades, including an increase in workers with higher education. However, it shows an imbalance caused by overeducation, leading to inefficiency, decreased productivity, low wages, and dissatisfaction with mismatched jobs. This study aims to explain whether overeducation in Brazil is driven by labor supply or job demand factors. Using a microdata panel from the Annual List of Social Information (RAIS) for the period from 2010 to 2019, micro and macroeconomic variables were analyzed, and a random effects model with Newey-West robust standard errors was estimated, aggregated for the 27 Federative Units. Results indicate that overeducation stems from both the increase in workers with higher education and the slow growth in demand for qualified jobs. It is concluded that Brazil should adopt policies to improve worker qualifications and enhance the quality of education, creating economic conditions for the growth in demand for qualified jobs to be directly correlated with the supply of qualified workers, thus better allocating workers in the labor market.

KEYWORDS
Labor market; Over-education; RAIS; Random effect

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, o Brasil vem passando por mudanças significativas em seu perfil educacional, principalmente no aumento do acesso à educação superior. Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep, 2019 Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo da educação superior 2019: Divulgação dos resultados. Brasília, DF: INEP, 2019. Disponível em: https://download.inep.gov.br/educacao_superior/censo_superior/documentos/2020/Apresentacao_Censo_da_Educacao_Superior_2019.pdf . Acesso: 20 jan. 2023.
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) apontaram que o número de matrículas de cursos de graduação e sequencial no ensino superior passou de 5.985.873 em 2009 para 8.604.526 em 2019 — um aumento de cerca de 43,7% ao longo de 10 anos. As instituições privadas detêm cerca de 75,8% do total de matriculas realizadas em 2019, restando às instituições públicas cerca de 24,2%.

Em 2019, o Inep ( 2019 Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo da educação superior 2019: Divulgação dos resultados. Brasília, DF: INEP, 2019. Disponível em: https://download.inep.gov.br/educacao_superior/censo_superior/documentos/2020/Apresentacao_Censo_da_Educacao_Superior_2019.pdf . Acesso: 20 jan. 2023.
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) informou que mais de um milhão e duzentos mil estudantes concluíram cursos de graduação no Brasil, sendo um crescimento de 37% na rede privada de ensino e de 21,5% na rede pública, em comparação com dados de 2009. Em relação à evolução de acesso ao ensino superior, por meio do número de matrículas, o grau acadêmico bacharelado foi o que mais evoluiu no período analisado, passando de 3.867.551 matrículas em 2009, para 5.662.939 em 2019, um aumento de cerca de 46,4%. Enquanto isso, segundo dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS, 2019), a evolução de empregos qualificados (aqueles ocupados por trabalhadores com nível de escolaridade superior) no mercado formal saltou de 4.271.175 (2010) para 5.216.156 (2019), um aumento de 22% em 10 anos.

Sloane e Mavromaras ( 2014 Sloane, P.; Mavromaras, K. Overeducation, skill mismatches, and labor market outcomes for college graduates. IZA World of Labor, n. 88, 2014. Disponível em: https://wol.iza.org/articles/overeducation-skill-mismatches-and-labor-market-outcomes-for-college-graduates/long . Acesso: 20 jan. 2023.
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) argumentam que a convergência de acesso à educação superior requer investimentos de recursos privados e governamentais para alcançar esse maior nível educacional. Mas nem sempre esses recursos investidos direcionam as pessoas para empregos compatíveis, ou seja, empregos para os quais os indivíduos estudaram para de fato exercerem no mercado de trabalho. Surge, então, uma situação em que os trabalhadores têm empregos que não têm salários compatíveis com suas qualificações, gerando um custo social na medida em que a produtividade do trabalhador pode ser reduzida.

O Brasil apresenta uma oferta crescente de mão de obra com educação superior, que não tem sido acompanhada pelo aumento da demanda por empregos qualificados. Um dos argumentos do descompasso entre oferta qualificada e as oportunidades de emprego pode estar no baixo nível da qualificação recebida pelos trabalhadores com níveis superiores de escolaridade. Mehta et al. ( 2011 Mehta, A.; Felipe, J.; Quising, P.; Camingue, S. Overeducation in developing economies: How can we test for it, and what does it mean? Economics of Education Review, v. 30, n. 6, p. 1334-1347. Disponível em: https://ideas.repec.org/a/eee/ecoedu/v30y2011i6p1334-1347.html . Acesso: 20 jan. 2023.
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) chamam atenção para o fato de que a baixa qualidade da educação pode levar trabalhadores à sobre-educação, visto que estariam sujeitos a não exercer ocupações compatíveis com o grau de escolaridade que teoricamente possuem, sendo destinados a ocupações que exigem um grau inferior de escolaridade.

Essa incompatibilização educação-emprego ocorre quando se tem trabalhadores com nível de escolaridade acima (sobre-educado) ou abaixo (subeducado) do nível de escolaridade mínimo exigido para ocupar uma determinada função. Tal comportamento acontece na medida em que a demanda de mão de obra não acompanha a oferta de trabalhadores, ocasionando um desequilíbrio no mercado de trabalho (Croce; Ghignoni, 2012 Croce, G.; Ghignoni, E. Demand and supply of skilled labour and overeducation in Europe: A country-level analysis. Comparative Economic Studies, v. 54, n. 2, p. 413-439, 2012. Disponível em: https://ideas.repec.org/a/pal/compes/v54y2012i2p413-439.html . Acesso: 20 jan. 2023.
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; McGuinness, 2006 McGuinness, S. Overeducation in the labour market. Journal of Economic Surveys, v. 20, n. 3, p. 387-418, 2006. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1111/j.0950-0804.2006.00284.x . Acesso: 20 jan. 2023.
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; Quintini, 2011 Quintini, G. Over-qualified or under-skilled: A review of existing literature. OECD Social, Employment and Migration Working Paper, n. 121, 2011. Disponível em: https://www.oecd-ilibrary.org/social-issues-migration-health/over-qualified-or-under-skilled_5kg58j9d7b6d-en . Acesso: 20 jan. 2023.
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). Sendo assim, é possível constatar que a ocorrência desse fenômeno pode gerar ineficiência no mercado de trabalho e, consequentemente, na economia como um todo. Essa distorção causa gastos excessivos de investimentos em educação que não necessariamente promovem alocações ótimas nos empregos e ganhos de renda esperados pelos trabalhadores (Annegues; Souza, 2020 Annegues, A. C.; Souza, W. P. S. F. Retorno salarial do overeducation: viés de seleção ou penalização ao excesso de escolaridade? Revista Brasileira de Economia, v. 74, n. 2, 2020. Disponível em: https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/77646 . Acesso: 20 jan. 2023.
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).

Para Marioni ( 2021 Marioni, L. D. Overeducation in the labour market: evidence from Brazil. Education Economics, v. 29, n. 1, p. 53-72, 2021. Disponível em: https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/09645292.2020.1832201 . Acesso: 20 jan. 2023.
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), a qualidade das instituições de ensino superior no Brasil caiu nos últimos anos, em parte devido à crescente quantidade do acesso à educação superior privada, que no Brasil apresenta, em média, menor qualidade em relação às instituições públicas de ensino superior. Ou seja, ter acesso a instituições com baixa qualidade pode acarretar maiores chances de o trabalhador não conseguir ser alocado em empregos compatíveis.

A situação de trabalhadores sobre-educados fica mais evidente em períodos de crise ou recessão econômica, fenômeno característico da economia brasileira durante toda a segunda metade da década de 2010. Huckfeldt ( 2022 Huckfeldt, C. Understanding the scarring effect of recessions. American Economic Review, v. 112, n. 4, p. 1273-1310, 2022. Disponível em: https://www.aeaweb.org/articles?id=10.1257/aer.20160449 . Acesso: 20 jan. 2023.
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) diz que durante os períodos de instabilidade da economia, os empregadores tornam-se mais cautelosos ou seletivos ao procurarem trabalhadores com qualificação. Modestino, Shoag e Ballance ( 2019 Modestino, A. S.; Shoag, D.; Ballance, J. Upskilling: do employers demand greater skill when workers are plentiful? The Review of Economics and Statistics, v. 102, n. 4, p. 793–805, 2019. DOI: https://doi.org/10.1162/rest_a_00835 .
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) também confirmam maiores exigências nas contratações de empregos qualificados, sobretudo no que se refere à economia americana, no período de recessão causado pela crise econômica entre os anos de 2008 e 2009.

Diante disso, surgem os seguintes questionamentos: quais fatores são responsáveis para explicar a incompatibilidade entre nível educacional e empregos? As causas da incompatibilidade são oriundas da maior oferta de trabalhadores ou menor demanda por empregos qualificados no mercado de trabalho?

A justificativa deste estudo está na importância de compreender a dinâmica de incompatibilidade entre os agentes do mercado de trabalho (ofertantes e demandantes), contribuindo para a melhor tomada de decisão dos investimentos públicos/privados em educação, no estímulo de ganhos de satisfação e produtividade dos trabalhadores no mercado de trabalho. Com base nos microdados da RAIS, de 2010 a 2019, procura-se analisar se as causas da incompatibilidade geradas pela sobre-educação são ocasionadas pela maior oferta de mão de obra qualificada ou de menor demanda por empregos qualificados nos estados brasileiros. Para o estudo, a amostra será restrita aos trabalhadores com nível de ensino superior, dado o maior investimento aplicado, seja público ou privado, nessa modalidade de ensino, que não necessariamente promove ao trabalhador o emprego adequado com a qualificação adquirida, portanto uma forma de estudar a ineficiência nos custos gerados pela incompatibilidade ocupacional.

O diferencial do estudo é avaliar as causas da sobre-educação a nível de estados da Federação e por desagregação de ocupações da Classificação Brasileira de Ocupações – CBO disponibilizada pelo MTE (2010), que pode de certa forma diminuir possível viés ao avaliar grupos de ocupações. Outro diferencial é que se concentram em amostras de trabalhadores com ensino superior, os quais podem ser os mais afetados, devido ao tamanho do investimento para conseguir a qualificação e não necessariamente estarem corretamente alocados no mercado de trabalho.

Além da introdução, o trabalho contém mais três seções. A seção 1 descreve a revisão de literatura. A seção 2 descreve a metodologia e a base de dados. A seção 3 refere-se à apresentação e discussão dos resultados. Por fim, reporta-se às considerações finais.

1. REVISÃO DE LITERATURA

É possível definir a incompatibilidade entre educação e emprego quando se tem trabalhadores com nível de escolaridade acima (sobre-educado) ou abaixo (subeducado) do nível de escolaridade mínimo exigido para ocupar uma determinada função. Esse comportamento acontece na medida em que a demanda de mão de obra não acompanha a oferta de trabalhadores, ocasionando assim um desequilíbrio no mercado de trabalho (Annegues; Souza, 2020 Annegues, A. C.; Souza, W. P. S. F. Retorno salarial do overeducation: viés de seleção ou penalização ao excesso de escolaridade? Revista Brasileira de Economia, v. 74, n. 2, 2020. Disponível em: https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/77646 . Acesso: 20 jan. 2023.
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; Croce; Ghignoni, 2012 Croce, G.; Ghignoni, E. Demand and supply of skilled labour and overeducation in Europe: A country-level analysis. Comparative Economic Studies, v. 54, n. 2, p. 413-439, 2012. Disponível em: https://ideas.repec.org/a/pal/compes/v54y2012i2p413-439.html . Acesso: 20 jan. 2023.
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; McGuinness; Bergin; Whelan, 2018 McGuinness, S.; Bergin, A.; Whelan, A. Overeducation in Europe: trends, convergence, and drivers. Oxford Economic Papers, v. 70, n. 4, p. 994-1015, 2018. Disponível em: https://academic.oup.com/oep/article-abstract/70/4/994/5036780 . Acesso: 20 jan. 2023.
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; Quintini, 2011 Quintini, G. Over-qualified or under-skilled: A review of existing literature. OECD Social, Employment and Migration Working Paper, n. 121, 2011. Disponível em: https://www.oecd-ilibrary.org/social-issues-migration-health/over-qualified-or-under-skilled_5kg58j9d7b6d-en . Acesso: 20 jan. 2023.
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; Reis, 2012 Reis, S. M. Incompatibilidades entre educação e ocupação: Uma análise regionalizada do mercado de trabalho brasileiro. 2012. Tese (Doutorado em Economia) – Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional, Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2012. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/AMSA-8UYPZ3/1/tese_sandra_reis_vers_o_final_21mai2012.pdf . Acesso em: 20 jan. 2023.
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).

Para autores como Quintini ( 2011 Quintini, G. Over-qualified or under-skilled: A review of existing literature. OECD Social, Employment and Migration Working Paper, n. 121, 2011. Disponível em: https://www.oecd-ilibrary.org/social-issues-migration-health/over-qualified-or-under-skilled_5kg58j9d7b6d-en . Acesso: 20 jan. 2023.
https://www.oecd-ilibrary.org/social-iss...
) e Croce e Ghignoni ( 2012 Croce, G.; Ghignoni, E. Demand and supply of skilled labour and overeducation in Europe: A country-level analysis. Comparative Economic Studies, v. 54, n. 2, p. 413-439, 2012. Disponível em: https://ideas.repec.org/a/pal/compes/v54y2012i2p413-439.html . Acesso: 20 jan. 2023.
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), a situação de desequilíbrio entre oferta e demanda de empregos está relacionada a fatores de estrutura econômica, como rigidez salarial, fricções no mercado de trabalho e atrasos nas relações empresariais. Para Sloane e Mavromaras ( 2014 Sloane, P.; Mavromaras, K. Overeducation, skill mismatches, and labor market outcomes for college graduates. IZA World of Labor, n. 88, 2014. Disponível em: https://wol.iza.org/articles/overeducation-skill-mismatches-and-labor-market-outcomes-for-college-graduates/long . Acesso: 20 jan. 2023.
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), a incompatibilidade educação-emprego pode acarretar aos trabalhadores sobre-educados uma perda de bem-estar por meio da frustração decorrente de salários mais baixos e aumento de rotatividade no mercado de trabalho, o que nos leva a considerar que o Governo foi ineficiente nos seus gastos com educação e na condução de um mismatch de equilíbrio no mercado de trabalho.

Sendo assim, é necessário que a oferta de trabalhadores esteja apta a fornecer os serviços que a demanda por empregos exige. Para explicar o porquê da ocorrência de desequilíbrios no mercado de trabalho, serão apresentadas, resumidamente, algumas teorias discutidas na literatura, tais como: Teoria do capital humano, Teoria do pareamento, Teoria da mobilidade de carreira, Teoria da concorrência, Teoria da sinalização e Teoria da designação. Essas teorias serão brevemente explicadas a seguir:

Teoria do capital humano: Schultz ( 1961 Schultz, T. W. Investment in human capital. The American Economic Review, v. 51, n. 1, p. 1-17, 1961. Disponível em: https://www.ssc.wisc.edu/\~walker/wp/wp-content/uploads/2012/04/schultz61.pdf . Acesso: 20 jan. 2023.
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) e Becker ( 1975 Becker, G. S. Human capital: A theoretical and empirical analysis, with special reference to education. 2. ed. New York: National Bureau of Economic Research, 1975. Disponível em: https://www.nber.org/system/files/chapters/c3730/c3730.pdf . Acesso: 20 jan. 2023.
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) relatam que as atribuições dos trabalhadores têm relação positiva com o ganho de salários, por consequência do estoque de produtividade, experiência, anos de estudo e treinamentos em geral. A teoria do capital humano se concentra ao lado da oferta, possibilitando maior acesso ao mercado, dado a oferta de habilidades que tornem as firmas um ambiente mais competitivo e eficiente. Sendo assim, espera-se que os trabalhadores mais produtivos obtenham vagas em melhores empregos, enquanto os menos produtivos serão destinados aos empregos inferiores.

McGuiness ( 2006 McGuinness, S. Overeducation in the labour market. Journal of Economic Surveys, v. 20, n. 3, p. 387-418, 2006. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1111/j.0950-0804.2006.00284.x . Acesso: 20 jan. 2023.
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) argumenta que as incompatibilidades geradas no mercado de trabalho devido ao aumento de trabalhadores sobrequalificados podem gerar uma subutilização do trabalho e menores salários. Todavia, a teoria do capital humano afirma que esse desequilíbrio é um fenômeno de curto prazo, que com o passar do tempo o mercado se encarrega de ajustar oferta e demanda de empregos, dado que a teoria sugere que as empresas tendem a aproveitar o conjunto de habilidades do trabalhador por meio da força de trabalho observada. Esse possível desequilíbrio é causado, segundo a teoria do capital humano, pela rigidez e/ou restrição ao mercado de trabalho.

Teoria do pareamento: Essa teoria, assim como a teoria do capital humano, também afirma que os desequilíbrios educação-emprego são temporários, já que o desencontro entre oferta e demanda é devido a informações assimétricas e custos de informação. Reis ( 2012 Reis, S. M. Incompatibilidades entre educação e ocupação: Uma análise regionalizada do mercado de trabalho brasileiro. 2012. Tese (Doutorado em Economia) – Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional, Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2012. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/AMSA-8UYPZ3/1/tese_sandra_reis_vers_o_final_21mai2012.pdf . Acesso em: 20 jan. 2023.
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) relata que a ideia principal da teoria do pareamento é que o trabalhador aceita trabalhar num emprego inferior à sua qualificação a fim de revelar sua produtividade e, com o acúmulo de experiência, poder diminuir a sobre-educação existente com o passar do tempo. Esta teoria possibilita ao trabalhador seguir características de trabalhadores com mobilidade de carreira.

Teoria de mobilidade de carreira: Parte da ideia de que o nível educacional do trabalhador cria maiores chances de o trabalhador ter ascensão no emprego, a nível de promoção e, consequentemente, melhores salários. Essa teoria pressupõe que os trabalhadores podem aceitar um emprego que exige qualificação inferior no curto prazo, para assim poderem ter experiência e mostrar sua produtividade e com o objetivo de melhorar o status, e com o tempo a incompatibilidade via sobre-educação vai diminuindo.

Essa teoria recebe críticas por parte de alguns autores no que diz respeito ao comportamento dos trabalhadores em direção aos empregos compatíveis, pois esse fenômeno não necessariamente ocorre num período curto, fazendo com que a incompatibilidade se mantenha presente por mais tempo (Büchel; Mertens, 2004 Büchel, F.; Mertens, A. Overeducation, undereducation, and the theory of caree mobility. Applied Economics, v. 36, n. 8, p. 803-816, 2004. DOI: https://doi.org/10.1080/0003684042000229532 .
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). A não ocorrência da promoção para um status ou salário melhor no curto prazo poderá gerar a falta de motivação ao trabalhador sobre-educado, acarretando abandono do emprego (Sicherman, 1991 Sicherman, N. “Overeducation” in the labor market. Journal of labor Economics, v. 9, n. 2, p. 101-122, 1991. Disponível em: https://www.journals.uchicago.edu/doi/10.1086/298261 . Acesso: 20 jan. 2023.
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).

Teoria da concorrência: Para Reis ( 2012 Reis, S. M. Incompatibilidades entre educação e ocupação: Uma análise regionalizada do mercado de trabalho brasileiro. 2012. Tese (Doutorado em Economia) – Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional, Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2012. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/AMSA-8UYPZ3/1/tese_sandra_reis_vers_o_final_21mai2012.pdf . Acesso em: 20 jan. 2023.
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), a classificação dos trabalhadores é feita com base nos custos de treinamentos que as firmas podem ter. Sendo assim, os trabalhadores que têm um nível de escolaridade maior terão custos de treinamento menores em relação aos trabalhadores com níveis de escolaridade inferiores. Nessa teoria, a demanda de empregos é quem determina a remuneração dos trabalhadores, sendo assim os retornos não compatíveis com a demanda de mercado serão iguais a zero (McGuinness, 2006 McGuinness, S. Overeducation in the labour market. Journal of Economic Surveys, v. 20, n. 3, p. 387-418, 2006. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1111/j.0950-0804.2006.00284.x . Acesso: 20 jan. 2023.
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).

Em relação à incompatibilidade gerada entre educação e emprego, tem-se como consequência dos custos de treinamento um aumento de sobre-educação à medida que os trabalhadores buscam maiores escolaridade para estarem melhor classificados segundo a demanda de empregos que o mercado de trabalho define. Em relação a esse comportamento, Thurow ( 1975Thurow, L. C. Generating Inequality: mechanisms of distribution in the U.S. economy. New York: Basic Books, 1975. 258 p. ) explica que os trabalhadores buscam formas de proteger ou melhorar o seu lugar nas classificações que o mercado impõe. Dado que se tem uma crescente competição entre os indivíduos por melhores postos de trabalho, é necessário investimento em educação. Com isso, à medida que se tem mais indivíduos aumentando suas qualificações, tem-se um aumento de sobre-educados em circulação na economia.

Teoria da sinalização: A teoria da sinalização afirma que, em decorrência das informações que os empregadores não têm em relação à produtividade do trabalhador, o nível educacional passa a ser um mecanismo que ajuda a diminuir a assimetria de informação em relação ao funcionário (Spence, 1973 Spence, A. M. Job market signaling. Quarterly Journal of Economics, v. 87, n. 3, p. 355-374, 1973. Disponível em: https://viterbi-web.usc.edu/~shaddin/cs590fa13/papers/jobmarketsignaling.pdf . Acesso: 20 jan. 2023.
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). Sobre a incompatibilidade educação-emprego, esta seria causada pela assimetria de informação sobre a qualidade da produtividade do trabalhador, que pode ser diminuída com o tempo, com a observação dos empregadores em relação aos empregados. Um problema que se tem identificado nessa teoria é que os trabalhadores podem se sentir desmotivados a aceitarem empregos abaixo do seu nível educacional por se tratar de uma sinalização negativa.

Teoria da designação: Reis ( 2012 Reis, S. M. Incompatibilidades entre educação e ocupação: Uma análise regionalizada do mercado de trabalho brasileiro. 2012. Tese (Doutorado em Economia) – Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional, Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2012. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/AMSA-8UYPZ3/1/tese_sandra_reis_vers_o_final_21mai2012.pdf . Acesso em: 20 jan. 2023.
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) argumenta que a produtividade dos trabalhadores tem relação positiva com as condições de escolaridade, mesmo que se tenha trabalhadores com mesmo nível de escolaridade com desempenhos diferentes para diferentes ocupações. De acordo com McGuinness ( 2006 McGuinness, S. Overeducation in the labour market. Journal of Economic Surveys, v. 20, n. 3, p. 387-418, 2006. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1111/j.0950-0804.2006.00284.x . Acesso: 20 jan. 2023.
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), os rendimentos são determinados tanto por atribuições dos trabalhadores quanto por características das ocupações, assim o fenômeno de sobre-educação seria uma consequência de má alocação, quando, por exemplo, trabalhadores sobre-educados podem ser contratados para ocupar cargos de complexidade inferior ao que a sua escolaridade é capaz de exercer. Sobre a má alocação, tem-se que trabalhadores subeducados ocasionam uma limitação de funções dada a complexidade da ocupação, enquanto a sobre-educação ocasiona restrições sobre o máximo de produtividade na ocupação, dada as funções mais simples (Reis, 2012 Reis, S. M. Incompatibilidades entre educação e ocupação: Uma análise regionalizada do mercado de trabalho brasileiro. 2012. Tese (Doutorado em Economia) – Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional, Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2012. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/AMSA-8UYPZ3/1/tese_sandra_reis_vers_o_final_21mai2012.pdf . Acesso em: 20 jan. 2023.
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).

2.1. Referencial empírico

No que se refere à sobre-educação, existem diversos trabalhos que tentam explicar o retorno salarial e a duração dessa incompatibilidade. Alguns trabalhos sobre o retorno salarial da sobre-educação (overeducation) podem ser vistos em Annegues e Souza ( 2020 Annegues, A. C.; Souza, W. P. S. F. Retorno salarial do overeducation: viés de seleção ou penalização ao excesso de escolaridade? Revista Brasileira de Economia, v. 74, n. 2, 2020. Disponível em: https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/77646 . Acesso: 20 jan. 2023.
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), Cavalcanti ( 2020Cavalcanti, G. S. Ensaios em economia da educação. 2020. Dissertação (Mestrado em Economia) – Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2020. ), Marioni ( 2021 Marioni, L. D. Overeducation in the labour market: evidence from Brazil. Education Economics, v. 29, n. 1, p. 53-72, 2021. Disponível em: https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/09645292.2020.1832201 . Acesso: 20 jan. 2023.
https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1...
) e Nieto ( 2017Nieto, S. Overeducation, skills and wage penalty: Evidence for Spain using PIAAC data. Social Indicators Research, v. 134, n. 1, p. 219-236, 2017. ). Já referente à explicação dos motivos da sobre-educação, podem-se destacar os de Annegues et al. ( 2018 Annegues, A. C.; Oliveira, C.; Figueiredo, E.; Porto Júnior, S. Overeducation e área de formação: evidências para os Egressos da UFPB. In: ENCONTRO REGIONAL DE ECONOMIA, 23., 2018. Anais […]. Fortaleza: Anpec, 2018. Disponível em: http://www.anpec.org.br/novosite/br/xxiii-encontro-regional-de-economia\--atigos-selecionados . Acesso: 20 jan. 2023.
http://www.anpec.org.br/novosite/br/xxii...
), Kupets( 2016 Kupets, O. Education-job mismatch in Ukraine: Too many people with tertiary education or too many jobs for low-skilled? Journal of Comparative Economics, v. 44, n. 1, p. 125-147, 2016. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0147596715000876 . Acesso: 20 jan. 2023.
https://www.sciencedirect.com/science/ar...
), Mariano e Araújo ( 2019Oliveira, C.; Mariano, F. Z.; Araújo, J. A. A qualidade e expansão do ensino superior contribui para o overeducation? Evidências para o Ceará. In: ENCONTRO REGIONAL DE ECONOMIA, 24., 2019. Anais […]. Fortaleza: Anpec, 2019. ), Morano ( 2014Morano, C. P. The determinants of overeducation: Evidence from the Italian labour market. Investigaciones de Economía de la Educación, v. 9, p. 681-698, 2014. ), Oliveira, Reis ( 2020 Reis, M. C. Os ensinos público e privado no Brasil e a incidência de sobre-educação no mercado de trabalho. Economia Aplicada, v. 24, n. 3, p. 367-392, 2020. Disponível em: https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/9959/1/td_2558.pdf . Acesso: 05 mar. 2024.
https://repositorio.ipea.gov.br/bitstrea...
) e Santos et al . ( 2020 Santos, M. M. D.; Mariano F. Z.; Arraes R. A.; Oliveira C.S. Recorrência de sobreeducação em trabalhadores brasileiros de primeiro emprego. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA – ANPEC, 48., 2020. Anais […]. Niterói: Anpec, 2020. Disponível em: https://www.anpec.org.br/encontro/2020/submissao/files_I/i13-d70b5b194ba65273c669360df7a687d5.pdf . Acesso em: 20 jan. 2023.
https://www.anpec.org.br/encontro/2020/s...
).

Morano ( 2014Morano, C. P. The determinants of overeducation: Evidence from the Italian labour market. Investigaciones de Economía de la Educación, v. 9, p. 681-698, 2014. ) avaliou possíveis determinantes do overeducation no mercado de trabalho italiano para trabalhadores com grau acadêmico de mestrado utilizando dados do National Labour Force Survey para o período de 2006 a 2011 e o modelo Probit. Os principais resultados indicaram que: (i) os trabalhadores mais jovens, casais e trabalhadores estrangeiros têm maiores chances de serem overeducation; (ii) trabalhadores de grandes empresas, assim como os que têm título de mestrado em formações mais científicas ou específicas como engenharia e medicina, têm menores chances de serem alocados em empregos inferiores às suas respectivas formações acadêmicas.

Kupets ( 2016 Kupets, O. Education-job mismatch in Ukraine: Too many people with tertiary education or too many jobs for low-skilled? Journal of Comparative Economics, v. 44, n. 1, p. 125-147, 2016. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0147596715000876 . Acesso: 20 jan. 2023.
https://www.sciencedirect.com/science/ar...
) examinou o descompasso educacional no mercado de trabalho da Ucrânia, para o período de 2003 a 2012, usando dados em painel coletados no Labor Force Survey (LFS). Como objetivos, a autora propôs verificar os determinantes da sobre-educação e subeducação no mercado de trabalho ucraniano utilizando dois modelos: o modelo de efeitos fixos com dummies anuais e erro padrão robusto de Cluster, e o modelo de Hausman-Taylor para verificar possíveis causas de incompatibilidade entre oferta de mão de obra qualificada e demanda por empregos qualificados. Os resultados principais foram: (i) os trabalhadores considerados mais velhos sofrem mais as consequências da incompatibilidade se comparados a trabalhadores mais jovens; (ii) em relação à mudança de estrutura nos setores de empregos, foi observada uma polarização de empregos, muito provavelmente pelas mudanças decorrentes de desindustrialização, aumento do setor de serviços e de empregos que são considerados menos intensivos em conhecimento.

Annegues et al . ( 2018 Annegues, A. C.; Oliveira, C.; Figueiredo, E.; Porto Júnior, S. Overeducation e área de formação: evidências para os Egressos da UFPB. In: ENCONTRO REGIONAL DE ECONOMIA, 23., 2018. Anais […]. Fortaleza: Anpec, 2018. Disponível em: http://www.anpec.org.br/novosite/br/xxiii-encontro-regional-de-economia\--atigos-selecionados . Acesso: 20 jan. 2023.
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) buscaram mensurar, no período de 2003 a 2013, como diferentes campos de estudo podem ter impacto na probabilidade dos indivíduos se tornarem overeducation, assim como avaliar como essa situação de incompatibilidade pode durar após o término da formação no curso. Usando dados da Superintendência de Tecnologia da Informação (STI), da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e da RAIS, adotou-se a metodologia job analysis para analisar a incompatibilidade educação-emprego. Para avaliar chances do indivíduo ser overeducation partiu-se do modelo logit, e para analisar a duração da incompatibilidade ocupacional usou-se o modelo de sobrevivência. Os principais resultados de Annegues ( 2018 Annegues, A. C.; Oliveira, C.; Figueiredo, E.; Porto Júnior, S. Overeducation e área de formação: evidências para os Egressos da UFPB. In: ENCONTRO REGIONAL DE ECONOMIA, 23., 2018. Anais […]. Fortaleza: Anpec, 2018. Disponível em: http://www.anpec.org.br/novosite/br/xxiii-encontro-regional-de-economia\--atigos-selecionados . Acesso: 20 jan. 2023.
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) foram: (i) indivíduos das áreas de humanas, artes, ciências sociais aplicadas têm maiores chances de se tornarem overeducation, pois têm um mercado mais restrito, levando os mesmos a aceitarem empregos não compatíveis com a formação adquirida. Enquanto áreas como direito e saúde são as que menos têm chances de permanecer nessa situação; (ii) trabalhadores com coeficiente de rendimento acadêmico menor, trabalhadores mais jovens e mulheres tendem também a sofrer mais com o overeducation ; (iii) em relação às mulheres, a dupla jornada imposta a estas, devido a responsabilidades profissionais e atividades do lar e com filhos, faz com que aceitem empregos que exijam menos que sua formação para poderem dar conta da dupla jornada; sobre a duração do overeducation .

Oliveira, Mariano e Araújo ( 2019Oliveira, C.; Mariano, F. Z.; Araújo, J. A. A qualidade e expansão do ensino superior contribui para o overeducation? Evidências para o Ceará. In: ENCONTRO REGIONAL DE ECONOMIA, 24., 2019. Anais […]. Fortaleza: Anpec, 2019. ) analisaram potenciais determinantes do overeducation no mercado de trabalho do Ceará em 2015. Foi usado o modelo Logit e a base de dados da RAIS. Os principais resultados indicaram que: (i) existe uma relação positiva entre a expansão do ensino superior e a probabilidade de ser overeducation , visto que muitas novas vagas ofertadas no ensino superior se encontram no interior do Estado, onde existe baixo nível de desenvolvimento econômico comparado à capital, ocasionando que trabalhadores com ensino superior aceitem empregos inferiores às suas respectivas formações; (ii) o tipo de formação está relacionado às chances de ser incompatível no mercado de trabalho, como ensino básico em escola pública e ensino superior em universidades privadas em alguns cursos; (iii) o trabalho alerta para a necessidade de melhor qualidade de ensino, como ferramenta para amenizar os desequilíbrios da educação-emprego.

Reis ( 2020 Reis, M. C. Os ensinos público e privado no Brasil e a incidência de sobre-educação no mercado de trabalho. Economia Aplicada, v. 24, n. 3, p. 367-392, 2020. Disponível em: https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/9959/1/td_2558.pdf . Acesso: 05 mar. 2024.
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) avaliou a relação entre ensino público e privado e como essas modalidades impactam na sobre-educação em seus empregos utilizando dados da Pesquisa Nacional de Amostra e Domicílio Contínua (PNAD Contínua) para o segundo trimestre de 2016. O modelo usado para as estimativas foi o probit, separado para dois tipos de estimação, uma com ensino básico e outra com ensino superior. Os principais resultados afirmaram que: (i) em relação ao ensino básico, trabalhadores que tiveram até o ensino médio na rede pública tem 9,1% de chance de serem sobre-educados em relação a trabalhadores que obtiveram o mesmo ensino médio na rede privada de ensino; (ii) ao analisar o ensino superior, um aluno com ao menos um ano de ensino superior tem 2,7% a menos de probabilidade de ser sobre-educado em relação a um trabalhador que tem um ano de ensino superior.

Santos et al . ( 2020 Santos, M. M. D.; Mariano F. Z.; Arraes R. A.; Oliveira C.S. Recorrência de sobreeducação em trabalhadores brasileiros de primeiro emprego. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA – ANPEC, 48., 2020. Anais […]. Niterói: Anpec, 2020. Disponível em: https://www.anpec.org.br/encontro/2020/submissao/files_I/i13-d70b5b194ba65273c669360df7a687d5.pdf . Acesso em: 20 jan. 2023.
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) analisaram a probabilidade de trabalhadores brasileiros serem classificados como sobre-educados no primeiro emprego e como decorre a duração desse status. Para tal, utilizaram dados da RAIS para os anos de 2006-2015, com informações da CBO para 2002 e informações do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), além da aplicação do modelo probit bivariado recursivo. Os principais resultados foram: (i) os trabalhadores sobre-educados no primeiro emprego têm 26,6% mais chances de permanecerem nessa situação no emprego atual; (ii) os homens têm mais chances de serem sobre-educados no primeiro emprego; e, por outro lado, (iii) trabalhadores declarados brancos têm menos chances de aceitar um primeiro emprego abaixo de sua qualificação; (iv) em relação à transição de incompatibilidade para compatibilidade, para os trabalhadores que aceitam o primeiro emprego em instituições de grande porte, as chances de permanecerem sobre-educados após dez anos é de 6,8%, e 4,8% menor em relação a trabalhadores que aceitam o primeiro emprego em empresas de pequeno porte; (v) encontram-se também indícios de que a sobre-educação tem relação com características familiares, assim como qualidade da educação superior, uma vez que instituições públicas de ensino superior são vistas como de melhor qualidade em relação a instituições de ensino superior privadas.

2. DADOS E MÉTODOS

2.1. Modelo Econométrico

Os modelos de dados em painel consideram a junção de características de dados de séries temporais com dados de corte transversal, pois analisam indivíduos ou grupos em diferentes períodos, assim como analisam diversas características correspondentes aos indivíduos ou grupos. Wooldridge ( 2016Wooldridge, J. M. Introdução à econometria: uma abordagem moderna. São Paulo: Cengage Learning, 2016. ) descreve que os modelos de dados em painel têm algumas vantagens em relação às séries de tempo ou dados de corte transversal ao considerar a heterogeneidade dos dados, apresentando maior variabilidade, menor colinearidade, além de propiciarem mais eficiência, sendo bastante utilizados para avaliar mudanças na dinâmica econômica.

Inicialmente foram feitos alguns testes usuais da literatura para definir qual o melhor modelo de dados em painel para o estudo, como o teste F (para decidir entre o modelo pooled ou o modelo de efeitos fixos), o teste de Breusch-Pagan Lagrange Multiplier (para escolher entre o modelo pooled e efeitos aleatórios), e o teste de Hausman (para a escolha entre o modelo de efeitos fixos e modelo de efeitos aleatórios). O teste F rejeitou a hipótese nula de que os interceptos e inclinações são iguais para todas as unidades federativas, enquanto o teste de Breusch-Pagan Lagrange Multiplier rejeitou a hipótese nula de que a variância é constante, e, por fim, o teste de Hausman, que indicou que o modelo de efeito aleatório seria o mais adequado.

Adicionalmente, foram aplicados: (i) o teste de normalidade dos resíduos — Shapiro-Wilk, que indicou que os resíduos não seguem uma distribuição normal; (ii) o teste de Breusch-Pagan rejeitou a hipótese nula de que os resíduos são homocedásticos, o que indicou que a variância dos resíduos não segue um padrão constante; e (iii) o teste de Breusch-Godfrey/Wooldridge para verificar se existe correlação serial nos dados, que apontou significância menor que 5%, indicando que os resíduos são correlacionados no tempo. Neste caso, para a correção da heterocedasticidade e correlação serial, utilizou-se o erro padrão robusto de Newey-West (1987) agregados por unidades federativas, que, conforme Gujarati e Porter ( 2011Gujarati, N. D.; Porter, D. C. Econometria básica. 5. ed. Porto Alegre: AMGH, 2011. ), além de corrigir os erros padrão na presença da heterocedasticidade, corrige também a correlação serial dos resíduos. No Apêndice A Apêndice A – Estatísticas de teste usadas no estudo Testes Valor de teste p-valor Estatística F F=23.225 <0.00000000000000022 Multiplicador de Lagrange – Breusch-Pagan chisq=421.03 <0.00000000000000022 Teste de Hausman chisq=7.8305 =0.9811 Dependência transversal – Pesaran z=-1.7112 =0.08704 Normalidade – Shapiro-Wilk W=0.96522 =0.000004109 Homocedasticidade dos resíduos – Breusch-Pagan BP=83.637 =0.000000004048 Correlação serial – Breusch-Godfrey/Wooldridge chisq=35.094 =0.0001203 Teste de efeitos individuais não observados –Wooldridge z=3.2405 =0.001193 Teste de efeitos não observados de tempo –Wooldridge z=-2.9761 =0.002919 Fonte: Elaboração própria. podem ser conferidos os valores dos testes aplicados.

Sendo assim, o modelo escolhido foi o de efeito aleatório com dummies anuais e erros padrão robusto de Newey-West — permitindo a possibilidade de incluir variáveis que possam ser invariantes no tempo. As regressões estão apresentadas para os três modelos principais abordados, para título de comparação, contendo dados das 27 unidades federativas durante dez anos.

O modelo de efeito aleatório estimado segue abaixo na equação (1):

\begin{equation}Y_{it}=\beta_{0}+\beta_{1}\chi_{it1}+\cdots+\beta_{k}\chi_{itk}+a_{it}+v_{it}\qquad{(1)}\end{equation}

Em ( 1 ), Y i t é a variável dependente “percentual de trabalhadores sobre-educados”. O termo x itk é um vetor de variáveis explicativas, que são: oferta de trabalhadores com educação superior, demanda de empregos que exigem curso superior, coeficiente de especialização estadual, taxa de desemprego estadual, proporção de mulheres no mercado de trabalho, proporção de trabalhadores entre 50 e 65 anos, participação de trabalhadores brancos, salário médio estadual, grau de abertura econômica e dummies de ano e regiões. Por fim, v it é o termo de erro composto, contendo ε i — erro composto em t período —, e a it é o erro referente a série temporal e corte transversal.

2.1.1. Medindo a incompatibilidade educacional no mercado de trabalho

Existem algumas formas de medir a incompatibilidade entre o nível educacional do trabalhador e o nível educacional que a ocupação exige. É importante destacar, contudo, que tais formas são suscetíveis a críticas pois ainda não existe um consenso geral de qual método é o mais robusto. Ademais, é importante observar as características dos dados para tomar a decisão correta de qual método melhor se encaixa para o estudo.

As formas mais conhecidas de medir incompatibilidade são por meio da identificação da escolaridade do trabalhador e a escolaridade exigida pela profissão. Para medir esse indicador destacam-se os seguintes métodos: job analysis (Autor; Levy; Murnane, 2003 Autor, D. H.; Levy, F.; Murnane, R. J. The skill content of recent technological change: Tem empirical exploration. The Quarterly Journal of Economics, v. 118, n. 4, p. 1279-1333, 2003. Disponível em: https://www.jstor.org/stable/25053940 . Acesso: 20 jan. 2023.
https://www.jstor.org/stable/25053940...
), realized matches (Leuven; Oosterbeek, 2011 Leuven, E.; Oosterbeek, H. Overeducation and mismatch in the labor market. In: Hanushek, E. A.; Machin, S.; Woessmann, L. (Eds.) Handbook of the Economics of Education. v. 4. Amsterdam: Elsevier, 2011. Disponível em: https://ideas.repec.org/h/eee/educhp/4-283.html . Acesso: 20 jan. 2023.
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) e self-assessment (McGuinness, 2006 McGuinness, S. Overeducation in the labour market. Journal of Economic Surveys, v. 20, n. 3, p. 387-418, 2006. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1111/j.0950-0804.2006.00284.x . Acesso: 20 jan. 2023.
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; Quintini, 2014 Quintini, G. Skills at work: How skills and their use matter in the labour market. OECD Social, Employment and Migration Working Paper, n. 158, 2014. Disponível em: http://www.observatorioabaco.es/biblioteca/docs/648_OECD_WP158_2014.pdf . Acesso em: 20 jan. 2023.
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). Neste trabalho será utilizado o método de job analysis por ser mais objetivo, que corresponde à classificação de profissões a partir de identificações feitas por analistas profissionais sobre o nível educacional mínimo de cada emprego.

As classificações das ocupações são baseadas em parâmetros internacionais de educação e ocupações – International Labour Office (ILO, 2012International Labour Office. International Standard Classification of Occupations: ISCO 08. Vol. 1. Structure, Group Definitions and Correspondence Tables. Geneva: ILO, 2012. ) –, que serve como base para a CBO no Brasil. A CBO é uma ferramenta que identifica a formação escolar, as atribuições, as habilidades e as competências necessárias para o exercício de uma determinada ocupação. Dessa forma, foi possível fazer um mapeamento do nível educacional do trabalhador comparando com o nível de experiência e formação exigida para aquela atividade ocupacional que consta na CBO. Este mapeamento foi feito no maior nível de desagregação possível visando captar o nível requerido por cada opção, ao invés de adotar a média ou um valor atribuído a determinados grupos ocupacionais. Ademais, foram utilizadas as informações contidas na CBO de 2010. Sendo assim, para um trabalhador ser considerado sobre-educado foi necessário analisar se o seu nível educacional é maior do que o nível educacional que a sua ocupação exige. Caso o nível educacional seja menor do que as exigências educacionais da ocupação, tem-se o caso de um trabalhador subeducado. Consequentemente, para um trabalhador ser considerado compatível, o seu nível educacional deve ter o nível de educação que sua ocupação realmente exige.

2.1.2. Variáveis usadas para explicar a incidência de incompatibilidade educação-emprego

As variáveis utilizadas estão fundamentadas, em sua maioria, no trabalho de Kupets ( 2016 Kupets, O. Education-job mismatch in Ukraine: Too many people with tertiary education or too many jobs for low-skilled? Journal of Comparative Economics, v. 44, n. 1, p. 125-147, 2016. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0147596715000876 . Acesso: 20 jan. 2023.
https://www.sciencedirect.com/science/ar...
), e algumas adaptadas de Annegues et al . ( 2018 Annegues, A. C.; Oliveira, C.; Figueiredo, E.; Porto Júnior, S. Overeducation e área de formação: evidências para os Egressos da UFPB. In: ENCONTRO REGIONAL DE ECONOMIA, 23., 2018. Anais […]. Fortaleza: Anpec, 2018. Disponível em: http://www.anpec.org.br/novosite/br/xxiii-encontro-regional-de-economia\--atigos-selecionados . Acesso: 20 jan. 2023.
http://www.anpec.org.br/novosite/br/xxii...
) e Santos et al. ( 2020 Santos, M. M. D.; Mariano F. Z.; Arraes R. A.; Oliveira C.S. Recorrência de sobreeducação em trabalhadores brasileiros de primeiro emprego. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA – ANPEC, 48., 2020. Anais […]. Niterói: Anpec, 2020. Disponível em: https://www.anpec.org.br/encontro/2020/submissao/files_I/i13-d70b5b194ba65273c669360df7a687d5.pdf . Acesso em: 20 jan. 2023.
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), conforme descritas abaixo:

Incidência de sobre-educação: Variável definida como percentual de trabalhadores que estão em empregos que exigem um nível educacional menor do que o nível de educação que o trabalhador tem. Utilizou-se o método job analysis para identificar as correspondências entre trabalhadores e empregos. Ao todo foram catalogadas 2.734 ocupações e seus níveis de formação e experiência exigidas.

Oferta relativa de trabalhadores com qualificação elevada: Variável definida como a razão entre a soma de trabalhadores com educação superior e a soma de trabalhadores que têm nível educacional abaixo da educação superior. Essa variável mede o volume relativo de trabalhadores qualificados e tende a ter um sinal positivo ao explicar a incompatibilidade educacional no mercado de trabalho, especialmente no que se refere à sobre-educação.

Demanda relativa de empregos que exigem alta qualificação: Variável definida como a razão entre a soma de ocupações que exigem um nível de qualificação superior e ocupações que exigem qualificação inferior. Essa variável mede o volume relativo de empregos qualificados disponíveis no mercado formal. Aqui se tem uma variável com sinal esperado negativo ao explicar a sobre-educação.

Coeficiente de especialização estadual: É calculado somando o valor absoluto da diferença entre a participação de empregos no estado e no país da j-ésima atividade econômica observada; o resultado desse cálculo deve ser dividido por 2. A equação (2) descreve de forma algébrica o coeficiente de especialização:

\begin{equation}CE_{it}=\frac{1}{2}\sum\left( \frac{K_{kit}}{E_{it}}-\frac{K_{kt}}{E_t}\right)\qquad{(2)}\end{equation}

Em ( 2 ), K ki t é o emprego do setor k na localidade i, no ano t; o E i t é o total do emprego na localidade i, no ano t; o K k t é o emprego do setor k no ano t, e E t é o total de empregos no ano t.

Os valores dos coeficientes de especialização próximos de zero revelam que a especialização do estado se aproxima da especialização nacional. Ao contrário, quando se aproxima de 1, a especialização difere da especialização nacional. Serão usadas aproximadamente 668 atividades da Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE 2.0, disponibilizada pelo IBGE ( 2010a Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2010: Informações de Mercado de Trabalho. Rio de Janeiro: IBGE, 2010a. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9662-censo-demografico-2010.html?=&t=microdados . Acesso em: 20 mar. 2024
https://www.ibge.gov.br/estatisticas/soc...
). Espera-se que o valor do coeficiente de especialização seja positivamente relacionado a maior incidência de sobre-educação.

Taxa de desemprego estadual: Calculada pela razão entre a soma de pessoas que não estavam trabalhando, mas que continuaram à procura de emprego, e a população economicamente ativa. Essa variável é calculada a partir de informações de mercado de trabalho no Censo 2010 (IBGE, 2010b Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE 2.0). Rio de Janeiro: IBGE, 2010b. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/metodos-e-classificacoes/classificacoes-e-listas-estatisticas/9078-classificacao-nacional-de-atividades-economicas.html\ . Acesso em: 20 mar. 2024
https://www.ibge.gov.br/estatisticas/met...
), PNAD (IBGE, 2011Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, PNAD Anual 2011. Rio de Janeiro: IBGE, 2011 ) e PNAD Contínua (IBGE, 2019a Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, PNADC Anual. Rio de Janeiro: IBGE, 2019a. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/trabalho/2511-np-pnad-continua/30980-pnadc-divulgacao-pnadc4.html?=&t=downloads\ . Acesso em: 20 mar. 2024
https://www.ibge.gov.br/estatisticas/soc...
). Também é responsável por medir o fluxo no mercado de trabalho na medida em que possam existir períodos de instabilidade nos empregos.

Proporção de trabalhadores entre 50 e 65 anos de idade: Variável calculada pela razão entre a soma de trabalhadores mais velhos (50 a 65 anos) e os trabalhadores com idades inferiores (25 a 49 anos). Essa variável é definida como uma variável de controle para analisar a possibilidade de maior incidência dessa faixa etária.

Proporção de mulheres nos empregos: soma de trabalhadoras que estão no mercado de trabalho em relação à soma de trabalhadores homens. Essa variável também é definida como variável de controle, ao passo que tende a ter uma relação positiva com a sobre-educação devido à dupla jornada de vida, entre ter emprego formal e prestar serviços culturalmente atribuídos em sua maioria às mulheres, como atividades domésticas.

Proporção de trabalhadores brancos: Variável calculada pela razão entre o total de trabalhadores brancos em relação a trabalhadores não brancos. Após encontrar esse resultado soma-lo a 1, aplica-se a logaritmo. O uso do logaritmo é devido à discrepância de valores dessa variável entre as unidades federativas. O motivo de somar os resultados com 1 antes de aplicar o logaritmo é para evitar valores negativos entre as unidades federativas, visto que algumas apresentaram um valor de muito próximo de zero, resultando em logaritmo negativo. É uma variável de controle, para avaliar se essa categoria tem alguma influência na variação da sobre-educação no mercado de trabalho, no caso em relação a empregos que exigem curso superior.

Logaritmo do salário médio: Variável calculada usando o salário médio dos trabalhadores com ensino superior completo das unidades federativas, mensurado em reais e aplicado o logaritmo natural, avaliando possível custo de oportunidade entre ter um emprego formal qualificado ou ter um emprego inferior com salário próximo do emprego qualificado, como um salário reserva, quando o trabalhador faz escolha entre buscar a alocação ideal ou aceitar alocações inferiores, desde que esteja com salários médios próximos.

Grau de abertura econômica: Essa variável é calculada pela soma das exportações e importações em razão da soma do Produto Interno Bruto (PIB) de cada Estado i no ano t e multiplicando o valor por 100. Essa variável será usada para capturar o potencial de atração de investimento, tecnologia e geração de empregos nos Estados. O conjunto de variáveis usadas (exportações, importações) foram coletadas na base do Comex Stat (Brasil, 2019bInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Sistema de Contas Regionais: Brasil 2019. Rio de Janeiro: IBGE, 2019b. ). Já o PIB estadual foi coletado no Sistema de Contas Regionais (IBGE, 2019bInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Sistema de Contas Regionais: Brasil 2019. Rio de Janeiro: IBGE, 2019b. ). A variável grau de abertura econômica pode ser demonstrada na equação (3):

\begin{equation}Grau\ de\ abertura\ econômica_{it} = \log\left(\left(\Sigma^{i=27}_t\frac{Exportações_{it} + Importações_{it}}{PIB_{it} } * 100\right)+1\right)\qquad{(3)}\end{equation}

A soma da variável com 1 antes de calcular o logaritmo é para evitar valores negativos entre as unidades federativas, visto que algumas unidades possuem um valor de soma de exportações e importações muito próximo do valor do PIB, fazendo com que o resultado da divisão seja muito próximo de zero, resultando em logaritmo negativo.

Já as variáveis dummies de ano e regiões para controlar efeitos de tempo e localizações geográficas são importantes para identificar movimentos decorrentes de situações na economia, como alteração de legislação, períodos de crise e ascensão de políticas referentes à educação.

2.2. Base de dados

Os dados foram coletados na RAIS (Brasil, 2019 Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. Relação Anual de Informações Sociais. Brasília, DF: MTE, 2019a. Disponível em http://portal.mte.gov.br/rais/estatisticas.htm\ . Acesso em: mar. 2024.
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), cuja base é um registro administrativo responsável por acompanhar as informações e estatísticas dos trabalhadores anualmente, sendo responsável por descrever as características socioeconômicas dos trabalhadores formais, com informações referentes a rendimentos, número de admitidos e demitidos em cada ano, tempo de serviço, dentre outros dados.

A justificativa para o uso da RAIS se deu pela maior abrangência de trabalhadores registrados em relação a outras fontes de dados disponíveis no Brasil, visto que compreende todos os registros de empregos formais para todos os municípios brasileiros. Dessa forma, foram coletadas informações para o período de 2010 a 2019 – portanto, anterior à pandemia da Covid-19 – para todos os estados do Brasil (período mais recentes de que se tinha informações disponíveis).

Para alcançar os objetivos do artigo, em função do grande volume de dados (cerca de 384.004.039 informações), foi construída uma amostra aleatória formada por 10% dos registros da base de dados (em torno de 38,4 milhões), em procedimento semelhante ao de Freguglia et al . ( 2019 Freguglia, R. S.; Gonçalves, E.; Dutra, R. H. P.; Gama, L. C. D. Fuga de cérebros no mercado de trabalho formal das cidades brasileiras: uma análise de dados em painel para o período 1995-2008. Planejamento e Políticas Públicas, n. 53, jul./dez. 2019. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/ppp/index.php/PPP/article/view/875/616 . Acesso: 20 jan. 2023.
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). A partir dessa amostra foi possível contabilizar as incidências de sobre-educação com base no percentual de trabalhadores ocupados em profissões que exigem um nível educacional menor do que o que têm.

As demais variáveis se baseiam em cálculos das proporções de indicadores dos trabalhadores com idade entre 25 e 65 anos, faixa etária que permite a observação de trabalhadores em sua maioria já com nível superior completo e idade média ativa nos empregos, sendo criado um painel de dados para comportar os valores de cada variável utilizada, totalizando 270 observações em um painel balanceado, para assim analisar a situação de desequilíbrio educação-emprego nos estados brasileiros.

Destaca-se que o estudo será delimitado a trabalhadores com empregos formais (dados da RAIS) que têm como escolaridade o nível superior completo. A justificativa desse recorte de informações está no fato de que na base de trabalhadores formais é mais fácil associar trabalhadores e ocupações devidamente registradas, o que facilita na identificação alocativa entre a formação do trabalhador e as exigências dos empregos. Ademais, o estudo restrito apenas a trabalhadores com nível ensino superior completo busca reduzir um possível viés de amostra, dado que a incompatibilidade poderia ocorrer com níveis inferiores de escolaridade. Assim, do ponto de vista econômico, de política pública, é mais relevante analisar os trabalhadores com ensino superior, visto que para alcançar esse nível de qualificação exige-se um valor financeiro maior, seja público ou privado. Serão considerados apenas trabalhadores da base da RAIS com vínculo ativo até 31 de dezembro de cada ano.

3. RESULTADOS

3.1. Resultados da análise descritiva

Na Tabela 1 estão expostas as estatísticas descritivas dos dados, para os anos de 2010 e 2019, dos trabalhadores com ensino superior. Nessa tabela constam informações referentes a média de idade, salário médio, sexo, raça e regiões.

As principais observações a serem destacadas referem-se à mudança verificada entre os anos de análise, 2010 e 2019. Percebe-se que: (i) a idade média dos trabalhadores compatíveis e sobre-educados são próximas (sendo 1 ou 2 anos de idade média inferior para estes últimos); (ii) o percentual de homens e mulheres sobre-educados aumentou no período; e (iii) o percentual de trabalhadores sobre-educados saltou de 36,95% para 43,41% – este aumento impactou todas as regiões do país, principalmente a região Sul, saltando de 36,80% em 2010 para 47,18% em 2019 –, e que os trabalhadores sobre-educados recebem, aproximadamente, 20% e 30% a menos que os trabalhadores compatíveis em 2010 e 2019, respectivamente.

Tabela 1
- Estatísticas descritivas comparativas, trabalhadores com ensino superior, em percentual, 2010 e 2019

As tabelas seguintes irão detalhar as principais características microeconômicas do perfil dos trabalhadores da amostra. Iniciando com base na Tabela 2 , é possível analisar como estão alocados os trabalhadores qualificados por nível de formação. Nesta, destaca-se a queda do percentual de trabalhadores compatíveis nos níveis de graduação e mestrado, enquanto no nível de formação doutorado observa-se um aumento. De maneira geral, a maior mudança refere-se ao nível de graduação, com o aumento (redução) de trabalhadores sobre-educados (compatíveis).

Tabela 2
- Comparativo da situação alocativa nos empregos com base nas formações de educação superior, em percentual, 2010 e 2019

Na Tabela 3 são apresentados os percentuais alocativos de trabalhadores por faixas etárias. Observa-se que todas sofrem com a migração de empregos compatíveis para sobre-educados, com variações similares em torno entre 3% e 5%.

Tabela 3
- Comparativo de trabalhadores considerados sobre-educados por faixa de idade, em percentual, 2010 e 2019

Na Tabela 4 , tem-se as estatísticas descritivas das variáveis usadas para estimar as causas da incidência de sobre-educação nas unidades federativas do Brasil.

As duas primeiras variáveis, oferta de trabalhadores e demanda por empregos, referem-se, respectivamente, ao total de trabalhadores com educação superior divido pelo total de trabalhadores que não têm educação superior, e ao total de trabalhos que exigem curso superior dividido pelo total de trabalhos que não exigem curso superior. As demais variáveis da tabela têm seus indicadores calculados a partir do grupo populacional da amostra, ou seja, trabalhadores com idade entre 25 e 65 anos, com nível de formação graduação ou superior.

Cabe destacar que a média de trabalhadores com ensino superior em empregos com educação inferior é de cerca de 40,6%. A taxa de desemprego variou entre 1,5% e 14,4%, tendo uma média de 5%.

Tabela 4
- Estatística descritiva das variáveis usadas nas regressões, 2010 a 2019

Algumas informações adicionais estão expostas no Gráfico 1 , em que é possível analisar as incidências referente a situações dos trabalhadores com ensino superior nas 27 unidades federativas do Brasil.

Inicialmente, percebe-se que houve uma alteração significativa entre os anos analisados. Em 2019 os percentuais de trabalhos sobre-educados são maiores e díspares entre as unidades federativas em comparação a 2010. Ademais, as unidades federativas que mais se destacam em termos de trabalhadores sobre-educados em 2010 são Rondônia, Goiás, São Paulo e Amapá, com valores acima ou muito próximos de 50% dos trabalhadores vivendo incompatibilidade ocupacional. Já em 2019, o caso mais destacado é o do Amapá, com mais de 70% de seus trabalhadores alocados em trabalhos que exigem qualificação inferior. Esse valor alto no Amapá pode estar relacionado a limitações econômicas do Estado, o que pode acarretar uma menor demanda de empregos em relação à quantidade de trabalhadores com educação superior. Por outro lado, os estados do Acre, Piauí e Sergipe (em 2010) são os que mais se destacam em relação à participação de trabalhadores com alocações em empregos compatíveis com a escolaridade obtida, com valor aproximado de 72% dos trabalhadores compatíveis no mercado de trabalho. Já em 2019, os que se destacaram foram Mato Grosso de Sul e Pará, com valor aproximado de 63% dos trabalhadores compatíveis no mercado de trabalho.

Gráfico 1
- Comparativo de percentuais de trabalhadores sobre-educados nas unidades federativas do Brasil, 2010 e 2019

3.2. Resultados das estimações econométricas

Os resultados das regressões para os três principais modelos de dados em painel podem ser vistos na Tabela 5 , em que são apresentados os modelos com dummies de ano e regiões geográficas, assim como feita a estimação por erros padrão robustos de Newey-West, para correção de heterocedasticidade e correlação serial encontradas nos dados.

Inicialmente percebe-se uma relação positiva e significativa ao nível de 1% entre o aumento da oferta de trabalhadores com educação superior e a incidência de trabalhadores sobre-educados (coeficiente estimado 0,544), indicando que um aumento na proporção de trabalhadores com ensino superior impacta em um aumento médio na incidência de trabalhadores sobre-educados. Este indicador reflete o crescimento observado na última década na formação de capital humano no país, fruto em parte de políticas públicas que visam ampliar o acesso dos estudantes às universidades, com intuito de qualificar trabalhadores.

Outra variável determinante no estudo é a demanda de empregos qualificados. Os resultados indicam que um aumento na demanda de empregos que exigem curso superior diminui em média as chances de que trabalhadores sejam classificados como sobre-educados (coeficiente estimado igual a -1,451), com um nível de significância de 1%.

As duas variáveis acima expostas, que representam a oferta de trabalhados qualificados e a demanda por empregos qualificados, parecem indicar que houve um crescimento da oferta de trabalhadores com qualificação superior proporcionalmente maior à quantidade de empregos qualificados gerados, sendo isso o causador da incompatibilidade escolaridade-ocupação no Brasil. Em relação ao possível desequilíbrio segundo informações coletadas na base nos dados da RAIS (Brasil, 2019 Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. Relação Anual de Informações Sociais. Brasília, DF: MTE, 2019a. Disponível em http://portal.mte.gov.br/rais/estatisticas.htm\ . Acesso em: mar. 2024.
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), para o período entre 2010 e 2019 houve um crescimento de cerca de 37,28% no número de trabalhadores com educação superior nos empregos formais, com uma média anual de crescimento de 4,54%. Já no que diz respeito a empregos que exigem curso superior, no período 2010 a 2019 houve um crescimento de 22,12%, sendo 2,27% a taxa de crescimento média anual.

As informações acima confirmam que existe um desequilíbrio entre trabalhadores qualificados e o número de empregos que exigem qualificação superior de ensino. Pode-se observar que a taxa de crescimento média anual da quantidade de trabalhadores cresce aproximadamente duas vezes mais do que a taxa média anual de empregos que exigem curso superior. Sabe-se que o dinamismo do mercado de trabalho tende a exigir que os trabalhadores invistam em capital humano, visando conseguir melhores salários e ou até se manterem em suas ocupações atuais. Com isso, na medida em que se tem uma oferta de trabalhadores crescendo em níveis elevados aos patamares anteriores pode-se incorrer em um aumento de trabalhadores sobre-educados, salvo se a demanda por empregos qualificados crescesse em níveis igualmente elevados.

Referente à proporção de mulheres, os resultados foram divergentes em relação à maioria dos trabalhos publicados sobre o tema, em que se aponta uma relação positiva na variável sexo feminino em relação à incidência de sobre-educação. Os resultados aqui expostos indicam que a relação dessa variável com a variável dependente foi negativa (-0,133), indicando que um aumento na proporção de mulheres nos empregos reduz as chances de incidência de trabalhadores sobre-educados. Certamente, a explicação possível deve estar associada ao tipo de emprego que esses trabalhadores ocupam ou a um possível viés de seleção entre esses grupos que estariam os habilitando a terem maiores chances de exercer uma ocupação compatível ao seu nível de qualificação educacional.

Por fim, foram incluídas dummies de ano e regiões para captar potenciais acontecimentos entre os períodos e controlar variações nas regiões geográficas do país que explicassem a incidência de sobre-educação. O ano base é 2010, e o período entre 2012 e 2019 mostrou-se significativo a 5% (2012 e 2013) e 1% (2014 até 2019), comprovando a tendência de alta de trabalhadores considerados incompatíveis no período analisado, aumento do acesso à educação superior e aumento ainda pequeno de demanda por empregos como possíveis justificativas pelo direcionamento de trabalhadores com educação superior para empregos inferiores.

Algumas variáveis importantes que foram incluídas no estudo não obtiverem significância estatística, como é o caso da taxa de desemprego, coeficiente de especialização, grau de abertura comercial, proporção de brancos, faixa etária de 50 a 65 anos e salário médio, sobre as quais não serão feitos comentários adicionais.

Tabela 5
- Resultados das regressões para determinar a incidência de sobre-educação nos estados brasileiros usando erros padrão robustos de Newey-West, 2010-2019

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo teve como objetivo analisar o mercado de trabalho formal brasileiro, em especial, os possíveis fatores responsáveis pela incidência de trabalhadores sobre-educados. Com base em informações da RAIS de 2010 a 2019, o trabalho se concentrou prioritariamente em levantar a discussão se a incidência da incompatibilidade no emprego seria causada por fatores associados à oferta ou à demanda por trabalhadores qualificados.

O resultado da análise descritiva de algumas características mostrou que: (i) houve aumento de trabalhadores sobre-educados na maioria das unidades federativas; (ii) entre as formações de ensino superior, a que mais sofreu perda de trabalhos qualificados durante o período foi o nível graduação; (iii) trabalhadores mais velhos (51-65) e mais novos (25-39) foram os que mais perderam empregos qualificados durante o período de estudo, com aumento da sobre-educação em 5,35% e 3,84%.

Já na análise econométrica, os principais resultados indicam que a oferta de trabalhadores qualificados e a demanda por empregos qualificados foram significativas (ambos a 1% de significância) para explicar a incidência de sobre-educação, com relação positiva e negativa, respectivamente. Os resultados convergiram para indicar que tanto a oferta de trabalhadores com ensino superior quanto a demanda foram determinantes para explicar a incompatibilidade educação-emprego na última década.

Isso sugere que o crescimento do número de trabalhadores com ensino superior completo não vem sendo absorvido pela demanda por empregos qualificados, causando assim, o fenômeno da sobre-educação no mercado de trabalho. Nesse contexto, as duas opções de solução seriam: (i) reduzir o investimento educacional visando a diminuição da formação de trabalhadores com ensino superior; e/ou (ii) estimular a demanda por trabalhadores qualificados.

A primeira delas parece inviável em um país onde o número relativo de trabalhadores qualificados (com ensino superior) ainda está muito aquém da média global dos países mais desenvolvidos ou em desenvolvimento. Segundo informações do Inep ( 2019 Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo da educação superior 2019: Divulgação dos resultados. Brasília, DF: INEP, 2019. Disponível em: https://download.inep.gov.br/educacao_superior/censo_superior/documentos/2020/Apresentacao_Censo_da_Educacao_Superior_2019.pdf . Acesso: 20 jan. 2023.
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), o Brasil está na última colocação, num grupo de 31 países analisados, em relação ao percentual da população entre 25 e 34 anos que tem escolaridade superior (cerca de 21,3% no Brasil contra 40,0% de média dos demais países, estando atrás de México (23,6%), Itália (27,7%) e Colômbia (29,9%), só para citar alguns). Os maiores percentuais de ensino superior nessa faixa etária estão na Coreia do Sul (69,8%), Canadá (63,0%) e Rússia (62,1%). E quando se analisa a população entre 55 e 64 anos com ensino superior o índice para o Brasil é de 14,3%, contra quase 30,0% da média dos demais países.

Já a segunda solução, referente ao estímulo da demanda das empresas por trabalhadores qualificados, embora teoricamente viável, é de difícil implementação, visto que o chamado “estímulo” pode não ser suficiente para que as empresas maximizadoras de lucro em um mercado competitivo contratem trabalhadores mais qualificados sem o retorno esperado.

Ademais, outro ponto a ser enfatizado é o de que o resultado apresentado nesse artigo pode estar retratando uma “falsa” qualificação da mão de obra, ou seja, embora os trabalhadores tenham níveis mais elevados de qualificação acadêmica (formação de ensino superior completo), sua produtividade efetiva no emprego pode ser baixa. Com isso, as empresas podem estar, de fato, demandando trabalhadores compatíveis com à produtividade desejada, caso o nível de qualificação escolar/universitária recebida pelos trabalhadores com o ensino superior for baixo. A principal limitação deste estudo é de não dispor de variáveis adicionais, como mensuração de produtividade e informações sobre treinamento, que possam capturar a qualidade a nível agregado da educação superior nos estados brasileiros durante os períodos de análise.

Concluindo, são limitações deste trabalho: (i) restrito aos trabalhadores formais, sendo assim os valores apresentados podem ter subestimado a incompatibilidade; (ii) falta de uma variável de mensuração da produtividade do trabalho, o que contribuiria para dirimir algumas dúvidas em relação a análise dos resultados encontrados; (iii) a falta de informações qualitativas sobre a educação universitária, se foi obtida em universidades públicas ou privadas, ou ainda em que área de ensino foi obtido o diploma universitário. Acredita-se, no entanto, que o trabalho alcançou o objetivo proposto, apresentando informações e discussões importantes da alocação de trabalhadores qualificados e encontrando indícios de que a expansão de mão de obra qualificada impacta na variação da incompatibilidade educacional nos empregos, sendo necessária a adoção de políticas que contribuam para a efetiva melhoria da qualificação dos trabalhadores.

Apêndice A – Estatísticas de teste usadas no estudo

Testes Valor de teste p-valor
Estatística F F=23.225 <0.00000000000000022
Multiplicador de Lagrange – Breusch-Pagan chisq=421.03 <0.00000000000000022
Teste de Hausman chisq=7.8305 =0.9811
Dependência transversal – Pesaran z=-1.7112 =0.08704
Normalidade – Shapiro-Wilk W=0.96522 =0.000004109
Homocedasticidade dos resíduos – Breusch-Pagan BP=83.637 =0.000000004048
Correlação serial – Breusch-Godfrey/Wooldridge chisq=35.094 =0.0001203
Teste de efeitos individuais não observados –Wooldridge z=3.2405 =0.001193
Teste de efeitos não observados de tempo –Wooldridge z=-2.9761 =0.002919
Fonte: Elaboração própria.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    09 Fev 2023
  • Aceito
    22 Nov 2023
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