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Análise do cuidado e estereótipos de gênero na produção científica da enfermagem: revisão de escopo

RESUMO

Objetivo:

Mapear evidencias sobre o cuidado e os estereótipos de gênero na produção científica de enfermagem.

Método:

Revisão de escopo desenvolvida sob o referencial do Joanna Briggs Institute com análise da perspectiva de gênero nas abordagens de cuidado. As buscas foram realizadas em 31 de janeiro de 2023, nas bases: SciELO, SCOPUS, CINAHL, PUBMED, BDENF.

Resultados:

Dos 3.743 estudos localizados, 25 foram incluídos. As evidências foram agrupadas nas categorias: cuidado essencialmente feminino (n = 9; 36%); chamado e serviço do amor (n = 3; 12%); apagamento das desigualdades de gênero (n = 2; 8%); cuidado “inadequado e danoso” (n = 5; 20%); neutralização do gênero e dos corpos (n = 3; 12%); e denúncia das opressões no trabalho do cuidado (n = 3; 12%).

Conclusão:

A maioria da produção científica sobre o cuidado reproduz estereótipos de gênero que reforçam as opressões sobre as mulheres na enfermagem. Em contraponto, as resistências denunciam a naturalização do cuidado como “inadequado e danoso”, por perpetuarem as opressões de gênero no trabalho do cuidado.

DESCRITORES
Cuidados de Enfermagem; Identidade de Gênero; Enfermagem; Feminismo

ABSTRACT

Objective:

To map evidence about care and gender stereotypes in nursing scientific research.

Method:

A scoping review developed under the JBI framework with analysis of gender perspective in care approaches. The searches were carried out on January 31, 2023 in SciELO, Scopus, CINAHL, PubMed, BDENF.

Results:

Of the 3,743 studies located, 25 were included. Evidence was grouped into categories: essentially female care (n = 9; 36%); calling and service of love (n = 3; 12%); erasure of gender inequalities (n = 2; 8%); “inadequate and harmful” care (n = 5; 20%); neutralization of gender and bodies (n = 3; 12%); and reporting oppression in care work (n = 3; 12%).

Conclusion:

Most scientific research on care reproduces gender stereotypes that reinforce the oppression of women in nursing. In contrast, resistance denounces naturalization of care as “inadequate and harmful”, for perpetuating gender oppression in care work.

DESCRIPTORS
Nursing Care; Gender Identity; Nursing; Feminism

RESUMEN

Objetivo:

Mapear evidencias sobre cuidados y estereotipos de género en la producción científica de enfermería.

Método:

Revisión de alcance desarrollada en el marco del JBI con análisis de la perspectiva de género en los enfoques de cuidado. Las búsquedas se realizaron el 31 de enero de 2023 en SciELO, Scopus, CINAHL, PubMed, BDENF.

Resultados:

De los 3.743 estudios localizados se incluyeron 25. La evidencia se agrupó en las categorías: cuidado esencialmente femenino (n = 9; 36%); llamado y servicio de amor (n = 3; 12%); eliminación de las desigualdades de género (n = 2; 8%); atención “inadecuada y nociva” (n = 5; 20%); neutralización de género y cuerpos (n = 3; 12%); y reportando opresión en el trabajo de cuidados (n = 3; 12%).

Conclusión:

La mayor parte de la producción científica sobre cuidados reproduce estereotipos de género que refuerzan la opresión de las mujeres en la enfermería. En cambio, la resistencia denuncia la naturalización de los cuidados como “inadecuada y dañina”, por perpetuar la opresión de género en el trabajo de cuidados.

DESCRIPTORES
Atención de Enfermería; Identidad de Género; Enfermería; Feminismo

INTRODUÇÃO

O estereótipo da “cuidadora natural”, marcado por questões de gênero, classe, raça e geração, cristaliza a imagem da mulher como supostamente “vocacionada” a cuidar em vista de sua natureza feminina, repercutindo em desigualdades de gênero, sobretudo na enfermagem. O rótulo da cuidadora natural reforça a ideia de que o trabalho do cuidado seria destinado para as mulheres, condicionado fixamente pela natureza feminina atrelada ao determinismo biológico, à revelia de serem construções sociais. Nessa ótica, se tomarmos o cuidado como elemento central para a concretização da democracia, vemos as repercussões injustas desse estereótipo, entre elas: a precarização das relações de trabalho; a dificuldade de acesso aos espaços políticos; a tripla jornada de trabalho; a baixa remuneração; o incipiente reconhecimento social; bem como a expropriação do tempo e energia das mulheres, questões que implicam em maiores injustiças(11. Pires MRGM, Fonseca RMGS, Padilla B. A politicidade do cuidado na crítica aos estereótipos de gênero. Rev Bras Enferm. 2016;69(6):1223–30. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0441. PubMed PMID: 27925101.
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0...

2. Tronto J. ¿Riesgo o cuidado? Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Fundación Medifé Edita; 2020 [cited 2023 Mar 2]. Available from: https://www.fundacionmedife.com.ar/sites/default/files/Edita/Horizontes-Del-Cuidado/Riesgo-o-cuidado.pdf.
https://www.fundacionmedife.com.ar/sites...
-33. Spinelli L. Joan Tronto: relational responsibility, recognition of privileges and vulnerability. Princípios. 2022 Feb 28 [cited 2023 Mar 2]; 29(58):66–83. Available from: https://periodicos.ufrn.br/principios/article/view/23774.
https://periodicos.ufrn.br/principios/ar...
).

É bem debatido na literatura que o trabalho do cuidado – de crianças, idosos, doentes e do lar – majoritariamente realizado por mulheres, enfermeiras ou não, é socialmente desvalorizado, mal remunerado (ou não remunerado) e precarizado. A concepção mais aceita de trabalho do cuidado, oriunda da sociologia das emoções, diz respeito à atenção constante e intensa que uma pessoa faz para o bem-estar de outra. A enfermagem, como profissão inserida no trabalho do cuidado, igualmente se depara com as injustas condições laborais, especialmente na área assistencial. Recente pesquisa sobre o perfil profissional no Brasil aponta susceptibilidades no mercado de trabalho, tais como: desvalorização com baixos salários; precarização dos vínculos; multiempregos; dificuldades de alocação; insegurança e violência no ambiente de trabalho, entre outras(44. Biroli F, Quintela DF. Sexual division of labor, separation and hierarchy: contributions to the analysis of the gender of democracies. Rev. Pol & Trab. 2021 Mar 23 [cited 2023 Mar 2]; 1(53):72–89. Available from: https://periodicos.ufpb.br/index.php/politicaetrabalho/article/view/51417.
https://periodicos.ufpb.br/index.php/pol...
,55. Machado MH, Koster I, Aguiar Filho W, Wermelinger MCMW, Freire NP, Pereira EJ. Labor market and regulatory processes – Nursing in Brazil. Cien Saude Colet. 2020;25(1):101–12. doi: http://doi.org/10.1590/1413-81232020251.27552019. PubMed PMID: 31859859.
https://doi.org/10.1590/1413-81232020251...
).

Na enfermagem, os estereótipos marcam o imaginário e a realidade da profissão desde a origem, aprisionando-a em adjetivações fixas que aprofundam as desigualdades nas condições de trabalho. Os estereótipos podem ser compreendidos como uma visão preconceituosa e generalizante de características que grupos e indivíduos possuem ou de atributos que a sociedade espera que tenham. Estereotipar consiste em ignorar as características singulares de uma pessoa e tratá-la como um molde. Estudos de revisão identificam estereótipos de gênero nas visões da sociedade sobre a enfermagem, entre eles: para as enfermeiras, presumível incompetência técnica, fraco nível acadêmico e profissional, incipiente autonomia e hipersexualização; para os enfermeiros, o questionamento da masculinidade, faces da mesma injustiça(11. Pires MRGM, Fonseca RMGS, Padilla B. A politicidade do cuidado na crítica aos estereótipos de gênero. Rev Bras Enferm. 2016;69(6):1223–30. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0441. PubMed PMID: 27925101.
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0...
,66. Teresa-Morales C, Rodríguez-Pérez M, Araujo-Hernández M, Feria-Ramírez C. Current stereotypes associated with nursing and nursing professionals: an integrative review. Int J Environ Res Public Health. 2022;19(13):7640. doi: http://doi.org/10.3390/ijerph19137640. PubMed PMID: 35805296.
https://doi.org/10.3390/ijerph19137640...
).

Entrementes, no presente estudo, problematizamos o quanto as visões preconceituosas sobre a profissão são retroalimentadas por nossos discursos científicos. A esse respeito, são emblemáticas as produções que constatam a reedição da “cuidadora natural” nas produções na enfermagem. Os motivos da escolha profissional, por exemplo, continuam marcados por sexismos, conservadorismos e idealizações de perfectibilidades inatingíveis, centradas num altruísmo santificado do “ser enfermeira”. Por seu turno, os homens da profissão demarcam suas escolhas com base em objetivos racionais, como possibilidade de emprego e liderança na categoria, demarcando bem as desigualdades de gênero dentro da profissão. Noutro estudo, a sexualização das enfermeiras, a liderança masculina, a fragilidade emocional da mulher e o cuidado como atributo feminino foram interpretados como parte da “visão da sociedade sobre a profissão”, com ausência de reflexão acerca dos discursos científicos ideologizados na enfermagem. Em consequência, constatamos um abismo entre o que a enfermagem afirma e o cotidiano da profissão, numa contradição endógena(77. Burton CW. Paying the caring tax: the detrimental influences of gender expectations on the development of nursing education and science. ANS Adv Nurs Sci. 2020;43(3):266–77. doi: http://doi.org/10.1097/ANS.0000000000000319. PubMed PMID: 32732607.
https://doi.org/10.1097/ANS.000000000000...
,88. Andina-Díaz E, Ventura-Miranda MI, Quiroga-Sánchez E, Ortega-Galán ÁM, Fernández-Medina IM, Ruiz-Fernández MD. Nursing students’ perception about gender inequalities presented on social networks: a qualitative study. Int J Environ Res Public Health. 2023;20(3):1962. doi: http://doi.org/10.3390/ijerph20031962. PubMed PMID: 36767328.
https://doi.org/10.3390/ijerph20031962...
).

Num contraponto crítico, a pandemia de covid-19 exacerbou o quanto os epítetos de enfermeiras “anjos” ou “heróis” não correspondem à dura realidade e à elevada mortalidade no segmento profissional. Uma pesquisa que investigou as percepções dessas narrativas entre profissionais de enfermagem concluiu pela ciência do quão distante as idealizações estão do cotidiano de trabalho das(os) entrevistadas(os). No Brasil, homenagens sentimentais da mídia durante a pandemia não se traduziram na defesa do piso salarial para a enfermagem, que até o momento persiste na luta. Portanto, passa da hora de refletirmos sobre o quanto os discursos que reeditamos nas produções científicas contribuem para tamanha fragilidade política(99. Stokes-Parish J, Barrett D, Elliott R, Massey D, Rolls K, Credland N. Fallen angels and forgotten heroes: a descriptive qualitative study exploring the impact of the angel and hero narrative on critical care nurses. Aust Crit Care. 2023;36(1):3–9. doi: http://doi.org/10.1016/j.aucc.2022.11.008. PubMed PMID: 36470775.
https://doi.org/10.1016/j.aucc.2022.11.0...
).

Esse cenário reitera a importância de investigarmos a naturalização dos estereótipos de gênero, compreendendo-os como manifestações discursivas de intrincadas relações de poderes capazes de limitar rigidamente a prática social e a produção científica da enfermagem a partir de um suposto determinismo social. As repercussões assimétricas da naturalização do cuidado – como caráter estruturante de desigualdades de gênero que interpela às mulheres aptidões pautadas em uma pretensa linearidade causal – justificam a necessidade de ampliar a produção crítica acerca do enfrentamento da naturalização do cuidado como uma condição feminina.

Para análise dos estereótipos de gênero, realizamos anteriormente um estudo teórico sobre a epistemologia feminista e cuidado(1010. Mundim GDA. Abordagens do cuidado na produção científica da enfermagem: reedição ou combate ao estereótipo da “cuidadora natural”? [trabalho de conclusão de curso]. Brasília: Universidade de Brasília; 2021 [cited 2024 Feb 27]. Available from: https://bdm.unb.br/bitstream/10483/33343/1/2022_GabrielaDuarteAlmeidaMundim_tcc.pdf.
https://bdm.unb.br/bitstream/10483/33343...
), com delimitação das seguintes dimensões à crítica da “cuidadora natural” na ciência da enfermagem: Gênero – categoria de contestação para qualquer sentido binário de homem/mulher restrito ao sexo biológico que, em contraponto, considera as relações de poderes produzidas nos atos performáticos e discursivos sobre sexo, sexualidade, desejo e gênero na conformação da normatividade heterossexual discriminatória(1111. Butler J, Miguens F, Rodrigues C. Gênero em tradução: além do monolinguismo, de Judith Butler. Cad Ética Filos Polít. 2021 Dec 21 [cited 2023 Jun 5];39(2):364–87. Available from: https://www.revistas.usp.br/cefp/article/view/191642.
https://www.revistas.usp.br/cefp/article...
); Trabalho do cuidado – tudo que fazemos para o bem-estar de alguém ou alguma coisa, seja na esfera reprodutiva ou produtiva da vida(22. Tronto J. ¿Riesgo o cuidado? Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Fundación Medifé Edita; 2020 [cited 2023 Mar 2]. Available from: https://www.fundacionmedife.com.ar/sites/default/files/Edita/Horizontes-Del-Cuidado/Riesgo-o-cuidado.pdf.
https://www.fundacionmedife.com.ar/sites...
); “Cuidadora natural” – destinação exclusiva, desigual e injusta da mulher às tarefas do cuidado, em vista de uma suposta e imutável natureza “feminina”(11. Pires MRGM, Fonseca RMGS, Padilla B. A politicidade do cuidado na crítica aos estereótipos de gênero. Rev Bras Enferm. 2016;69(6):1223–30. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0441. PubMed PMID: 27925101.
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0...
). O uso do termo “cuidadora natural”, nesse estudo, sintetiza os muitos estereótipos de gênero a ele atrelados no âmbito da enfermagem.

A partir desses pressupostos, a questão norteadora do artigo é esta: como se apresentam as evidências sobre as abordagens do cuidado na produção científica da enfermagem, no que se refere aos estereótipos de gênero? O estudo se justifica pela centralidade do cuidado para a prática da enfermagem e as poucas revisões de escopo que analisam a perspectiva de gênero nessas produções. Com base nessa premissa, o objetivo é mapear as evidências sobre o cuidado e os estereótipos de gênero na produção científica de enfermagem.

MÉTODO

Tipo De Estudo

Trata-se de uma revisão de escopo (scoping review) com análise das abordagens do cuidado na produção científica da enfermagem, na perspectiva do gênero. Esse tipo de revisão tem como finalidade identificar conceitos-chave e lacunas de conhecimento passíveis de aprofundamento em estudos futuros, a partir da síntese de evidências presentes na literatura(1212. Nyanchoka L, Tudur-Smith C, Thu VN, Iversen V, Tricco AC, Porcher R. A scoping review describes methods used to identify, prioritize and display gaps in health research. J Clin Epidemiol. 2019;109:99–110. doi: http://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2019.01.005. PubMed PMID: 30708176.
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).

Procedemos a revisão de escopo sobre as concepções de cuidado na produção científica da enfermagem seguindo o método recomendado pelo Joanna Briggs Institute (JBI)(1212. Nyanchoka L, Tudur-Smith C, Thu VN, Iversen V, Tricco AC, Porcher R. A scoping review describes methods used to identify, prioritize and display gaps in health research. J Clin Epidemiol. 2019;109:99–110. doi: http://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2019.01.005. PubMed PMID: 30708176.
https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2019....
,1313. Peters MDJ, Godfrey C, McInerney P, Munn Z, Tricco AC, Khalil H. Scoping Reviews (2020 version). In: Aromataris E, Munn Z, editors. JBI manual for evidence synthesis. Adelaide: JBI; 2020. chap 11, pp. 458–71. doi: http://doi.org/10.46658/JBIMES-20-12.
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), com as etapas: 1 – identificação da questão a partir do mnemônico PCC: P (População/Population); C (Conceito/Concept); C (Contexto/Context); 2 – critérios de inclusão; 3 – estratégias de pesquisa em duas fases; 4 – extração dos dados com análise da concepção de cuidado na perspectiva de gênero; 5 – sistematização e apresentação dos resultados. Foram utilizadas ainda as recomendações do checklist Prisma Statement 2020 (Primas-ScR)(1414. Page MJ, McKenzie JE, Bossuyt PM, Boutron I, Hoffmann TC, Mulrow CD, et al. The PRISMA 2020 statement: an updated guideline for reporting systematic reviews. BMJ. 2021;372(71):n71. doi: http://doi.org/10.1136/bmj.n71. PubMed PMID: 33782057.
https://doi.org/10.1136/bmj.n71...
). O protocolo utilizado no estudo foi elaborado e registrado no Open Science Framework, sob o link: https://osf.io/xv3ph/.

Questão de Pesquisa

Para a construção da questão de pesquisa, utilizamos o mnemônico PCC: P – enfermagem; C – abordagens do cuidado; C –– estereótipo de gênero; com delimitação da pergunta: como se apresentam as evidências sobre as abordagens do cuidado na produção científica da enfermagem, no que se refere aos estereótipos de gênero?

Critérios de Inclusão e de Exclusão

Adotamos os seguintes critérios de inclusão: artigos de periódicos científicos, disponibilizados na íntegra, que abordem o cuidado como objeto de reflexão na enfermagem; produções publicadas por enfermeiras e/ou em revistas de enfermagem. Foram excluídos estudos que não contemplavam o cuidado como objeto de discussão.

Estratégia de Pesquisa

Em vista de a quantidade de produções nas bases de dados investigadas ter sido suficiente para a análise do estereótipo da “cuidadora natural”, optamos por não incluir literatura cinzenta no escopo de busca. Por rigor metodológico, realizamos uma fase exploratória com a inclusão de palavras-chave em português, inglês e francês para averiguar a pertinência dos descritores, das bibliotecas virtuais da enfermagem e das bases de dados. Nessa fase, a busca foi delimitada ao período de 2020 a 2021. Em seguida, na fase de aperfeiçoamento, ampliamos o processo de busca, modificamos os descritores, incluímos apenas os termos em inglês e ajustamos as bases de dados para ampliar progressivamente o processo investigativo. Nessa segunda fase, não estabelecemos limites quanto ao período de publicação ou idioma, pois pretendíamos investigar o escopo dos estudos sobre concepções de cuidado na enfermagem(1212. Nyanchoka L, Tudur-Smith C, Thu VN, Iversen V, Tricco AC, Porcher R. A scoping review describes methods used to identify, prioritize and display gaps in health research. J Clin Epidemiol. 2019;109:99–110. doi: http://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2019.01.005. PubMed PMID: 30708176.
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,1313. Peters MDJ, Godfrey C, McInerney P, Munn Z, Tricco AC, Khalil H. Scoping Reviews (2020 version). In: Aromataris E, Munn Z, editors. JBI manual for evidence synthesis. Adelaide: JBI; 2020. chap 11, pp. 458–71. doi: http://doi.org/10.46658/JBIMES-20-12.
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).

Na identificação de artigos relevantes à temática, pesquisamos nas seguintes bases e/ou bibliotecas: SciELO, SCOPUS, CINAHL, PUBMED, BDENF (Via BVS). Além disso, fizemos a busca manual e reversa nas referências bibliográficas dos artigos identificados. Quanto aos descritores, consideramos os preconizados da Medical Subject Headings (MESH) da National Library of Medicine (NLM) dos Estados Unidos, bem como os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS). Para ampliar o retorno, os operadores booleanos foram utilizados desta forma: i – fase exploratória: (Enfermagem OR Nursing OR Soins Infirmiéres OR Enferm*) AND (Cuidado OR Care OR Soins) AND (Gênero OR Gender OR Genero); ii – fase de aperfeiçoamento: (care OR practice) AND (gender) AND (nursing) AND (research OR studie). O string de busca, realizado em 31 de janeiro de 2023, está descrito no Quadro 1.

Quadro 1
String de busca por bases de dados e fase da revisão – Brasília, DF, 2023.

Extração dos Resultados

Os artigos foram pré-selecionados a partir dos títulos e resumos, sendo realizada, em seguida, a leitura na íntegra das produções. Como recomendação da técnica, a triagem em duas etapas (leitura dos títulos e resumos; leitura na íntegra), a extração de dados e a análise dos resultados foram realizadas por duas avaliadoras de forma independente. As divergências foram decididas por uma terceira(1212. Nyanchoka L, Tudur-Smith C, Thu VN, Iversen V, Tricco AC, Porcher R. A scoping review describes methods used to identify, prioritize and display gaps in health research. J Clin Epidemiol. 2019;109:99–110. doi: http://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2019.01.005. PubMed PMID: 30708176.
https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2019....
,1313. Peters MDJ, Godfrey C, McInerney P, Munn Z, Tricco AC, Khalil H. Scoping Reviews (2020 version). In: Aromataris E, Munn Z, editors. JBI manual for evidence synthesis. Adelaide: JBI; 2020. chap 11, pp. 458–71. doi: http://doi.org/10.46658/JBIMES-20-12.
https://doi.org/10.46658/JBIMES-20-12...
). Recorremos aos softwares Zotero® para gerenciamento de referências e Rayyan® para tomada de decisão na fase de triagem. Na extração dos resultados, o programa Microsoft Excel possibilitou a organização das produções por ano, título, autoria, local de publicação, idioma, metodologia, objetivo e concepção de cuidado.

Para a análise do cuidado na perspectiva de gênero, adaptamos o instrumento de extração de dados recomendado pelo JBI(1313. Peters MDJ, Godfrey C, McInerney P, Munn Z, Tricco AC, Khalil H. Scoping Reviews (2020 version). In: Aromataris E, Munn Z, editors. JBI manual for evidence synthesis. Adelaide: JBI; 2020. chap 11, pp. 458–71. doi: http://doi.org/10.46658/JBIMES-20-12.
https://doi.org/10.46658/JBIMES-20-12...
) com a inclusão das seguintes questões, elaboradas a partir das dimensões gênero(1111. Butler J, Miguens F, Rodrigues C. Gênero em tradução: além do monolinguismo, de Judith Butler. Cad Ética Filos Polít. 2021 Dec 21 [cited 2023 Jun 5];39(2):364–87. Available from: https://www.revistas.usp.br/cefp/article/view/191642.
https://www.revistas.usp.br/cefp/article...
), trabalho do cuidado(22. Tronto J. ¿Riesgo o cuidado? Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Fundación Medifé Edita; 2020 [cited 2023 Mar 2]. Available from: https://www.fundacionmedife.com.ar/sites/default/files/Edita/Horizontes-Del-Cuidado/Riesgo-o-cuidado.pdf.
https://www.fundacionmedife.com.ar/sites...
) e estereótipo da “cuidadora natural”(11. Pires MRGM, Fonseca RMGS, Padilla B. A politicidade do cuidado na crítica aos estereótipos de gênero. Rev Bras Enferm. 2016;69(6):1223–30. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0441. PubMed PMID: 27925101.
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0...
): 1 – O artigo aborda a questão de gênero em perspectiva feminista e contesta a relação binária? 2 – As abordagens de cuidado discutem as relações de poder e de gênero intrínsecas ao trabalho do cuidado? 3 – A produção científica reflete sobre as repercussões das desigualdades de gênero no trabalho da enfermagem? 4 – O artigo reedita valores morais, discursos ou práticas de que as mulheres “nasceram para cuidar”? Na crítica do estereótipo, consideramos as produções que contemplam afirmativamente pelo menos uma das questões de 1 a 3. Para a reedição, classificamos aqueles com ausência de discussão das dimensões de gênero e trabalho do cuidado, com reafirmação do estereótipo da cuidadora natural. Aqueles que descreveram a problemática da desigualdade, sem análise ou posicionamento, consideramos reedição.

Análise e Apresentação dos Resultados

Na sistematização dos resultados, realizamos a análise de conteúdo dos artigos com a extração das respectivas categorias empíricas. Para isso, inicialmente procedemos a leitura na íntegra do material flutuante, com destaque de trechos considerados relevantes para a investigação, no que se refere à reedição ou à crítica dos estereótipos de gênero na produção científica da enfermagem. Em seguida, produzimos planilhas no Microsoft Excel com a classificação dos 25 artigos segundo respostas às quatro perguntas norteadoras elaboradas (1 – O artigo aborda a questão de gênero em perspectiva feminista e contesta a relação binária? 2 – As abordagens de cuidado discutem as relações de poder e de gênero intrínsecas ao trabalho do cuidado? 3 – A produção científica reflete sobre as repercussões das desigualdades de gênero no trabalho da enfermagem? 4 – O artigo reedita valores morais, discursos ou práticas de que as mulheres “nasceram para cuidar”?). Cada artigo foi analisado conforme reedição ou crítica dos estereótipos, com extração de trechos representativos para justificar cada resposta às perguntas norteadoras. A partir dessa primeira tipificação, realizamos a extração de seis categorias empíricas do conteúdo selecionado, sendo três representativas de reedição e três que informam a crítica dos estereótipos de gênero. As categorias empíricas extraídas dos artigos foram as seguintes. Reedição: a) cuidado essencialmente feminino; b) chamado e serviço do amor; c) apagamento das desigualdades de gênero. Crítica: d) cuidado “inadequado e danoso”; e) neutralização do gênero e dos corpos; f) denúncia das opressões no trabalho do cuidado. Para efeitos de maior visualização objetiva do mapeamento e discussão das evidências, optamos pela classificação em números e percentuais da quantidade de artigos agrupados em cada uma dessas categorias. Na apresentação dos resultados, utilizamos o fluxograma de PRISMA, um quadro com a caracterização dos 25 estudos e outro com a exemplificação dos trechos representativos da reedição ou da crítica do estereótipo de gênero, conforme o caso. No quadro 2, referente a descrição dos 25 estudos, estabelecemos códigos de identificação (ID) para cada uma das produções incluídas, numeradas de E1 a E25.

Quadro 2
Caracterização dos artigos incluídos na revisão de escopo por título resumido, local de publicação, objetivo, participantes e metodologia – Brasília, DF, 2024.

Disponibilidade de Dados

Conforme preconizado pela Ciência Aberta, os dados de pesquisa foram depositados em repositório de acesso público, sob o link: https://doi.org/10.48331/scielodata.VKXGGD.

RESULTADOS

Retornaram da busca 3.743 estudos, que, com a remoção dos duplicados, resultaram em 2.529. Na primeira etapa de triagem, por meio da leitura do título e do resumo, foram excluídos 2.462 artigos. Na segunda etapa de triagem, 67 artigos foram lidos na íntegra e 42 foram excluídos pelos seguintes motivos: população não era a enfermagem (n = 24); o cuidado não era o conceito abordado (n = 7); e não contextualizavam o estereótipo de gênero (n = 11). A amostra final foi composta por 25 estudos. A Figura 1 apresenta o fluxograma PRISMA(1414. Page MJ, McKenzie JE, Bossuyt PM, Boutron I, Hoffmann TC, Mulrow CD, et al. The PRISMA 2020 statement: an updated guideline for reporting systematic reviews. BMJ. 2021;372(71):n71. doi: http://doi.org/10.1136/bmj.n71. PubMed PMID: 33782057.
https://doi.org/10.1136/bmj.n71...
) da presente revisão.

Figura 1
Fluxograma PRISMA de seleção dos estudos.

O Quadro 2 apresenta a descrição dos 25 artigos incluídos na presente revisão em relação a identificação do estudo, título, local e ano de publicação, objetivo, participantes e metodologia. O Quadro 3 analisa a reedição ou a crítica presente nas produções quanto ao estereótipo da cuidadora natural, com exemplificação de citação direta extraída dos respectivos artigos. Todas as traduções realizadas nesses quadros são de nossa responsabilidade.

Quadro 3
Análise das abordagens do cuidado na produção científica de enfermagem incluída na revisão de escopo em relação ao estereótipo da cuidadora natural, segundo resultado e trecho exemplificador – Brasil, Brasília, DF, 2024.

Das 25 produções incluídas, a pesquisa qualitativa (n = 15; 60%) foi o método predominante, com presença de reflexões ou ensaios teóricos (n = 4; 16%), revisões narrativas ou sistemáticas de literatura (n = 3; 12%), bem como estudo quantitativo (n = 3; 12%). Quanto aos locais de publicação, concentraram-se em periódicos do Brasil (n = 18; 48%), da Inglaterra (n = 3; 12%), da Colômbia (n = 2; 8%), da Espanha (n = 2; 8%) e do México (n = 2; 8%). Os demais (n = 4; 16%) se distribuíram entre Cuba, Escócia, EUA e Canadá. Dentre as regiões globais, as produções se concentraram nas Américas (n = 19; 76%) e na Europa (n = 6; 24%). Acerca do ano de publicação, um maior número de artigos ocorreu no período de 2014 a 2019 (n = 14; 56%), seguidos dos intervalos de 1996 a 2013 (n = 6; 24%) e de 2020 a 2022 (n = 5; 20%). Na distribuição temporal dos artigos entre críticos (n = 11; 44%) ou reeditores do estereótipo (n = 14; 66%), não verificamos regularidades dignas de notas.

As pesquisas incluídas na revisão apresentam os seguintes objetos de estudo (Quadro 2): i-experiências, práticas, concepções, racionalidade e/ou aprendizados dos homens na enfermagem (E1; E2; E18; E20); ii-conceitos de cuidar ou de enfermagem para estudantes, enfermeiras(os) e/ou cuidadores de ambos os sexos (E12; E14; E17; E19; E24); iii-Tarefas e/ou éticas moralizantes do cuidado como feminino/maternal (E5; E10; E11; E15; E16); iv- Teorizações sobre a dimensão política, a perspectiva de gênero e/ou a sexualidade no cuidado na enfermagem (E3; E6; E7; E23; E25); v- Análises da perspectiva de gênero no ensino, na produção da enfermagem, no cuidado, na escolha da profissão e/ou nas desigualdades do trabalho do cuidado (E4; E8; E9; E13; E21; E22). Os sujeitos participantes das investigações incluíram as(os) estudantes de enfermagem (n = 968; 81,4%), distribuídos entre mulheres (n = 514; 53%), homens (n = 390; 40,2%) ou sem especificação (n = 43; 4,4%); estudantes mulheres dos cursos de pedagogia, enfermagem ou administração (n = 21; 2,2%); enfermeiras (n = 58; 79,4%); enfermeiros (n = 15;20,5%); cuidadoras mulheres (n = 66; 71,7%); cuidadores homens (n = 26; 28,2%); mulheres de baixa renda (n = 56;4,7%).

Embora a maioria dos artigos reproduza acriticamente o estereótipo da cuidadora natural (n = 14; 56%), as resistências epistêmicas (n = 11; 44%) criticam as desigualdades de gênero na profissão, constituindo-se em contraponto explícito. As evidências mapeadas foram agrupadas em seis categorias inter-relacionadas, sendo três para a reedição e três para a crítica do estereótipo da cuidadora natural. As categorias, com as respectivas referencias, são as seguintes: reedição: a) cuidado como essencialmente feminino (E1; E2; E10; E12; E15; E17; E18; E19; E20) (1515. Paterson BL, Tschikota S, Crawford M, Saydak M, Venkatesh P, Aronowitz T. Learning to care: gender issues for male nursing students. Can J Nurs Res. 1996;28(1):25–39.,1616. Milligan F. The concept of care in male nurse work: an ontological hermeneutic study in acute hospitals. J Adv Nurs. 2001;35(1):7–16. doi: http://doi.org/10.1046/j.1365-2648.2001.01818.x. PubMed PMID: 11442677.
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,2323. Rodrigues BC, de Lima MF, Neto BM, de Oliveira GL, de Paula Corrêa AC, Higarashi IH. Being a mother and a nurse: issues about gender and overlapping social roles. Rev Rene. 2017;18(1):91–8. doi: http://doi.org/10.15253/2175-6783.2017000100013.
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); b) cuidado como chamado e serviço do amor (E5; E11; E24) (1919. Burgos S, Cecilia B. Nursing care from the perspective of ethics of care and of gender. Invest Educ Enferm. 2013;31(2):243–51. doi: http://doi.org/10.17533/udea.iee.12105.
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); c) inocuidade/apagamento das desigualdades de gênero (E14; E16) (2727. Olea-Gutiérrez CV, Zavala-Pérez IC, Salas-Medina DL, Rivas MX. Structure and organization of social representations of caring concept in caregivers of people with chronic disease. Rev Enferm Inst Mex Seguro Soc. 2018 [cited 2023 Mar 2];26(3):161–70. Available from: https://www.medigraphic.com/pdfs/enfermeriaimss/eim-2018/eim183b.pdf.
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); crítica: d) cuidado “inadequado e danoso” (E3; E4; E23; E25); (77. Burton CW. Paying the caring tax: the detrimental influences of gender expectations on the development of nursing education and science. ANS Adv Nurs Sci. 2020;43(3):266–77. doi: http://doi.org/10.1097/ANS.0000000000000319. PubMed PMID: 32732607.
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,1818. Amorim RD. Gender issue in Nursing teaching. Rev Enferm UERJ. 2009 [cited 2023 Mar 2];17(1):64–8. Available from: http://www.revenf.bvs.br/pdf/reuerj/v17n1/v17n1a12.pdf.
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,3737. Rabelo AR, Silva KL. Let it not be that nursing that asks for silence: participation in social movements and sociopolitical-emancipatory knowledge. Rev Bras Enferm. 2022;75(4):e20210630. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2021-0630. PubMed PMID: 35442312.
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) e) neutralização do gênero e dos corpos (E6; E8; E9)(2020. Costa LH, Coelho ED. Sexuality and the intersection with caring in the nurse’s professional practice. Rev Bras Enferm. 2013;66(4):493–500. doi: http://doi.org/10.1590/S0034-71672013000400005. PubMed PMID: 24008701.
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2222. Galindo Huertas MS, Herrera Giraldo SL. La categoría de género en la investigación y producción de conocimiento en enfermería en Iberoamérica: aportes para el debate. Ventana. 2017;5(46):177–201. doi: http://doi.org/10.32870/lv.v5i46.6041.
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); f) denúncia das opressões de gênero no trabalho do cuidado (E7; E13; E22) (11. Pires MRGM, Fonseca RMGS, Padilla B. A politicidade do cuidado na crítica aos estereótipos de gênero. Rev Bras Enferm. 2016;69(6):1223–30. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0441. PubMed PMID: 27925101.
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,2626. Souza ID, Pereira JD, Silva EM. Between State, society and family: the care of female caregivers. Rev Bras Enferm. 2018;71(suppl 6):2720–7. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0111. PubMed PMID: 30540049.
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,3535. Cascella Carbó GF, García-Orellán R. Burden and gender inequalities around informal care. Invest Educ Enferm. 2020;38(1). doi: http://doi.org/10.17533/udea.iee.v38n1e10. PubMed PMID: 32124578.
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).

Dentre os resultados dos estudos que reeditam os estereótipos de gênero na enfermagem (n = 14; 66%), verificamos ratificações das concepções binárias de gênero (n = 5;20%), reprodutoras de estereótipos que rotulam a emoções como atributo feminino e a razão como masculina (E1; E2; E18; E19; E-20). Incluem-se nesse grupo os estudos quantitativos que analisam as experiencias dos homens na enfermagem (E1; E2; E20), com a hegemonia de pesquisadores masculinos na autoria. Outras investigações reproduziram conceitos de cuidado como sinônimo de amor, altruísmo, feminilidade ou como função procriadora, com evidente violência de gênero sobre as mulheres (E5; E11; E12; E14; E17). A essencialização da “cuidadora natural” como enfermeira, mãe e mulher se manifesta fortemente nas produções que se propuseram a refletir sobre o trabalho do cuidado (E10; E14; E15; E16). As produções que ratificam os estereótipos de gênero na enfermagem invisibilizam nas análises os recortes por população estudada (estudantes, profissionais de enfermagem ou cuidadoras(es), mulheres). Ou seja, eles tendem a tratar os sujeitos como um bloco homogêneo, sem maiores diferenciações de gênero, classe social, raça ou geração na discussão dos resultados.

Por sua vez, os artigos que criticam os estereótipos de gênero na enfermagem (n = 11; 44%), embora partam de objetos de estudo e sujeitos semelhantes, diferenciam-se pela problematização das análises realizadas. Alguns desses, sobretudo teóricos e qualitativos, assumem a centralidade do político no conceito e na prática da profissão (E3; E7; E25). Outros denunciam a naturalização do cuidado como essencialmente feminino, desvelando as injustiças discursivas (E4; E8; E9; E13; E21). A enfermagem como prática social, bem como os questionamentos dos sexismos e das desigualdades de gênero assumem destaque em parte das pesquisas críticas (E6; E21; E23). Nas pesquisas qualitativas dos artigos classificados como críticos, os recortes de gênero na população estudada são priorizados nas análises realizadas (E4; E6; E13; E21; e25).

DISCUSSÃO

A concentração de artigos publicados em periódicos da região global das Américas (n = 19; 76%) pode ser explicada pelos mecanismos de busca da fase exploratória (BDENF via BVS) e pela preponderância de estudos da América do Sul na base SciELO. A despeito dessa limitação, a preferência por pesquisas clínicas e epidemiológicas dos periódicos da saúde, pouco afeitos às discussões epistêmicas do cuidado, pode ter contribuído para as escassas produções oriundas de outras regiões globais, merecendo aprofundamentos.

Face às características complexas do cuidado, as metodologias qualitativas presentes nos artigos são adequadas ao estudo do objeto, por permitirem o aprofundamento de singularidades. Entretanto, se considerarmos a interdisciplinaridade da epistemologia feminista à crítica dos estereótipos de gênero(22. Tronto J. ¿Riesgo o cuidado? Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Fundación Medifé Edita; 2020 [cited 2023 Mar 2]. Available from: https://www.fundacionmedife.com.ar/sites/default/files/Edita/Horizontes-Del-Cuidado/Riesgo-o-cuidado.pdf.
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44. Biroli F, Quintela DF. Sexual division of labor, separation and hierarchy: contributions to the analysis of the gender of democracies. Rev. Pol & Trab. 2021 Mar 23 [cited 2023 Mar 2]; 1(53):72–89. Available from: https://periodicos.ufpb.br/index.php/politicaetrabalho/article/view/51417.
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,1212. Nyanchoka L, Tudur-Smith C, Thu VN, Iversen V, Tricco AC, Porcher R. A scoping review describes methods used to identify, prioritize and display gaps in health research. J Clin Epidemiol. 2019;109:99–110. doi: http://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2019.01.005. PubMed PMID: 30708176.
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), as poucas reflexões teóricas produzidas parecem comprometer o potencial crítico da ciência da enfermagem. Como sabemos, as reflexões teóricas dialogam melhor com as abordagens das ciências humanas e sociais, por serem oriundas desses campos. Nesse contexto, ressaltamos a capilaridade interdisciplinar nos estudos sobre gênero, haja vista a formação das pesquisadoras dos artigos críticos, quase todas com doutorado, pós-doutorado ou pesquisas na área de gênero, de ciências humanas ou sociais (E3; E4; E6; E7; E8; E9; E13; E21; E22; E23; E25),(11. Pires MRGM, Fonseca RMGS, Padilla B. A politicidade do cuidado na crítica aos estereótipos de gênero. Rev Bras Enferm. 2016;69(6):1223–30. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0441. PubMed PMID: 27925101.
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,77. Burton CW. Paying the caring tax: the detrimental influences of gender expectations on the development of nursing education and science. ANS Adv Nurs Sci. 2020;43(3):266–77. doi: http://doi.org/10.1097/ANS.0000000000000319. PubMed PMID: 32732607.
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,1717. Pires MRGM. Politicity of care as an emancipatory reference for nursing: getting to know to care better, delivering care to confront, delivering care to emancipate. Rev Lat Am Enfermagem. 2005;13(5):729–36. doi: http://doi.org/10.1590/S0104-11692005000500018. PubMed PMID: 16308631.
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,1818. Amorim RD. Gender issue in Nursing teaching. Rev Enferm UERJ. 2009 [cited 2023 Mar 2];17(1):64–8. Available from: http://www.revenf.bvs.br/pdf/reuerj/v17n1/v17n1a12.pdf.
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,2020. Costa LH, Coelho ED. Sexuality and the intersection with caring in the nurse’s professional practice. Rev Bras Enferm. 2013;66(4):493–500. doi: http://doi.org/10.1590/S0034-71672013000400005. PubMed PMID: 24008701.
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,2121. Rangel Flores YY, Mendoza Hernández A, Hernández Ibarra LE, Cruz Ortiz M, Pérez Rodríguez M, Gaytán Hernández D. Contributions of gender in the investigation of primary caregivers of dependent people. Index Enferm. 2017 [cited 2023 Mar 2];26(3):157–61. Available from: https://scielo.isciii.es/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1132-12962017000200008.
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,2626. Souza ID, Pereira JD, Silva EM. Between State, society and family: the care of female caregivers. Rev Bras Enferm. 2018;71(suppl 6):2720–7. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0111. PubMed PMID: 30540049.
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) o que repercutiu nas produções das autoras. Assim, a coincidência entre os artigos críticos e a interdisciplinaridade na titulação das pesquisadoras indica a necessidade de ampliarmos a formação de enfermeiras para a análise crítica das questões de gênero na profissão, em diálogo com a epistemologia feminista.

O gênero como categoria de análise que problematiza o essencialismo da “Mulher” (letra maiúscula como denúncia ao totalitarismo e a rigidez semântica) foi a grande contribuição da epistemologia feminista às ciências(22. Tronto J. ¿Riesgo o cuidado? Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Fundación Medifé Edita; 2020 [cited 2023 Mar 2]. Available from: https://www.fundacionmedife.com.ar/sites/default/files/Edita/Horizontes-Del-Cuidado/Riesgo-o-cuidado.pdf.
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44. Biroli F, Quintela DF. Sexual division of labor, separation and hierarchy: contributions to the analysis of the gender of democracies. Rev. Pol & Trab. 2021 Mar 23 [cited 2023 Mar 2]; 1(53):72–89. Available from: https://periodicos.ufpb.br/index.php/politicaetrabalho/article/view/51417.
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,1212. Nyanchoka L, Tudur-Smith C, Thu VN, Iversen V, Tricco AC, Porcher R. A scoping review describes methods used to identify, prioritize and display gaps in health research. J Clin Epidemiol. 2019;109:99–110. doi: http://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2019.01.005. PubMed PMID: 30708176.
https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2019....
). Consequentemente, a perspectiva do gênero(1111. Butler J, Miguens F, Rodrigues C. Gênero em tradução: além do monolinguismo, de Judith Butler. Cad Ética Filos Polít. 2021 Dec 21 [cited 2023 Jun 5];39(2):364–87. Available from: https://www.revistas.usp.br/cefp/article/view/191642.
https://www.revistas.usp.br/cefp/article...
) introduziu um relevante enfoque questionador aos resultados discursivos das investigações revisadas. Constatamos esse diferencial nas produções que assumiram a centralidade do político nas concepções e nas práticas da enfermagem (E3; E7; E25), nos que denunciaram a naturalização do cuidado como feminino (E4; E8; E9; E13; E21) ou naqueles que questionaram os sexismos e as iniquidades de gênero na profissão (E6; E21; E23).

Por seu turno, a hegemonia do positivismo, do tecnicismo e do produtivismo nas profissões da saúde(3838. Cavalcanti FMS, Amaral MVB. Technique fetishism and value production in the health professional’s work. Rev Katálysis. 2020;23(3):658–66. doi: http://doi.org/10.1590/1982-02592020v23n3p658.
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) – mantenedora do modelo biomédico, patriarcal, mercadológico e socialmente injusto para as mulheres(22. Tronto J. ¿Riesgo o cuidado? Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Fundación Medifé Edita; 2020 [cited 2023 Mar 2]. Available from: https://www.fundacionmedife.com.ar/sites/default/files/Edita/Horizontes-Del-Cuidado/Riesgo-o-cuidado.pdf.
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55. Machado MH, Koster I, Aguiar Filho W, Wermelinger MCMW, Freire NP, Pereira EJ. Labor market and regulatory processes – Nursing in Brazil. Cien Saude Colet. 2020;25(1):101–12. doi: http://doi.org/10.1590/1413-81232020251.27552019. PubMed PMID: 31859859.
https://doi.org/10.1590/1413-81232020251...
) – retroalimenta a insuficiência de teorizações críticas na área. Soma-se a isso o quase inexistente espaço dedicado às reflexões teóricas nos periódicos da saúde, pressionados pelo utilitarismo da ciência, o que desestimula pesquisas com pendor reflexivo e político sobre o cuidado. Esse cenário positivista, atrelado à historicidade da enfermagem imersa em ideologias sexistas, racistas e elitistas,(3939. Ferreira SC, Caitano de Jesus L, Pinto AJCC. The production of healthcare knowledge from the perspective of ethnic-racial, class and gender intersectionalities in Brazil. Cenas Educ. 2021 [cited 2023 Mar 2]; 4:e11858. Available from: https://www.revistas.uneb.br/index.php/cenaseducacionais/article/view/11858.
https://www.revistas.uneb.br/index.php/c...
) conforma a insuficiência crítica dos artigos que reproduziram os estereótipos de gênero. Mais da metade dessas produções reafirma o cuidado como “essencialmente feminino”, sem qualquer filtro sobre o caráter opressivo para nós, mulheres.(22. Tronto J. ¿Riesgo o cuidado? Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Fundación Medifé Edita; 2020 [cited 2023 Mar 2]. Available from: https://www.fundacionmedife.com.ar/sites/default/files/Edita/Horizontes-Del-Cuidado/Riesgo-o-cuidado.pdf.
https://www.fundacionmedife.com.ar/sites...
,33. Spinelli L. Joan Tronto: relational responsibility, recognition of privileges and vulnerability. Princípios. 2022 Feb 28 [cited 2023 Mar 2]; 29(58):66–83. Available from: https://periodicos.ufrn.br/principios/article/view/23774.
https://periodicos.ufrn.br/principios/ar...
,44. Biroli F, Quintela DF. Sexual division of labor, separation and hierarchy: contributions to the analysis of the gender of democracies. Rev. Pol & Trab. 2021 Mar 23 [cited 2023 Mar 2]; 1(53):72–89. Available from: https://periodicos.ufpb.br/index.php/politicaetrabalho/article/view/51417.
https://periodicos.ufpb.br/index.php/pol...
,1212. Nyanchoka L, Tudur-Smith C, Thu VN, Iversen V, Tricco AC, Porcher R. A scoping review describes methods used to identify, prioritize and display gaps in health research. J Clin Epidemiol. 2019;109:99–110. doi: http://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2019.01.005. PubMed PMID: 30708176.
https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2019....
)

Perfazem os resultados das produções acríticas na enfermagem as concepções restritas ao binarismo de gênero (E1; E2; E18; E19; E-20), repletos de estereótipos moralizantes sobre o cuidado, repercutindo em violências para as mulheres, enfermeiras ou não (E5; E11; E12; E14; E17). As desigualdades do trabalho do cuidado(22. Tronto J. ¿Riesgo o cuidado? Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Fundación Medifé Edita; 2020 [cited 2023 Mar 2]. Available from: https://www.fundacionmedife.com.ar/sites/default/files/Edita/Horizontes-Del-Cuidado/Riesgo-o-cuidado.pdf.
https://www.fundacionmedife.com.ar/sites...
44. Biroli F, Quintela DF. Sexual division of labor, separation and hierarchy: contributions to the analysis of the gender of democracies. Rev. Pol & Trab. 2021 Mar 23 [cited 2023 Mar 2]; 1(53):72–89. Available from: https://periodicos.ufpb.br/index.php/politicaetrabalho/article/view/51417.
https://periodicos.ufpb.br/index.php/pol...
) são igualmente invisibilizadas no preconceito da “cuidadora natural”, por vezes associado a uma indistinção ideológica entre enfermeira, cuidadora e mãe (E10; E14; E15; E16). Como traço comum ao positivismo biomédico(3838. Cavalcanti FMS, Amaral MVB. Technique fetishism and value production in the health professional’s work. Rev Katálysis. 2020;23(3):658–66. doi: http://doi.org/10.1590/1982-02592020v23n3p658.
https://doi.org/10.1590/1982-02592020v23...
), destacamos o total apagamento das diferenças de gênero, classe, raça ou geração no segmento populacional investigado, característica da pretensa neutralidade científica, geradora de iniquidades. Outrossim, observamos rígida demarcação nos papéis de gênero, com subordinação das mulheres, nos artigos que se propuseram a investigar a presença dos homens na enfermagem (E1; E2; E20), em sua maioria com autoria masculina. Este achado desvela a suposta isenção da ciência positiva e dos pesquisadores (notadamente homens), delineando as visões machistas e a autorreferencia dos discursos estereotipados da profissão. Dizendo mais claramente: pesquisadores homens tenderam a investigar a si próprio na enfermagem, com reprodução dos seus sexismos. Seria redundância dizer que as injustiças de classe, raça, gênero e geração conformam a historicidade da enfermagem, portanto os discursos estigmatizados apenas nos vituperam(1111. Butler J, Miguens F, Rodrigues C. Gênero em tradução: além do monolinguismo, de Judith Butler. Cad Ética Filos Polít. 2021 Dec 21 [cited 2023 Jun 5];39(2):364–87. Available from: https://www.revistas.usp.br/cefp/article/view/191642.
https://www.revistas.usp.br/cefp/article...
,3838. Cavalcanti FMS, Amaral MVB. Technique fetishism and value production in the health professional’s work. Rev Katálysis. 2020;23(3):658–66. doi: http://doi.org/10.1590/1982-02592020v23n3p658.
https://doi.org/10.1590/1982-02592020v23...
,3939. Ferreira SC, Caitano de Jesus L, Pinto AJCC. The production of healthcare knowledge from the perspective of ethnic-racial, class and gender intersectionalities in Brazil. Cenas Educ. 2021 [cited 2023 Mar 2]; 4:e11858. Available from: https://www.revistas.uneb.br/index.php/cenaseducacionais/article/view/11858.
https://www.revistas.uneb.br/index.php/c...
).

Verificamos reforço do estereótipo de gênero nos discursos da enfermagem nas afirmações de que “aspectos do cuidado vieram naturalmente”15 para as “colegas mulheres” (E1)(1515. Paterson BL, Tschikota S, Crawford M, Saydak M, Venkatesh P, Aronowitz T. Learning to care: gender issues for male nursing students. Can J Nurs Res. 1996;28(1):25–39.), pois “uma vinculação de gênero entre cuidado e feminilidade” (1616. Milligan F. The concept of care in male nurse work: an ontological hermeneutic study in acute hospitals. J Adv Nurs. 2001;35(1):7–16. doi: http://doi.org/10.1046/j.1365-2648.2001.01818.x. PubMed PMID: 11442677.
https://doi.org/10.1046/j.1365-2648.2001...
) é “cada vez mais […] necessária para transmitir o cuidado” (E2)(1616. Milligan F. The concept of care in male nurse work: an ontological hermeneutic study in acute hospitals. J Adv Nurs. 2001;35(1):7–16. doi: http://doi.org/10.1046/j.1365-2648.2001.01818.x. PubMed PMID: 11442677.
https://doi.org/10.1046/j.1365-2648.2001...
). Noutras vozes, lemos que “o modo de ser feminino”(2323. Rodrigues BC, de Lima MF, Neto BM, de Oliveira GL, de Paula Corrêa AC, Higarashi IH. Being a mother and a nurse: issues about gender and overlapping social roles. Rev Rene. 2017;18(1):91–8. doi: http://doi.org/10.15253/2175-6783.2017000100013.
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) predispõe a uma “sensibilidade e envolvimento pessoal com o sofrimento alheio” (E10),(2323. Rodrigues BC, de Lima MF, Neto BM, de Oliveira GL, de Paula Corrêa AC, Higarashi IH. Being a mother and a nurse: issues about gender and overlapping social roles. Rev Rene. 2017;18(1):91–8. doi: http://doi.org/10.15253/2175-6783.2017000100013.
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) posto que as mulheres “aprenderam o papel de cuidadora […] e aprimoraram suas habilidades participando do cuidado diário dos filhos” (E15).(2828. Veras MP. Gender and informal care: different sense and meanings for men and women. Rev Enferm UFPI. 2019;8(1):11–6. doi: http://doi.org/10.26694/2238-7234.8111-16.
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) Nessas produções, a “Mulher” é vista como uma “receptora do ensino-aprendizagem do cuidado”,(3030. Becerra AC, Tole MG, Escobar LM. Meaning of care before starting Nursing professional training. Revista Cubana de Educación Médica Superior. 2018 [cited 2023 Mar 2]; 32(3):133–46. Available from: https://www.medigraphic.com/pdfs/educacion/cem-2018/cem183k.pdf.
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) entendido como uma “função social” que seria “praticamente exclusiva devido a sua capacidade de procriar”(3030. Becerra AC, Tole MG, Escobar LM. Meaning of care before starting Nursing professional training. Revista Cubana de Educación Médica Superior. 2018 [cited 2023 Mar 2]; 32(3):133–46. Available from: https://www.medigraphic.com/pdfs/educacion/cem-2018/cem183k.pdf.
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) (E17).

Nas categorias a) cuidado como essencialmente feminino e b) cuidado como chamado e serviço do amor, observamos o enraizamento de papéis de gênero que tipificam a mulher como sensível, emotiva e com pouco uso da razão, reeditado nos discursos das pesquisadoras. Essas enfermeiras defendem, sem filtros, que “as mulheres são mais preocupadas com aspectos relacionais” (E19).(3232. Trinidad MF, Pascual JL, García MR. Perception of caring among nursing students: results from a cross-sectional survey. Nurse Educ Today. 2019;83:104196. doi: http://doi.org/10.1016/j.nedt.2019.08.014. PubMed PMID: 31479980.
https://doi.org/10.1016/j.nedt.2019.08.0...
) A mesma reprodução dos estereótipos de gênero se verifica numa pesquisa com estudantes de graduação em enfermagem, donde se conclui que “a feminilidade das alunas”(3131. Liu NY, Hsu WY, Hung CA, Wu PL, Pai HC. The effect of gender role orientation on student nurses’ caring behaviour and critical thinking. Int J Nurs Stud. 2019;89:18–23. doi: http://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2018.09.005. PubMed PMID: 30316956.
https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2018....
) está “associada ao comportamento do cuidar”(3131. Liu NY, Hsu WY, Hung CA, Wu PL, Pai HC. The effect of gender role orientation on student nurses’ caring behaviour and critical thinking. Int J Nurs Stud. 2019;89:18–23. doi: http://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2018.09.005. PubMed PMID: 30316956.
https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2018....
), enquanto que “maior masculinidade”(3131. Liu NY, Hsu WY, Hung CA, Wu PL, Pai HC. The effect of gender role orientation on student nurses’ caring behaviour and critical thinking. Int J Nurs Stud. 2019;89:18–23. doi: http://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2018.09.005. PubMed PMID: 30316956.
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) se relaciona ao “pensamento crítico” (E18)(3131. Liu NY, Hsu WY, Hung CA, Wu PL, Pai HC. The effect of gender role orientation on student nurses’ caring behaviour and critical thinking. Int J Nurs Stud. 2019;89:18–23. doi: http://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2018.09.005. PubMed PMID: 30316956.
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). Intrinsecamente imbricada nessas distorções, a visão do cuidado como um “chamado de serviço” do amor complementa o tom discriminatório dos discursos que nos agridem, sem qualquer filtro, manifestados pelas autoras. Por fim, na categoria c) inocuidade das desigualdades, as pesquisadoras apagaram as injustiças relacionadas ao gênero, visto como sinônimo de sexo, associado à exaltação estereotipada acrítica da “supermulher” (E16)(2929. Ruiz IJ, Nicolás MM. The family caregiver: the naturalized sense of obligation in women to be caregivers. Enfermería Global. 2018 [cited 2023 Mar 2]; 17(1):420–47. Available from: https://revistas.um.es/eglobal/article/view/292331/220741.
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), como se fosse um fenômeno imutável e biologicamente determinado.

Destacamos um trecho que sintetiza o estereótipo da “cuidadora natural” sem parcimônia, reforçando violências simbólicas contra nós, mulheres enfermeiras, o qual merece profundas reflexões. Referimo-nos ao estudo que considera a enfermagem não como um trabalho, uma prática social ou uma profissão histórica, mas “uma qualidade que algumas pessoas possuem de forma inata”,(2525. Pedrosa OR, Caïs J, Monforte-Royo C. Emergence of the nursing model transmitted in Spanish universities: an analytical approach through Grounded Theory. Cien Saude Colet. 2018;23(1):41–50. doi: http://doi.org/10.1590/1413-81232018231.21132017. PubMed PMID: 29267810.
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) a qual leva a uma “predisposição especial, chamada vocação, para ajudar os outros”(2525. Pedrosa OR, Caïs J, Monforte-Royo C. Emergence of the nursing model transmitted in Spanish universities: an analytical approach through Grounded Theory. Cien Saude Colet. 2018;23(1):41–50. doi: http://doi.org/10.1590/1413-81232018231.21132017. PubMed PMID: 29267810.
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). A enfermagem, reiteram as colegas sem qualquer ressalva, seria “uma atividade vinculada a mulher e relacionada à maternidade”(2525. Pedrosa OR, Caïs J, Monforte-Royo C. Emergence of the nursing model transmitted in Spanish universities: an analytical approach through Grounded Theory. Cien Saude Colet. 2018;23(1):41–50. doi: http://doi.org/10.1590/1413-81232018231.21132017. PubMed PMID: 29267810.
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), a qual “proporciona a motivação e o impulso necessário para cuidar” (E12).(2525. Pedrosa OR, Caïs J, Monforte-Royo C. Emergence of the nursing model transmitted in Spanish universities: an analytical approach through Grounded Theory. Cien Saude Colet. 2018;23(1):41–50. doi: http://doi.org/10.1590/1413-81232018231.21132017. PubMed PMID: 29267810.
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)

Conceber a enfermagem como um atributo feminino, numa visão essencialista imutável, assim como o cuidado como um “impulso” da maternidade, apenas acalenta práticas e discursos sexistas tidos como “naturais” – quando são socialmente produzidos para aprofundar as opressões de gênero na profissão. As autoras do estudo não deixam claro o que entendem por “impulso” (E12)(2525. Pedrosa OR, Caïs J, Monforte-Royo C. Emergence of the nursing model transmitted in Spanish universities: an analytical approach through Grounded Theory. Cien Saude Colet. 2018;23(1):41–50. doi: http://doi.org/10.1590/1413-81232018231.21132017. PubMed PMID: 29267810.
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), quiçá por suporem “dada” e “autoevidente” a natureza essencialmente cuidadora da mulher, portanto isenta de quaisquer questionamentos. Tampouco discorrem sobre as repercussões nefastas para nós, enfermeiras, se considerarmos o cuidado, em vez de uma prática social situada em relações de poderes – portanto em situações estratégicas e flexíveis de domínios passíveis de mudanças pelas correlações de forças(1717. Pires MRGM. Politicity of care as an emancipatory reference for nursing: getting to know to care better, delivering care to confront, delivering care to emancipate. Rev Lat Am Enfermagem. 2005;13(5):729–36. doi: http://doi.org/10.1590/S0104-11692005000500018. PubMed PMID: 16308631.
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) – uma espécie de pulsão freudiana, quer dizer, uma “representação psíquica e endossomática”(4040. Roudinesco E, Plon M. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar; 1998 [cited 2023 Mar 2]. Available from: https://professor.pucgoias.edu.br/SiteDocente/admin/arquivosUpload/8941/material/Roudinesco_Elisabeth_Plon_Michel_Dicionario_de_psicanalise_1998.pdf.
https://professor.pucgoias.edu.br/SiteDo...
) incontrolável. Em suma, lemos nessa produção que a “qualidade inata” da enfermagem (e não o trabalho!) predisporia a ajudar os outros e estaria presente em nós, mulheres-objeto procriadoras, como uma força da natureza contra a qual não podemos lutar, contrapor, resistir ou negar criticamente, apenas aceitar passivamente.

Nada mais avesso às conquistas sociais e políticas que precisamos do que discursos germinadores e incubadores das desigualdades de gênero acerca da “cuidadora natural” nos nossos corpos(1111. Butler J, Miguens F, Rodrigues C. Gênero em tradução: além do monolinguismo, de Judith Butler. Cad Ética Filos Polít. 2021 Dec 21 [cited 2023 Jun 5];39(2):364–87. Available from: https://www.revistas.usp.br/cefp/article/view/191642.
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). Os equívocos, as iniquidades e os danos retroalimentados por esse tipo de ciência, surpreendentemente produzidos pela elite pensante da enfermagem, são prementes. Em flagrante contraste com as idealizações da profissão como “um chamado para servir” (E5)(1919. Burgos S, Cecilia B. Nursing care from the perspective of ethics of care and of gender. Invest Educ Enferm. 2013;31(2):243–51. doi: http://doi.org/10.17533/udea.iee.12105.
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), recordemos brevemente as péssimas condições laborais, as violências, as discriminações, as baixas remunerações, a ausência de piso salarial ou a fragilidade política da categoria nas lutas trabalhistas, entre outras injustiças contextualizadas na introdução(11. Pires MRGM, Fonseca RMGS, Padilla B. A politicidade do cuidado na crítica aos estereótipos de gênero. Rev Bras Enferm. 2016;69(6):1223–30. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0441. PubMed PMID: 27925101.
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0...

2. Tronto J. ¿Riesgo o cuidado? Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Fundación Medifé Edita; 2020 [cited 2023 Mar 2]. Available from: https://www.fundacionmedife.com.ar/sites/default/files/Edita/Horizontes-Del-Cuidado/Riesgo-o-cuidado.pdf.
https://www.fundacionmedife.com.ar/sites...

3. Spinelli L. Joan Tronto: relational responsibility, recognition of privileges and vulnerability. Princípios. 2022 Feb 28 [cited 2023 Mar 2]; 29(58):66–83. Available from: https://periodicos.ufrn.br/principios/article/view/23774.
https://periodicos.ufrn.br/principios/ar...

4. Biroli F, Quintela DF. Sexual division of labor, separation and hierarchy: contributions to the analysis of the gender of democracies. Rev. Pol & Trab. 2021 Mar 23 [cited 2023 Mar 2]; 1(53):72–89. Available from: https://periodicos.ufpb.br/index.php/politicaetrabalho/article/view/51417.
https://periodicos.ufpb.br/index.php/pol...

5. Machado MH, Koster I, Aguiar Filho W, Wermelinger MCMW, Freire NP, Pereira EJ. Labor market and regulatory processes – Nursing in Brazil. Cien Saude Colet. 2020;25(1):101–12. doi: http://doi.org/10.1590/1413-81232020251.27552019. PubMed PMID: 31859859.
https://doi.org/10.1590/1413-81232020251...

6. Teresa-Morales C, Rodríguez-Pérez M, Araujo-Hernández M, Feria-Ramírez C. Current stereotypes associated with nursing and nursing professionals: an integrative review. Int J Environ Res Public Health. 2022;19(13):7640. doi: http://doi.org/10.3390/ijerph19137640. PubMed PMID: 35805296.
https://doi.org/10.3390/ijerph19137640...
-77. Burton CW. Paying the caring tax: the detrimental influences of gender expectations on the development of nursing education and science. ANS Adv Nurs Sci. 2020;43(3):266–77. doi: http://doi.org/10.1097/ANS.0000000000000319. PubMed PMID: 32732607.
https://doi.org/10.1097/ANS.000000000000...
,99. Stokes-Parish J, Barrett D, Elliott R, Massey D, Rolls K, Credland N. Fallen angels and forgotten heroes: a descriptive qualitative study exploring the impact of the angel and hero narrative on critical care nurses. Aust Crit Care. 2023;36(1):3–9. doi: http://doi.org/10.1016/j.aucc.2022.11.008. PubMed PMID: 36470775.
https://doi.org/10.1016/j.aucc.2022.11.0...
). Embora essas falas se expliquem estruturalmente na historicidade da profissão, permeada por ideologias conservadoras, sexistas e racistas que nos vituperam(77. Burton CW. Paying the caring tax: the detrimental influences of gender expectations on the development of nursing education and science. ANS Adv Nurs Sci. 2020;43(3):266–77. doi: http://doi.org/10.1097/ANS.0000000000000319. PubMed PMID: 32732607.
https://doi.org/10.1097/ANS.000000000000...
,1010. Mundim GDA. Abordagens do cuidado na produção científica da enfermagem: reedição ou combate ao estereótipo da “cuidadora natural”? [trabalho de conclusão de curso]. Brasília: Universidade de Brasília; 2021 [cited 2024 Feb 27]. Available from: https://bdm.unb.br/bitstream/10483/33343/1/2022_GabrielaDuarteAlmeidaMundim_tcc.pdf.
https://bdm.unb.br/bitstream/10483/33343...
,1717. Pires MRGM. Politicity of care as an emancipatory reference for nursing: getting to know to care better, delivering care to confront, delivering care to emancipate. Rev Lat Am Enfermagem. 2005;13(5):729–36. doi: http://doi.org/10.1590/S0104-11692005000500018. PubMed PMID: 16308631.
https://doi.org/10.1590/S0104-1169200500...
,3737. Rabelo AR, Silva KL. Let it not be that nursing that asks for silence: participation in social movements and sociopolitical-emancipatory knowledge. Rev Bras Enferm. 2022;75(4):e20210630. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2021-0630. PubMed PMID: 35442312.
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), elas não determinam a totalidade dos discursos científicos da profissão. Outrossim, evidenciam uma maioria que não se percebe aprisionada no próprio discurso, tampouco identifica as repercussões hostis para nós, mulheres, na disseminação acrítica do estereótipo da “cuidadora natural” na enfermagem.

Como resistência no campo científico da profissão, outras produções problematizaram as desigualdades advindas dos estereótipos de gênero, agrupadas nas seguintes categorias: d) cuidado “inadequado e danoso”; e) neutralização do gênero e dos corpos; e f) denúncia das opressões de gênero no trabalho do cuidado. Representantes dessas classificações manifestaram um pensamento divergente amparado na epistemologia feminista, como dissemos acima. Tomamos de empréstimo a expressão do cuidado “inadequado e danoso” (E25)(3737. Rabelo AR, Silva KL. Let it not be that nursing that asks for silence: participation in social movements and sociopolitical-emancipatory knowledge. Rev Bras Enferm. 2022;75(4):e20210630. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2021-0630. PubMed PMID: 35442312.
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2021-0...
), referida num dos artigos, para nomear a primeira categoria crítica. Nas argumentações, as investigadoras apontam o cuidado como uma prática social e política (E3)(1717. Pires MRGM. Politicity of care as an emancipatory reference for nursing: getting to know to care better, delivering care to confront, delivering care to emancipate. Rev Lat Am Enfermagem. 2005;13(5):729–36. doi: http://doi.org/10.1590/S0104-11692005000500018. PubMed PMID: 16308631.
https://doi.org/10.1590/S0104-1169200500...
); questionam as relações hierárquicas estabelecidas entre homens e mulheres no cuidar (E4);(1818. Amorim RD. Gender issue in Nursing teaching. Rev Enferm UERJ. 2009 [cited 2023 Mar 2];17(1):64–8. Available from: http://www.revenf.bvs.br/pdf/reuerj/v17n1/v17n1a12.pdf.
http://www.revenf.bvs.br/pdf/reuerj/v17n...
) denunciam a “imposição de normas associadas ao feminino” (E23)(77. Burton CW. Paying the caring tax: the detrimental influences of gender expectations on the development of nursing education and science. ANS Adv Nurs Sci. 2020;43(3):266–77. doi: http://doi.org/10.1097/ANS.0000000000000319. PubMed PMID: 32732607.
https://doi.org/10.1097/ANS.000000000000...
) e a naturalização da “relação entre cuidado e ação feminina”, assim como as “expectativas maternais das mulheres nos locais de trabalho”(77. Burton CW. Paying the caring tax: the detrimental influences of gender expectations on the development of nursing education and science. ANS Adv Nurs Sci. 2020;43(3):266–77. doi: http://doi.org/10.1097/ANS.0000000000000319. PubMed PMID: 32732607.
https://doi.org/10.1097/ANS.000000000000...
). Os estudos críticos também desvelaram as narrativas opressoras que “culpam, julgam e vitimizam” (E25)(3737. Rabelo AR, Silva KL. Let it not be that nursing that asks for silence: participation in social movements and sociopolitical-emancipatory knowledge. Rev Bras Enferm. 2022;75(4):e20210630. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2021-0630. PubMed PMID: 35442312.
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) as mulheres e o cuidado.

Por sua vez, nos artigos acerca da neutralização do gênero e dos corpos, segunda categoria crítica, as cientistas contestaram a interdição sexual e a negação nos corpos eróticos das enfermeiras (E6);(2020. Costa LH, Coelho ED. Sexuality and the intersection with caring in the nurse’s professional practice. Rev Bras Enferm. 2013;66(4):493–500. doi: http://doi.org/10.1590/S0034-71672013000400005. PubMed PMID: 24008701.
https://doi.org/10.1590/S0034-7167201300...
) problematizaram a “ordem social do gênero” (E8)(2121. Rangel Flores YY, Mendoza Hernández A, Hernández Ibarra LE, Cruz Ortiz M, Pérez Rodríguez M, Gaytán Hernández D. Contributions of gender in the investigation of primary caregivers of dependent people. Index Enferm. 2017 [cited 2023 Mar 2];26(3):157–61. Available from: https://scielo.isciii.es/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1132-12962017000200008.
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) do contexto patriarcal; assim como contestaram a concepção restrita de gênero nos estudos da enfermagem, a maioria centrada em “constructos invariáveis e fixos” (E9)(2222. Galindo Huertas MS, Herrera Giraldo SL. La categoría de género en la investigación y producción de conocimiento en enfermería en Iberoamérica: aportes para el debate. Ventana. 2017;5(46):177–201. doi: http://doi.org/10.32870/lv.v5i46.6041.
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). Quer dizer, as pesquisadoras criticam a concepção de gênero que prevalece na ciência da enfermagem, a qual segue atrelada exclusivamente à concepção restrita de mulher ou apaga as diferenças hierárquicas (E9)(2222. Galindo Huertas MS, Herrera Giraldo SL. La categoría de género en la investigación y producción de conocimiento en enfermería en Iberoamérica: aportes para el debate. Ventana. 2017;5(46):177–201. doi: http://doi.org/10.32870/lv.v5i46.6041.
https://doi.org/10.32870/lv.v5i46.6041...
). Na terceira categoria crítica, os artigos denunciam as opressões de gênero no trabalho do cuidado, falsamente justificados no estereótipo da “cuidadora natural” (A7)(11. Pires MRGM, Fonseca RMGS, Padilla B. A politicidade do cuidado na crítica aos estereótipos de gênero. Rev Bras Enferm. 2016;69(6):1223–30. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0441. PubMed PMID: 27925101.
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0...
). As estudiosas do care na enfermagem defendem mudanças nas representações do trabalho das mulheres como “prolongamento das funções domésticas” (E14)(2727. Olea-Gutiérrez CV, Zavala-Pérez IC, Salas-Medina DL, Rivas MX. Structure and organization of social representations of caring concept in caregivers of people with chronic disease. Rev Enferm Inst Mex Seguro Soc. 2018 [cited 2023 Mar 2];26(3):161–70. Available from: https://www.medigraphic.com/pdfs/enfermeriaimss/eim-2018/eim183b.pdf.
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), uma vez que a “ruptura com os papéis socialmente designados para as mulheres” (E22)(3535. Cascella Carbó GF, García-Orellán R. Burden and gender inequalities around informal care. Invest Educ Enferm. 2020;38(1). doi: http://doi.org/10.17533/udea.iee.v38n1e10. PubMed PMID: 32124578.
https://doi.org/10.17533/udea.iee.v38n1e...
) contribui para uma distribuição mais justa do trabalho do cuidado.

De fato, uma das relevantes discussões da epistemologia feminista argumenta que a relação entre cuidado e capitalismo passa pela dimensão reprodutiva do trabalho, cuja responsabilidade recai desigualmente para as mulheres (ou “servas do capital”)(22. Tronto J. ¿Riesgo o cuidado? Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Fundación Medifé Edita; 2020 [cited 2023 Mar 2]. Available from: https://www.fundacionmedife.com.ar/sites/default/files/Edita/Horizontes-Del-Cuidado/Riesgo-o-cuidado.pdf.
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). Ou seja, num contexto de economia global, o trabalho produtivo, gerador de acumulação mediante valores de troca, precisa indissociavelmente da dimensão reprodutiva, daquela que produz a força de trabalho saudável para ser explorada, forjada nas atividades para manutenção da vida (tarefas domésticas, cuidados de saúde, das crianças, dos idosos, de bem-estar, outros). Noutras palavras, na complexidade das relações produtivas do cuidado, o capitalismo não sobrevive sem o trabalho desigualmente atribuído às mulheres. Nessa seara, a subversão da lógica patriarcal de distribuição das tarefas do cuidado pode tornar mais equânime a relação entre os gêneros, repercutindo na democracia(22. Tronto J. ¿Riesgo o cuidado? Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Fundación Medifé Edita; 2020 [cited 2023 Mar 2]. Available from: https://www.fundacionmedife.com.ar/sites/default/files/Edita/Horizontes-Del-Cuidado/Riesgo-o-cuidado.pdf.
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3. Spinelli L. Joan Tronto: relational responsibility, recognition of privileges and vulnerability. Princípios. 2022 Feb 28 [cited 2023 Mar 2]; 29(58):66–83. Available from: https://periodicos.ufrn.br/principios/article/view/23774.
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-44. Biroli F, Quintela DF. Sexual division of labor, separation and hierarchy: contributions to the analysis of the gender of democracies. Rev. Pol & Trab. 2021 Mar 23 [cited 2023 Mar 2]; 1(53):72–89. Available from: https://periodicos.ufpb.br/index.php/politicaetrabalho/article/view/51417.
https://periodicos.ufpb.br/index.php/pol...
).

Numa similitude para a saúde, haja vista a maioria quantitativa das trabalhadoras da enfermagem, a oferta dos serviços depende visceralmente das enfermeiras e das técnicas. A despeito dessa sustentação majoritária, o viés discriminatório que voluntariamente proclamamos dociliza nossos corpos, entorpece nossas reflexões, silencia nossas vozes e mina nossa força política para modificar as indignas condições de trabalho. Não obstante, as contribuições deste e de outros estudos na identificação das resistências críticas dentro do campo epistêmico da enfermagem podem desequilibrar esse pêndulo em nosso favor.

Nesse contexto, as estratégias para o enfrentamento dos estereótipos de gênero na enfermagem passam por uma maior articulação entre a pesquisa, a educação, a organização política e a prática. No âmbito da formação de enfermeiras e equipe, urge incluirmos a perspectiva de gênero na problematização crítica dos discursos endógenos que nos aprisionam em opressões simbólicas, posto que eles apenas alargam as violências, a desvalorização salarial e as condições indignas de trabalho. A epistemologia feminista constitui um enfoque necessário aos conteúdos disciplinares e extracurriculares, especialmente naquelas que dialogam com a historicidade, o cuidado e o exercício profissional. Mais ainda, a pesquisa e a ciência da enfermagem, articulada ao ensino e a extensão, pode dialogar melhor com os referenciais feministas na produção dos pensamentos críticos e dos engajamentos políticos na enfermagem. No âmbito das associações de classe, precisamos problematizar de maneira aprofundada, nos vários fóruns de discussão, o quão injusto, cruel e opressivo são os discursos ideológicos que reproduzimos, ampliando nosso poder de enfrentamento das iniquidades. Num curto prazo, os resultados desse artigo podem subsidiar discussões problematizadoras sobre o cuidado e os estereótipos de gênero na produção científica da enfermagem, em cenários de aprendizagem diversos, entre estudantes de enfermagem, docentes, enfermeiras e enfermeiros.

Limitações do Estudo

Por não termos contactado as autoras dos artigos não disponibilizados na internet, alguma referência importante pode ter sido suprimida do estudo. A exclusão da literatura cinzenta pode ter diminuído a quantidade das produções críticas dos estereótipos de gênero na enfermagem, presentes em dissertações de mestrado e teses de doutorado.

CONCLUSÃO

A produção científica da enfermagem sobre o cuidado, em sua maioria, reproduz estereótipos de gênero e as idealizações que reforçam as opressões sobre as mulheres da profissão. Nesses estudos, preponderam discursos que cristalizam a “cuidadora natural” e assinalam um cuidado vinculado ao feminino, como se fosse “um chamado e serviço do amor” – nunca uma relação social de poderes em disputa, disruptiva.

Em contraponto, as resistências críticas de enfermeiras cientistas denunciam a naturalização do cuidado feminino como “inadequado e danoso”, por perpetuar as opressões de gênero. Essas produções se amparam na epistemologia feminista e utilizam o gênero como uma dimensão analítica questionadora dos binarismos, das interdições sobre o corpo, das falsas neutralidades e dos apagamentos dos sexismos. Em consonância com esses estudos, perguntamos o quanto essas questões integram o nosso fazer científico para repercutir na formação crítica de enfermeiras e de técnicas. Ou o que aconteceria se acumulássemos práticas discursivas para confrontar os poderes mercadológicos, misóginos, biomédicos e patriarcais por detrás de cada cuidado “bondoso”, ou seja, daquele do falso “impulso” (feminino) para subservir.

Haja vista a centralidade do cuidado para a enfermagem, os achados desta revisão sinalizam a necessidade de ampliar a autocrítica sobre os discursos científicos da profissão, de forma a desvelar padrões sexistas que nos violentam de forma endógena, invisível e acrítica. As implicações deste estudo para a pesquisa em enfermagem apontam para uma lacuna nas produções científicas sobre o cuidado a partir da perspectiva de gênero, com incipiente poder de crítica a partir da epistemologia feminista. No âmbito das práticas da enfermagem, a reedição de estereótipos de gênero no discurso das(os) pesquisadoras(es) enfermeiras(os), além de manter condições indignas de trabalho, obstaculiza a conquista de direitos, a autonomia e a valorização profissional.

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Editado por

EDITOR ASSOCIADO

Maria Helena Baena de Moraes Lopes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    28 Fev 2024
  • Aceito
    26 Jun 2024
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