Acessibilidade / Reportar erro

Cuidar da criança e família na pandemia de COVID-19: inovações emudanças vivenciadas por enfermeiros* * Extraído da dissertação: “O cuidar da criança e sua família durante a pandemia de covid-19: inovações e mudanças vivenciadas por enfermeiros de um hospital universitário”, Universidade de São Paulo, 2022.

RESUMO

Objetivo:

Compreender a vivência do enfermeiro que atua em unidades pediátricas diante das inovações e das mudanças no processo de cuidar da criança e da família durante a pandemia de COVID-19 e apreender o típico da vivência dos enfermeiros neste cuidado.

Método:

Pesquisa qualitativa, que contou com a participação de 16 enfermeiros de unidades pediátricas de um hospital público e de ensino. Os dados foram analisados de acordo com o referencial teórico-metodológico da fenomenologia social de Alfred Schütz.

Resultados:

Os relatos dos participantes geraram as categorias: o desafio de vivenciar as mudanças em meio ao medo, a adaptação da equipe às inovações e às mudanças provocadas pela pandemia de COVID-19 e a expectativa para o cuidado e processo de trabalho.

Conclusão:

A compreensão da vivência dos enfermeiros evidenciou mudanças, adaptações da equipe e expectativas ao cuidado da criança e da família que, embora permeada por aprendizagem, foi vivenciada por dilemas éticos e sofrimento moral por esses profissionais.

DESCRIPTORES
COVID-19; Enfermagem Pediátrica; Família; Pesquisa Qualitativa

ABSTRACT

Objective:

To understand the experience of nurses working in pediatric units in the face of innovations and changes in the process of caring for children and families during the COVID-19 pandemic. Also, the objective is to understand the typical experience of nurses in this care.

Method:

Qualitative research, which involved the participation of 16 nurses from pediatric units of a public teaching hospital. The data were analyzed according to the theoretical-methodological framework of Alfred Schütz’s social phenomenology.

Results:

The participants’ reports generated the categories: the challenge of experiencing changes amid fear, the team’s adaptation to innovations and changes caused by the COVID-19 pandemic and the expectation for care and the work process.

Conclusion:

The understanding of the nurses’ experience highlighted changes, team adaptations and expectations for the care of children and families, which, although permeated by learning, were experienced by ethical dilemmas and moral suffering for these professionals.

DESCRIPTORS
COVID-19; Pediatric Nursing; Family; Qualitative research

RESUMEN

Objetivo:

Comprender la vivencia del enfermero que actúa en unidades pediátricas frente a las innovaciones y los cambios en el proceso de cuidar al niño y su familia durante la pandemia de COVID-19 y aprehender lo típico de la vivencia de los enfermeros en este cuidado.

Método:

Se trata de una investigación cualitativa con la participación de 16 enfermeros de unidades pediátricas de un hospital público docente. Los datos se analizaron según el referencial teórico-metodológico de la fenomenología social de Alfred Schütz.

Resultados:

Los relatos de los participantes concibieron las siguientes categorías: el reto de experimentar el cambio en medio del miedo, la adaptación del equipo a las innovaciones y los cambios provocados por la pandemia COVID-19, y las expectativas sobre la atención y el proceso de trabajo.

Conclusión:

La comprensión de la experiencia de los enfermeros mostró cambios, adaptaciones del equipo y expectativas en la atención al niño y a su familia que, aunque impregnada de aprendizaje, fue vivida por estos profesionales como dilemas éticos y sufrimiento moral.

DESCRIPTORES
COVID-19; Enfermería Pediátrica; Familia; Investigación Cualitativa.

INTRODUÇÃO

A pandemia do novo Coronavírus trouxe desafios para os profissionais prestarem o cuidado centrado no paciente e na família: abordagem que visa ao planejamento, à participação e à avaliação entre familiares, pacientes e profissionais de saúde(11. Institute for Patient and Family Centered Care. What is patient- and family-centered care? Bethesda: Institute for Patient and Family Centered Care; 2020 [cited 2021 July 10]. Available from: https://www.ipfcc.org/.
https://www.ipfcc.org/...
).

Entre os desafios, o estabelecimento de novas políticas de circulação de pessoas no ambiente hospitalar provocou uma das mudanças mais importantes para o cuidado pediátrico. Diferindo entre as instituições, essas políticas tornaram-se amplamente difundidas nesses ambientes e afetaram de modo significativo a presença dos familiares(22. Darcy Mahoney A, White RD, Velasquez A, Barrett TS, Clark RH, Ahmad KA. Impact of restrictions on parental presence in neonatal intensive care units related to coronavirus disease 2019. J Perinatol. 2020;40(Suppl 1):36–46. doi: http://doi.org/10.1038/s41372-020-0753-7. PubMed PMID: 32859963.
https://doi.org/10.1038/s41372-020-0753-...
).

Como consequências a tais políticas, dificuldades para participação e presença da família no ambiente hospitalar foram estabelecidas. Entre elas, a falta de compreensão do novo cenário entre membros familiares, crianças e profissionais(33. Hart JL, Turnbull AE, Oppenheim IM, Courtright KR. Family-centered care during the COVID-19 era. J Pain Symptom Manage. 2020;60(2):e93–7. doi: http://doi.org/10.1016/j.jpainsymman.2020.04.017. PubMed PMID: 32333961.
https://doi.org/10.1016/j.jpainsymman.20...
), dificuldade na comunicação e envolvimento centrado na condição física do paciente(44. Maaskant JM, Jongerden IP, Bik J, Joosten M, Musters S, Storm-Versloot MN, et al. Strict isolation requires a different approach to the family of hospitalised patients with COVID-19: a rapid qualitative study. Int J Nurs Stud. 2021;117:103858. doi: http://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2020.103858. PubMed PMID: 33621720.
https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2020....
), além da limitação na participação dos familiares nos cuidados clínicos e sua ausência à beira leito(55. Aboumatar H. Three reasons to focus on patient and family engagement during the COVID-19 pandemic. Qual Manag Health Care. 2020;29(3):176–7. doi: http://doi.org/10.1097/QMH.0000000000000262. PubMed PMID: 32590495.
https://doi.org/10.1097/QMH.000000000000...
,66. Lemmon ME, Chapman I, Malcolm W, Kelley K, Shaw RJ, Milazzo A, et al. Beyond the first wave: consequences of COVID-19 on high-risk infants and families. Am J Perinatol. 2020;37(12):1283–8. doi: http://doi.org/10.1055/s-0040-1715839. PubMed PMID: 32911555.
https://doi.org/10.1055/s-0040-1715839...
).

Com a participação prejudicada desses indivíduos durante a hospitalização e diante dos efeitos da separação da criança dos seus familiares, estratégias foram descritas para superar com segurança essas dificuldades, sobretudo com medidas que enfatizam uso de recurso virtual para o cuidado(77. Aziz S, Arabi YM, Alhazzani W, Evans L, Citerio G, Fischkoff K, et al. Managing ICU surge during the COVID-19 crisis: rapid guidelines. Intensive Care Med. 2020;46(7):1303–25. doi: http://doi.org/10.1007/s00134-020-06092-5. PubMed PMID: 32514598.
https://doi.org/10.1007/s00134-020-06092...
,88. Gaulton J, Ziegler K, Chang E. Virtual practices transform the care delivery model in an intensive care unit during the coronavirus pandemic. NEJM Catal. 2020;1(3):1–11. doi: http://doi.org/10.1056/CAT.20.0169.
https://doi.org/10.1056/CAT.20.0169...
). Embora as estratégias sejam úteis, desafios éticos foram estabelecidos para os enfermeiros frente às mudanças no cenário assistencial(99. Morley G, Grady C, McCarthy J, Ulrich CM. COVID-19: ethical challenges for nurses. Hastings Cent Rep. 2020;50(3):35–9. doi: http://doi.org/10.1002/hast.1110. PubMed PMID: 32410225.
https://doi.org/10.1002/hast.1110...
). Essas mudanças referem-se à segurança dos profissionais, dos pacientes e de suas famílias, à alocação de recursos e às relações estabelecidas com aqueles que cuidam(99. Morley G, Grady C, McCarthy J, Ulrich CM. COVID-19: ethical challenges for nurses. Hastings Cent Rep. 2020;50(3):35–9. doi: http://doi.org/10.1002/hast.1110. PubMed PMID: 32410225.
https://doi.org/10.1002/hast.1110...
).

Considerando o cenário descrito de cuidado, compreender a vivência desses profissionais diante das inovações no processo de cuidar da criança e da família durante esse período permitiu, sob a perspectiva da fenomenologia social(1010. Schütz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018.), uma compreensão ímpar, dada por uma ótica coletiva das vivências estabelecidas. Além disso, compreender as inovações e as mudanças no atendimento às crianças e suas famílias poderá demonstrar esse contexto de grandes mudanças na área da saúde, incluindo as áreas de enfermagem pediátrica e enfermagem da família.

Este estudo norteou-se pelo seguinte questionamento: “Como os enfermeiros vivenciaram as mudanças e as inovações no processo de cuidado à criança e à família durante a pandemia COVID-19?”. Desse modo, o objetivo estabelecido é compreender a vivência do enfermeiro que atua em unidades pediátricas diante das inovações e das mudanças no processo de cuidar da criança e da família durante a pandemia de COVID-19 e apreender o típico da vivência dos enfermeiros neste cuidado.

MÉTODO

Tipo de Estudo

Pesquisa qualitativa fundamentada na fenomenologia social de Alfred Schütz.

Referencial Teórico-Metodológico

A teoria de Alfred Schütz incorpora a experiência biográfica do autor e a temporalidade como fatores indispensáveis na compreensão da gênese de suas motivações para a ação. As mudanças e as inovações estabelecidas no cuidado ao público pediátrico, sobretudo no contexto sanitário da pandemia de COVID-19, constituíram aspectos que permearam a experiência do trabalho dos enfermeiros, sendo um importante fenômeno vivido por esses profissionais, além de uma motivação para a escolha da fenomenologia social. Para a compreensão desse fenômeno, os conceitos como: o mundo vida, a atitude natural, a intersubjetividade, a relação face a face, a situação biográfica, a bagagem de conhecimentos, o sistema de relevância, a ação social e conduta motivacional (motivos para e motivos porque) foram utilizados(1010. Schütz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018.).

Local

O estudo foi realizado em unidades pediátricas – pronto-socorro infantil, unidade de internação e unidade de terapia intensiva e neonatal de um hospital público de ensino e nível secundário, localizado no município de São Paulo.

População e Critérios de Seleção

Foram incluídos enfermeiros que atuam em pediatria e que acompanharam, desde o início da pandemia de COVID-19, o processo de cuidado à criança e à família.

Coleta de Dados

A coleta de dados foi realizada por meio de entrevista fenomenológica por uma das autoras, com experiência prévia em pesquisa qualitativa e especialista na área de enfermagem pediátrica. Os participantes foram convidados pela chefia de enfermagem, seguido de contato pela pesquisadora principal, o qual o formalizou por e-mail. O contato, pela pesquisadora principal, foi possível por ser colaboradora da instituição em momento anterior à pesquisa.

As entrevistas ocorreram no período de abril a julho de 2020 e foram realizadas na modalidade on-line, com duração média de trinta minutos. O recurso de videoconferência foi utilizado para favorecer a interação, no entanto, somente o áudio dessas sessões foi gravado.

A obtenção dos relatos dos participantes foi orientada por questões fundamentadas no conceito de motivação humana do referencial teórico adotado. A pergunta disparadora foi “Fale-me das inovações e mudanças no processo de cuidado da criança e da família durante a pandemia de COVID-19. Dados como idade, gênero, formação e tempo de atuação no local, também foram coletados.

Dezoito participantes foram convidados, no entanto, apenas dezesseis aceitaram participar do estudo. Não houve adesão dos participantes para verificar a transcrição das entrevistas. Para ter maior representatividade de participantes, foi necessário o uso da estratégia snowball sampling(1111. Kirchherr J, Charles K. Enhancing the sample diversity of snowball samples: recommendations from a research project on anti-dam movements in Southeast Asia. PLoS One. 2018;13(8):e0201710. doi: http://doi.org/10.1371/journal.pone.0201710. PubMed PMID: 30133457.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.020...
), a qual possibilitou que um participante indicasse outro potencial participante e assim sucessivamente. A coleta foi finalizada à medida que os dados foram considerados suficientes para compreensão do fenômeno investigado(1212. Minayo MC S. Amostragem e saturação em pesquisa qualitativa: consensos e controvérsias. Revista Pesquisa Qualitativa. 2017 [cited 2021 July 10];5(7):1–12. Available from: https://editora.sepq.org.br/rpq/article/view/82.
https://editora.sepq.org.br/rpq/article/...
).

Análise e Tratamento dos Dados

Para realizar a análise dos relatos dos participantes, foram utilizadas as etapas descritas para a pesquisa fenomenológica(1313. Kortchmar E. A experiência de reganho de peso após a cirurgia bariátrica: um enfoque fenomenológico [doutorado]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2018 [cited 2021 Oct 22]. Available from: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/7/7141/tde-23112018-155901/.
http://www.teses.usp.br/teses/disponivei...
): leitura atenta dos relatos dos participantes, para assim, identificar e apreender o sentido global da experiência vivenciada pelos participantes da pesquisa; seleção dos relatos dos participantes, com a intenção de discriminar as unidades de significados, as quais ocorreram à medida que foi observada a sua relevância para o fenômeno do estudo; agrupamento das unidades, respeitando a sua convergência de significados, tornando possível, nesta etapa, a composição das categorias representativas do fenômeno vivenciado pelos participantes; síntese de todas as unidades, integrando-as aos conceitos da fenomenologia social e da literatura sobre a temática. Esta pesquisa atendeu aos Critérios Consolidados para Relatar uma Pesquisa Qualitativa (COREQ)(1414. Tong A, Sainsbury P, Craig J. Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ): a 32-item checklist for interviews and focus groups. Int J Qual Health Care. 2007;19(6):349–57. doi: http://doi.org/10.1093/intqhc/mzm042. PubMed PMID: 17872937.
https://doi.org/10.1093/intqhc/mzm042...
).

Aspectos Éticos

Este estudo respeitou as diretrizes éticas estabelecidas pela Resolução 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde(1515. Brasil. Ministério da Saúde. Resolução n° 466, de 12 de dezembro de 2012. Dispõe sobre diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União; Brasília; 2012 [cited 2021 Mar 10]. Available from: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/reso466.pdf.
http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/...
), e foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da instituição proponente e instituição coparticipante. A aprovação ocorreu no ano de 2021 sob os respectivos pareceres n. 4.582.098 e 4.614.009. Para o anonimato dos enfermeiros, utilizou-se a letra P (participantes) seguido de números arábicos. Os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) de modo virtual.

RESULTADOS

Participaram do estudo 16 enfermeiros, com idade entre 38 e 55 anos, 14 reconheciam-se do gênero feminino e 2 do gênero masculino; 9 possuíam formação em nível de especialização em outras áreas e áreas afins, 3 em nível de mestrado e 1 com doutorado. O tempo de atuação desses profissionais na área variou de 10 a 34 anos. Quanto à área de atuação, 5 enfermeiros atuavam em unidade de terapia intensiva pediátrica e neonatal, 6 em pronto socorro infantil e 5 em unidades de internação pediátrica.

A partir da fenomenologia social de Alfred Schütz(1010. Schütz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018.), três categorias foram desveladas: “O desafio de vivenciar as mudanças em meio ao medo”, “Adaptação da equipe às inovações e às mudanças provocadas pela pandemia de COVID-19” e “Expectativa para o cuidado e processo de trabalho”.

O Desafio de Vivenciar as Mudanças em Meio ao Medo

A vivência do enfermeiro que atua em pediatria foi marcada pelas mudanças que ocorreram no ambiente hospitalar para o enfrentamento da COVID-19. Entre elas, estão os ajustes estruturais, os quais foram experienciados por meio do impacto significativo na estrutura física, nos recursos humanos e nos materiais.

(...) a gente ia diminuir os leitos e aí fechou uma ala e depois não abriu mais. E aí veio COVID, foi usada uma ala para o COVID. A maternidade ficou na outra ala da gente (P1).

(...) Eu trabalho em um pronto-socorro e aqui teve uma mudança estrutural muito importante que foi a construção de um setor chamado “gripário” (P3).

Mudanças no fluxo de atendimento também foram evidenciadas pelos enfermeiros, com destaque para a maratona da família em busca de atendimento e a admissão da criança com foco na COVID-19 frente aos novos ajustes assistenciais, que restringiam os atendimentos e impunham medidas de isolamento.

(...) com o COVID, ficou restrito, nem atendia, a orientação que a família tinha era de nem ir para o hospital. Tinha mães que para o filho ser atendido, passavam por 3,4 hospitais (P1).

(...) Todas as crianças passam pelo mesmo processo de isolamento. Isso é até um fator de estresse entre a gente, porque a gente não concorda, não precisamos generalizar (P6).

Em suas vivências, os enfermeiros também destacaram as restrições da presença dos visitantes e acompanhantes como mudanças, o que impactou no processo assistencial e nas relações dos membros da família com a criança internada.

(...) Se fazia de uma forma antes, a troca de acompanhante, agora faz de outra. A questão das visitas, que eu acho que faz bastante diferença para as crianças (P2).

(...) A primeira mudança foi grande e negativa, foi nós termos que restringir o acesso ao pai e à mãe, que era uma coisa que normalmente nós fazíamos (P10).

O ajuste na realização de práticas e procedimentos, seguido de mudanças na paramentação, foi uma transformação destacada pelos participantes, impondo, assim, um controle rigoroso de práticas de cuidado não só aos pacientes, mas de si mesmo e dos demais membros da equipe.

(...) Em termos de exposição, a gente tem uma nova forma de se cuidar, né? Foi uma nova forma de trabalho que a gente precisou aprender a fazer (P3).

A rotina restritiva de visitação e acompanhamento e fluxo de rastreamento da COVID-19 para as crianças e famílias foram dificuldades trazidas com as mudanças, aspectos vividos por esses profissionais.

(...) É um desafio, porque muitas vezes a mãe não entende, a criança às vezes também não entende isso. A família não entende (P7).

(...) Mas quanto à família, é difícil, viu? Você ter que abordar que só ela pode ficar de acompanhante, que ela não vai poder receber visita (P12).

Impasses com rotinas iniciais de visitação, bem como desafios éticos com a restrição das visitas resultaram em dificuldades para o enfermeiro desempenhar o seu papel no que se refere a uma abordagem centrada na criança e na família.

(...) a gente estava bem no começo da pandemia e aí o que acontecia: a instituição liberou a mãe não o pai. Só que a mãe estava internada, e quem via essa criança? ninguém? A gente não podia liberar o pai, então isso foi muito difícil (P6).

(...) o paciente está internado com COVID, ela não vai poder ficar com acompanhante. Isso não se aplica à criança. É uma infração dos direitos da criança também (P3).

Dificuldade para trabalhar com a nova organização das unidades e obstáculos com o uso da paramentação demandaram para o enfermeiro ajustes contínuos em seu processo de trabalho para torná-lo mais próximo do que considera um cuidado humanizado.

(...) trabalhar dentro de um “gripário” pediátrico é algo bastante desafiador. Eu precisei mudar o meu modo de me relacionar com os colegas e com os pacientes e suas famílias (P3).

(...) eu acho que a máscara ela descaracteriza muito esse acolhimento ao cuidado (P2).

O medo, o desconhecimento e maior exposição ao vírus foram vivenciados pelos enfermeiros deste estudo. Os enfermeiros descreveram receio por estarem mais expostos ao vírus, com a aproximação com a criança e família, por estarem no ambiente hospitalar de risco, presenciando o adoecimento de familiares e colegas, reforçando a sensação de vulnerabilidade no ambiente.

(...) a gente estava se sentindo extremamente exposta, uma coisa que ninguém conhecia. E aí colegas nossos da equipe começaram a pegar COVID e ficaram mal (P1).

(...) a família também nos expõe enquanto profissionais (P6).

Desconhecimento, medo e insegurança ao vivenciar o início da pandemia, devido a desinformação sobre a doença e formas de proteção, foram aspectos descritos pelos enfermeiros, os quais chamam a atenção para o impacto e a insegurança no relacionamento entre os pares.

(...) Então, toda aquela paramentação que a gente tinha que fazer, se estava fazendo certo, se estava fazendo errado (P8).

(...) todo mundo com um certo grau ou outro de estresse, né? todo mundo está (P10).

O enfermeiro, diante do desconhecimento da doença, especialmente nas fases iniciais, tinha maior receio de contaminar o outro do que a si mesmo – sobretudo medo de contaminar a sua família.

(...) para mim, é engraçado, eu não tinha tanto receio de me contaminar pela doença, mas tinha pavor de contaminar alguém, por exemplo minha família (P14).

Esse profissional compreende que o risco de exposição ao vírus teve impacto no cuidado, além da perda do contato físico com os pares, essa sensação esteve presente na relação dos familiares e as crianças e famílias hospitalizadas.

(...) fiquei muito tempo sem ver meus pais que eu tinha muito medo de passar COVID para eles, então, foi meio doloroso (P1).

(...) da questão do abraço, muitas vezes tinha isso né, no dia a dia, de confortar a família, e agora você precisa manter uma distância, acho que esse distanciamento das famílias hospitalizadas foi muito ruim (P5).

O sentimento de medo, de desconhecimento e de maior exposição ao vírus, explícito nas fases iniciais da pandemia, passou a ser menos intenso a partir da vacinação dos profissionais de saúde, visto que o enfermeiro passou a sentir menos preocupação por estar vacinado e por trabalhar com crianças que não estavam contaminadas.

(...) a gente começou a vacinar, eu vacinei, então senti um alívio nessa parte, a gente tem que ter um pouco de tranquilidade para acalmar a equipe também (P14).

(...) Depois quando a gente foi vendo que as coisas não eram tão assim, também pelo fato da criança não ter tantos casos, acho que isso foi um fator muito tranquilizante (P6).

Por meio do autocuidado e do apoio aos pares, os participantes desse estudo buscaram estratégias de enfrentamento, com destaque à saúde mental dos profissionais.

(...) a gente está tendo que cuidar da saúde mental, eles (instituição) têm nos orientado (P1).

(...) se preocupar com a saúde do profissional também, então cuidar mais da gente (P3).

Adaptação da Equipe às Inovações e às Mudanças Provocadas Pela Pandemia de Covid-19

Ao longo da pandemia, os participantes vivenciaram adaptação com ajuste às novas formas de cuidar da criança e da família. Para isso, eles vivenciaram novas rotinas restritivas de visitação e acompanhamento, introdução de um novo fluxo de rastreamento da COVID-19 e uso de novos materiais.

(...) Antes a gente tinha assim: “não dá para vir tio, não dá para vir...” Então, todas essas coisas da rotina do setor, a gente foi criando conforme as coisas foram caminhando (P3).

(...) foi permitido a gente coletar os exames desses pais na instituição, antes demorava uma semana para ficar pronto o resultado, agora os pais podem voltar a ficar com a criança (P6).

(...) A gente precisou aprender a manipular outros recursos respiratórios que são mais recursos nos casos de COVID por exemplo (P3).

Os enfermeiros reconheceram, durante esse tempo, uma postura de adaptação, a qual foi possível pelo momento em que a pandemia se encontrava, e pelo seu sentimento de adaptação frente aos novos processos de trabalho.

(...) falando especificamente de pandemia, eu acho que a pior parte já passou (P10).

(...) a equipe teve que se adaptar com relação à assistência e à família (P16).

(...) é uma questão de adaptação, já me adaptei, as famílias também já se adaptaram (P6).

A necessidade de inovar nas formas de realizar o cuidado foram experienciadas. Os enfermeiros compreenderam que tiveram que se reinventar buscando alternativas para que as crianças não só tivessem acesso aos brinquedos mas que também pudessem se comunicar.

(...) O excesso de cuidado com a higiene desses brinquedos, quando a gente coloca nos isolamentos, né, então a gente tem que ter muito cuidado (P4).

(...) Então é lógico que a gente teve que aprender a conversar pelo olhar, né? (P2).

(...) antes o uso do celular era bem restrito. Agora liberamos o celular para conversar por vídeo. Isso não era permitido, mas a gente faz para tentar amenizar essa separação (P11).

Além desses aspectos, foi importante para o enfermeiro que houvesse a flexibilização das rotinas de visitação e acompanhamento em algumas situações.

(...) às vezes as crianças precisam de uma intervenção na UTI, nesse momento, é muito importante estar o casal, para um dar apoio para o outro e para a criança também (P7).

(...) a gente fez um treinamento (capacitação) eu acabei liberando a mãe e a irmã para ajudar no treinamento, coisa que no começo a gente não conseguia liberar (P13).

Ao flexibilizar essas novas rotinas institucionais, os enfermeiros tiveram implicações para o processo de trabalho. Para isso, eles reconhecem os riscos para a transmissão do vírus e tiveram conflitos com os membros da equipe e demais familiares.

(...) eu tentava adaptar para a dinâmica daquela família. Por outro lado, também vejo que talvez isso impactava quando você ia na troca de plantão e seu colega questionava (P15).

(...) a gente teve vários conflitos em relação a isso, porque a mãe reclama que a gente permitiu que o pai ficasse, porque a criança vai para a UTI, e ela não entende... (P16).

O enfermeiro compreende que avalia e flexibiliza essas rotinas institucionais porque coloca-se no lugar da família.

(...) fiquei do outro lado, né? do lado de paciente (P1).

(...) Para mim é muito difícil porque eu me considero uma pessoa muito empática, muito humana, e eu vejo a necessidade das famílias (P6).

Diante das mudanças trazidas pela pandemia, os participantes desenvolveram aprendizados, os quais implicaram no compartilhamento de experiências, no cuidado à família e no uso efetivo de medidas de segurança.

(...) ouvir outros pontos de vista que são diferentes do seu, concordar, discordar, tudo isso é muito rico (P10).

(...) tudo o que aconteceu na pandemia foram muitos fatores que fizeram com que a gente reavaliasse a forma de cuidado não só para a criança como para a família (P13).

(...) a gente ter aprendido a tomar realmente os cuidados dentro do hospital para que a gente possa não levar isso para casa, para mim foi um dos maiores aprendizados (P4).

Expectativa Para o Cuidado e Processo de Trabalho

A vivência dos enfermeiros que atuam em pediatria também é demarcada por suas expectativas. Ao ter incerteza do término da pandemia, esse profissional faz projeções em meio à dúvida dessas expectativas acontecerem.

(...) Eu acredito que vá continuar dessa forma, porque a pandemia está longe de acabar e então eu acho que cada vez a gente vai continuar com essa restrição de pessoas (P6).

Entre as expectativas, o anseio por medidas seguras e valorização do trabalho realizado foram pontos significativos para que esse profissional pudesse prosseguir com o seu papel, ao menos se sentindo protegido e valorizado.

(...) Em relação à máscara, acho que a gente vai usar muito tempo, é uma coisa protetora mesmo para a gente (P14).

(...) E na questão da paramentação, eu acho que foi muito positivo (P15).

(...) Depois da pandemia, acho que é isso, uma coisa positiva, no sentido de valorizarmos nosso trabalho enquanto profissionais (P13).

Como se pode ver, o profissional também faz projeções para a criança e a família, ao acreditar que houve prejuízo para o cuidado, em consequência ao contexto sanitário, o enfermeiro almeja um cuidado realizado por meio de medidas criativas, humanas e centradas na criança e na família.

(...) A minha expectativa é que o cenário melhore, que a gente veja inovações no cenário humano. Acho que a gente precisa pensar em soluções mais humanas (P8).

(...) Que as crianças continuem na presença de seus familiares, que não ocorra essa separação. Porque muitas coisas a gente já tinha conquistado, eu não falo nós como equipe de trabalho do pronto-socorro, eu falo isso a nível de outras instituições (P15).

Típico Vivido

As categorias provenientes dos relatos dos enfermeiros permitiram compreender o cuidar da criança e família durante a pandemia COVID-19 e apreender o típico vivido desses profissionais, como sendo: aquele que enfrentou o desafio de vivenciar as mudanças em meio ao medo, acolhendo as mudanças que ocorreram no ambiente hospitalar, as dificuldades enfrentadas; o medo, o desconhecimento e maior exposição ao vírus; a busca de estratégias de enfrentamento para prosseguir com o cuidado; que liderou a adaptação da equipe às inovações e mudanças provocadas pela pandemia COVID-19, com o ajuste às novas formas de cuidar da criança e da família, com postura de adaptação, com o reforço contínuo à necessidade de inovar formas de realizar o cuidado, e pela compreensão de que as mudanças decorrentes da pandemia trouxeram aprendizado; que tem expectativa para o cuidado e processo de trabalho, em meio à incerteza do término da pandemia, tem anseio por medidas seguras e valorização do trabalho realizado e que faz projeção de medidas criativas, humanas e centradas na criança e na família.

DISCUSSÃO

Os relatos dos enfermeiros que atuam em pediatria revelaram, por meio da recorrência e da convergência das suas falas, um mundo comum. Essa construção coletiva possibilitou a identificação das vivências desses profissionais diante das mudanças e das inovações no processo de cuidado à criança e à família durante a pandemia de COVID-19, bem como a apreensão do típico da vivência dos enfermeiros neste cuidado.

A experiência vivenciada “motivos porque” evidenciou que os ajustes estruturais e as mudanças no atendimento constituíram aspectos desafiadores para esses profissionais. A reorganização dos serviços também foi observada em diferentes instituições de atendimento pediátrico(1616. Somekh I, Somech R, Pettoello-Mantovani M, Somekh E. Changes in routine pediatric practice in light of Coronavirus 2019 (COVID-19). J Pediatr. 2020;224:190–3. doi: http://doi.org/10.1016/j.jpeds.2020.05.053. PubMed PMID: 32497546.
https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2020.05....
,1717. Tedesco B, Borgese G, Cracco U, Casarotto P, Zanin A. Challenges to delivering family-centred care during the Coronavirus pandemic: voices of Italian paediatric intensive care unit nurses. Nurs Crit Care. 2020;26(1):10–2. doi: http://doi.org/10.1111/nicc.12578. PubMed PMID: 33263209.
https://doi.org/10.1111/nicc.12578...
), assim como a dificuldade no atendimento, devido à alta demanda gerada pela COVID-19(1818. Noronha KVMS, Guedes GR, Turra CM, Andrade MV, Botega L, Nogueira D, et al. Pandemia por COVID-19 no Brasil: análise da demanda e da oferta de leitos hospitalares e equipamentos de ventilação assistida segundo diferentes cenários. Cad Saúde Pública. 2020;36(6):e00115320. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311X00115320.
https://doi.org/10.1590/0102-311X0011532...
).

As restrições da presença de visitantes e acompanhantes, seguidas do ajuste na realização de práticas e procedimentos, foram mudanças que ocorreram no ambiente hospitalar. Essas políticas foram adotadas em muitas instituições(22. Darcy Mahoney A, White RD, Velasquez A, Barrett TS, Clark RH, Ahmad KA. Impact of restrictions on parental presence in neonatal intensive care units related to coronavirus disease 2019. J Perinatol. 2020;40(Suppl 1):36–46. doi: http://doi.org/10.1038/s41372-020-0753-7. PubMed PMID: 32859963.
https://doi.org/10.1038/s41372-020-0753-...
) para responder ao risco de transmissão do novo Coronavírus; no entanto, a interrupção de cuidados integrais fez com que enfermeiros vivenciassem desafios éticos e sofrimento moral(1919. Jia Y, Chen O, Xiao Z, Xiao J, Bian J, Jia H. Nurses’ ethical challenges caring for people with COVID-19: a qualitative study. Nurs Ethics. 2021;28(1):33–45. http://doi.org/10.1177/0969733020944453. PubMed PMID: 32856534.
https://doi.org/10.1177/0969733020944453...
,2020. Rezaee N, Mardani-Hamooleh M, Seraji M. Nurses’ perception of ethical challenges in caring for patients with COVID-19: a qualitative analysis. J Med Ethics Hist Med. 2020;13:23. doi: http://doi.org/10.18502/jmehm.v13i23.4954.
https://doi.org/10.18502/jmehm.v13i23.49...
).

Nesse processo, aspectos como mudanças na paramentação, cuidados para evitar a transmissão do vírus, dificuldade para trabalhar com a nova organização das unidades, além de dificuldades e obstáculos de diversas ordens foram vivenciadas pelo grupo em questão. Entre as experiências vividas por enfermeiros da linha de frente, durante a pandemia no Catar, descreve-se que o remanejamento de profissionais para diferentes unidades trouxe estresse para esses profissionais(2121. Villar RC, Nashwan AJ, Mathew RG, Mohamed AS, Munirathinam S, Abujaber AA, et al. The lived experiences of frontline nurses during the coronavirus disease pandemic in Qatar: a qualitative study. Nurs Open. 2021;8(6):3516–26. doi: http://doi.org/10.1002/nop2.901. PubMed PMID: 33949145.
https://doi.org/10.1002/nop2.901...
). Quanto à paramentação, houve divergências quanto aos aspectos encontrados neste estudo, visto que foram ressaltadas principalmente a dificuldade de uso(2222. Liu Y-E, Zhai Z-C, Han Y-H, Liu Y-L, Liu F-P, Hu D-Y. Experiences of front-line nurses combating coronavirus disease-2019 in China: a qualitative analysis. Public Health Nurs. 2020;37(5):757–63. doi: http://doi.org/10.1111/phn.12768. PubMed PMID: 32677072.
https://doi.org/10.1111/phn.12768...
,2323. Zhang Y, Wei L, Li H, Pan Y, Wang J, Li Q, et al. The psychological change process of frontline nurses caring for patients with COVID-19 during its outbreak. Issues Ment Health Nurs. 2020;41(6):525–30. http://doi.org/10.1080/01612840.2020.1752865. PubMed PMID: 32497451.
https://doi.org/10.1080/01612840.2020.17...
) e a presença de lesão facial(2424. Coelho MMF, Cavalcante VMV, Moraes JT, de Menezes LCG, Figueirêdo SV, Branco MFCC, et al. Lesão por pressão relacionada ao uso de equipamentos de proteção individual na pandemia da COVID-19. Rev Bras Enferm. 2020;73(Suppl 2):e20200670. doi: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0670.
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0...
).

O medo, o desconhecimento e a maior exposição ao vírus também fizeram parte da trajetória dos participantes. Nesse aspecto, os enfermeiros chamam a atenção para o impacto no cuidado, além da perda do contato físico com os pares, com seus familiares e com as crianças e famílias hospitalizadas, destacaram que o medo foi sendo reduzido por estarem vacinados e por trabalharem com crianças. Os enfermeiros da linha de frente, no início da pandemia, não tinham experiência e informações sobre como se proteger, refletindo, dessa forma, uma maior preocupação nesses profissionais(2222. Liu Y-E, Zhai Z-C, Han Y-H, Liu Y-L, Liu F-P, Hu D-Y. Experiences of front-line nurses combating coronavirus disease-2019 in China: a qualitative analysis. Public Health Nurs. 2020;37(5):757–63. doi: http://doi.org/10.1111/phn.12768. PubMed PMID: 32677072.
https://doi.org/10.1111/phn.12768...
). O medo de contaminar a família(2525. Góes FGB, Silva ACSSD, Santos ASTD, Pereira-Ávila FMV, Silva LJD, Silva LFD, et al. Desafios de profissionais de Enfermagem Pediátrica frente à pandemia da COVID-19. Rev Lat Am Enfermagem. 2020;28:e3367. doi: https://doi.org/10.1590/1518-8345.4550.3367. PubMed PMID: 32901774.
https://doi.org/10.1590/1518-8345.4550.3...
) bem como a restrição de contato com familiares foram achados descritos em outras realidades(2121. Villar RC, Nashwan AJ, Mathew RG, Mohamed AS, Munirathinam S, Abujaber AA, et al. The lived experiences of frontline nurses during the coronavirus disease pandemic in Qatar: a qualitative study. Nurs Open. 2021;8(6):3516–26. doi: http://doi.org/10.1002/nop2.901. PubMed PMID: 33949145.
https://doi.org/10.1002/nop2.901...
).

O uso de estratégias de enfrentamento para prosseguir com o cuidado também foi descrito pelos depoentes da pesquisa, elas foram observadas por meio de ações de autocuidado e apoio aos pares; sendo aspectos que auxiliaram na adaptação durante a pandemia de COVID-19. A adaptação foi relatada em pesquisa com enfermeiros que atuaram com pacientes afetados pela COVID-19 na China, através de uma sequência de três estágios: o primeiro estava vinculado ao senso de missão profissional e ao medo do vírus; o segundo, à exaustão emocional, e o terceiro, à adaptação psicológica. Esse último foi relacionado à familiaridade ao ambiente e aos processos de trabalho, além do reconhecimento e do apoio social entre os pares(2323. Zhang Y, Wei L, Li H, Pan Y, Wang J, Li Q, et al. The psychological change process of frontline nurses caring for patients with COVID-19 during its outbreak. Issues Ment Health Nurs. 2020;41(6):525–30. http://doi.org/10.1080/01612840.2020.1752865. PubMed PMID: 32497451.
https://doi.org/10.1080/01612840.2020.17...
).

A postura de adaptação foi vivenciada por esses profissionais pela percepção de que as piores fases da pandemia já haviam acabado, bem como pela adaptação às novas configurações de trabalho. O último aspecto merece atenção, uma vez que a adaptação pode significar a incorporação efetiva das práticas que foram modificadas, em especial àquelas que dizem respeito à presença dos membros familiares no ambiente hospitalar, conferindo, assim, prejuízo ao cuidado centrado no paciente e na família(33. Hart JL, Turnbull AE, Oppenheim IM, Courtright KR. Family-centered care during the COVID-19 era. J Pain Symptom Manage. 2020;60(2):e93–7. doi: http://doi.org/10.1016/j.jpainsymman.2020.04.017. PubMed PMID: 32333961.
https://doi.org/10.1016/j.jpainsymman.20...
).

A inovação nas formas de realizar o cuidado representa a maior parte das ações realizadas durante este período. Os enfermeiros reconheceram alternativas para as crianças terem acesso aos brinquedos, novas formas de comunicação e meios tecnológicos para estabelecer comunicação com a família. O uso da tecnologia para o cuidado foi a principal medida recomendada para a atenção à saúde durante esse evento sanitário(77. Aziz S, Arabi YM, Alhazzani W, Evans L, Citerio G, Fischkoff K, et al. Managing ICU surge during the COVID-19 crisis: rapid guidelines. Intensive Care Med. 2020;46(7):1303–25. doi: http://doi.org/10.1007/s00134-020-06092-5. PubMed PMID: 32514598.
https://doi.org/10.1007/s00134-020-06092...
,88. Gaulton J, Ziegler K, Chang E. Virtual practices transform the care delivery model in an intensive care unit during the coronavirus pandemic. NEJM Catal. 2020;1(3):1–11. doi: http://doi.org/10.1056/CAT.20.0169.
https://doi.org/10.1056/CAT.20.0169...
).

Além dessas medidas, houve a necessidade de avaliar e flexibilizar as rotinas restritivas de visitação e acompanhamento. Ao flexibilizar tais rotinas, os enfermeiros colocaram-se no lugar da família, tendo, assim, repercussões em seus processos de trabalho. Para a abordagem fenomenológica, toda autêntica compreensão do outro está fundada em atos de autointerpretação do sujeito que se dedica a compreender. Desse modo, emerge, nessa relação face a face, estabelecida entre enfermeiro, criança e família, o resgate da bagagem e do acervo de conhecimentos desses profissionais(1010. Schütz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018.).

Apesar das dificuldades vivenciadas, as mudanças trazidas pela pandemia trouxeram aprendizado. A troca de experiências com profissionais de outra instituição proporcionou novos conhecimentos. Com isso, houve maior atuação em equipe; aspecto que corrobora com outros estudos(2121. Villar RC, Nashwan AJ, Mathew RG, Mohamed AS, Munirathinam S, Abujaber AA, et al. The lived experiences of frontline nurses during the coronavirus disease pandemic in Qatar: a qualitative study. Nurs Open. 2021;8(6):3516–26. doi: http://doi.org/10.1002/nop2.901. PubMed PMID: 33949145.
https://doi.org/10.1002/nop2.901...
,2222. Liu Y-E, Zhai Z-C, Han Y-H, Liu Y-L, Liu F-P, Hu D-Y. Experiences of front-line nurses combating coronavirus disease-2019 in China: a qualitative analysis. Public Health Nurs. 2020;37(5):757–63. doi: http://doi.org/10.1111/phn.12768. PubMed PMID: 32677072.
https://doi.org/10.1111/phn.12768...
). Reavaliar o cuidado prestado à família também foi um aprendizado conferido aos enfermeiros; a importância dos pais como parceiros no cuidado e a responsabilidade da equipe clínica em estimular alternativas à presença da família também foram aspectos descritos(1717. Tedesco B, Borgese G, Cracco U, Casarotto P, Zanin A. Challenges to delivering family-centred care during the Coronavirus pandemic: voices of Italian paediatric intensive care unit nurses. Nurs Crit Care. 2020;26(1):10–2. doi: http://doi.org/10.1111/nicc.12578. PubMed PMID: 33263209.
https://doi.org/10.1111/nicc.12578...
). Por fim, o uso efetivo de medidas de segurança, outro aprendizado que ocorreu em virtude da alta transmissibilidade, além da contaminação de colegas e familiares(2626. Catania G, Zanini M, Hayter M, Timmins F, Dasso N, Ottonello G, et al. Lessons from Italian front-line nurses’ experiences during the COVID-19 pandemic: a qualitative descriptive study. J Nurs Manag. 2021;29(3):404–11. http://doi.org/10.1111/jonm.13194. PubMed PMID: 33107657.
https://doi.org/10.1111/jonm.13194...
).

A expectativa quanto ao cuidado e ao processo de trabalho, isto é, o desejo que os enfermeiros tinham em retomar um cuidado adequado às crianças, com melhores condições de trabalho foram aspectos vividos que indicam suas expectativas para projetos futuros, isto é, os “motivos para” da ação social(1010. Schütz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018.).

Em sua vivência, os enfermeiros demonstraram a incerteza sobre o término da pandemia, contudo, referiram o anseio por medidas seguras e valorização do trabalho realizado. Quanto à valorização, esse tem sido um aspecto comumente destacado(2727. Conz CA, Braga VAS, Vasconcelos R, Machado FHRS, Jesus MCP, Merighi MAB, et al. Experiences of intensive care unit nurses with COVID-19 patients. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e20210194. doi: https://doi.org/10.1590/1980-220X-REEUSP-2021-0194.
https://doi.org/10.1590/1980-220X-REEUSP...
). Já as projeções de medidas criativas, humanas e centradas na criança e na família representam uma importante expectativa que converge com o padrão de atendimento em pediatria, e que necessitam ser asseguradas em momentos de crise(33. Hart JL, Turnbull AE, Oppenheim IM, Courtright KR. Family-centered care during the COVID-19 era. J Pain Symptom Manage. 2020;60(2):e93–7. doi: http://doi.org/10.1016/j.jpainsymman.2020.04.017. PubMed PMID: 32333961.
https://doi.org/10.1016/j.jpainsymman.20...
).

CONCLUSÃO

A essência do fenômeno do presente estudo foi evidenciada nas mudanças trazidas pela pandemia, pela adaptação da equipe, frente ao cenário de restrições e riscos, e pelas expectativas dadas ao cuidado da criança, da família e ao processo de trabalho. Essa vivência trouxe aprendizagem, mas também dilemas éticos, pelas restrições estabelecidas para os visitantes e acompanhantes no ambiente hospitalar, e sofrimento moral, aos enfermeiros na tentativa de garantir o cuidado centrado na criança e na família.

  • Apoio financeiro O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001

REFERENCES

  • 1.
    Institute for Patient and Family Centered Care. What is patient- and family-centered care? Bethesda: Institute for Patient and Family Centered Care; 2020 [cited 2021 July 10]. Available from: https://www.ipfcc.org/
    » https://www.ipfcc.org/
  • 2.
    Darcy Mahoney A, White RD, Velasquez A, Barrett TS, Clark RH, Ahmad KA. Impact of restrictions on parental presence in neonatal intensive care units related to coronavirus disease 2019. J Perinatol. 2020;40(Suppl 1):36–46. doi: http://doi.org/10.1038/s41372-020-0753-7. PubMed PMID: 32859963.
    » https://doi.org/10.1038/s41372-020-0753-7
  • 3.
    Hart JL, Turnbull AE, Oppenheim IM, Courtright KR. Family-centered care during the COVID-19 era. J Pain Symptom Manage. 2020;60(2):e93–7. doi: http://doi.org/10.1016/j.jpainsymman.2020.04.017. PubMed PMID: 32333961.
    » https://doi.org/10.1016/j.jpainsymman.2020.04.017
  • 4.
    Maaskant JM, Jongerden IP, Bik J, Joosten M, Musters S, Storm-Versloot MN, et al. Strict isolation requires a different approach to the family of hospitalised patients with COVID-19: a rapid qualitative study. Int J Nurs Stud. 2021;117:103858. doi: http://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2020.103858. PubMed PMID: 33621720.
    » https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2020.103858
  • 5.
    Aboumatar H. Three reasons to focus on patient and family engagement during the COVID-19 pandemic. Qual Manag Health Care. 2020;29(3):176–7. doi: http://doi.org/10.1097/QMH.0000000000000262. PubMed PMID: 32590495.
    » https://doi.org/10.1097/QMH.0000000000000262
  • 6.
    Lemmon ME, Chapman I, Malcolm W, Kelley K, Shaw RJ, Milazzo A, et al. Beyond the first wave: consequences of COVID-19 on high-risk infants and families. Am J Perinatol. 2020;37(12):1283–8. doi: http://doi.org/10.1055/s-0040-1715839. PubMed PMID: 32911555.
    » https://doi.org/10.1055/s-0040-1715839
  • 7.
    Aziz S, Arabi YM, Alhazzani W, Evans L, Citerio G, Fischkoff K, et al. Managing ICU surge during the COVID-19 crisis: rapid guidelines. Intensive Care Med. 2020;46(7):1303–25. doi: http://doi.org/10.1007/s00134-020-06092-5. PubMed PMID: 32514598.
    » https://doi.org/10.1007/s00134-020-06092-5
  • 8.
    Gaulton J, Ziegler K, Chang E. Virtual practices transform the care delivery model in an intensive care unit during the coronavirus pandemic. NEJM Catal. 2020;1(3):1–11. doi: http://doi.org/10.1056/CAT.20.0169.
    » https://doi.org/10.1056/CAT.20.0169
  • 9.
    Morley G, Grady C, McCarthy J, Ulrich CM. COVID-19: ethical challenges for nurses. Hastings Cent Rep. 2020;50(3):35–9. doi: http://doi.org/10.1002/hast.1110. PubMed PMID: 32410225.
    » https://doi.org/10.1002/hast.1110
  • 10.
    Schütz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018.
  • 11.
    Kirchherr J, Charles K. Enhancing the sample diversity of snowball samples: recommendations from a research project on anti-dam movements in Southeast Asia. PLoS One. 2018;13(8):e0201710. doi: http://doi.org/10.1371/journal.pone.0201710. PubMed PMID: 30133457.
    » https://doi.org/10.1371/journal.pone.0201710
  • 12.
    Minayo MC S. Amostragem e saturação em pesquisa qualitativa: consensos e controvérsias. Revista Pesquisa Qualitativa. 2017 [cited 2021 July 10];5(7):1–12. Available from: https://editora.sepq.org.br/rpq/article/view/82
    » https://editora.sepq.org.br/rpq/article/view/82
  • 13.
    Kortchmar E. A experiência de reganho de peso após a cirurgia bariátrica: um enfoque fenomenológico [doutorado]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2018 [cited 2021 Oct 22]. Available from: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/7/7141/tde-23112018-155901/
    » http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/7/7141/tde-23112018-155901/
  • 14.
    Tong A, Sainsbury P, Craig J. Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ): a 32-item checklist for interviews and focus groups. Int J Qual Health Care. 2007;19(6):349–57. doi: http://doi.org/10.1093/intqhc/mzm042. PubMed PMID: 17872937.
    » https://doi.org/10.1093/intqhc/mzm042
  • 15.
    Brasil. Ministério da Saúde. Resolução n° 466, de 12 de dezembro de 2012. Dispõe sobre diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União; Brasília; 2012 [cited 2021 Mar 10]. Available from: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/reso466.pdf
    » http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/reso466.pdf
  • 16.
    Somekh I, Somech R, Pettoello-Mantovani M, Somekh E. Changes in routine pediatric practice in light of Coronavirus 2019 (COVID-19). J Pediatr. 2020;224:190–3. doi: http://doi.org/10.1016/j.jpeds.2020.05.053. PubMed PMID: 32497546.
    » https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2020.05.053
  • 17.
    Tedesco B, Borgese G, Cracco U, Casarotto P, Zanin A. Challenges to delivering family-centred care during the Coronavirus pandemic: voices of Italian paediatric intensive care unit nurses. Nurs Crit Care. 2020;26(1):10–2. doi: http://doi.org/10.1111/nicc.12578. PubMed PMID: 33263209.
    » https://doi.org/10.1111/nicc.12578
  • 18.
    Noronha KVMS, Guedes GR, Turra CM, Andrade MV, Botega L, Nogueira D, et al. Pandemia por COVID-19 no Brasil: análise da demanda e da oferta de leitos hospitalares e equipamentos de ventilação assistida segundo diferentes cenários. Cad Saúde Pública. 2020;36(6):e00115320. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311X00115320.
    » https://doi.org/10.1590/0102-311X00115320
  • 19.
    Jia Y, Chen O, Xiao Z, Xiao J, Bian J, Jia H. Nurses’ ethical challenges caring for people with COVID-19: a qualitative study. Nurs Ethics. 2021;28(1):33–45. http://doi.org/10.1177/0969733020944453. PubMed PMID: 32856534.
    » https://doi.org/10.1177/0969733020944453
  • 20.
    Rezaee N, Mardani-Hamooleh M, Seraji M. Nurses’ perception of ethical challenges in caring for patients with COVID-19: a qualitative analysis. J Med Ethics Hist Med. 2020;13:23. doi: http://doi.org/10.18502/jmehm.v13i23.4954.
    » https://doi.org/10.18502/jmehm.v13i23.4954
  • 21.
    Villar RC, Nashwan AJ, Mathew RG, Mohamed AS, Munirathinam S, Abujaber AA, et al. The lived experiences of frontline nurses during the coronavirus disease pandemic in Qatar: a qualitative study. Nurs Open. 2021;8(6):3516–26. doi: http://doi.org/10.1002/nop2.901. PubMed PMID: 33949145.
    » https://doi.org/10.1002/nop2.901
  • 22.
    Liu Y-E, Zhai Z-C, Han Y-H, Liu Y-L, Liu F-P, Hu D-Y. Experiences of front-line nurses combating coronavirus disease-2019 in China: a qualitative analysis. Public Health Nurs. 2020;37(5):757–63. doi: http://doi.org/10.1111/phn.12768. PubMed PMID: 32677072.
    » https://doi.org/10.1111/phn.12768
  • 23.
    Zhang Y, Wei L, Li H, Pan Y, Wang J, Li Q, et al. The psychological change process of frontline nurses caring for patients with COVID-19 during its outbreak. Issues Ment Health Nurs. 2020;41(6):525–30. http://doi.org/10.1080/01612840.2020.1752865. PubMed PMID: 32497451.
    » https://doi.org/10.1080/01612840.2020.1752865
  • 24.
    Coelho MMF, Cavalcante VMV, Moraes JT, de Menezes LCG, Figueirêdo SV, Branco MFCC, et al. Lesão por pressão relacionada ao uso de equipamentos de proteção individual na pandemia da COVID-19. Rev Bras Enferm. 2020;73(Suppl 2):e20200670. doi: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0670.
    » https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0670
  • 25.
    Góes FGB, Silva ACSSD, Santos ASTD, Pereira-Ávila FMV, Silva LJD, Silva LFD, et al. Desafios de profissionais de Enfermagem Pediátrica frente à pandemia da COVID-19. Rev Lat Am Enfermagem. 2020;28:e3367. doi: https://doi.org/10.1590/1518-8345.4550.3367. PubMed PMID: 32901774.
    » https://doi.org/10.1590/1518-8345.4550.3367
  • 26.
    Catania G, Zanini M, Hayter M, Timmins F, Dasso N, Ottonello G, et al. Lessons from Italian front-line nurses’ experiences during the COVID-19 pandemic: a qualitative descriptive study. J Nurs Manag. 2021;29(3):404–11. http://doi.org/10.1111/jonm.13194. PubMed PMID: 33107657.
    » https://doi.org/10.1111/jonm.13194
  • 27.
    Conz CA, Braga VAS, Vasconcelos R, Machado FHRS, Jesus MCP, Merighi MAB, et al. Experiences of intensive care unit nurses with COVID-19 patients. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e20210194. doi: https://doi.org/10.1590/1980-220X-REEUSP-2021-0194.
    » https://doi.org/10.1590/1980-220X-REEUSP-2021-0194

Editado por

EDITOR ASSOCIADO

Ivone Evangelista Cabral

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    06 Nov 2023
  • Aceito
    16 Abr 2024
Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: reeusp@usp.br