Open-access Avaliação da autoestima de gestantes com uso da Escala de Autoestima de Rosenberg

Evaluación de la autoestima de gestantes con uso de la escala de autoestima de Rosemberg

Resumos

O objetivo deste estudo descritivo e transversal foi avaliar a autoestima de 127 gestantes atendidas em programa de pré-natal de um hospital público de ensino. Os dados foram colhidos usando-se a Escala de Autoestima de Rosenberg; a autoestima insatisfatória foi relacionada a variáveis sócio-demográficas, de saúde da gestante e da presença ou não de sistemas de apoio. Os dados foram submetidos à análise estatística descritiva e análise univariada, buscando possíveis associações. As gestantes com autoestima insatisfatória totalizaram 60% da amostra. Em relação aos dados sócio-demográficos, as mulheres com menor escolaridade apresentaram maior frequência de escores de autoestima insatisfatória, divergindo de resultados de outros estudos. As gestantes que referiram gestação não planejada apresentaram maior prevalência de autoestima insatisfatória do que aquelas que referiram tê-la planejado. A ausência de apoio do parceiro para cuidar do filho após seu nascimento também esteve associada a menor autoestima nas grávidas. Não foram encontradas relações estatisticamente significativas para as demais variáveis estudadas.

Gestantes; Autoimagem; Cuidado pré-natal; Saúde da mulher


El objetivo de este estudio descriptivo y transversal fue evaluar la autoestima de 127 gestantes atendidas en el programa prenatal de un hospital público de enseñanza. Los datos fueron recolectados utilizando la Escala de Autoestima de Rosenberg; la autoestima insatisfactoria se relacionó con variables socio-demográficas, de salud de la gestante y de la existencia o no de sistemas de apoyo. Los datos fueron sometidos a análisis estadístico descriptivo y a análisis univariado, buscando posibles asociaciones. Las gestantes con autoestima insatisfactoria totalizaron el 60 % de la muestra. En relación a los datos socio-demográficos, las mujeres con menor escolarización presentaron mayor frecuencia de puntajes de autoestima insatisfactoria, divergiendo de resultados de otros estudios. Las gestantes que refirieron embarazo no planificado presentaron mayor prevalencia de autoestima insatisfactoria respecto de aquellas que refirieron haber planeado su gravidez. La ausencia de apoyo del compañero para cuidar del hijo con posterioridad al nacimiento también estuvo asociada a menor autoestima en las embarazadas. No se encontraron relaciones estadísticamente significativas para las demás variables estudiadas.

Mujeres embarazadas; Autoimagen; Atención prenatal; Salud de la mujer


The objective of this descriptive, cross-sectional study was to evaluate the self-esteem of 127 pregnant women seen in a prenatal care program conducted in a public school hospital. Data collection was performed using the Rosenberg's Self-esteem Scale; unsatisfactory self-esteem was related to socio-demographic and health variables of the pregnant woman, and to the presence or absence of support systems. Descriptive and univariate statistical analysis were used to assess possible associations. Pregnant women who had low scores for self-esteem were 60% of all subjects. As for the socio-demographic data, women with fewer years of education presented higher frequency of lower self-esteem scores, which disagrees with other studies. Pregnant women who report having an unplanned pregnancy presented higher prevalence of low self-esteem than those who reported having planned their pregnancy. The lack of support from the partner to look after the baby was also associated to the pregnant women's low self-esteem. Other associations between variables were not statistically significant.

Pregnant women; Self concept; Prenatal care; Women's health


ARTIGO ORIGINAL

Avaliação da autoestima de gestantes com uso da Escala de Autoestima de Rosenberg*

Evaluación de la autoestima de gestantes con uso de la escala de autoestima de Rosemberg

Ligia MaçolaI; Ianê Nogueira do ValeII; Elenice Valentim CarmonaIII

IGraduanda de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas. Bolsista PIBIC/CNPq. Campinas, SP, Brasil. ligiam@fcm.unicamp.br

IIEnfermeira. Professora Doutora do Departamento de Enfermagem da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de Campinas. Campinas, SP, Brasil. ianevale@hotmail.com

IIIEnfermeira. Professora Mestre do Departamento de Enfermagem Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de Campinas. Campinas, SP, Brasil. elenicevalentim@uol.com.br

Correspondência

RESUMO

O objetivo deste estudo descritivo e transversal foi avaliar a autoestima de 127 gestantes atendidas em programa de pré-natal de um hospital público de ensino. Os dados foram colhidos usando-se a Escala de Autoestima de Rosenberg; a autoestima insatisfatória foi relacionada a variáveis sócio-demográficas, de saúde da gestante e da presença ou não de sistemas de apoio. Os dados foram submetidos à análise estatística descritiva e análise univariada, buscando possíveis associações. As gestantes com autoestima insatisfatória totalizaram 60% da amostra. Em relação aos dados sócio-demográficos, as mulheres com menor escolaridade apresentaram maior frequência de escores de autoestima insatisfatória, divergindo de resultados de outros estudos. As gestantes que referiram gestação não planejada apresentaram maior prevalência de autoestima insatisfatória do que aquelas que referiram tê-la planejado. A ausência de apoio do parceiro para cuidar do filho após seu nascimento também esteve associada a menor autoestima nas grávidas. Não foram encontradas relações estatisticamente significativas para as demais variáveis estudadas.

Descritores: Gestantes. Autoimagem. Cuidado pré-natal. Saúde da mulher.

RESUMEN

El objetivo de este estudio descriptivo y transversal fue evaluar la autoestima de 127 gestantes atendidas en el programa prenatal de un hospital público de enseñanza. Los datos fueron recolectados utilizando la Escala de Autoestima de Rosenberg; la autoestima insatisfactoria se relacionó con variables socio-demográficas, de salud de la gestante y de la existencia o no de sistemas de apoyo. Los datos fueron sometidos a análisis estadístico descriptivo y a análisis univariado, buscando posibles asociaciones. Las gestantes con autoestima insatisfactoria totalizaron el 60 % de la muestra. En relación a los datos socio-demográficos, las mujeres con menor escolarización presentaron mayor frecuencia de puntajes de autoestima insatisfactoria, divergiendo de resultados de otros estudios. Las gestantes que refirieron embarazo no planificado presentaron mayor prevalencia de autoestima insatisfactoria respecto de aquellas que refirieron haber planeado su gravidez. La ausencia de apoyo del compañero para cuidar del hijo con posterioridad al nacimiento también estuvo asociada a menor autoestima en las embarazadas. No se encontraron relaciones estadísticamente significativas para las demás variables estudiadas.

Descriptores: Mujeres embarazadas. Autoimagen. Atención prenatal. Salud de la mujer.

INTRODUÇÃO

A literatura destaca a importância da atenção à saúde mental da gestante e sua relação com o desenvolvimento do vínculo mãe-filho(1-4). Entretanto, ainda é escassa sobre programas de pré-natal que abordem efetivamente as questões emocionais, visando auxiliar a mulher a lidar com o processo de gestação e a maternidade. Tendo em vista a repercussão dos aspectos emocionais da mulher na formação do vínculo com o filho, as autoras deste estudo procuraram avaliar a autoestima de um grupo de gestantes através da aplicação de uma escala.

O vínculo afetivo, atração que um indivíduo sente por outro, é entendido aqui como a formação de um compromisso emocional que leva a mãe a procurar satisfazer as necessidades do filho, desde alimentação, higiene a carinho e conforto(5). Autores(6-7) apontam em seus estudos que a relação que uma mãe constrói com seu filho é fruto de, dentre outras coisas, experiências emocionais vivenciadas por elas na infância e na vida. Se tais experiências foram difíceis, possivelmente causarão problemas no processo de formação de vínculo(3,6).

Toda mãe tem capacidade para cuidar de seu bebê, precisando apenas estar envolvida, confiante e dedicando-se a ele, o que é proporcional à intensidade do vínculo estabelecido em relação ao filho(1,8). E, de acordo com o resultado de estudos recentes, o nível de autoestima da mulher é essencial para o desenvolvimento do apego ao filho(9-11).

A autoestima é o juízo de valor que um indivíduo tem de si mesmo e que começa a ser moldado no cotidiano da primeira infância. Sua importância é grande na relação do indivíduo consigo mesmo e com os outros, influenciando sua percepção dos acontecimentos e principalmente seu comportamento. O sucesso frente a um desafio depende do estado emocional do indivíduo, o que está diretamente relacionado à qualidade da autoestima e seu nível de confiança(5). Logo, ao se lançar aos desafios da maternidade, quanto melhor o estado emocional da mulher, maior sua chance de sucesso nessa tarefa.

Portanto, a revisão da literatura sinalizou que as intervenções que melhoraram vínculo, com melhora do desempenho materno nas tarefas relativas ao bebê, foram aquelas que incluíram a atenção ao estado emocional da mulher decorrente da gestação. Os autores também apontam a necessidade de desenvolvimento de mais estudos com mães sobre autoestima e a relação desta com o vínculo mãe-filho(10-11).

Na assistência pré-natal as principais temáticas abordadas pelos profissionais de saúde junto às mulheres, tanto no atendimento individual quanto em grupo, ainda se restringem às questões fisiológicas da gestação, parto e pós-parto, destacando os cuidados com o bebê(2). Este tipo de abordagem é necessária, sem dúvida também favorece o vínculo e consiste em avanço. Entretanto, ainda é limitada, visto que enfatiza o bebê e sua saúde durante gestação e puerpério, em detrimento das necessidades da mãe como ser individual(3). Há mais de trinta anos, um autor(1) já afirmava que deixar de lado as necessidades da mulher é uma das coisas que mais contribuem para a baixa autoestima e para o desencadear de outros sentimentos negativos durante períodos emocionalmente delicados.

A discussão sobre a importância da autoestima na construção do vínculo mãe-filho tem sido desenvolvida por vários autores(1,8-11). Entretanto, são poucos os estudos que avaliaram a autoestima de gestantes, o que pode denotar pouca valorização deste tipo de avaliação na assistência pré-natal, seja pelos limites da formação dos profissionais ou pela estrutura dos serviços de atendimento à saúde. Assim, surgiu o interesse em desenvolver estudo que realizasse tal avaliação, estabelecendo subsídios para a proposição de intervenções na assistência pré-natal, o que inclui encaminhamento a profissionais especializados.

OBJETIVOS

Este estudo teve como objetivo geral avaliar a autoestima de gestantes. Os objetivos específicos foram: 1. Verificar a prevalência de baixa autoestima entre as gestantes; 2. Identificar se existe relação entre a autoestima das gestantes e seus dados sócio-demográficos, condição de saúde, assim como apoio recebido por companheiro e familiares.

MÉTODO

Trata-se de um estudo observacional, descritivo e transversal, realizado com gestantes atendidas em um hospital-escola do interior de São Paulo, que atende usuárias do Sistema Único de Saúde (SUS) da região metropolitana de Campinas. É um hospital terciário cujas atividades de atendimento obstétrico ambulatorial são distribuídas em oito ambulatórios: Pré-Natal de Alto Risco; Pré-Natal Especializado; Pré-Natal de Adolescentes; Revisão Puerperal; Revisão Puerperal de Adolescentes; Medicina Fetal e Aborto Recorrente.

O local de desenvolvimento deste estudo foi o Pré-Natal Alto Risco (PNAR) que, a despeito do nome, não tem como objetivo atender gestantes de risco com agravos, pois estas são atendidas no Ambulatório de Pré-Natal Especializado. Portanto, frequentam este ambulatório gestantes de demanda espontânea e aquelas que preferem não retornar para as Unidades Básicas de Saúde (UBS), após serem atendidas no Pré-Natal Especializado e liberadas para tal. Neste ambulatório são assistidas cerca de 60 mulheres por mês, em consultas médicas, de enfermagem, grupos educativos e atendimento multiprofissional quando necessário.

Foram incluídas no estudo todas as gestantes que estivessem no segundo trimestre de gestação: pela menor chance de ocorrerem sintomas freqüentes no primeiro trimestre da gestação (sentimentos ambivalentes quanto à descoberta da gestação, tontura, enjôo) e as dificuldades advindas de um corpo mais pesado e volumoso, como se dá no último trimestre. Considerou-se que tais sintomas poderiam influenciar negativamente os níveis da autoestima obtidos nesta amostra. Adolescentes não foram incluídas para obter-se amostra mais homogênea.

Os dados foram colhidos de fevereiro a março de 2007. A primeira autora deste trabalho, de posse da agenda do ambulatório, selecionava as gestantes que se enquadravam nos critérios estabelecidos e procurava um local próximo à sala de espera, onde pudesse conversar com a gestante sem interrupções e interferências.

Participaram do estudo 127 gestantes. O cálculo amostral foi feito considerando-se uma população-alvo estimada (180 gestantes) para um tempo de coleta de três meses. Para tanto, considerou-se: erro amostral de 0,5; média de 30,2 e desvio padrão de 2,1 dos escores obtidos em um pré-teste realizado com 12 gestantes. O nível de significância bilateral (alfa) considerado foi 0,05.

As variáveis estudadas foram: nível de autoestima, mensurado pela Escala de Autoestima de Rosenberg(12); características sócio-demográficas(4) (idade, escolaridade, ocupação, situação conjugal, relacionamento com o pai do bebê) e de saúde(4) das gestantes (número de gestações anteriores, número de filhos vivos, idade gestacional, idade gestacional em que iniciou pré-natal, mudança de humor, planejamento ou não da gravidez, preocupações com a gravidez, motivo pelo qual segue pré-natal na instituição); e dados sobre fontes de apoio(1,3) identificadas por elas (ajuda para cuidar do filho). Quanto à variável ocupação, trabalhar em casa refere-se às atividades domésticas desempenhadas sem remuneração; enquanto trabalho informal seria trabalho remunerado sem registro em carteira profissional, ao passo que o trabalho formal foi considerado o trabalho remunerado e com este registro.

A Escala de Autoestima de Rosenberg propõe uma medida unidimensional com dez itens destinados a avaliar globalmente a atitude positiva ou negativa do indivíduo em relação a si mesmo. Esta escala é de fácil aplicação, desenvolvida por Rosenberg em 1965, sendo amplamente utilizada e conhecida internacionalmente. No Brasil, estudos recentes têm demonstrado a confiabilidade desta Escala e apontado a importância de sua utilização em diferentes populações(13-14). No presente trabalho, foi utilizada versão com adaptação transcultural, considerada eficiente(12); a qual está apresentada como AnexoAnexo.

O escore obtido com a Escala pode variar de 10 a 40, sendo calculado somando-se as pontuações obtidas através das respostas dadas às 10 frases. Cada frase pode receber uma pontuação de, no mínimo, 1 e no máximo 4. Uma autoestima satisfatória é definida como escore maior ou igual a 30 na Escala de Rosenberg e insatisfatória com escore menor que 30(12).

Durante a coleta de dados, as gestantes liam as frases em um cartão dado em suas mãos ou, se preferissem, as frases eram lidas pela entrevistadora. Para cada frase foram orientadas a posicionarem-se dizendo se concordavam totalmente, concordavam, discordavam ou discordavam totalmente da frase. As opções de respostas estavam apresentadas em ordem diferente logo abaixo de cada frase, para que as gestantes fossem estimuladas a procurar a opção que melhor se adequasse a elas, sem responder de forma impensada e/ou automática.

Considerando os aspectos éticos, antes de iniciar a aplicação do instrumento, a autora explicava os objetivos do estudo e o conteúdo do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, explicitando que a identificação da entrevistada seria mantida em sigilo. O Termo foi lido e assinado por todas as gestantes da amostra, ficando uma cópia em poder das mesmas. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), com Parecer emitido sob o número 661/2006.

O programa de banco de dados utilizado foi o Epi Info. Para análise estatística utilizou-se o software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 14.0. Os dados coletados foram submetidos à análise estatística descritiva. Realizou-se teste de associação entre a variável principal (escore da Escala de Autoestima de Rosenberg) e as outras variáveis utilizando o qui-quadrado ou teste exato de Fischer.

Foi calculado o coeficiente alfa de Cronbach para checar a consistência interna da escala, obtendo-se 0,76 como resultado. Foi demonstrado que nenhum item comprometeu tal consistência.

RESULTADOS

As mulheres apresentaram idades gestacionais variando entre 13 e 27 semanas e seis dias. Mais da metade das entrevistadas (60,6% = 77 gestantes) apresentou autoestima insatisfatória. Os dados sócio-demográficos e de saúde das 127 gestantes são apresentados na Tabela 1.

Verificou-se predominância de gestantes com segundo grau completo (34,6%=44 gestantes), com companheiro fixo (92,9% = 118 gestantes), referindo bom relacionamento entre o casal (92,9%) e apoio familiar satisfatório. A maior parte das entrevistadas não tem atividade profissional (57,5% = 73 gestantes), como se verifica na Tabela 2.

Também a maioria das mulheres (67,7% = 86 gestantes) não planejou a gravidez e declarou ter preocupações em relação à mesma. A mudança de humor, como aumento da irritabilidade, esteve presente em cerca de metade das mulheres (Tabela 2).

A Tabela 3 mostra a relação entre o escore de autoestima insatisfatória e as variáveis de caracterização da amostra. Já a Tabela 4, a relação entre o escore de autoestima insatisfatório e a freqüência das demais variáveis relativas à gestação, pré-natal, condições de saúde e de relacionamento com o pai do bebê.

DISCUSSÃO

A faixa etária das gestantes da amostra não foi significativa na determinação dos escores de autoestima. Consultando a literatura, verificou-se que alguns autores apontam que quanto mais idade tem a mulher, melhor é o nível de autoestima(15); enquanto outros afirmam que essa relação não existe(6-7,16).

Neste estudo, encontrou-se relação significativa entre baixa escolaridade e autoestima insatisfatória, p = 0,04 (Tabela 3), o que discorda dos resultados de outros estudos(6-7,16). Enquanto a ocupação da gestante e sua situação conjugal não demonstraram relação com os níveis de autoestima.

Contrariando achados de outros autores(1,17-18); ter ou não emprego não influenciou significativamente os escores de autoestima nesta amostra. Entretanto, as gestantes tiveram necessidade de falar sobre sua percepção quanto à atividade laboral desempenhada: cuidar da própria casa foi uma atividade considerada como de menor valor por algumas entrevistadas, que se denominavam como apenas dona de casa. Aquelas que tinham emprego (formal ou não) mostravam-se muito apreensivas quanto à possibilidade de perdê-lo devido à gestação, além da preocupação com sua capacidade de conciliar trabalho e maternidade. Estas últimas se diziam especialmente preocupadas com a manutenção do emprego para possibilitar o sustento da casa e do novo membro da família.

Ao contrário da expectativa das autoras, quando o relacionamento com o pai do bebê foi considerado ruim pela entrevistada, isto não influenciou negativamente seu escore de autoestima. Também não houve relação significativa entre a autoestima das gestantes e o número de gestações anteriores ou o número de filhos vivos, o que corrobora com a literatura consultada(6-7).

Outras variáveis que não apresentaram relação estatisticamente significativa com os escores de autoestima foram: a idade gestacional no momento da entrevista; o trimestre de início do pré-natal; preocupações da gestante com a gravidez e a possibilidade de receber ou não auxílio para cuidar do bebê.

Este auxílio é discutido na literatura sob diferentes perspectivas: embora o suporte social à mulher seja considerado importante(3); também é apontado que conflitos entre a mulher e familiares, que se aproximam neste período (apontados por 72% das gestantes deste estudo como provável fonte de apoio), podem conturbar sua experiência mais que deixá-la tranquila(1).

Embora a relação entre a autoestima e a percepção de mudança de humor não tenha sido estatisticamente relevante, o tipo de mudança - quando negativa, como tristeza e irritabilidade - mostrou influência significativa na baixa autoestima (p=0,046).

A falta de planejamento da gravidez influenciou negativamente a autoestima das mulheres da amostra, tendo essa relação significância estatística (p = 0,019). A gravidez inesperada preocupou-as por motivos diferentes: a saúde da mulher como fator complicador da gestação; rompimento do relacionamento com o parceiro e o impacto financeiro sobre a família. Considerando esta questão da gravidez não planejada e sua interferência no processo de formação de vínculo mãe-filho, autores(6) ressaltam que, somado a outros problemas, não ter desejado ou planejado o nascimento do filho faz com que muitas mulheres reajam surpresas e confusas quanto ao papel materno, apresentando dificuldades no desenvolvimento de vínculo.

Também apresentou significância estatística a ausência de "ajuda do marido" após o nascimento do bebê, relacionando-se à autoestima insatisfatória das respondentes (p=0,042). Este fato corrobora com estudo(11) que aponta a falta de apoio do parceiro como fator de risco para problemas de saúde mental materna.

Sem dúvida, a gestação é um processo vivenciado por cada mulher de forma singular, trazendo significados diversos tanto para ela quanto para seus familiares. Independentemente das circunstâncias, a mulher necessita de acolhimento integral por parte daqueles que lhe prestam assistência, proporcionando-lhe condições para uma vivência positiva e construtiva da gestação e da maternidade(19). Considera-se, assim, que a autoestima é algo a ser levado em conta na assistência pré-natal.

CONCLUSÃO

Foi encontrada alta prevalência de autoestima insatisfatória entre as gestantes do grupo estudado com a aplicação da Escala de Autoestima de Rosenberg.

Quanto à caracterização dos sujeitos, o grupo apresentou, de forma predominante, segundo grau completo (34,6% = 44 gestantes), companheiro fixo (92,9% = 118 gestantes), bom relacionamento entre gestante e companheiro (92,9%) e apoio familiar satisfatório. A maior parte das mulheres não tem atividade profissional, não planejou a gravidez e apresenta doença crônica, o que as leva a ter preocupações quanto ao nascimento do bebê.

No que se refere às correlações entre os resultados obtidos com o uso da Escala e demais variáveis de estudo, verificou-se que:

• Em relação aos dados sócio-demográficos, as mulheres com menor escolaridade apresentaram maior freqüência de escores de autoestima insatisfatória, divergindo de resultados de outros estudos;

• As gestantes que referiram gestação não planejada apresentaram maior prevalência de autoestima insatisfatória do que aquelas que referiram terem planejado a gravidez, o que também se deu no caso de gestantes que relataram alterações negativas de humor;

• A falta de apoio do parceiro para cuidar do filho após nascimento influenciou negativamente a autoestima.

Não foram encontradas relações estatisticamente significativas para as demais variáveis propostas neste estudo.

Ressalta-se como uma limitação do estudo a não inclusão da perda de filhos anteriores como uma variável, devido ao expressivo número de mulheres que declararam número de gestações maior que o número de filhos vivos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma vez que o grau de autoestima da gestante é apontado na literatura como um dos fatores importantes para vinculação ao filho, o acompanhamento pré-natal oferece oportunidade de investigação deste aspecto, com consequente proposição de intervenções. A Escala de Autoestima de Rosenberg se mostrou um instrumento de fácil aplicação, podendo auxiliar este processo de investigação.

Considera-se relevante a replicação deste estudo em outras populações, já que não há possibilidade de, através deste, verificar se o baixo nível de autoestima encontrado na amostra é um fator relacionado à fase de vida em que se encontram as mulheres ou a uma condição pregressa.

A gestação é um período ideal para intervenções que visem, entre outras coisas, um trabalho de descoberta da futura mãe sobre si mesma e sobre o novo papel. O profissional deve demonstrar compreensão e atenção quanto aos sentimentos da gestante, o que também favorece o seu bem-estar e o vínculo com o filho. Assim, mostra-se necessária a elaboração de um conjunto de ações voltado para mulheres com o perfil delineado neste estudo, que possa ser aplicado nesse grupo e em outros. Sugere-se que as ações incluam oportunidades de discussão, com monitoramento de declarações da gestante em relação ao seu autoconceito, encorajando-a a identificar os aspectos positivos de suas experiências e características individuais.

Seria interessante garantir na assistência pré-natal momentos para discussões sobre expectativas relacionadas à maternidade, sentimentos durante a gestação, participação ou não do companheiro e preocupações com a gestação ou decorrentes dela: condição sócio-econômica; dificuldades para conciliar emprego, serviço de casa e desempenho de outras atividades diárias e o papel de mãe; problemas de saúde durante a gestação, entre outras questões. Isso poderia favorecer a verbalização de incômodos e sentimentos que estejam conturbando o processo de gestação e que não poderiam, de outra forma, ser expostos e acolhidos.

No processo de assistência pré-natal, são necessárias estratégias que favoreçam a percepção da gestação como evento significativo e não como fardo. Evento este que, se encarado como desafio, deve ser aceito com o estabelecimento de metas realistas, valorizando-se cada progresso. Considerada como parte do programa de assistência pré-natal, destaca-se a necessidade da multidisciplinaridade nas intervenções, com a participação de médicos, enfermeiros, psicólogos e assistentes sociais, profissionais presentes na maioria dos serviços.

Recebido: 20/01/2009

Aprovado: 18/08/2009

Financiada pelo PIBIC/CNPq.

* Extraído da pesquisa de Iniciação Científica "Avaliação da auto-estima de gestantes: subsídio para proposição de intervenções que favorecem o vínculo com o bebê", Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, 2007.

Escala de autoestima de Rosenberg(12)

1- No conjunto, eu estou satisfeito comigo.

Concordo totalmente / concordo / discordo /discordo totalmente

2- Às vezes, eu acho que não presto para nada.

Discordo totalmente / discordo / concordo / concordo totalmente

3- Eu sinto que tenho várias boas qualidades.

Concordo totalmente / concordo / discordo /discordo totalmente

4- Eu sou capaz de fazer coisas tão bem quanto a maioria das pessoas.

Discordo totalmente / discordo / concordo / concordo totalmente

5- Eu sinto que não tenho muito do que me orgulhar.

Discordo totalmente / discordo / concordo / concordo totalmente

6- Eu, com certeza, me sinto inútil às vezes.

Concordo totalmente / concordo / discordo /discordo totalmente

7-Eu sinto que sou uma pessoa de valor, pelo menos o mesmo nível que as outras pessoas.

Concordo totalmente / concordo / discordo /discordo totalmente

8-Eu gostaria de poder ter mais respeito por mim mesmo.

Discordo totalmente / discordo / concordo / concordo totalmente

9-No geral, eu estou inclinado a sentir que sou um fracasso.

Concordo totalmente / concordo / discordo /discordo totalmente

10-Eu tenho uma atitude positiva em relação a mim mesmo.

Discordo totalmente / discordo / concordo / concordo totalmente

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Anexo

  • Correspondência:
    Ianê Nogueira do Vale
    Rua Frei Manoel da Ressureição, 942 - Jardim Guanabara
    CEP 13073-221- Campinas, SP, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Out 2010
    • Data do Fascículo
      Set 2010

    Histórico

    • Recebido
      20 Jan 2009
    • Aceito
      18 Ago 2009
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